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Infectologista diz que novo coronavírus assusta mais que HIV e H1N1

Com a experiência de quem acompanhou a proliferação da aids e da gripe suína, Boaventura Braz de Queiroz compara a Covid-19 à Segunda Guerra Mundial

Gestão responsável evita desabastecimento

Esse bem essencial para a vida – e cada vez mais escasso – tem merecido atenção especial do Governo de Goiás desde o início de nossa gestão

Covid-19 já deu mais de R$ 10 milhões em prejuízo para o turismo em Goiás, estima associação

Setor de Turismo é um dos mais impactados pela disseminação do novo coronavírus no mundo. Municípios goianos param a atividade

Goianas contam como encaram a quarentena na Itália e em Portugal

Relatos de duas goianas mostram como a Europa lida com a pandemia do novo coronavírus [caption id="attachment_242560" align="alignnone" width="620"] Novo coronavírus surgiu na China e se espalhou pelo mundo. Europa é o novo epicentro da pandemia | Foto: Reprodução[/caption] “Acredito que, a princípio, as pessoas estavam mais calmas pensando que não era para tanto, não precisavam entrar em pânico”, diz a publicitária goiana Ana Luiza Ciuffreda, de 37 anos, sobre a pandemia de Covid-19, doença provocada pelo novo coronavírus (Sars-Cov-2), que assola a Itália. Ela e o marido vivem em Milão e estão em quarentena em um apartamento no Affori Centro desde o dia 9 de março. Ela diz que no primeiro momento, os italianos tomaram medidas como lavar bem as mãos, mas continuaram a levar a vida normalmente. Escolas, academias, universidades, pontos turísticos e museus foram fechados. Tentou evitar pegar transporte público (metrô e ônibus ) ao máximo, mas podia ir para o trabalho, academia e supermercado a pé.  O marido dela, o desenvolvedor de software Antônio Ciuffreda, de 37 anos, não foi dispensado pela empresa para trabalhar em casa e continuou a pegar dois metrôs para ir ao trabalho de segunda a sexta-feira.  No início o governo lançou uma campanha publicitária, com um vídeo com a hashtag #milanononsiferma que significa algo como “Milão não para”.  Porém, uma semana depois, no último dia 8, o primeiro-ministro, Giuseppe Conti, decretou quarentena, com fechamento das fronteiras da Lombardia, onde fica a cidade de Milão, no norte da Itália. 

Quarentena

[caption id="attachment_242562" align="alignleft" width="300"] A publicitária Ana Luiza Ciuffreda está em quarentena em Milão, no norte da Itália (Foto: Arquivo Pessoal)[/caption] Foi tudo muito rápido. Já na segunda-feira seguinte após o fechamento das fronteiras da Lombardia, Giuseppe Conti decretou quarentena por toda a Itália. Houve restrição quase total de movimentação pelo país e fechamento do comércio, exceto supermercados e farmácias. “Foi aí que começamos a perceber que realmente não era só uma simples gripe, que o corona é um vírus que causa um caos social muito grande mesmo não sendo letal pra maioria das pessoas”, diz Ana Luíza. “Os hospitais estão lotados e tiveram, por exemplo, que aumentar o número de leitos em 60% em questão de dias”, aponta. A Organização Mundial de Saúde (OMS) classificou a Covid-19 como pandemia na quarta-feira, 11, e na sexta-feira, 13, o mesmo órgão considerou o continente europeu, e não mais a China, como o centro global da doença. A Itália, que até então registrava mais de 15 mil casos e 1.016 mortes, era o epicentro da epidemia na Europa. A taxa de mortalidade escalou rapidamente, chegando a oito vezes maior que a Coreia do Sul, que adotou o esquema de testes em praticamente todos os infectados por coronavírus, localização dos contatos dessas pessoas e confinamento. Na Itália, que não adotou tais medidas, 6,21% dos pacientes com Covid-19 morreram. No país asiático, apenas 0,7%. O país europeu registrou, na última quarta-feira, 18, o maior número de mortes em um único dia: 475, chegando ao total de vítimas de 2.978. O que deixou o sistema de saúde da Itália praticamente colapsado e fez com que médicos passassem a escolher dar tratamento paliativos para os pacientes que não respondem bem.

Rotina

“Desde então vivemos em absoluta quarentena, só saindo para ir ao supermercado ou farmácia, que são os únicos locais públicos abertos”, explica Ana Luiz. “No meu caso, do meu marido, sócio e amigos próximos, nós temos a sorte de poder trabalhar em casa. Todos são aconselhados a trabalhar de casa”, diz.  Para sair é preciso ter uma boa justificativa. Ainda assim, há risco de a polícia parar quem se aventure na rua e indague o porquê a pessoa está fora de casa. Há, inclusive, multas pesadas para quem desobedecer. O número de multas a cidadãos que violaram a quarentena chegou a 27.616 desde que o decreto entrou em vigor.  Ana Luzia diz que uma amiga que foi levar as compras do supermercado para a mãe, que é idosa, chegou a ser abordada por um policial. “Desde que a quarentena começou saímos somente uma vez para ir ao supermercado e à farmácia. Me senti bastante tensa, com medo do contágio e apreensiva tendo que manter a distância das pessoas. A vida perde a naturalidade uma vez que temos que pensar nos mínimos detalhes para se proteger”, afirma.  “Com quase dez dias de quarentena, eu pessoalmente me sinto um pouco ansiosa, desorientada e com bastante dificuldade de concentração e até mais emotiva”. 

Em Portugal, há medo de desemprego

[caption id="attachment_242771" align="alignleft" width="300"] A editora Aline Soares Lima, de 37 anos, relata que Portugal têm seus primeiros efeitos (Foto: Arquivo Pessoal)[/caption] Enquanto a Itália experimenta momento de pânico, sem saber exatamente como e quando a epidemia vai acabar, Portugal ainda registra suas primeiras mortes. Entre elas, de Mário Veríssimo, antigo massagista do clube de futebol Estrela da Amadora e amigo de Jorge Jesus, treinador do Flamengo. E do presidente conselho de administração do banco Santander, António Vieira Monteiro.   A Direção-Geral da Saúde, órgão português semelhante ao Ministério da Saúde, emitiu recomendações às empresas aconselhando-as a definir planos de contingência para casos suspeitos entre os trabalhadores. Ela estabelece zonas de isolamento e regras específicas de higiene, evitando reuniões, e que devem se preparar para que funcionários não trabalhem, em caso de doença, além de eventual suspensão de transporte público e fechamento das escolas. Ainda assim, o clima não é dos melhores. A percepção geral é de que o número de casos aumentará, o que pode gerar medidas mais drásticas e afetar a estabilidade econômica. A diretora editorial Aline Soares Lima, de 37 anos, explica que a sensação é a de que quem está em situação de emprego precário vai ficar sem trabalho e os trabalhadores independentes também vão ficar sem boa parte dos rendimentos.  [caption id="attachment_242564" align="alignleft" width="300"] Rua Miguel Bombarda, Porto, por volta das 19h. Horário que geralmente há cafés abertos, restaurantes e muita gente a passear | Foto: Arquivo Pessoal[/caption] Aline, que saiu de Goiânia há 9 anos para fazer pós-graduação na cidade do Porto, afirma que o mercado está sendo afetado em todos os setores. O turismo é uma das áreas mais atingidas e o turismo tem representado muito para a economia portuguesa. Sobretudo para os brasileiros, já que a maioria trabalha na área de restaurantes. Com os estabelecimentos fechados, acabam sem trabalho. “A situação é preocupante não só pela saúde, mas pelo colapso social”, diz.  O governo português tem tomado medidas de contenção da propagação, ainda não radicais. As escolas estão fechadas, shopping, cinemas, academias, faculdades, serviços públicos e supermercados com horário reduzido. Portugal amargou seus piores momentos após a crise de 2008, mas conseguiu se levantar, em grande parte devido ao turismo, o que atraiu hordas de brasileiros para o país da Península Ibérica.

