Por Rodrigo Hirose

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Às vésperas da reabertura em Goiânia, vale a pena observar o exemplo de Aparecida

Em um mês de fechamento de atividades comerciais por zona, segundo maior município teve alta de 456%, enquanto na capital ela foi de 213%

Coronavírus matou, em quatro meses, mais que a dengue desde 2010

Número de mortes confirmadas em Goiás em julho corresponde a 35% do total registrado desde a primeira, em 26 de março

Na terra do cada um por si, o coronavírus é contra todos

A falta de ações coordenadas contra a Covid-19 se mistura com o charlatanismo difundido nas redes sociais, com o óbvio resultado de mais casos e mortes

Goiás entrou no período mais duro da pandemia de Covid-19 da pior forma possível. Autoridades bateram cabeça, o setor produtivo pressionou, o Judiciário se meteu e alguns médicos optaram pelo curandeirismo. Enquanto isso, apenas nos quatro primeiros dias de julho, 130 pessoas morreram vítimas da doença no Estado. Isso equivale a 20% de todas as mortes desde o início da pandemia, cujos primeiros diagnósticos positivos para o coronavírus datam de um já longínquo 12 de março.

A média de mortes em julho está em 32,5 por dia. Essa foi a média que o Amazonas teve no final de abril. A curva de mortes em Goiás, nesse momento, é muito semelhante à do Estado do Norte brasileiro, um dos mais devastados pela pandemia no início dela em território brasileiro. Depois de picos que romperam a casa dos 100 óbitos em um dia, o Amazonas volta ao patamar de 30 – o que, assustadoramente, hoje é uma boa notícia.

Em Goiânia, os leitos de UTI dedicadas à Covid-19 disponíveis na rede privada ligada à Associação dos Hospitais Privados de Alta Complexidade de Goiás (Ahpaceg) estavam esgotados no final da tarde de sexta-feira, 3. Na rede pública, restavam 15 vagas, mas o número de pacientes que dependiam delas era muito maior que isso.

Na mesma semana em que o caos começou a dar os primeiros sinais, um imbróglio legal piorou ainda mais a confusão que já toma conta a cabeça das pessoas. Em um dia, decretos governamentais proibiam o funcionamento de atividades econômicas não essenciais em Goiânia. Noutro, uma liminar autorizou. Só para depois ser derrubada no Tribunal de Justiça e comerciantes, trabalhadores e consumidores dormirem sem saber como seria o dia seguinte.

Isolamento social

Na dúvida, as pessoas decidiram que não é mais hora de ficar em casa. O índice de isolamento social cresceu mísero 0,8% em Goiás no primeiro dia do decreto de quarentena alternada (14 dias com quase tudo aberto, igual período com quase tudo parado). Aglomerações nas ruas, comércio funcionando, distribuidoras de bebidas que se transformaram em bares, pessoas lotando os parques sem máscaras. Em terra de cego, o cidadão segue seus próprios instintos.

O abre e fecha do comércio em Goiânia deixa todo mundo sem saber o que fazer

Para piorar a situação, médicos decidiram que era hora de publicar vídeos em que alegam que a cura para a Covid-19 já existe. Prefeitos passaram a dispensar "kits Covid" em seus municípios. O brasileiro, crédulo, supersticioso e crente em milagres teve reforçada a impressão de que, se pegar, não morre. E que os políticos deixam milhares morrerem por pura maldade ou interesse escuso, já que a cura está ali, num coquetel ao alcance de todos.

Ficam as perguntas: se é tão fácil curar a Covid-19, por que 525 mil pessoas, 62 mil delas no Brasil, morreram à míngua? Por que, a cada dia que passa, a morte parece estar mais próxima de todos?

Aids e HIV

O momento é repleto de semelhanças com o início da epidemia da aids nos anos 1980. Elas vão desde a comunicação atrapalhada sobre grupos de risco (naquela época, os gays; hoje, os idosos ou pacientes com comorbidades), linguagem (da peste gay ao vírus chinês), teoristas conspiratórias (vírus criado em laboratório), charlatanismo e negacionismo.

Na década de 1990, um “pesquisador” radicado no Tocantins ficou famoso na internet ao divulgar que havia encontrado a cura para a aids em um produto a base de mutamba. A “pesquisa” ficou conhecida como “Mutamba Project”. Não se tem notícia de que ele tenha ganhado algum prêmio Nobel pela descoberta.

Atualmente, várias sãos as “mutambas” contra a Covid-19. Corre nos grupos de WhatsApp a tese de que o chá de São Caetano, usado na medicina popular para o controle do diabetes, também tem propriedades contra o coronavírus. De fato, como mais de 90% das pessoas se recuperam da Covid-19, muita gente se cura tomando aspirina.

O Brasil foi referência no combate
ao HIV/Adis | Foto: Divulgação

O uso de medicamentos experimentais contra uma doença nova, em si, não é problemático. Ao contrário, faz parte do desenvolvimento de tratamento eficazes. No caso do HIV, por exemplo, a primeira substância com algum efeito positivo foi a zidovudina, popularmente conhecida como AZT. Inicialmente sintetizada para tratamento de tipos específicos de câncer, ela foi experimentada contra a aids, que matava 100% dos pacientes.

O AZT efetivamente foi uma virada de chave na guerra contra a aids e continua no arsenal disponível para os soropositivos no Brasil. Contudo, por causa dos severos e inúmeros efeitos colaterais e rápida adaptação do vírus ao medicamento, há muito deixou de ser receitado como opção inicial. Hoje, no País, o principal coquetel é composto por uma combinação de dois comprimidos: um de dolutegravir e outro que reúne o tenofovir e a lamivudina. A quantidade de medicamentos disponibilizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), porém, chega atualmente às duas dezenas e cada paciente pode ter um tratamento praticamente individual.

