Contraponto
[caption id="attachment_18358" align="alignright" width="300"] Luiza Erundina: expulsa do PT, a deputada prefere apoiar Dilma Rousseff do que Aécio Neves[/caption]
Duas defecções, apenas, têm importância no apoio do PSB a Aécio Neves: Roberto Amaral e Luiza Erundina.
Sente-se na atitude do primeiro, mais que uma posição ideológica, a reação à perda de poder. Conseguisse Amaral manter-se à frente do partido, possivelmente não dissidiria, e apoiaria o mineiro. Como fracassou sua tentativa de uma reeleição extemporânea, e ficou claro que teria que apear da presidência do PSB, Amaral resolveu sair do partido e o fez atirando. Não tem seguidores para causar muitos estragos, pois jamais disputou um pleito, mas numa eleição majoritária, tudo conta.
Mais previsível, e um pouco mais expressiva, é a saída de Erundina da campanha de Aécio, onde, aliás, nunca esteve. Erundina pertence à ala mais radical do PT, de onde jamais saiu de verdade, embora expulsa em 1992, readmitida em 1993 e filiada ao PSB desde 1998. Sua história é de radicalismo esquerdista. Elegeu-se prefeita de São Paulo com apenas um terço dos votos dos paulistanos, em 1989 (não havia segundo turno). Com a incompetência administrativa das esquerdas, terminou mal o mandato, concorrendo para a derrota de seu candidato a prefeito, Eduardo Suplicy, que perdeu para Paulo Maluf, em 1992.
Com a queda de Collor, Erundina aceitou o convite de Itamar Franco, num governo de coalizão (de reconstrução nacional, e não de corrupção), para ser ministra da Secretaria de Administração Federal. Foi expulsa do PT, que pretendia dinamitar também o probo e bem intencionado mineiro presidente, e não permitia que ela assumisse o ministério.
Incompetente à frente da pasta, Erundina chocava-se com o chefe da Casa Civil, Fernando Hargreaves. Deixou abruptamente o governo, sem dar satisfações ao presidente, em 1993. Pior: saiu falando mal dele: “Nunca vi ninguém tão burro”, dizia. Ao que Itamar, com fair-play, retrucava: “Tenho que concordar. Sou mesmo burro. Prova é que a nomeei ministra”.
Voltando ao PT, e dele saindo em 1998, para o PSB, Erundina colecionou um colar de derrotas. Sonhava ser senadora ou voltar à prefeitura paulistana. Perdeu as eleições de 1994, para o Senado, e as de 1996, 2000 e 2004 para a Prefeitura de São Paulo. Só então acordou para a realidade de que só poderia se eleger para cargos proporcionais. Foi eleita cinco vezes deputada federal, em 1998, 2002, 2006, 2010 e 2014. Por que digo que Erundina nunca saiu, em espírito do PT, ou ao menos de sua ala mais radical? Derrotada Marina Silva no primeiro turno das presentes eleições presidenciais, a opção de Erundina, que a assessorava, sem titubear, foi pelo PT de Dilma Roussef, apesar da enorme indigência administrativa da candidata e da gigantesca corrupção do seu partido.
Aécio Neves não é nenhum radical conservador e não tem passado deavanço nos dinheiros públicos. Como explicar a opção da velha deputada senão como um fortíssimo apelo do ranço ideológico, que vê em cada “companheiro” ladrão um guerreiro inocente, a praticar meios que mesmo abjetos, sempre são justificados pela nobreza dos fins?