Ações

A decisão de decretar estado de emergência preocupava os portugueses e só foi decretada na última quarta-feira, 18, justamente para que a economia não fosse tão afetada. Embora haja consenso que o caso da Itália é paradigmático, é a primeira vez desde 1975 que o país decreta este tipo de medida.   Aline diz que as cidades portuguesas estão mais vazias e mais tristes, porque há muitos estabelecimentos fechados. Ela afirma que, nos primeiros dias de aulas suspensas e de trabalho remoto, muita gente foi para os cafés, praia, parques. No entanto, os parques, bibliotecas e tudo que é de gestão do estado foram fechados e as praias, interditadas.  [caption id="attachment_242565" align="alignleft" width="300"] Ruas da cidade do Porto, em Portugal, estão vazias devido às medidas de contenção | Foto: Arquivo Pessoal[/caption] “Tudo está diferente, há sempre um clima de tensão no ar, os supermercados estão a ficar vazios. Algo curioso, o item que primeiro acabou nos supermercados foi o papel higiênico, não se entende bem a razão”, aponta.  “A primavera está a chegar e a cidade iria ficar novamente inundada de turistas, agora está tudo vazio. Moro numa rua no centro do Porto onde há muita agitação artística por causa das galerias de arte que existem aqui. Hoje estava tudo vazio, galerias fechadas, cafés”, relata.  Ela acompanha o que acontece no Brasil e diz que ainda não há uma percepção real do que acontece. Parece ser, para os brasileiros, uma realidade distante, embora em muitas cidades recomendem o distanciamento social.  Aline diz ter cogitado voltar para o Brasil, mas não considera que a situação no país não seja 100% segura. Além disso, não tem plano de saúde, por isso estaria mais vulnerável e poderia ser ainda mais uma pessoa para inflacionar o Sistema Único de Saúde (SUS). “Não nos resta mais nada a não ser ficar em casa, trabalhar e tentar não enlouquecer com as notícias e com o isolamento. Eu moro sozinha e ficar uma semana, duas, um mês em isolamento parece realmente dramático”, lamenta.

Goiás adota medidas necessárias para não virar uma Itália, aponta infectologista

A primeira ação do governador Ronaldo Caiado (DEM), após a confirmação de três casos em território goiano da Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus (Sars-Cov-2), foi decretar estado de emergência da Saúde em Goiás. A partir daí, decretos assinados pelo chefe do executivo cancelaram grandes eventos, fecharam escolas, promoveu o teletrabalho para servidores públicos, fechou comércios e shopping centers, reduziu número de cirurgias eletivas. Tudo para que a curva do gráfico de infectados pelo vírus se achate o máximo possível. O limite principal é o número de doentes que o sistema público de saúde, no caso do Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS), consiga absorver sem colapsar. Esse é o grande problema da Covid-19. No início da epidemia argumentava-se que outras contaminações tinham o índice de morte mais elevado que o novo coronavírus. A taxa de letalidade calculada com base nos últimos dados oficiais divulgados é de 3,2%. Para se ter uma ideia, a síndrome respiratória aguda grave (Sars) matou quase 10% dos infectados na China. Já a síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS), também um coronavírus, possui taxa de mortalidade de 39%. O ebola chega a 60%.  A questão é que, como a Sars, a Covid-19 pode evoluir para um quadro de pneumonia atípica — pneumonia inflamatória em parte deflagrada pela reação imunológica do paciente. Um tipo difícil de conter, pois não diretamente causada por um agente infeccioso (como uma bactéria ou vírus). Gripes, por exemplo, podem levar a quadros de pneumonia, mas como infecções secundárias. No caso da Covid-19, a pneumonia atípica é a progressão da doença, não uma infecção secundária.  Isso quer dizer que todas as pessoas que apresentam sintomas mais graves da doença precisam dos chamados ventiladores mecânicos. Ou seja, precisam ficar entubadas para que um aparelho faça a respiração para elas. O que provoca a internação de um número elevado de pessoas com equipamentos específicos e pode colapsar o sistema de saúde. Por isso, as medidas de contenção.

Timing

Segundo a infectologista Luciana Duarte de Morais é preciso não perder o timing. Ela diz que nos casos da Itália e da Espanha provavelmente as medidas de supressão não foram feitas a tempo — rompimento das cadeias de transmissão, para deter a epidemia e reduzir os casos ao menor número possível, como fez a China. O que levou a um contágio muito rápido de muitas pessoas, culminando com o colapso dos sistemas de saúde. Para ela, em Goiás, estão sendo adotadas as medidas indicadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) já no princípio da epidemia, o que tem o potencial de diminuir a curva no gráfico dos infectados pela doença. A partir do momento em que passa a haver contaminação do tipo comunitária, aquela em que os agentes de saúde não conseguem mapear a cadeia de infecção, a tendência do gráfico é verticalizar. Nesse momento é que as medidas de contenção devem ser eficazes para diminuir os casos. Por isso, aponta a infectologista, não há outra solução que não evitar o contato físico. É preciso mesmo restringir a movimentação das pessoas para assim diminuir o risco de contaminação, já que ela é altíssima para o novo coronavírus. Num piscar de olhos, a Itália passou de poucos infectados a um estado de calamidade pública que nem mesmo a quarentena radical conseguiu conter o avanço da doença.  “Se não houver o isolamento social, podemos registrar um aumento muito grande dos casos e o sistema de saúde não consegue absorver. O que leva a pacientes com prognósticos bons acabando evoluindo para óbitos”, diz.

Aprendizado

Luciana Duarte aponta que as medidas tomadas para conter o Sars-Cov-2 podem servir de aprendizado para novas epidemias no futuro, assim como os governos estão utilizando do que foi aprendido com a Mers e a Sars. “Cada vírus e epidemia é diferente. No entanto, vamos testando e adquirindo a experiência. Se um dia acontecer de novo, já teremos uma ideia de medidas drásticas e rápidas para conter a doença e não cometermos os erros que tivemos na Itália, por exemplo”, avalia.

Zika dá pistas para compreender como pode terminar o novo coronavírus

Virologista explica que fim levou a zika, iluminando o que pode ocorrer com a pandemia de coronavírus se países colaborarem no controle da doença

Longe do horror da fome e da repressão, venezuelanos chegam a Goiás em busca de recomeço