Bala de prata

No caso da Covid-19, no mundo todo estão sendo testadas várias intervenções. Não há, contudo, nenhuma que tenha se revelado a bala de prata contra o coronavírus. Na prática clínica, alguns médicos relatam sucesso com este ou aquele produto. Repita-se: esse não é o problema.

Se não há remédio, não há que se esperar todo o longo trâmite das pesquisas para se tentar salvar vidas.

O perigo começa quando se dá a falsa impressão de que a cura já existe, como tem sido difundido nas redes sociais e como algumas autoridades políticas e médicas têm deixado transparecer.

Isso só estimula o comportamento já indisciplinado do brasileiro, que se recusa a usar camisinha, que dirá uma máscara.

Legado brasileiro no enfrentamento à aids está sendo jogado fora

O sucesso do Brasil no combate à aids, que tornou o País referência mundial, não é construção de uma só pessoa.  Em 1996, o presidente Fernando Henrique Cardoso sancionou a Lei 9.313, que tornou obrigatória o fornecimento dos antirretrovirais pelo SUS. Em 1999, começou a produção nacional do AZT e da lamivudina. Nos anos 2000, o governo brasileiro, especialmente na gestão Dilma Rousseff, obteve avanços na negociação com laboratórios e com quebra de patentes, barateando o custo do tratamento e universalizando o acesso. Nos últimos anos, substâncias e tratamentos mais modernos foram incorporados, inclusive com possibilidade de profilaxia pré e pós exposição ao vírus.

No caso da Covid-19, todo esse legado está sendo jogado na lata de lixo da história. Cada prefeito e cada governador toma as medidas que julgam as melhores. Enquanto o governo federal lava as mãos.

Em Goiás, um exemplo curioso de como a descentralização de ações pode dar com os burros n´água. O prefeito de Goianésia decretou lockdown apenas nos fins de semana, a partir das 19 horas de sexta-feira. O resultado, como foi possível observar na primeira semana em que a regra vigorou, foi uma corrida insana aos supermercados e postos de combustível (veja vídeo abaixo).

Enquanto cada um decide por si, o coronavírus segue tranquilo sua saga mortal.

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Coronavírus pulverizou 26,7 mil empregos com carteira assinada em Goiás

Mulheres, trabalhadores com ensino médico completo e com idade de 25 a 39 anos são os que foram mais atingidos pela perda do emprego no período

Painel de informações do Caged

Os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), divulgados na segunda-feira, 29, pelo Ministério do Trabalho, demonstra em números o que empresários e trabalhadores têm sentido na prática: a pandemia de Covid-19 tem causado devastação não apenas em vidas, mas também no emprego. Em Goiás, segundo a Secretaria Estadual da Saúde (SES), 6.665 pessoas morreram vítimas do Sars-CoV-2, o coronavírus que causa a doença. Desde março, mês em que o governo do Estado publicou o primeiro decreto de quarentena, 26.755 vagas de emprego formal foram fechadas.

O número é resultado das admissões e demissões nos três meses sob pandemia – e só leva em conta quem trabalhava (ou trabalhava) com carteira assinada. Neste período, foram contratadas 99.169 pessoas. Em contrapartida, 125.906 foram demitidas.

A retração nos empregos coincide exatamente com o início da pandemia. Até fevereiro, o saldo era positivo, com 19.487 vagas de trabalho formal criadas no Estado. Em março, a queda foi de 1.587 vagas. Abril, o pior mês até agora, fechou 20.587 postos de trabalho formal. Em maio, foram mais 4.581.

Serviços e comércio são os mais atingidos

O Caged revela também os setores mais atingidos pela crise. O setor de serviços foi o que mais desempregou, fechando 15.555 postos de trabalho com carteira assinada. Em seguida, vem o comércio, com 10.751. Apenas a agropecuária teve resultado positivo desde março, com 1.972 vagas criadas. Apesar de terem voltado a contratar em maio, a indústria e a construção civil fecharam o período com saldo negativo: -1.438 e -953, respectivamente.

As mulheres representam 57% do total de vagas fechadas na pandemia (15.279). Em relação à escolaridade, os trabalhadores com ensino médio completo foram os mais prejudicados, correspondendo a 62% dos postos de trabalho a menos (16.614). Os empregados na faixa etária entre 25 a 39 anos foram responsáveis por 49,5% das vagas fechadas.

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Goiás entra no período mais duro de enfrentamento ao coronavírus

Já são mais de 100 dias desde o primeiro caso no Estado e, segundo autoridades de saúde, pico de contaminações ocorrerá em julho

Goiás alcançou, na quinta-feira, dia 25, 100 dias desde o registro do primeiro caso de Covid-19 no Estado. Vidas se perderam, empresas quebraram, famílias se despediram de pessoas amadas, homens e mulheres ficaram sem trabalho. Solidão e medo caminharam de mãos dadas. E, mais de três meses depois, tudo leva a crer que o período mais duro de enfrentamento ao coronavírus começa agora.

Os números são frios. E assustadores. Em poucos dias, o aparente controle da doença começa a escorrer tal como água pelas mãos. Os dados de junho são reveladores. No dia 1º, havia 4 mil diagnósticos de Covid-19 em Goiás. O coronavírus Sars-CoV-2 havia matado, até então, 139 pessoas. No sábado, 27, já eram 21 mil testes positivos e 434 mortes. Em termos porcentuais, a alta foi de 404% e 212%, respectivamente.