Esquerdismo petista contamina as Forças Armadas
Algo que parecia impossível vem acontecendo no Exército Brasileiro. Aliás é algo paradoxal para qualquer exército: colaborar com o inimigo e atacar os aliados. O desarmamento, tal como adotado no Brasil, visando apenas as armas legais e poupando (pode-se dizer beneficiando) os larápios e traficantes, foi repelido pela população e concorreu para a alta criminalidade que enfrentamos. Só se explica pela vontade ideológica de fazer uma sociedade totalmente dominada pela “vanguarda revolucionária”. Quer-se não um povo, mas um rebanho de obedientes cordeiros, incapazes de qualquer reação. Não satisfeitos em desarmar o cidadão comum, investem agora os “esquerdistas revolucionários” ou qualquer nome que se lhes dê, contra os atletas do tiro, esporte olímpico praticado em todo o mundo, contra os caçadores (ainda se caçam no Brasil os javalis predadores que invadem o sul, vindos da Argentina) e contra os colecionadores de armas. E o fazem usando o Exército, que controla essas atividades. Em suma, o Exército, que sempre teve como aliados, e até como colaboradores e força de reserva (como fazem as nações mais avançadas) atiradores, caçadores e experts em armamento, agora os vê, de uma hora para outra, como inimigos. Dificulta-lhes a vida. Trata-os como marginais. Cria para eles os mais estultos embaraços burocráticos. Por outro lado, vê como aliados aqueles que detestam as Forças Armadas, delas escarnecem, e as culpam de todos os males que podem ser atribuídos a uma instituição. O Exército colabora, endossando essas absurdas restrições, com os que fizeram uma Comissão da Verdade para imputar às Forças Armadas os piores crimes de guerra, enquanto enaltecem os terroristas que as chamaram para o combate armado. Ao aceitar a ingerência indevida do Ministério da Justiça em seu meio, com a subserviência não da disciplina, mas do engano ou da covardia, muitos chefes militares mostram que o esquerdismo, viajando no petismo, vem contaminando nossas Forças Armadas, levando-as para o campo ideológico, e o da pior ideologia — aquela que quer nossas Forças Armadas aniquiladas, ou quando nada desmoralizadas.Imprensa brasileira ignora aqueles que fogem da ditadura cubana
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[caption id="attachment_17807" align="alignright" width="620"] Mário Palmério, escritor mineiro, cansado de explicar o significado da palavra saudade
para estrangeiros, decidiu compor uma canção para torná-la patrimônio da humanidade[/caption]
Saudade: é sabido que não há em outra língua, que não a portuguesa, vocábulo que traduza esse substantivo abstrato. Para vertê-lo para outro idioma, só através de uma locução. Mas — pergunta-se — de onde veio essa jabuticaba sentimental, quais as suas raízes, e que etimologia a explica?
Um livro de crônicas de Julio Dantas — “Abelhas Doiradas” —, publicado em 1925, nos dá uma lição sobre o surgimento dessa palavra tão cara aos enamorados e aos poetas. Uma das melhores crônicas do livro chama-se precisamente: “A Saudade”.
Vejamos o que diz a respeito o ilustre escritor, historiador e dramaturgo português: saudade (palavra que parece que canta, que palpita, que estremece e que chora, diz Dantas) aparece pela primeira vez no “Cancioneiro da Vaticana”, que, para quem não sabe, é uma coleção que reúne mais de mil canções dos trovadores galego-portugueses, que nos séculos XIII e XIV faziam suas apresentações para os reis, para os nobres ou para o simples populacho. Essa coletânea, recopiada no século XV, encontra-se hoje na biblioteca do Vaticano — daí seu nome. Ali aparece pela primeira vez nossa palavra, sob as formas arcaicas de “soydade” e “suydade”, mas já com seu sentido atual — e permanente — de sentimento de si (certa pessoa), ou melhor, sentimento de sua ausência (da ausência daquela pessoa).
Mais precisamente, quem pela primeira vez a deixa registrada, é um trovador da corte de D. Afonso III (quinto rei de Portugal, cujo reinado durou de 1248 a 1279), chamado Fernão Fernandes Cogominho, que se dirige a uma dama, cuja ausência lhe oprime o peito: “Non queredes viver migo, e moiro de soydade”.
Também de saudade padece o rei poeta e trovador português D. Dinis, (sexto rei de Portugal, de 1279 a 1325), que chora a ausência da rainha: “Que soydade de minha senhora ey”.
E no reinado seguinte, de Afonso IV (que durou de 1325 a 1357), quando embarcados os soldados portugueses para a Batalha do Salado, contra os mouros, choram na voz do poeta da corte João Zorro, as mulheres que ficam, angustiadas, à espera dos maridos: “Mete El-rei barcas no rio forte; Quem amigo há, que Deus lho amostre; A La vai madre; Oj’ey suydade”.
Vê-se que nossa palavra convive com os pobres e com a realeza, pois a ela e seus efeitos nem reis estão imunes. Tanto que outro rei — D. Duarte, que também foi escritor — irmão do mais importante dos portugueses, o Infante D. Henrique, comenta: “Suydade he sentida mais com prazer do que com tristeza”. Este rei filósofo é o primeiro a notar que não existe palavra equivalente fora da língua de Portugal. É seu o comentário: “Parece-me este nome de suydade tam próprio que o latym, nem outra linguagem que eu saiba, nom he para tal sentido semelhante”.
D. Duarte, que deixou escritos, separa os sentimentos da dor, da tristeza, do aborrecimento e da saudade, e define este último: “suydade propriamente eh sentido que o coraçom filha por se achar partydo da presença d’alguma pessoa que muito por afeiçom ama, ou o espera cedo de seer; e isso medes dos tempos e lugares em que por deleytaçom muito folgou; digo afeiçom e deleytaçom porque sem sentimentos que ao coraçom pertencem, donde verdadeiramente nace a suydade”.