Desde 2017, mais de 450 mil venezuelanos chegaram ao Brasil atrás de uma vida melhor. Em Goiás, eles tentam a sorte e revelam o sofrimento vivenciado no país de origem [caption id="attachment_241437" align="alignnone" width="620"] Thania viu a situação na Venezuela como insustentável, e decidiu vir para o Brasil atrás de uma vida melhor / Foto: Ton Paulo[/caption] Sentada à uma mesa, Jonalquiz Viviana se distrai com a tinta descascada do móvel enquanto fala. Apesar da expressão dura e do tom de voz firme, a venezuelana de 36 anos deixa escapar algumas lágrimas durante seu relato. Ela conta que seu nome, Jonalquiz, quer dizer “Felicidade” num dialeto local de seu país. Entretanto, tal sentimento só voltou a ser experimentado por ela no ano passado, quando deixou a Venezuela para tentar uma vida melhor em solo tupiniquim. Desde o início da década, o país que faz divisa com o Brasil vem experimentando uma fuga em massa da população, impulsionada pelo aprofundamento da crise econômica e pelas contínuas violações de Direitos Humanos perpetradas pelo controverso comandante da nação, Nicolás Maduro. De acordo com dados da Operação Acolhida, promovida pelo Exército Brasileiro, 454.890 venezuelanos entraram no Brasil entre 2017 e 2019. Crianças, jovens, adultos e idosos, homens e mulheres, todos fugindo da mesma coisa: o cenário de guerra que vive o país sul-americano governado por Maduro. Jonalquiz faz parte de um grupo de 128 que chegou em Roraima, especificamente na região de Boa Vista, no início do ano passado. Ela veio para o Brasil com a filha Liz, de 10 anos, e a companheira Anni, que também tem dois filhos pequenos, de 12 e 15 anos. Elas foram algumas das beneficiadas pela iniciativa da entidade filantrópica Obras Sociais do Centro Espírita Irmão Áureo (Osceia), de Goiás, em parceria com o Exército Brasileiro, Corpo de Bombeiros e missionários que atuam em Roraima. Natural do estado de Anzoátegui, Jonalquiz revela que decidiu vir para o Brasil após a situação na Venezuela ficar insustentável. Não foi fácil, e as dificuldades começaram logo que pisou em solo brasileiro. Ela conta que, logo quando chegou em Roraima, suas malas, com todos os seus pertences, foram roubadas. Jonalquiz e Anni tiveram que ficar na rua, juntamente com as crianças, sem ter o que comer ou vestir. Só depois as venezuelanas tiveram contato com a obra da Osceia e deram entrada no programa de interiorização - estratégia de deslocamento de imigrantes venezuelanos para outros estados, que conta com apoio do governo federal e da Organização das Nações Unidas (ONU). Em Goiás há três meses, onde chegou num avião da Força Aérea Brasileira (FAB) junto com outros venezuelanos, Jonalquiz trabalhava como comerciante em seu país natal, apesar de se declarar formalmente como operadora de máquinas pesadas. A rotina era dura na Venezuela: a jornada de trabalho começava às 5h e ia até às 20h. Entretanto, apesar de passar o dia todo e parte da noite trabalhando, o poder de compra do dinheiro que vinha no salário no fim do mês refletia a situação da Venezuela. Num português ainda misturado com espanhol, Jonalquiz narra como era ir ao supermercado quando recebia seu pagamento: “Não dava para comprar nada, sabe. Com o dinheiro, a gente comprava um pacote de arroz, um pouquinho de carne, algumas verduras e o que dava para produto [de higiene] pessoal”. [caption id="attachment_241438" align="alignleft" width="428"] Jonalquiz foi roubada quando chegou ao Brasil, mas não desistiu / Foto: Ton Paulo[/caption] Jonalquiz conta que era frequente, devido à inflação desenfreada do país, observar um aumento de preço vertiginoso em alimentos e outros itens no supermercado. “Nós comprávamos uma coisa hoje por 50, e no dia seguinte o preço já era 100. Não dava para comprar nada, não”, diz. Atualmente, um dólar é equivalente a cerca de 73.600 bolívares venezuelanos. Por causa de seu trabalho como comerciante, em que tinha contato direto com alimentos, Jonalquiz revela que costumava “regalar” seus amigos com comida. De acordo com ela, era uma forma de tentar reduzir o sofrimento dos amigos à sua volta. “Eu via muita, mas muita gente com necessidade, passando fome. Eu nunca passei fome, porque sempre trabalhei muito, mas muitos lá não conseguem emprego, não tem o que comer. E quando trabalham, não conseguem comprar nada com o dinheiro que ganham”, conta. Aqui no Brasil, tanto ela quanto sua companheira, com quem está há nove anos, estão trabalhando. Jonalquiz como auxiliar de limpeza e Anni como cozinheira. O dinheiro que ganha é o suficiente para se manter aqui, ainda com ajuda da Osceia, e mandar um pouco para a mãe, que ainda vive na Venezuela mas que também deve vir em breve para o Brasil. Enquanto fala com a reportagem, Jonalquiz enfatiza o tempo todo o quanto está feliz no Brasil. Apesar da primeira má impressão ao chegar em Roraima, onde teve seus pertences roubados, ela agradece pelo fato de ter sua filha, assim como os filhos de sua companheira, na escola, de poder trabalhar e ganhar seu dinheiro e de poder ajudar quem ainda permanece na Venezuela. Quando perguntada se tem vontade de regressar ao país natal, Jonalquiz responde que sim, “mas no futuro, quando a Venezuela voltar a ser um bom lugar de se viver”.A gente só podia fazer uma refeição por dia”, diz venezuelana que veio com as filhas para o BrasilAgora estou falando dois idiomas: espanhol e português”, diz, entre risos, a venezuelana Thania Velez, de 28 anos. Ela está no Brasil há pouco mais de um ano, e veio no mesmo grupo de Jonalquiz. Também amparada pela Osceia, a moça de olhar doce se gaba de estar tendo aulas de Língua Portuguesa oferecidas pela entidade filantrópica, uma vez que, segundo ela, o idioma é uma das maiores dificuldades desde que pisou em território brasileiro. Thania, que também veio de Anzoátegui, tem duas filhas: Victoria, de 7 anos, e Valéria, de apenas um ano. Na Venezuela, a moça trabalhava vendendo verduras ao lado da irmã. O negócio familiar era suficiente para suprir suas necessidades e das filhas, mas esse tempo ficou no passado. Segundo Thania, os últimos cinco anos foram de miséria e sofrimento para o povo venezuelano. Assim como Jonalquiz, Thania decidiu vir para o Brasil após ver seu país amargar numa depressão econômica agravada por repressão e violação de direitos por parte do governo. Ela relata que o primeiro sentimento que teve ao chegar ao Brasil, em Roraima, foi o de “tranquilidade”. “Eu fiquei mais calma no primeiro momento que pisei aqui [no Brasil], porque eu vi muita coisa que não via há muito tempo na Venezuela, como muita comida, pessoas usando produtos de higiene pessoal, medicamentos. Lá [na Venezuela] não tem mais isso”. De acordo com Thania, suprimentos básicos são cada vez mais escassos para a população venezuelana. Com supermercados vazios, o que ainda há de alimento disponível para compra custa valores além do que o povo pode pagar. “É em dólar, não tem como comprar”, diz. Ela conta que as pessoas preferem comprar verduras do que arroz, por exemplo, devido ao valor menor e à maior quantidade disponível do alimento. Com os olhos marejados, Thania revela que lhe doía ver pais de crianças tendo que escolher entre comprar sapatos para seus filhos irem à escola ou comprar comida. “Os pais preferiam comprar o que comer do que sapatos para seus filhos. Minha filha Victoria estudava lá, chegou um momento em que fiquei preocupada, porque não tinha mais dinheiro para comprar o que ela precisava para ir à escola”, relembra. O dinheiro para comprar comida, oriunda da venda de verduras, também era escasso. Segundo Thania, o alimento comprado só era suficiente para uma refeição por dia, às vezes – raras – duas. [caption id="attachment_241439" align="alignright" width="379"] "Só fazia uma refeição por dia", relembra Thania / Foto: Ton Paulo[/caption] Todavia, a venezuelana recorda que nem sempre foi assim. Até o ano de 2014, segundo ela, a população da Venezuela vivia bem. O trabalho exercido por ela e pelos familiares e amigos era o bastante para comprar comida, vestimentas e até para o lazer. “Antes eu tinha uma vida boa. Todo mundo tinha trabalho, tínhamos dinheiro para tudo, para fazer mercado, para roupas. Hoje não tem mais isso não. Hoje o dinheiro é só para comer um vez por dia”. Assim como Jonalquiz, Thania trabalha em Goiás como auxiliar de limpeza e também manda dinheiro para a mãe, de 57 anos, que vive na Venezuela. Ela expõe a saudade que sente, e revela que aquela era a primeira que vez que teve que se separar dela. “Hoje só posso falar com a minha mãe por telefone, mas está tudo bem. Estou trabalhando, estou ajudando ela”, conta. Thania é questionada pela reportagem se ela tem um sonho para o futuro. A pergunta parece pegá-la desprevenida. Com a voz embargada e já com lágrimas descendo pelo rosto, ela responde: “Sim. É que a Venezuela volte a ser como antes, e que eu me reencontre com minha mãe, e mi papa...”. Repressão, violência e criminalidade Num país em crise, quando os efeitos do desemprego e da fome passam a ser sentidos, os Direitos Humanos começam a virar “privilégios” de poucos. Esse parece ter sido o caso da Venezuela. Segundo Jonalquiz e Thania, a truculência policial e a violação da integridade do povo venezuelano por parte do Estado tornou-se uma amarga rotina para os que lá permaneceram. De acordo com as venezuelanas, a polícia de seu país natal acabou sendo absorvida por um sistema autoritário que não mede esforços para conter manifestações de insatisfação quanto ao cenário vigente. Professores, idosos e até crianças, segundo elas, são vítimas de truculência policial e das mais variadas formas de violação de direitos quando são “pegas”. “Todo dia, todo dia a gente vê mortos e mortos nas notícias. Tanto pela violência, pela delinquência, quanto pela polícia. Não importa se é um menino, eles [policiais] podem atirar na sua cara. Professores que têm um telefone, ou qualquer coisa boa, a polícia primeiro toma essa coisa e depois faz mal para a pessoa, pode até matar”, revela Jonalquiz. Mesmo a busca do povo venezuelano por ajuda externa era duramente reprimida por Maduro, conforme Thania. Ela conta que, na época em que o país começou a receber ajuda humanitária de outros países, doações de alimentos e medicamentos destinadas à população chegavam à Venezuela e eram prontamente destruídas pelo presidente. “Mandavam medicamentos, mandavam comida, mas o presidente não deixava que pegássemos não. Ele mandava queimar tudo, dizia que estava tudo contaminado”, revela. No final de setembro do ano passado, o Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas (ONU) aprovou uma resolução sobre a situação dos direitos humanos na Venezuela, apresentada pelo Brasil com os países que compõem o Grupo de Lima. A informação se deu em comunicado pelo Ministério das Relações Exteriores brasileiro. Segundo a nota, divulgada na época, havia profunda preocupação “com a situação alarmante dos direitos humanos na Venezuela, que inclui violações contra todos os direitos humanos – civis, políticos, econômicos, sociais e culturais – no contexto da corrente crise política, econômica, política, social e humanitária” provocada pelo regime do presidente Nicolás Maduro, atualmente no poder. Entidade filantrópica com mais de 35 anos de existência ofereceu amparo a refugiados venezuelanos Fundada em Goiânia, em maio de 1984, a Obras Sociais do Centro Espírita Irmão Áureo (Osceia) é uma entidade filantrópica não governamental que se propõe, segundo a mesma, a "promover a assistência social e a educação". Mantendo-se de doações, a entidade conseguiu, com o apoio do governo federal e de órgãos ligados à ONU, transferir 26 famílias venezuelanas de Boa Vista, em Roraima, para Goiás, oferecendo a elas amparo e oportunidades para um novo recomeço em solo brasileiro. Com o anúncio da chegada dos venezuelanos a Goiás, em novembro de 2019, a Osceia conseguiu arrecadar, através de instituições e empresas parceiras, móveis, alimentos, roupas, medicamentos, calçados, eletrodomésticos e até doações em dinheiro. Segundo a entidade, assim que chegam ao Estado, os refugiados recebem auxílio para a entrada no mercado de trabalho, através de intermédio da Osceia, e escola gratuita para as crianças. Além disso, a entidade aluga uma casa com móveis para cada família pelo período de três meses, até que os adultos possam se estabilizar e conseguir empregos. Para cada família acolhida pela Osceia, é designada um tutor. Ele possui o papel de assistir a cada família em suas necessidades no período de adaptação. Para entidade, a atuação deles auxilia o recomeço dos refugiados após uma história de sofrimento. De acordo com um informativo da Osceia, “mais do que acompanhar, os tutores desempenham o papel da atenção e da fraternidade, representando de perto todos os voluntários que auxiliam direta e indiretamente”.  