Em Goiânia e Aparecida de Goiânia, os dois maiores municípios goianos, e que dividem seus limites, a explosão de casos e mortes segue o mesmo padrão. Na capital, o número de casos cresceu 253% no mês (de 1,7 mil para 6,1 mil). O de mortes, 163% (de 58 para 153). Em Aparecida de Goiânia, o salto foi de 415% (de 458 para 2,3 mil) e 241% (de 12 para 41), respectivamente.

Olhados isoladamente, os dados de Goiás preocupam. Colocados em contexto nacional, dão a dimensão do problema. No mesmo período, o mês de junho, o crescimento no número de casos em todo o Brasil foi de 149% (de 526 mil para 1,3 milhão) e o de mortes subiu 90% (de 29, mil para 57 mil). Portando, a aceleração das infecções e mortes pelo coronavírus em Goiás está bem acima da média brasileira.

Média de mortes é semelhante ao que ocorreu em abril no Amazonas

O que Goiás vive agora se assemelha ao que o Amazonas experimentou em abril. A média de mortes na última semana, em território goiano, foi de quase 20. O Estado do Norte brasileiro tinha, há dois meses, patamar semelhante. Poucas semanas depois, as cenas de covas coletivas ganharam o noticiário e comoveu o Brasil – ao menos a parte do País que não está anestesiada pelo negacionismo.

A evolução das mortes por Covid-19 em Goiás, segundo o Ministério da Saúde

Não há sinais de que tamanha tragédia se abata sobre os goianos. A realidade dos dois Estados é diferente. O Amazonas tem um território imenso e a população está espalhada em vilarejos que estão a horas de viagem por barca dos hospitais mais próximos. Por outro lado, Goiás tem uma concentração populacional mais densa. As regiões metropolitanas de Goiânia e do Entorno do Distrito Federal são exemplos.

Mas os casos não têm se concentrado apenas nessas aglomerações urbanas. No começo da pandemia em Goiás, mais da metade dos casos estavam em Goiânia. Hoje, a capital tem aproximadamente 28% das notificações. Um dos motivos foi a expansão em Rio Verde, detectada por causa de testes em massa nas plantas da BRF na região.

Esse sinal vindo do Sudoeste goiano aciona outro alarme: o porcentual de positivos demonstra que a subnotificação é incalculável em todo o território. Experiências semelhantes, em outras empresas ou grupos específicos (como a Câmara de Vereadores de Goiânia e os clubes de futebol) revelam uma proporção muito grande de pessoas portadoras do vírus que não têm conhecimento da situação.

A polêmica reabertura do comércio

Todo esse contexto coincide com a retomada mais ampla das atividades comerciais. No interior, já havia uma flexibilização maior. Em Goiânia, shoppings e galerias reabriram as portas. Nos próximos dias, será a vez da região da Rua 44. Segundo maior polo de confecções do Brasil, circulavam por ali, em finais de semana normais, entre 200 mil e 250 mil pessoas. Quantidade de gente impensável na realidade atual.

O problema não tem solução simples. Por um lado, infectologistas e epidemiologistas apontam para a provável contaminação em massa, mesmo com todos os cuidados, como uso de máscara, contenção do fluxo de pessoas e uso de álcool em gel. Por outro, empresários, economistas e trabalhadores não enxergam mais como a atividade econômica ficar parada. O governo federal não tem auxiliado a contento nenhum dos dois lados da moeda: o empreendedor não consegue linhas de crédito (apenas 10% dos R$ 40 bilhões prometidos efetivamente chegaram às empresas), o trabalhador tem dificuldade em acessar o auxílio emergencial – que também não pode ser eterno.

O governo do Estado, as prefeituras e outras entidades (como representantes do setor privado de saúde e o Ministério Público) intensificaram as conversas nos últimos dias para encontrar saídas. Depois de um aparente distanciamento, especialmente após os prefeitos do interior terem optado por uma abertura mais ampla quando o Estado ainda pleiteava um isolamento mais profundo, o diálogo foi retomado. A possibilidade de lockdown foi aventada, assim como a adoção de medidas mais ou menos dura em cada região de Goiás, conforme a situação epidemiológica e a capacidade de atendimento.

São medidas necessárias em busca de um equilíbrio delicado e difícil de ser encontrado. A emergência sanitária coincide, tristemente, com a endemia social da pobreza e desigualdade social. Um casamento que obriga a convivência entre o necessário e o possível.

Comportamento social não ajuda, só atrapalha

Em meio aos números (de doentes, mortos, desempregados e falidos), o comportamento social só tem piorado a situação. Em Goiânia, ao menos, não é difícil encontrar grupos reunidos em postos de combustível e perto de food trucks, como se nada estivesse ocorrendo. O isolamento social em Goiás, que já foi o melhor do País, atualmente está estacionado na casa dos 30% - na prática, isso significa muito pouco, pois, mesmo antes da pandemia, o índice era de aproximadamente 20%. O ideal, conforme os especialistas, é que ele fique acima dos 50%.

Não é o caso de exigir que todos fiquem dentro de suas casas. A realidade brasileira faz com que essa não seja uma opção para muita gente. Além disso, há os que trabalham em atividades essenciais (como os profissionais de saúde) e os deslocamentos para compras de itens de alimentação e medicamentos, por exemplo. Contudo, há quem possa, mas não quer ficar longe das ruas. A esses, o mínimo que se espera é um comportamento adequado, com o uso de itens de segurança e o distanciamento uns dos outros.

Em 2020, julho chega para os goianos sem a temporada do Araguaia. A temporada, este ano, é de enfrentamento de um inimigo mortal. E ela, que se prolonga há meses, terá os capítulos mais tensos nas próximas semanas.

