Opção cultural

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Giacomo Leopardi – Além do pessimismo, a “poesia consoladora”

O poeta italiano, considerado anti-Pascal, é um incrédulo, um negativista, um descrente, mas sua poesia toca em algum lugar na alma do cristão que se torna impossível não gostar dele, tanto quanto é impossível descrever esse gosto em poucas palavras

Peregrina, um poema de Rosy Cardoso

A artista plástica vem provando saber moldar bem as palavras em versos, e o que era antes uma promessa de poeta concretiza-se; dá pra ver o exercício formal de sua arte, sua força expressiva

VI Fliaraxá começa agitada

Evento ocorrerá entre 15 a 19 de novembro, e no primeiro dia terá shows de Daniella Zupo, Fernanda Takai, Claudio Prado e Pato Fu

Ziraldo e a velhice anunciada

[caption id="attachment_80066" align="aligncenter" width="620"] Ziraldo aos 79 anos. Descobriria a velhice aos 85: “A velhice é uma coisa que acontece assim de surpresa”, diz, em entrevista à Folha de S. Paulo | Foto: Ana Colla/divulgação/Flipiri[/caption] Aos 85 anos, Ziraldo se declara velho. Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo de hoje, o multiartista, eterno autor de “O Menino Maluquinho”, disse que ao tropeçar e cair deparou-se com a velhice. Percebeu que não se sente mais um adolescente. Ou seja, Ziraldo recebeu a notícia de que já não é mais um jovem por um tropeção, por uma espécie de peraltice do tempo, uma risadinha malandra da vida que lhe mostra a dentição afiada da existência, dando-lhe uma mordiscada. São poucos os que anunciam a velhice. É uma irreverência ou uma entrega dos pontos? Ver Ziraldo assim, nu diante do tempo, é ver Ziraldo desenhando e escrevendo “O Menino Maluquinho”. A aproximação entre o menino e o velho é que me fez entristecer. Meu mundo turvou um pouquinho. Se Ziraldo está envelhecendo, eu também estou. É que me lembrei da leitura do livro, aos nove anos. Lembrei-me da última página, quando o Menino Maluquinho cresce, não podendo mais driblar o insuperável vento da vida. Ziraldo foi tantas coisas nesse mundo imensurável de coisas, desde cantor, nos tenros anos em que sua mãe queria fazer dele um astro pop, até chegar ao patamar de Menino Maluquinho, de onde construiu sua base de resistência, passando pelo Pasquim, pela parceria com Carlos Drummond de Andrade no Jornal do Brasil, e tantos livros, tantos projetos, tanta energia dedicada à arte. A arte ainda é sua própria vida, e a arte foi que o manteve jovem até agora, o dia de seu anúncio de que envelheceu. Enfraquecimento muscular, coordenação debilitada, e a memória traindo-o. “O Menino Maluquinho” é sua Magnum Opus. Todo mundo leu o livro, viu os filmes, as peças, acompanhou as citações, as aventuras de tudo quanto foi jeito. Mais que o texto, as ilustrações enchem a alma da gente. O Menino Maluquinho são os desenhos, os traços do Ziraldo, seu caráter ali em linhas. O sorriso, a alma oferecida no sorriso. A alegria de dias inteiros saindo em desfile por entre os dentes de Ziraldo risonho. Ziraldo, nosso patrimônio, anunciando a velhice de 85 anos, celebrados no dia 24 de outubro, uma velhice que vem para poucos, diga-se, e às vezes vem com muitos estragos de feitos traumáticos ocorridos pela vida afora, às vezes vem com um superávit de realizações boas, como é seu caso. O problema de anunciar a velhice é que parece estar anunciando a última página, embora tenha dito que está trabalhando em diversos projetos.