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Após dois meses em vigor, Lei de Abuso de Autoridade ainda levanta debates

O universo jurídico se dividiu diante do questionamento: até onde a autoridade instituída pode ir em nome do Estado e por ele? [caption id="attachment_240143" align="alignnone" width="623"] Lei de Abuso de Autoridade está em vigor desde o início do ano / Foto: Reprodução[/caption] Alvo de críticas, elogios e debates acalorados, a Lei nº 13.869, ou, como é popularmente conhecida, Lei de Abuso de Autoridade, foi promulgada em setembro do ano passado e passou a vigorar a partir do início de janeiro deste ano. Após quase dois anos de discussões para sua consequente aprovação, ela substituiu uma outra lei do ano de 1965, exclusiva do Poder Executivo, mas que tinha a mesma essência em seu efeito prático: até onde a autoridade instituída pode ir em nome do Estado e por ele? A Lei enquadra 45 condutas no abuso de autoridade para servidores dos três poderes - Executivo, Legislativo e Judiciário - e valem tanto para civis quanto para militares. Inicialmente, 53 condutas haviam sido tipificadas. O presidente da República, Jair Bolsonaro, dessas, vetou 23, mas 15 foram restauradas. É caracterizado como abuso de autoridade, conforme a Lei nº 13.869, o ato executado com o objetivo de beneficiar ou prejudicar o investigado ou qualquer outra pessoa. Tal ato, para ser enquadrado na lei, deve ser devidamente comprovado e o indivíduo ter se valido do cargo. Todavia, a lei “rachou” o meio jurídico e civil, que se dividiu entre pros e contras ao “novo” sistema de execução da justiça. Enquanto uns vieram a público defendê-la com o argumento de que ela não exige nada mais do que o restrito e correto cumprimento da Constituição Federal e do Código Penal, outros alegaram que a lei contribui para o atraso e até inibição do combate à corrupção, livrando criminosos e infratores das devidas punições. Um dos setores da sociedade que mais se destacaram no posicionamento contrário à Lei de Abuso de Autoridade foi o da Magistratura. Em outubro de 2019, um mês após a promulgação, entidades membros da Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas) chegaram a publicar uma carta aberta chamando a atenção para os supostos riscos da nova lei. Conforme a associação, formada por quase 40 mil juízes e promotores de Justiça, o chamado “freio” ao abuso de autoridade na verdade seria um “incentivo à impunidade”, além de um instrumento de fragilização do sistema de Justiça no país. Na carta aberta, os magistrados alegam que “ao contrário de coibir os verdadeiros abusos de autoridade”, a Lei do Abuso atrapalha o poder-dever de “investigar, processar e julgar autores de crimes e de infrações civis e trabalhistas, sem o que não se sustenta uma sociedade democrática e fundada nos valores da democracia e da república”. A associação alerta para o texto da lei em si. Segundo os juízes, o mesmo é cheio de “expressões vagas, imprecisas, de múltiplos significados e de interpretação genérica”. O documento divulgado pela Frentas chega a afirmar que a Lei nº 13.869 submete a polícia e os membros do Ministério Público à uma exposição, fazendo-os correr o risco de serem ameaçados com "representações criminais ou responderem ações penais pelo simples fato de estarem cumprindo com suas obrigações funcionais”. Por outro lado, há o outro lado da sociedade que julga a promulgação da lei como um gigantesco avanço no cumprimento da justiça. O advogado e professor do curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC Goiás), Júlio Anderson, faz parte do “bloco pró” Lei de Abuso de Autoridade. De acordo com o professor, a lei em questão impõe o fator essencial de que a autoridade estatal tem um limite constitucional que não pode ultrapassar. Para ele, sem esse limite, “muitas atrocidades são cometidas contra os cidadãos”. “No Estado democrático de direito, existem garantias na Constituição Federal que protegem o cidadão. E aqui no Brasil, o que se tem observado é que algumas autoridades públicas têm atropelado essas garantias”, diz. [caption id="attachment_240144" align="alignright" width="377"] O professor da PUC Goiás e advogado acredita que a lei viabilizará o correto cumprimento das leis / Foto: Arquivo pessoal[/caption] Segundo o professor, a lei em questão responsabiliza o agente público que age em nome do Estado, impedindo-o de extrapolar sua competência baseado na convicção de que não será punido caso o faça. “Falam muito da Venezuela, que lá é uma ditadura. Mas por que falam isso? Por que lá não tem liberdades individuais, os agentes do Estado violam essas liberdades. Aqui no Brasil, a importância dessa lei é no sentido de frear o abuso do Estado contra as garantias individuais”, explica. Quanto ao argumento contrário à lei, que dá conta de que ela inibiria o combate à corrupção, Júlio discorda. De acordo com ele, a lei tem justamente o efeito contrário ao alegado pelos críticos, uma vez que ela reforçaria a obrigação de seguir o devido processo legal no que tange a investigados e suspeitos de crimes. “A corrupção tem que ser combatida, mas dentro dos parâmetros da lei, sem abusos. Se fizer como está na lei, vai combater da forma correta. Não se combate um mal causando outro”, arremata. Veja abaixo os 45 itens que foram promulgados na lei como sendo abuso de autoridade por parte de agentes do Estado: - Usar cargo para se eximir de obrigação ou obter vantagem - Constranger um preso a se exibir para a curiosidade pública - Impedir que o preso, réu ou investigado tenha seu advogado presente durante uma audiência e se comunique com ele - Não comunicar prisão em flagrante ou temporária ao juiz - Não comunicar prisão à família do preso - Não entregar ao preso, em 24 horas, a nota de culpa (documento contendo o motivo da prisão, quem a efetuou e testemunhas) - Prolongar prisão sem motivo, não executando o alvará de soltura ou desrespeitando o prazo legal - Não se identificar como policial durante uma captura - Não se identificar como policial durante um interrogatório - Negar ao investigado acesso aos documentos relativos a etapas vencidas da investigação - Interrogar à noite, com exceções de flagrante ou consentimento - Impedir encontro do preso com seu advogado - Procrastinar investigação ou procedimento de investigação - Exigir informação ou cumprimento de obrigação formal sem amparo legal - Pedir vista de processo judicial para retardar o seu andamento - Atribuir culpa publicamente antes de formalizar uma acusação - Decretar prisão fora das hipóteses legais - Não relaxar prisão ilegal - Não substituir prisão preventiva por outra medida cautelar, quando couber - Não conceder liberdade provisória, quando couber - Prestar informação falsa sobre investigação para prejudicar o investigado - Não deferir habeas corpus cabível - Decretar a condução coercitiva sem intimação prévia - Constranger um preso a se submeter a situação vexatória - Bloquear bens além do necessário para pagar dívidas - Constranger o preso a produzir provas contra si ou contra outros - Constranger a depor a pessoa que tem dever funcional de sigilo - Instaurar investigação de ação penal ou administrativa sem indício, sendo exceção a investigação preliminar sumária justificada - Insistir em interrogatório de quem optou por se manter calado - Insistir em interrogatório de quem exigiu a presença de um advogado, enquanto não houver advogado presente - Impedir ou retardar um pleito do preso à autoridade judiciária - Manter criança/adolescente em cela com maiores de idade - Entrar ou permanecer em imóvel sem autorização judicial (exceções: flagrante e socorro) - Coagir alguém a franquear acesso a um imóvel - Cumprir mandado de busca e apreensão entre 21h e 5h - Manter presos de diferentes sexos na mesma cela - Alterar cena de ocorrência - Eximir-se de responsabilidade por excesso cometido em investigação - Constranger um hospital a admitir uma pessoa já morta para alterar a hora ou o local do crime - Obter prova por meio ilícito - Forjar um flagrante - Usar prova mesmo tendo conhecimento de sua ilicitude - Divulgar material gravado que não tenha relação com a investigação que o produziu, expondo a intimidade e/ou ferindo a honra do investigado - Iniciar investigação contra pessoa sabidamente inocente  

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“Movimente-se”: doenças relacionadas a maus hábitos encabeçam mortes precoces

O conjunto formado por tabagismo, alcoolismo, má alimentação e sedentarismo pode ser a porta de entrada para toda sorte de enfermidades que ceifam a vida de milhares de pessoas todos os anos [caption id="attachment_239809" align="alignnone" width="620"] A obesidade é um dos maiores causadores de problemas cardíacos e do sistema circulatório / Foto: Reprodução[/caption] Trezentos e oitenta e oito. Segundo o Ministério da Saúde, esse é o número de pessoas que morrem por dia no Brasil em decorrência da hipertensão, ou a famosa “pressão alta”. Para se ter uma noção do quão grave é o problema, no ano de 2017 o Brasil registrou 141.878 mortes devido a essa doença ou causas atribuíveis a ela, o que significa quase 17 pessoas mortas por hora ao longo do ano. Já em 2018, ainda de acordo com o Ministério da Saúde, 24,7% da população que vive nas capitais brasileiras afirmou ter diagnóstico de hipertensão. Os dados revelam uma assustadora realidade: as pessoas estão morrendo mais e mais rápido por doenças agravadas ou ocasionadas por hábitos não-saudáveis. As enfermidades relacionadas ao coração e ao sistema circulatório encabeçam o ranking dos males que mais matam no Brasil e no mundo. A maioria deles tem origem ou ganha complicações com estilos de vida irregulares que abrangem excessos e negligência. A Organização Mundial da Saúde (OMS) listou, no ano passado, dez males que são responsáveis  por 54% das mortes ocorridas no mundo nos últimos anos. São eles: Cardiopatia isquêmica; Acidente vascular cerebral; Doença pulmonar obstrutiva crônica; Infecções das vias respiratórias inferiores; Alzheimer e outras demências; Câncer de pulmão, traqueia ou brônquios; Diabetes; Acidentes de trânsito; Doenças diarreicas e Tuberculose. No Brasil, especificamente, o cenário não é diferente. Conforme o Ministério da Saúde, em 2016, por exemplo, os males que mais ceifaram vidas foram doenças do coração e do aparelho circulatório; câncer; pneumonia e doenças respiratórias; diabetes mellitus e doença endócrina, nutricionais e metabólicas; doenças do fígado e do aparelho digestivo. A pasta federal contabiliza mais de 340 mil mortes por ano relacionadas às doenças do aparelho circulatório, incluindo doenças isquêmicas, que contam com cerca de 108 mil mortes. Já as doenças cerebrovasculares são mais de 99 mil mortes, e infarto agudo do miocárdio, quase 88 mil. De acordo com o cardiologista e professor do internato de Medicina da Universidade de Brasília (UnB) Marcelo Pasquali, a cardiopatia isquêmica é multifatorial e engloba não só o infarto, mas outras enfermidades relacionadas ao entupimento das veias. O médico conta que diversas causas podem fazer com que o indivíduo sofra desse mal, tais quais questão genética, estresse, sedentarismo, obesidade, diabetes e colesterol alto. “De acordo com o ritmo que a pessoa vai levando a vida, ela aumenta o risco de lesões nessas tubulações internas. A cardiopatia em si normalmente vem depois do infarto, e é preciso evitar todos os fatores de risco”, explica Pasquali. O médico também esclarece que a obesidade está intimamente relacionada aos problemas cardíacos, e que a simples circunferência abdominal acentuada do indivíduo já deve ser motivo de preocupação. A OMS aponta a obesidade como um dos maiores problemas de saúde pública no mundo. A projeção é que, em 2025, cerca de 2,3 bilhões de adultos estejam com sobrepeso; e mais de 700 milhões, obesos. No Brasil, a obesidade vem crescendo, e alguns levantamentos apontam que mais de 50% da população está acima do peso, ou seja, na faixa de sobrepeso e obesidade Na região Centro-Oeste, que engloba os Estados de Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e o Distrito Federal, 48,3% dos adultos estão com excesso de peso, enquanto nos jovens de 10 a 19 anos esse número fica em 22%.“Atendo pacientes com obesidade diariamente. Umas das primeiras e principais avaliações que faço quando o paciente vem até o meu consultório é da circunferência abdominal. Isso está ligado diretamente com os problemas que ela possa vir a ter”, pontua Pasquali.