Ex-diretor do Hospital de Urgências de Goiânia morre de Covid-19

Ciro Ricardo Pires de Castro, que ingressou no Hugo no início dos anos 1990, faleceu neste sábado, segundo a Secretaria Estadual da Saúde

Ciro Ricardo: mais um profissional da saúde vítima da Covid-19 | Foto: SES

Faleceu neste sábado, 27, em Goiânia, o médico Ciro Ricardo Pires de Castro, aos 75 anos. Ex-diretor do Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo), ele foi vítima da Covid-19, conforme nota de pesar publicada pela Secretaria Estadual da Saúde (SES).

Ciro Ricardo foi responsável pela implantação do Sistema Integrado de Atendimento ao Trauma e Emergência (Siate), serviço do qual foi coordenador. O médico foi um dos responsáveis pela criação da residência médica no hospital, no qual ingressou em 1991. Também foi conselheiro e diretor do Conselho Regional de Medicina de Goiás (Cremego).

Bolsonaro, o presidente que abriu mão de governar, enfrenta sua pior semana

Chefe da nação, que abdicou de liderar o País diante de uma pandemia mortal, perde importante porta-voz e vê a Justiça acuar o filho

Montagem sobre ilustração do livro A Roupa Nova do Rei

O presidente Jair Bolsonaro teve um primeiro ano de mandato relativamente suave. Contou com apoio dos brasileiros identificados com a pauta moralista, com a expectativa dos agentes econômicos e com a ala ideológica. Conseguiu aprovar pautas importantes, como a Reforma da Previdência – ainda que o resultado tenha ficado aquém das expectativas em relação à economia, algumas categorias do funcionalismo tenham conseguido manter os privilégios e outras tenham saído prejudicadas (mas não se faz omelete sem quebrar ovos).

Mesmo com o resultado minguado do Produto Interno Bruto (PIB) e geração de empregos longe do que o Brasil precisa, o discurso de reconstrução de uma nação quebrada e assolada por corrupção foi suficiente. Assim, Bolsonaro teve tempo, em todo o ano de 2019, para fazer o que realmente gosta: enfrentar seus moinhos de vento.

Grande parte da população não viu nada demais na gestão ambiental (propositalmente) frouxa em relação ao desmatamento, no discurso virulento em relação à oposição, na negligência às minorias e no ataque à ciência produzida nas universidades brasileiras e à imprensa tradicional, entre outros pontos. Ao contrário, muita gente aplaudiu tudo isso. Afinal, Bolsonaro foi eleito exatamente por essas razões, o que é legitimamente democrático. E o mercado renovou suas expectativas para 2020.

Tinha um vírus no caminho

Eis que 2020 começa com uma novidade inesperada: um vírus, como origem na província chinesa de Wuhan, cobrou dos líderes mundiais que fossem gestores e líderes de verdade. Mulheres como a primeira-ministra Jacinda Arden, da Nova Zelândia, e a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, são exemplos do que se quer dizer.

Então, o coronavírus revelou que Bolsonaro estava nu. Confrontado com a necessidade de conduzir o País, o presidente mostrou-se, de início, relapso. Com o andar da pandemia, encarnou Pilatos. Como o governador da Judeia, lavou as mãos.

Parte dos brasileiros descobriu, então, que discursos e bravatas não são suficientes para enfrentar um inimigo invisível, mas mortal. Sem liderança central, com duas trocas de ministro em plena pandemia (e com um titular provisório há mais de um mês), negando a gravidade e apostando em soluções milagrosas (como a controversa hidroxicloroquina, que, até hoje, não tem efeitos comprovados contra Covid-19), Bolsonaro é um não comandante sentado na cadeira presidencial.

Transferência de responsabilidade

No Twitter, Bolsonaro diz que combate ao
coronavírus cabe apenas a governadores
e prefeitos

Eleito com 57,7 milhões de votos, Bolsonaro preferiu jogar toda a responsabilidade por milhares de mortes nas costas dos governadores, que, sem um comando central, agiram individualmente. A falta de uma ação conjunta, organizada e financiada pela União, tornou o enfrentamento da maior crise sanitária em 100 anos ainda mais difícil.

O presidente fez uma interpretação particular sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a competência concorrente de Estados, municípios e o Distrito Federal em relação às medidas contra o coronavírus. Porém, a proposta do ministro Edson Fachin, aprovada pelo plenário, mantém nas mãos do chefe do Executivo Federal a possibilidade de legislar sobre o tema, inclusive determinando quais são os serviços essenciais. Em momento algum o STF retirou as obrigações da União em relação à pandemia, inclusive porque o Sistema Único de Saúde (SUS) é tripartite. Ao contrário, o tribunal reafirmou que a responsabilidade é de todos os entes da federação.

Infelizmente, o discurso presidencial continua colando. Os guerrilheiros virtuais do bolsonarismo espalham a versão de que ele não pode fazer nada e que toda a conta a ser paga é dos governadores e prefeitos.

Fica a pergunta: se, em um caso desses, o presidente se declara inútil, para que, então, o Brasil precisa de um presidente? Para mandar jornalista calar a boca? Ou para cavalgar em meio a manifestações que pedem o fechamento do Congresso e do STF, além de uma tal “democracia com militares”? Aparentemente, os resilientes 30% que apoiam Bolsonaro cegamente contentam-se com muito pouco.

50 mil mortos

Com um presidente que abriu mão de governar, o Brasil chegou a 50 mil mortos e mais de 1 milhão de infectados pelo coronavírus. Na mesma semana, apoiadores de Bolsonaro foram presos e alvos de busca e apreensão. Na quinta-feira, 18, Fabrício Queiroz, amigo íntimo do clã, foi preso e Abraham Weintraub foi demitido do Ministério da Educação.