Maria Valéria Rezende vence o Prêmio São Paulo

[caption id="attachment_109378" align="aligncenter" width="620"] Maria Valéria Rezende, escritora paulista que já amealhou dois prêmios
importantes com seu romance “Outros cantos” | Foto: Adriano Franco[/caption] A escritora paulista Maria Valéria Rezende, radicada na Paraíba, ganhou o Prêmio São Paulo de Literatura, em cerimônia realizada na noite de segunda-feira (6/11). Além do reconhecimento de uma autora que está na estrada há algumas décadas, ela tem 72 anos, a premiação em dinheiro é a maior entre as láureas brasileiras, R$ 200 mil. Maria Valéria foi laureada com o romance “Outros cantos”, que já havia ganhado o prêmio cubano Casa de las Américas, na categoria Literatura Brasileira. No São Paulo, ela concorreu com nomes fortes nessa temporada, como Silviano Santiago, que já papou o Jabuti, na categoria Romance, e espera o resultado de Livro do Ano, do mesmo prêmio, e está entre os finalistas do Oceanos (antigo Portugal Telecom), com “Machado”. Bernardo Carvalho, finalista do Oceanos com “Simpatia pelo demônio”, também concorria ao Prêmio São Paulo, que ainda outorgou o Melhor Romance de autor estreante ao “A instrução da noite”, de Maurício de Almeida, e o Melhor Romance de autor estreante acima dos 40 anos ao “Céus e terra”, de Franklin Carvalho. Os dois embolsarão, cada um, R$ 100 mil. Nada mal. Vale lembrar que a vencedora do Prêmio São Paulo do ano passado foi outra mulher, outra paulista, Beatriz Bracher, com “ Anatomia do Paraíso”. Beatriz é uma das fundadoras da renomada Editora 34 e já se revelou grande prosista, desde seu romance de estreia “Azul e dura”, de 2002. Goncourt Também ontem, em Paris, o escritor francês Éric Vuillard, pouco conhecido no Brasil, foi laureado com o prêmio mais importante da França, e um dos mais pomposos do mundo literário, o Goncourt. Saiu-se vencedor com o romance “L'ordre du jour” (A ordem do dia, em tradução livre). O livro de Vuillard narra a ascensão de Hitler ao poder na década de 1930, com o apoio da alta burguesia alemã, principalmente a elite do setor industrial, que fortaleceu a construção de armamentos do Nazismo. O valor em dinheiro do Goncourt é simbólico. São apenas 10 euros. Mas o prestígio que o autor ganha depois dele é incomensurável, catapultando-o ao lugar de best-seller.

Concerto traz composições de sultões turcos a São Paulo

Com entrada gratuita, evento será realizado no dia 9 deste mês, às 19h30, no MIS, sob a batuta do maestro e compositor Musa Göçmen

Três personagens ilustres

Novo livro de crônicas de Danilo Gomes joga luz sobre três personalidades brasileiras, amigos pela vida toda, que tinham muitas coisas em comum, como a política e o amor pela literatura: Augusto Frederico Schmidt, Juscelino Kubitschek e Odilon Behrens

Sugestões para um mundo mais justo

Carta da escritora nigeriana transformou-se num manifesto contundente e equilibrado, sugerindo que as crianças leiam livros e oferecendo 15 sugestões de como aproximá-las do conceito de feminismo, que para a autora não está moldado na desigualdade de gênero

Sete poemas de Hölderlin

Poeta alemão que viveu entre a segunda metade do século XVIII e a primeira do XIX, Hölderlin é um dos grandes de todos os tempos; e, ao lado de John Keats, é um dos mais influentes na modernidade

Kazuo Ishiguro sugere que o esquecimento é uma porta aberta para a paz entre os povos

Os livros do nipo-britânico sustentam-se como literatura de qualidade, para além das ideias? “O Gigante Adormecido” é um romance que fica de pé

Dostoiévski e a perspectiva redentora

A escrita do autor russo caminha na borda do abismo. Joga-se em suas profundezas e, lá do fundo da lama, onde apenas os heróis não são completamente maculados pela sujeira, como afirmou o Homem do Subsolo, ele se levanta em ímpetos de fervor subindo novamente para as paragens seguras

“A cidade de Ulisses”, de Teolinda Gersão, é um prato cheio para o leitor amante de narrativas híbridas

Escritora portuguesa nos dá um livro vigoroso e abrangente porque realiza uma sinergética fusão entre romance, história e ensaio, daí sua abrangência temática e seu acento reflexivo

1967: o ano que morreu… e se revira no túmulo

A Tropicália tinha como objetivo uma revolução cultural, pretendia abalar as instituições em uma época que facilmente se tornavam símbolos de opressão