“O AVC não avisa quando vai acontecer”, diz neurologista

O infarto não é o único mal que pode acometer o indivíduo que adere a uma vida desregrada e não-saudável. O Acidente Vascular Cerebral (AVC), também listado pela OMS como uma das maiores causas de morte, também pode ter fortes contribuições de uma rotina de negligência quanto à própria saúde. Conforme a médica neurologista Lorena Bochenek, o AVC é uma interrupção do fluxo sanguíneo no cérebro. Assim como infarto, diversos fatores podem servir para propiciar o problema, como a hipertensão, a diabetes, o tabagismo e o sedentarismo. Porém, quando uma pessoa chega ao extremo de sofrer um AVC, é porque, segundo Lorena, outras enfermidades já tomaram conta de seu organismo. “Eu costumo dizer para os pacientes que quando se tem um AVC, isso é só a ponta do ice berg. Ninguém que tem um AVC está bem. Se ela tem isso, é porque já sofre com outras doenças”, explica a médica. Lorena alerta que o AVC não avisa quando vai acontecer. De acordo com ela, “não existe um princípio” da doença: quando ela vem, já é tarde para qualquer prevenção. “É importante a pessoa reconhecer quando acontece. Normalmente, um dos lados do rosto paralisa, a pessoa fica com o rosto torto e a voz fica embolada, como se tivesse feito uso de bebida alcoólica, e não consegue caminhar. Se ela percebe os sintomas nas primeiras quatro horas e busca atendimento, as chances de ela não ficar com nenhuma sequela são bem maiores”, diz. Entretanto, nem sempre a pessoa que é tem um AVC consegue atendimento a tempo. Quando isso ocorre, aumenta a possibilidade de esse mal deixar rastros perda de memória, alteração na fala e paralisia de parte do corpo. [caption id="attachment_239804" align="alignright" width="431"] "É importante a pessoa reconhecer" os sinais do AVC, diz neurologista Lorena Bochenek / Foto: Arquivo pessoal[/caption] A médica conta que quando o indivíduo está com as taxas de colesterol e glicemia altas, se faz uso de cigarro, bebidas alcoólicas e não pratica exercícios físicos, “é como um rio que corre e segue seu fluxo [para enfermidades como o AVC] se nada for feito”. Lorena atribui a falta de trato da saúde com as transformações sociais e a rotina urbana agitada, e lembra que é preciso “desacelerar” se a pessoa quiser viver alguns anos a mais. “Existe uma mudança de valores na nossa vida, na sociedade. ‘Eu preciso ter tempo para trabalhar, mas não tenho tempo para fazer minha refeição corretamente. Eu tenho que ser produtivo, então isso toma todo meu tempo’. Não há mais tempo nem para a família, nem para o lazer”, discorre a neurologista. Para quem já possui algum tipo de enfermidade ou predisposição para outros males, todo cuidado é pouco. Conforme Lorena, a pessoa que sofre com pressão alta, por exemplo, precisa mantê-la sempre controlada, se atentando para a devida alimentação e exercícios físicos. Se há alguma arritmia, ela deve ser cuidadosamente tratada. Além disso, álcool e drogas devem ser evitados ao máximo.

Movimentar-se é preciso

A má circulação do sangue no corpo humano parece ser um dos elementos-chave para o surgimento dos mais variados tipos de doenças. Presentes no ranking dos males que mais matam no Brasil, as doenças do aparelho circulatório são temidas, mas podem ser evitadas. Adotar uma rotina saudável, alimentando-se equilibradamente e realizando atividades físicas diariamente, é o ponto de partida e permanência para se viver com qualidade. Porém, quando o indivíduo se submete à inércia e à alimentação desregrada, as portas se abrem para problemas diretamente relacionados com o aparelho circulatório, e a trombose venosa é um deles. Associada diretamente com a obesidade e à condição de imobilidade, a trombose venosa se caracteriza pela formação de coágulos na circulação, e pode ser espontânea ou provocada. Segundo o cirurgião vascular Fábio Campedelli, a doença, que tem como sintomas vermelhidão, dor, rigidez na musculatura e inchaço na região afetada, pode aparecer em qualquer região do corpo, mas é mais frequente nos membros inferiores. Campedelli explica que um dos fatores que facilitam o surgimento da trombose venosa é a ausência de movimentação, o que esclarece o fato de pacientes em repouso pós-operatórios, por exemplo, serem tão afetados. “Se não tiver os devidos cuidados, uma pessoa acamada tem grandes chances de desenvolver trombose venosa. Pessoas em UTI recebem profilaxia justamente para evitar os riscos. E a maior preocupação da trombose é com a possibilidade de os coágulos migrarem da perna para o pulmão, causando a embolia pulmonar. Isso sim pode levar ao óbito”, conta. De acordo com o Ministério da Saúde, aproximadamente 5 a 15% de pessoas não tratadas de trombose venosa podem morrer devido à embolia pulmonar. Além das causas já mencionadas, também podem ocasionar a doença o uso de anticoncepcionais ou tratamento hormonal; tabagismo; hereditariedade; presença de varizes; idade avançada; tumores malignos, entre outros.

O “susto” do prefeito de Aparecida de Goiânia

No dia 26 de fevereiro, quarta-feira, o prefeito de Aparecida de Goiânia, Gustavo Mendanha, do MDB, pegou a todos de surpresa quando precisou ser internado no Hospital Santa Mônica, na Vila Sul, em Aparecida. Mendanha deu entrada no hospital se queixando de fortes dores de cabeça. Já na unidade hospitalar, o prefeito foi diagnosticado com trombose venosa cerebral. Ao Opção, sua assessoria informou que Mendanha havia viajado para São Paulo no fim de semana anterior para tratar de uma parceria do município com o renomado Hospital Sírio-Libanês. Quando retornou para Aparecida de Goiânia, o prefeito já se reclamava da forte dor de cabeça que o acometia. Foi quando decidiu procurar, a tempo, atendimento médico. O primeiro exame não detectou nada sério. Entretanto, alguns dias depois, o prefeito passou mal, chegando a vomitar por causa da dor de cabeça. A internação se fez necessária. Mendanha, que tem 37 anos, chegou a ser levado para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do hospital, onde ficou internado por três dias. No dia 1º de março, o prefeito teve alta da UTI, mas seguiu internado. Ele só foi liberado definitivamente do hospital no dia 5 de março, quinta-feira, 9 dias após ser internado. O prefeito teve um tratamento a base de anticoagulantes, e não sendo preciso nenhum tipo de intervenção cirúrgica. Felizmente, ele não ficou com nenhuma sequela do mal que lhe acometeu. Ainda não se sabe o que exatamente causou a trombose venosa cerebral. Em meados de 2018, o prefeito, que tem 1,87 de altura, chegou a pesar 130 quilos. Decidido a mudar, ele procurou um especialista e iniciou um acompanhamento com dieta hormonal. Nos primeiros meses, o prefeito perdeu mais de 16 quilos. Hoje, seu peso está abaixo de 100 quilos, com mais de 30 quilos eliminados. Além disso, Mendanha também leva uma vida ativa, com a prática diária de exercícios. A rotina saudável que ele adotou desde que decidiu que devia perder peso é um dos fatores que podem ter contribuído para a sua cura rápida, mas as verdadeiras causas da trombose venosa que o acometeu ainda estão sendo investigadas.