A prisão de Queiroz e a queda de Weintraub transitam em universos diferentes. No caso do primeiro, o noticiário político bem que poderia ser transferido para as páginas policiais. Ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro, quando este era deputado no Rio de Janeiro, Queiroz tem muito a explicar para a Justiça. E, caso as explicações não sejam convincentes, a situação do filho 01 do presidente ficará extremamente delicada. O caminho para cassação do mandato estaria aberto, sem contar as possíveis implicações legais.

Weintraub: porta-voz da ala ideológica do
governo | Foto: Marcelo Camargo/ABr

A saída de Weintraub causa fissuras na chamada ala ideológica do governo – no caso específico, talvez seja mais correto falar em ala psiquiátrica. Nenhum ministro personificou tão bem alguns nichos do bolsonarismo como ele. Weintraub notabilizou-se pelo desprezo às universidades (especialmente às humanidades), pela falta de pudor em comprar discussões públicas que nada acrescentam à Educação do País e pelas patéticas aparições nas redes sociais (a canastríssima imitação de Gene Kelly é tristemente inesquecível).

Mas Weintraub verbalizava, no governo, o que muita gente pensa, mas tem receito de externar. A frase “Por mim, botava esses vagabundos na cadeia”, dita em uma reunião ministerial (reunião essa que demonstrou que não existe governo), ainda hoje ecoa como grito de guerra nas redes sociais e nas manifestações pró-Bolsonaro país afora.

O ex-ministro, portanto, era um porta-voz importante do bolsonarismo. Sem nenhuma realização em mais de um ano no MEC (exceto que se considere como "realização" a portaria que acabou com as cotas na pós-graduação), em relação ao discurso talvez Weintraub faça falta. Em troca pelos serviços prestados, Weintraub pode ganhar um bom cargo, com salário polpudo, no Banco Mundial.

Discurso para 2022

Ainda no meio do segundo ano de mandato, Bolsonaro já tem discurso para 2022. Terá na pandemia o álibi perfeito para o baixo crescimento econômico e para o desemprego. As mortes causadas pelo coronavírus serão debitadas na conta dos governadores e prefeitos. A falta de realizações será culpa do Congresso, do STF e da imprensa. Na miscelânea certamente pintará algo sobre uma "conspiração chinesa".

A lista de desculpas está pronta e ganha mais itens a cada dia. E tem muita gente que assina embaixo.

Sem jogos há seis meses, Serra Dourada luta pela sobrevivência

Prejuízo, que foi de R$ 2,3 milhões em 2018, caiu para R$ 900 mil em 2019, mas estádio busca receitas para se tornar atrativo e sustentável financeiramente

Estádio Serra Dourada: maior palco esportivo de Goiás completou 45 anos | Foto: Fernando Leite / Jornal Opção
Estádio Serra Dourada: maior palco esportivo de Goiás completou 45 anos | Foto: Fernando Leite / Jornal Opção

Em março, o Estádio Serra Dourada completou 45 anos. A data passou quase despercebida. Também, pudera: o último jogo oficial no maior palco do esporte goiano foi realizado em 8 de dezembro; portanto, há mais de seis meses. E, com a pandemia de Covid-19 e os planos dos times da capital que têm calendário garantido no segundo semestre, a tendência é que ele permaneça vazio – em longo prazo, o destino do estádio é incerto.

O Serra Dourada recebeu grandes jogadores (como Pelé, Zico, Linconl, Fernandinho e Baltazar), sediou jogos históricos (como o Flamengo e Atlético Mineiro pela Copa Libertadores, em 1981) e foi palco de shows antológicos (como a apresentação do beatle Paul MacCartney, em 2014). Mas uma série de fatores tem afastado os clubes de futebol e os torcedores de suas arquibancadas.

Em 2019, foram disputadas 40 partidas no estádio. Menos de uma por semana, portanto. A média de público foi de 9,8 mil. A receita para a administração do equipamento público, com os jogos, foi de R$ 928,6 mil, o que dá uma média de R$ 23,2 mil por rodada. Outras fontes de receita, com o futebol, são os bares e placas de publicidade.

O clube que mais utilizou o estádio foi o Goiás, que mandou 21 jogos ali, nenhum deles pelo Campeonato Goiano, apenas pelo Campeonato Brasileiro e Copa do Brasil. O Vila Nova mandou 15 partidas, também pelas competições nacionais. O Goiânia mandou quatro jogos no Serra Dourada e o Atlético, nenhum.

Secretário Rafael Rahif (c), com o ex-jogador Túlio e o secretário Adriano da Rocha Lima | Foto: Mantovani Fernandes

Fora do esporte, o Serra Dourada fatura com aluguel do estacionamento para shows e para o feirão de automóveis, que é realizado semanalmente. O maior evento local, o Villa Mix, por exemplo, pagou R$ 150 mil para usar o espaço, no ano passado. A receita com o feirão flutua, de acordo com a quantidade de carros que acessa o estacionamento (grande parte fica nas ruas adjacentes). Em fevereiro, último mês em que ele foi realizado (com a pandemia, as atividades foram suspensas), o estádio recebeu pouco mais de R$ 19 mil. Durante todo o ano passado, o estádio teve um faturamento de R$ 1,4 milhão. As despesas ficaram em R$ 2,3 milhões. Feitas as contas, o prejuízo foi de quase R$ 900 mil.

A situação financeira, porém, já foi pior. Em 2018, a receita foi de R$ 996 mil, diante de gastos na ordem de R$ 5,7 milhões. O que redundou em um déficit de R$ 4,7 milhões. “Cortamos gastos, repactuamos contratos e transferimos alguns custos para os clubes”, explica o secretário de Esporte e Lazer (SEEL) de Goiás, Rafael Rahif.