Muito mais psicólogos do que policiais

Entre as séries mais interessantes do ano, “Mindhunter” é um prato cheio para quem quer compreender o lado menos humano do ser humano [caption id="attachment_108365" align="aligncenter" width="620"] "Mindhunter" vem conquistando grande público pela qualidade da produção e da trama[/caption] Ricardo Silva Especial para o Jornal Opção Dois agentes do FBI que se propõem a estudar a engenharia psicológica de assassinos em série na década de 70, quando os estudos de psicologia criminal ainda eram embrionários, quase inexistentes. Para dar conta disso, a dupla formada por Holden Ford (Jonathan Groff) e Bill Tench (Holt McCallany) viaja pelo Estados Unidos entrevistando criminosos que cometeram os mais horrendos crimes e começa a traçar os perfis psicológicos dos detentos. Essa é a premissa básica de Mindhunter, série da Netflix, criada por Joe Penhall e produzida por David Fincher e Charlize Theron. O que poderia facilmente ser o mote para mais uma série pobre de investigação policial, nas mãos de Fincher — o verdadeiro núcleo criativo da obra — transforma-se numa inteligente narrativa ficcional. Baseado no caso real de dois agentes — John E. Douglas e Mark Olshaker que decidiram quebrar os protocolos da agência federal americana para estudar a estrutura mental de assassinos —, Minhunter sagra-se com uma das produções mais interessantes no seguimento de séries desse ano — ao lado de The Handmaid’s Tale, The Deuce, o retorno de Twin Peaks, apenas para citar algumas. Fincher — que dirigiu 4 dos 10 episódios — conseguiu imprimir seu DNA de forma definitiva na série — quem já assistiu Zodíaco facilmente concordará com essa afirmação. Com diálogos longos e muito bem escritos, a estrutura narrativa de Mindhunter não se concentra na velocidade. Sua ação é, como seria de esperar, totalmente psicológica. Com uma fotografia em tons pastéis, bastante sobria, que ambienta o clima da série de forma sombria e lúgubre — mas sem ser tenebroso —, a sutileza dos recursos permitem que o espectador receba o peso de cada cena na medida certa. O que vai dar intensidade à narrativa é a performance de cada núcleo: a dupla de agentes funciona com uma organicidade impressionante, a Dra. Wendy Carr (Anna Torv) é daqueles personagens hipnotizantes, e mesmo os criminosos têm suas psicologias e personalidades profundamentes bem captadas pelos seus intérpretes — com destaque para Cameron Britton e o seu irretocável Ed Kemper. Para o espectador familiarizado com a agilidade de cenas e as tramas cheias de plots de produções como C.S.I ou Criminal Minds, pode ser o que ritmo lento de Mindhunter não cative de primeira. Mas ao se dar conta da evolução muito bem construída dos personagens e de como suas vidas pessoais vão sendo influenciadas pelo seu ambiente de trabalho, o espectador mais sensível e esperto vai entender que está diante de uma grande obra — que já tem continuação garantida, segundo Fincher. O pioneiro trabalho de John E. Douglas e Mark Olshaker rendeu no livro “Mindhunter: o primeiro caçador de serial killers americano” — publicado no Brasil pela editora Intrínseca na tradução de Lucas Peterson —  que revela os procedimentos que a dupla precisou adotar para conseguir extrair os métodos, os gatilhos emocionais, as motivações dos serial killers — expressão cunhada pelos dois. Para conseguir isso precisaram ser muito mais psicólogos do que policiais. O trabalho de Fincher consegue exemplificar muito bem isso ao apresentar o agente especial Holden como um professor burocrata e meticuloso na primeira parte da série e, depois do contato com os criminosos, ele ir se transformar num irreconhecível burlador de regras e adotar comportamentos reprováveis pelo FBI afim de dar prosseguimento ao seu projeto e obter resultados mais autênticos e sinceros dos entrevistados. As cenas de entrevistas dos assassinos impressionam pela forma como cada um deles apresenta seus crimes. É possível entender ali que quem estava por trás daqueles crimes desumanos não eram bestas feras, ou qualquer espécie de animal. Eram humanos. Ao começar a traçar os perfis psicológicos de criminosos extremamente cruéis em seus crimes, Mindhunter apresenta algo que procuramos ignorar: a natureza humana pode ser profundamente cruel. Aquilo que chamamos “desumano” nada mais é do que outro desdobramento da natureza humana. A mente dos serial killers ainda estava numa zona gasosa para os estudos da psicologia criminal porque eles não eram compreendidos como humanos, tinham sua humanidade retirada por terem cometidos “atos desumanos” — como esquartejar um corpo e fazer sexo com o cadáver, por exemplo. No entanto, foi necessário o problemático processo de humanização desses sujeitos para conseguir submetê-los a um estudo. E isso gera conflitos — o agente Bill Tench é esse contraponto na série. Ao abordar esses meandros da natureza humana — como fez em Seven e Zodíaco — Fincher obtém uma fórmula preciosa na construção da estrutura de Mindhunter,  que é o estudo do grotesco criminal sem a necessidade de cenas gráficas, indo somente pela sua abordagem psicológica, muito mais sutil e interessante para quem vai se dedicar às dez horas da primeira temporada da série. Mindhunter é pura psicologia e loucura, explorando a natureza humana no que ela parece ter de menos humano, com bastante calma e maestria. Uma das melhores séries do ano, sem dúvida. Ricardo Silva é graduando em Filosofia pela Universidade do Estado do Amapá (UEAP) e crítico de literatura e cinema.