“Eu cheguei à obesidade mórbida”, diz dona de casa que perdeu 63 quilos em um ano

A ex-conselheira tutelar e dona de casa Thaynara Miranda, de 31 anos, tem uma rotina que se pode chamar de ativa. Moradora de Nazário, a 70 quilômetros de Goiânia, ela leva os filhos e participa de eventos na escola, organiza e limpa a casa, vai às compras, sai com o marido e amigos e cumpre diariamente os compromissos que dependem de sua participação. Entretanto, seu cotidiano nem sempre foi assim. Até o início do ano passado, Thaynara, que tem 1,62 de altura, pesava 130 quilos. A julgar pelo seu Índice de Massa Corporal, a jovem era o que se podia considerar de obesa mórbida. Seu peso a impossibilitava de fazer praticamente tudo, e sair de casa era algo feito apenas em últimas circunstâncias. Thaynara relata que há cerca de 12 anos começou a engordar. Ela chegou a tentar alguns tratamentos à base de medicamentos para emagrecer, mas esses não surtiam o efeito esperado. “Era um efeito sanfona. Eu emagrecia, mas passava um tempo e recuperava aqueles quilos todos outra vez”, relembra. De acordo com ela, alguns fatores contribuíram para seu ganho anormal de peso, tais como má alimentação, sedentarismo e até mesmo depressão – mal esse que era fortemente agravado pelo seu peso. “Minha comida era toda desregrada. Eu quase morria de comer no almoço, quase morria de comer no jantar. Não comia frutas, nem verdura. Carne assada então, eu passava um dia inteiro comendo”, conta Thaynara. [caption id="attachment_239816" align="alignleft" width="300"] Thaynara revela que já chegou a pesar 130 quilos / Foto: Arquivo pessoal[/caption] Com o passar do tempo, a situação foi se agravando. A rotina de inércia e alimentação desequilibrada de Thaynara se intensificava juntamente com seu ganho de peso. E conforme sua saúde era deteriorada, sua autoestima também ia por ladeira abaixo. “Eu era depressiva, não saía de casa. Quando meu marido me chamava para sair, eu nunca aceitava. Não ia em festa de família, em festa da cidade, nada. Eu tinha vergonha de sair, eu achava que as pessoas ficavam me olhando”, recorda. Thaynara conta que, certa vez, foi até uma loja de roupas da cidade em busca de um presente para uma amiga. Assim que adentrou o estabelecimento, ouviu da vendedora: “Aqui não tem roupa para você”. “Ela nem me deixou falar o que eu queria, a roupa nem era pra mim. Eu saí da loja já chorando”, lembra. A situação a afetou profundamente. Entretanto, a gota d’água veio em 2018. Thaynara relata que em maio do ano em questão, a escola onde seus filhos Davi e Arthur, à época com 4 e 9 anos, estudavam, promoveu uma festinha em comemoração ao Dia das Mães. Todas as mães de alunos foram convidadas, mas ela não pôde ir, e o motivo para a ausência no evento a deixou arrasada. “Por causa de problemas na coluna causados pelo meu peso, eu fiquei mais de 40 dias num sofá de casa, sem poder nem andar. Eu não conseguia fazer nada. Minha mãe e meu marido tinham que, inclusive, me ajudar a tomar banho”, revela. Faltar à festinha onde poderia ter tido momentos felizes com seus filhos a fez se indignar com sua condição. Foi quando decidiu, finalmente, procurar auxílio médico. A dona de casa consultou um endocrinologista, que a transferiu para um cirurgião, e ali começava a saga de Thaynara. Assim que o médico se deparou com seu caso, informou que providências urgentes deveriam ser tomada. O profissional passou à Thaynara as devidas orientações que deveriam ser seguidas na preparação para uma cirurgia de Bypass gástrico, técnica de tratamento cirúrgico da obesidade e doenças metabólicas que consiste em construir um novo pequeno reservatório gástrico. Ao revelar seu medo do procedimento cirúrgico para o médico, Thaynara ouviu como resposta que ela tinha muito mais chances de morrer se continuasse do jeito que estava do que na mesa de cirurgia. Ela passou por uma intensa preparação. Teve sessões com psicólogo, cardiologista, nutricionista e até oncologista, e no dia 19 de fevereiro de 2019, Thaynara foi submetida ao Bypass gástrico – cirurgia essa realizada com sucesso. Apenas 30 dias de repouso foram suficientes e, após o período, a nova Thaynara já estava de pé. Desde então, os hábitos da jovem passaram por uma verdadeira transformação. [caption id="attachment_239818" align="alignright" width="300"] Em um ano, Thaynara perdeu 63 quilos / Foto: Arquivo pessoal[/caption] Hoje, pouco mais de um ano depois da cirurgia, Thaynara está pesando 67 quilos – o peso atual significa que impressionantes 63 quilos foram eliminados de seu corpo. Ela conta que faz acompanhamento nutricional trimestralmente, frequenta a academia com supervisão de um personal trainer, procura sempre ir aos seus compromissos a pé ou de bicicleta, o que é facilitado por viver em uma cidade interiorana, e, claro, mudou radicalmente seus hábitos alimentares. “Não como mais sanduíche, o cheiro da carne assada me faz enjoar, cortei doces, frituras. Se antes eu evitava alimentos saudáveis, hoje eu sou conhecida como ‘a louca das frutas’”, brinca. A moça explica que as mudanças na alimentação foram essenciais para que ela recuperasse a vontade de viver e perdesse o excesso de peso. “Uma coisa que eu aprendi é: a gente é o que a gente come”, diz. Todavia, a jovem garante que sua transformação jamais teria ocorrido sem o suporte e o incentivo daqueles que a amam, e garante: a transformação também precisa vir de dentro. “A pessoa tem que ter o apoio da família, não adianta querer fazer sem apoio. Essa base que você ganha de quem está à sua volta é que te fortalece. Cada dia que eu levanto é um desafio pra mim, mas hoje eu escolho viver saudável. Hoje eu saio de casa, faço tudo, hoje eu vivo. Mas a mudança tem que ser psicológica, tem que vir de dentro. Não é fácil, mas é possível”, finaliza.

Manifestações do dia 15 de março não são autoritárias, dizem estudiosos

Apesar do consenso de que atos são democráticos, especialistas afirmam haver risco à democracia neste momento de mudança das relações entre poderes [caption id="attachment_140061" align="alignnone" width="620"] Manifestações a favor de governo Bolsonaro foram convocadas pelo próprio presidente | Foto: reprodução[/caption] Na terça-feira de carnaval, 25, o presidente Jair Bolsonaro compartilhou um vídeo por seu WhatsApp pessoal convocando o povo às ruas em ato do dia 15 de março contra as instituições dos poderes Legislativo e Judiciário. A manifestação tem como pauta “oficial” a defesa do governo Bolsonaro, mas o pano de fundo remonta ao atrito entre poderes Executivo e Legislativo gerado pela discussão do orçamento impositivo. A Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2020 foi aprovada pelo Congresso Nacional no ano passado com instituição do Orçamento Impositivo. Enquanto o orçamento do país é de R$ 3,5 trilhões, apenas R$ 90 bilhões estão disponíveis como gastos discricionários. Destes, segundo a LOA, R$ 30 bilhões estariam contingenciados sob competência do Congresso Nacional na forma de emendas parlamentares impositivas.  Em março de 2019, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL) se posicionou a favor do projeto de lei que obrigava Executivo a disponibilizar as emendas parlamentares ao Congresso, bem como lembrou que Jair Bolsonaro, quando deputado federal, foi favorável à medida sob justificativa de independência do Legislativo. Entretanto, mais recentemente, o presidente anunciou vetos parciais apostos ao Projeto de Lei do Congresso Nacional, incluindo veto sobre as diretrizes para a execução do Orçamento Impositivo. [caption id="attachment_238455" align="alignnone" width="620"] Professor e empresário Gustavo Gayer articula união entre movimentos de apoio à Bolsonaro em Goiânia | Foto: Fábio Costa[/caption] O assunto não exaltava os ânimos até a divulgação de que o presidente conclamou a participação de apoiadores em movimentos de apoio a si mesmo.  A revelação foi feita pela repórter do jornal Estado de S. Paulo, Vera Magalhães, que foi vítima de ataques nas redes sociais por parte da militância bolsonarista. Soma-se ao atrito a fala de general Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), na manhã de terça-feira, 18. "Não podemos aceitar esses caras chantageando a gente. Foda-se", disse Heleno quando não sabia que estava sendo gravado em transmissão ao vivo e sua voz sendo captada pelo sistema de microfones montados para a cerimônia de hasteamento da bandeira no Palácio do Planalto.