Entre esses custos está o quadro móvel – funcionários que cuidam, por exemplo, da limpeza e das bilheterias. Essa despesa era custeada pela administração, que tinha um contrato com uma empresa terceirizada, no valor de R$ 20 mil por jogo, em média, segundo a Secretaria de Esporte e Lazer. Esse montante oscila conforme o tamanho do evento.

Com todos esses ajustes, o déficit operacional do estádio recuou aproximadamente 80%. Mas o secretário conta que há planos para novas receitas. O estacionamento, por exemplo, atualmente é gratuito, pois o contrato com a empresa que explorava o serviço foi rompido. “Estamos trabalhando para que o Serra Dourada seja autossustentável”, diz Rahif.

Obras

Para tornar o estádio mais atrativo, a SEEL fez algumas melhorias, aproveitando o intervalo por causa da pandemia. De acordo com o secretário, foram investidos R$ 300 mil para recuperação do gramado, “que estava péssimo”, segundo ele. Foi construída uma sala para o árbitro de vídeo (VAR), sala de recepção para os times visitantes e feitas adequações para possibilitar a setorização das arquibancadas, como exigido pelo Corpo de Bombeiros. Assim, a capacidade, que estava limitada a 33 mil torcedores, agora é de 42 mil.

Gramado do Serra Dourada foi restaurado | Foto: Mantovani Fernandes

 Outras intervenções estão previstas, como uma reforma geral dos banheiros (um dos pontos fracos do estádio) e adequação da iluminação aos padrões exigidos pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF). A pandemia, contudo, obrigou o secretário a adiar alguns planos. “A prioridade, no Brasil, hoje é outra: a saúde”, justifica. A reforma dos banheiros 32 banheiros teve de ser revista. Para a iluminação, a licitação está em andamento e, segundo Rahif, os R$ 3 milhões necessários estão garantidos.

Times preferem jogar em estádios próprios

Marcelo Almeida, presidente do Goiás, na nova arquibancada do Estádio Hailé Pinheiro | Foto: Fernando Leite / Jornal Opção

O secretário de Esporte e Lazer de Goiás, Rafael Rahif, diz que o Serra Dourada está pronto para receber os jogos dos clubes goianos no Campeonato Brasileiro. Essa hipótese, porém, não é a preferida dos dirigentes de Goiás, Atlético e Vila Nova. Especialmente se os jogos voltarem sem público, como é a tendência, por causa da pandemia de Covid-19.

O Goiás, por exemplo, está construindo uma nova arquibancada, que levará o Estádio Hailé Pinheiro, popularmente conhecido como Serrinha. A meta era terminar a obra no início do segundo semestre, a tempo de jogar a maior parte da Série A, cujo início estava programado para o dia 2 de maio. Com a nova estrutura, que inclui banheiros e bares, a capacidade será para 14 mil torcedores – o mínimo exigido pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF) são 13 mil lugares. No ano passado, apenas 7 dos 15 jogos do Goiás no Serra tiveram mais de 14 mil presentes (o recorde ficou para o confronto com o Flamengo, que recebeu 38 mil torcedores).

A quarentena para impedir a disseminação do coronavírus Sars-CoV-2, causador da doença, porém, interrompeu os trabalhos por 60 dias. Agora, a nova projeção é de que tudo esteja concluído em dezembro. “Mas pode haver alguma surpresa e ficar pronto em outubro”, diz o presidente do Goiás, Marcelo Almeida. De toda forma, sem a possibilidade da presença da torcida, os primeiros jogos, quando ocorrerem, devem ser disputados na Serrinha.

Marcelo Almeida cita alguns problemas que tornam o Serra Dourada menos atrativo: a sonorização, a iluminação e a impossibilidade de setorização do estádio. Além, é claro, de questões econômicas, como as taxas cobradas pelo uso e a impossibilidade de exploração dos bares.

Há, também, questões esportivas e efetivadas envolvidas. O Estádio Hailé Pinheiro está sendo transformado em uma arena, em que a torcida fica mais próxima dos jogadores. “Será um caldeirão. No Serra, com 20 mil pessoas, parece que tem pouca gente”, afirma o dirigente. Além disso, o projeto inclui a construção de um museu, para que o local se transforme em um ponto turístico. “O torcedor quer ter sua própria casa”, afirma.

A ala Leste, que está sendo construída, terá cadeiras para cerca de 5 mil pessoas, quatro banheiros e um grande bar, que será explorado pelo clube. O investimento é de aproximadamente R$ 10 milhões, que se somam aos R$ 8 milhões investidos para construir o tobogã, onde fica a torcida organizada e demais torcedores que preferem assistir aos jogos em pé. Futuramente, será construída a ala Oeste, com camarotes, restaurantes, etc. O orçamento atual previsto é de cerca de R$ 37 milhões.

Atlético

Adson Batista, presidente do Atlético, acompanha
as obras no Antônio Accioly

O Atlético, que também disputa a Série A, já optou há mais tempo por mandar seus jogos no Estádio Antônio Accioly, em Campinas, ou no Estádio Olímpico, no Centro. Em 2019, o rubro-negro só atuou uma vez no Serra Dourada, mas foi como visitante, contra o Vila Nova. No Campeonato Goiano deste ano, o time também preferiu jogar em casa.

Para o Brasileiro, a expectativa é que os jogos iniciem sem público, mas a diretoria corre contra o tempo, depois de ter de parar a construção por causa da pandemia, para mandar a maioria das partidas no Accioly. “Tivemos de parar, perdemos alguns recursos, mas estamos normalizando e a esperança é jogar todo o Brasileiro em casa”, diz o presidente Adson Batista.