Tudo em ordem

Ao receber críticas pelo autoritarismo da interferência de um poder sobre outro, as manifestações do dia 15 ganharam vida própria e se descolaram da pauta do Orçamento Impositivo em que teve origem. Organizadores do movimento afirmam que ato não é autoritário por não ser contra o Congresso, apenas contra parte dele e contra determinadas medidas.  Segundo Joveny Sebastião Cândido de Oliveira, jurista e reitor do Centro Universitário de Goiás (Uni-Anhanguera), o enfrentamento do Poder Legislativo por parte do Executivo por fundos orçamentários não é anti democrático ou preocupante. Segundo o doutor em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP), a República tem meios de deter atrevimento por parte de qualquer poder. [caption id="attachment_239827" align="alignnone" width="620"] Para Joveny Cândido, manifestações são extremos permitidos na democracia | Foto: Reprodução / YouTube[/caption] “A sistemática de funcionamento da nossa democracia é bastante boa; não será o discurso de um líder que irá colocar em risco todo o sistema, por mais extremado que seja esse discurso”, afirma Joveny de Oliveira. “A sistemática brasileira não necessita que o cidadão faça justiça com as próprias mãos, não precisamos ir às ruas a todo momento – é lícito que aconteça, mas esta é uma exacerbação do processo democrático”. Joveny Cândido lembra que o impeachment de Dilma Rousseff (PT) foi iniciado pela petição de um professor e uma deputada. “São pessoas comuns; qualquer cidadão brasileiro tem condição de convocar remédios jurídicos necessários – não necessariamente precisa de um promotor de justiça ou procurador intervir. A participação do cidadão é permitida pela Constituição”.

Autoritarismo e totalitarismo

Ricardo Spíndola, professor da Escola de Direito da Universidade Anhembi Morumbi e doutorando do Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Universidade de São Paulo, afirma que caracterizar o governo de Jair Bolsonaro como autoritário é um equívoco e, para entender suas intenções nos conflitos com as instituições, é necessário dar um passo atrás.  O estudioso afirma: “A noção clássica do autoritarismo na representação de uma pirâmide – com o líder no topo e o poder emanando de cima para baixo – parece não explicar o momento atual. Não considero o atual governo autoritário porque não há aposta no medo, mas no segredo. Bolsonaro não reduz o espaço público, não diz que é mais seguro que as pessoas fiquem em casa; pelo contrário, ele estimula a participação das pessoas em manifestações populares, como a do dia 15.” Segundo Ricardo Spíndola, seria a ideia de um líder totalitário, que pode ser didaticamente representado por uma cebola: redonda, com diversas camadas e com o poder emanando do centro. “Bolsonaro aposta no segredo, na desinformação e na confusão. Articula quedas constantes de ministros, afirma que tomará uma atitude e recua, gera crises sucessivas para pautar o debate público." [caption id="attachment_239826" align="alignleft" width="300"] Segundo Ricardo Spíndola, o momento é de incertezas para instituições historicamente estabelecidas| Foto: Reprodução / Arquivo Pessoal[/caption]

Batalha pela democracia

Ricardo Spíndola traça um histórico do conflito entre poderes que remonta aos anos 1990, quando a recém estabelecida Constituição de 1988 ainda possuía “déficits institucionais”, e que a instituição que se mobilizou para resolver eventuais conflitos entre poderes foi o Judiciário. Entretanto, a seu ver, este momento político de mudanças representa o fim de um ciclo em que morre também a constelação de poderes da forma como estavam assentados.  “Temos alguns impasses que não são resolvidos mais nos termos clássicos: Bolsonaro promove a mobilização popular; compartilhar vídeos em que aparece como leão lutando contra o Supremo Tribunal Federal (STF) como hiena. Essas afrontas são mecanismos de enfrentamento para chegar a algum lugar”, diz Ricardo Spíndola. No presente momento, este lugar a que se almeja chegar parece ser o veto do orçamento impositivo, que foi logrado pelo Executivo e Bolsonaro.  Desta forma, os enfrentamentos com demais poderes não seriam um sintoma de autoritarismo ou tentativa de golpe de estado, mas recurso para negociação. “Faz parte do jogo populista querer ultrapassar esses limites institucionais com sua personalidade”, diz Ricardo Spíndola. “Enquanto um líder carismático conseguiria manobrar pelas instituições sem prescindir de afrontas, um líder totalitário utiliza outros recursos." Entretanto, quando questionado sobre os dispositivos institucionais para impedir que um líder mude o sistema democrático, Ricardo Spíndola é mais cético do que Joveny Cândido. Na prática, Ricardo Spíndola afirma que o principal mecanismo para deter eventuais ingerências em órgãos públicos são mandados de segurança. Mandados de segurança não são impetrados tão somente pelo Ministério Público, mas por qualquer órgão (constitucional, quer dizer, mencionado no texto constitucional - mas isso é uma construção da doutrina, doutrinadores mais antigos sustentavam que qualquer "órgão independente ou autônomo") para defender suas prerrogativas violadas por outro órgão perante ou com recurso ao judiciário. Embora não haja mapeamento histórico do número de expedições, houve redução sensível no número de mandados. Para Ricardo Spíndola, isso se deve ao contexto em que funcionários do MP se encontram. “Esses profissionais atualmente estão em negociação da progressão de suas carreiras e negociação de bonificações. Você não para pra pensar em mandados de segurança quando está preocupado em defender sua sobrevivência. É o que penso que aconteceu neste primeiro ano de mandato de Bolsonaro.”

É a regra, não a exceção

O jornalista Pérsio Menezes concorda que Bolsonaro não representa uma ameaça democrática e afirma que vive em constante conflito. Segundo o jornalista, se as manifestações representam autoritarismo, outras ingerências do Executivo sobre outros poderes também deveriam ser denominadas de autoritárias. “O mensalão foi um golpe de Estado que nunca recebeu esse nome”, exemplifica Pérsio Menezes. “No mensalão, houve destruição da estrutura republicana – o Congresso foi comprado pelo Executivo para colocar determinados nomes no STF. Se ministros foram sabatinados por um Congresso comprado, houve uma ruptura democrática. Mas isso nunca foi reconhecido e, nesta perspectiva, a corrupção é um pecado menor”, explica Pérsio Menezes. “Pense em todas as decisões tomadas por estes ministros até a prisão de José Dirceu, que foi ministro chefe da Casa Civil no primeiro mandato do governo do ex-presidente Lula da Silva.  As estruturas foram corrompidos e o prejuízo que isso causou ao Brasil é o questionamento de nosso sistema democrático.” Segundo Pérsio Menezes, a relação entre poderes é facilmente corruptível e, historicamente, um partido – PT – organizou o sistema de forma a obter vantagens.