No local, além de novas arquibancadas, que vão ampliar a capacidade de 10 mil para mais de 13 mil pessoas, estão projetados o Museu do Dragão, a ampliação da loja oficial do clube e uma lanchonete, com acesso ao público externo, que funcionará mesmo em dias sem jogos. Outra obra importante é a adequação da iluminação aos padrões exigidos pela CBF. O valor investido, porém, não é revelado. “É uma questão interna do clube, que muda a toda a hora. Quando tudo estiver pronto, vamos divulgar”, afirma Adson.

Vila Nova

Com a queda para a Série C, o Serra Dourada ficou ainda menos atrativo para o Vila Nova. A expectativa é que o público dos primeiros jogos não seja tão grande, tornando inviável o mando no maior estádio goiano. Dessa forma, as partidas serão no Onésio Brasileiro Alvarenga, o OBA, que fica no Setor Leste Universitário, em Goiânia.

Segundo o gerente de futebol do Vila Nova, Wagner Bueno, no OBA o clube pode explorar os dois bares, além de citar, também, o fator “nossa casa”. “Assim que for possível a volta da torcida, vamos fazer do OBA nosso caldeirão”, afirma. Alguns intervenções pontuais foram realizadas no estádio, como o asfaltamento do estacionamento.

Wagner Bueno: "O Serra ainda é o melhor
estádio de Goiás"

Ainda assim, o dirigente colorado elogia o Serra Dourada, que, para ele, é o melhor estádio do Estado. “O Serra dourada já foi palco de grandes jogos e decisões e até jogos de Seleção Brasileira. Estava meio abandonado e agora com a reforma creio q poderá sediar jogos maiores com mais torcidas”, acredita. Caso avance para as fases finais da Série C, a intensão do Vila Nova é recorrer ao velho e bom Serra.

O outro time da capital, o Goiânia, ainda aguarda a definição da CBF sobre a realização da Série D para se planejar para o segundo semestre. O clube ainda não retomou as atividades, mesmo com a liberação pelo prefeito Iris Rezende (MDB).

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Iris pavimentou o caminho para a reeleição, mas tinha um coronavírus no caminho

Aos 86 anos, prefeito tem sido impedido de fazer política da forma que ele gosta: com inaugurações e misturado com o povo nos mutirões

Iris Rezende de máscara em vídeo da Prefeitura: longe do povo | Foto: Reprodução

A cada eleição, a história se repete. Iris Rezende, expert no jogo de esconde e mostra, mais uma vez tem feito mistério sobre uma possível candidatura. O cenário estava montado para que o emedebista se lançasse às urnas, para conquistar o seu quinto mandato de prefeito de Goiânia: contas em dia e um pacotão de obras programas para serem entregues semanas antes da eleição. Nada novo, mas, ao longo dos anos, a estratégia se mostrou extremamente eficaz.

Mas havia uma pandemia no meio do caminho. O coronavírus chegou para virar de cabeça para baixo tudo aquilo que se achava consolidado. Tudo que era concreto, de repente esvaiu-se no ar. E, de uma hora para outra, o eleitor pode ter se despertado para o fato de que, afinal, não são apenas obras físicas que fazem uma administração.

Não se pode acusar o prefeito de omissão. Ele tem se movimentado. Transformou leitos da Maternidade Célia Câmara em unidades específicas para atendimento ao paciente com Covid-19. Especializou equipes do Teleatendimento para acompanhar, remotamente, os enfermos. Porém, mais que a questão prática, nota-se ausência de Iris Rezende na linha de frente do combate à doença.

Nas negociações com o setor produtivo – que pressiona pela reabertura de shoppings centers e das lojas da Rua 44, por exemplo –, a interlocução foi com os secretários Fátima Mrué (Saúde) e Walison Moreira (Desenvolvimento Econômico). Os empresários sentiram falta do diálogo direto com o prefeito.

Obviamente, a própria pandemia impõe restrições ao prefeito. Iris completará 87 anos em dezembro. Lá se vão mais de 60 desde que conquistou o primeiro mandato, no voto, a vereador, em 1958. Ainda que goze de perfeitas condições de saúde, de uma vitalidade e de uma lucidez invejáveis, é fato que ele é do grupo de risco para a Covid-19.

Portanto, afastar-se de aglomerações não é opcional – é obrigatório. A se manter a situação atual, não há como dar ampla visibilidade às inaugurações, mesmo pelas redes sociais. O efeito, assim, fica diluído.

Mas há exemplos de que as questões de saúde pessoal, se são limitantes, não são completamente proibitivas, mesmo porque existem muitos recursos para superar essas limitações. Em São Paulo, por exemplo, o prefeito Bruno Covas, que passa por um sério tratamento para um câncer muito agressivo, fala quase diariamente à população paulistana.

Aqui mesmo, em Goiás, o governador Ronaldo Caiado foi à linha de frente, especialmente no início da pandemia – a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que ratificou a autonomia dos municípios em questões de isolamento social, aliada à falta de apoio popular, diminuiu a margem de manobra do democrata. Caiado tem 70 anos de idade e, há poucos meses, enfrentou uma arritmia cardíaca. Portanto, também faz parte do grupo de risco.

Secretariado

Na última decisão importante da Prefeitura sobre as ações em relação à Covid-19, coube ao secretário de Governo Paulo Ortegal dar a notícia que os empresários não gostariam de ouvir: a de que, diante do avanço da doença, que está infectando e matando como nunca em Goiás, não seria possível reabrir as atividades que ainda estão paralisadas – como as academias, bares e restaurantes.

Outro sinal que deve ser interpretado é a permanência de Ortegal no secretariado, com o fim do prazo para desincompatibilização dos agentes públicos que pretendem disputar cargo eletivo em outubro. O secretário era um dos cotados à vice de Iris. Mas, a não ser que ocorra o adiamento da eleição – e que isso signifique que o prazo de desincompatibilização também seja estendido –, essa hipótese está sepultada.

Algumas pessoas próximas ao prefeito dizem que o “fico” de Ortegal garante o funcionamento da engrenagem da Prefeitura, o cronograma das obras e o combate ao coronavírus Sars-CoV-2. Sob esse olhar, a manutenção do homem-forte de Iris no cargo abre espaço para que o DEM, do governador Ronaldo Caiado, indique o próximo vice-prefeito do emedebista. Além disso, não deixaria a bola da gestão cair por causa de questões políticas. Há, porém, um outro olhar possível. Ortegal permaneceu onde estava porque não havia motivo para sair, já que não seria convocado para integrar a chapa de Iris em outubro.

Como o Jornal Opção tem demonstrado seguidamente, na Coluna Bastidores (uma das mais bem informadas do jornalismo político goiano), a possibilidade de Maguito Vilela vir a ser o candidato do MDB em Goiânia não está descartada. Ao contrário, tem sido cada vez mais discutida.

Maguito, por óbvio e por estilo, permanece calado – publicamente, claro. É fiel a Iris, não por qualquer tipo de submissão, mas por lealdade de homens que se respeitam e se admiram. O ex-prefeito de Aparecida de Goiânia deve muito de seu sucesso na vida pública a Iris. E nunca demonstrou qualquer rancor por ter sido preterido na eleição a governador em 1998 (mais de duas décadas depois, ainda há quem acredite que, tivesse sido o candidato do PMDB na época, a história política goiana teria sido diferente).

Maguito Vilela saiu revigorado da administração em Aparecida de Goiânia. Em sua gestão, o município cresceu vertiginosamente, o parque industrial se consolidou e os indicadores sociais melhoraram substancialmente. Suas virtudes, porém, não descredenciam Iris. Ao contrário, só demonstram que o MDB tem substituto à altura.

Pandemia

Voltando à pandemia. Mesmo para um político que, às vezes, parece imortal, o coronavírus trouxe desafios desconhecidos. O Sars-CoV-2 limitou muito as ações de Iris. Ele não pode, nesse momento, ser o gestor que sempre gostou de ser: misturado às pessoas, inaugurando obras, abraçando a todos em seus mutirões. Uma campanha totalmente digital descaracteriza totalmente a essência do emedebista. Essa nova forma de fazer política traria o oxigênio do qual ele sempre respirou? Certamente não.

Como um emedebista lembrou ao Jornal Opção, recentemente, a filha do prefeito, Adriana, é médica. A opinião de uma especialista em saúde pode pesar em uma decisão final. No cenário de hoje, a possibilidade de uma não candidatura pode sair da pura especulação e se tornar realidade. Ainda que, de Iris, um sim nunca será surpreendente.

Átila Iamarino alerta sobre fala da OMS em relação à transmissão do coronavírus por quem não tem sintomas

Entenda a diferença entre assintomáticos – que, segundo a entidade, raramente transmitem a doença – pré-sintomáticos, que são altamente transmissores

Depois do vai e volta sobre as máscaras de proteção e a hidroxicloroquina, a Organização Mundial de Saúde (OMS) pecou novamente na comunicação sobre os riscos de contágio do coronavírus Sars-CoV-2. Em comunicado à imprensa, na segunda-feira, 8, a chefe do programa de emergências da entidade, Maria van Kerkhove, afirmou que a transmissão de Covid-19 por pessoas assintomáticas “parece rara”.

Em poucos minutos, a declaração repercutiu mundialmente, dando força aos argumentos de que o isolamento social de massa é uma estratégia equivocada – bastando a quarentena de pessoas com sintomas da doença. Como esclareceu a própria OMS, e muitos especialistas, a coisa não é bem assim.

A OMS destacou que há uma diferença entre “assintomáticos” e “pré-sintomáticos”. No primeiro grupo estão as pessoas que contraem o vírus, mas que, em momento algum, desenvolverá sintomas da doença. Elas representam cerca de 20% do total que teve contato com o coronavírus. O segundo inclui pessoas infectadas que desenvolverão sintomas em algum momento – ou seja, cerca de 80% do total.

O biólogo Átila Iamarino, que se transformou em uma celebridade nas redes sociais e ganhou espaço na imprensa tradicional com seus estudos sobre a Covid-19, foi um dos que fizeram o alerta. “Onde se acompanhou a transmissão e os sintomas das pessoas, a maioria dos casos de transmissão e a maior quantidade de vírus no corpo acontecem 2 a 3 dias antes dos sintomas, na fase pré-sintomática”, postou, no Twitter.

Artigos científicos

Alguns artigos científicos, como este, do Annals of Internal Medicine, apontam que cerca de 40% a 60% da propagação do vírus partem de pessoas que ainda não apresentaram sintomas, mas que, em algum momento, os terão. “É um desavio, porque mesmo se os assintomáticos transmitem pouco, você não tem como saber com antecedência quem será assintomático de fato e quem só não apresentou sintomas. Não há uma linha clara dividindo um do outro e sintomas da Covid-19 podem aparecer de repente”, postou o cientista de dados e professor do Insper Thomas Conti.

“Ou seja, temos evidências significativas que houve falha de comunicação e a OMS deveria retomar em breve o tema para explicá-lo melhor. Transmissão sem sintomas acontece. Não deixem de usar máscaras, higienizar mãos e manter distância dos outros por não ter sentido sintomas”, alertou Conti.