É D. Francisco Manoel de Melo (1608-1666), o turbulento mas talentoso fidalgo, escritor, dramaturgo, militar e namorador português que define a saudade como “essa paixão que só nós sabemos o nome, chamando-lhe saudade, filha do amor e da ausência”. E que arremata: “He a saudade huma mimosa paixão d’alma, e por isso tão subtil, que equivocamente se experimenta, deixando-nos indistinta a dor, da satisfação. He um mal de que se gosta e um bem que se padece...”.
É natural que quem não tenha o português como língua materna se intrigue com o vocábulo. No final dos anos 1960, trabalhei por uma temporada no Paraguai. Muitas vezes perguntaram-me por Mário Palmério. É que o escritor mineiro havia sido nosso embaixador em Assunção, em 1961, quando Jânio Quadros, em sua breve passagem pela Presidência da República, resolveu nomear intelectuais como chefes de representações diplomáticas brasileiras mundo afora.
Mário Palmério, que eu conhecia, fora para o Paraguai nessa leva. Mário era extremamente social e um boêmio refinado, pois ligava a boemia à cultura. Fizera inúmeras amizades no Paraguai, e eram esses seus amigos que pediam notícias. Sentimental, poeta, permanente enamorado, o embaixador suspirava de saudades do Brasil, e não escondia o fato. Cansado de explicar o que era saudade para os paraguaios, acabou compondo em letra e música uma bela guarânia, que gravou primeiramente em espanhol, para esclarecer seus amigos em Assunção. Depois a traduziu, e foi muito gravada e tocada no Brasil. É uma terna canção, que faz sucesso até hoje. O leitor por certo a conhece, mas vale lembrar a bela letra:
“Se queres compreender o que é saudade
Terás que antes de tudo conhecer
Sentir o que é querer, o que é ternura
E ter por bem um grande amor, viver
Então compreenderás o que é saudade
Depois de ter vivido um grande amor
Saudade é solidão, melancolia
É nostalgia, é recordar, viver”
A bola fora da OAB de Brasília
O obscuro presidente da OAB-Brasília, Ibaneis Rocha, talvez nem sequer saiba quem foi Andy Warhol, mas já conquistou seus 15 minutos de fama, de que falava o pop artista americano. Só que não foi de boa fama. Ele impugnou o registro do ex-ministro e ex-presidente do STF Joaquim Barbosa, na OAB, sob a alegação de falta moral no tratar com a classe. Deve estar se referindo à retirada do advogado de José Genoino, à força, do plenário do STJ, quando desrespeitava a autoridade do presidente. A mesquinharia só pode ser entendida como retaliação política. Ibaneis ou será petista ou deseja agradar os petistas no poder. O ex-ministro, sabemos, não prima pela delicadeza ou comedimento no trato. Mas é um dos homens mais corretos e valorosos da República. Dizer que desrespeitou advogados, por ter sido duro com eles no exercício de sua função, não justifica a cassação de seu direito de exercer a advocacia, para a qual se qualificou infinitamente mais que o inexpressivo presidente da OAB. O fato é inusitado. Marcio Thomaz Bastos, quando ministro da Justiça, mandou invadir escritórios de advogados em São Paulo, em ações até discutíveis do ponto de vista legal. Bastos não detém a mesma alvura moral que detém Joaquim Barbosa. No exercício da profissão, sempre primou por não ser seletivo quanto às qualidades de quem defende ou como recebe seus honorários. Como ministro, chegou a usar a Polícia Federal para assuntos particulares e caseiros. Pior que isso, teria sido instrumento na tentativa de fazê-la uma polícia política. A despeito de tudo, ninguém, muito menos o sr. Ibaneis, jamais questionou a prerrogativa profissional de Marcio Thomaz Bastos.Patrulheiros falham e políticos conservadores são os mais votados
A imprensa “politicamente correta” deveria atentar para os deputados federais mais votados: proporcionalmente, o mais bem votado no país foi o amazonense Arthur Bisneto, filho do prefeito de Manaus, o que sem dúvida lhe foi de muita valia, mas que é um político muito voltado para as questões ambientais e de desenvolvimento. Teve 14% dos votos do eleitorado amazonense. Alberto Fraga, mais votado no Distrito Federal, teve 9,4% dos votos brasilienses. Sério, conservador, jamais escondeu suas posições, mas talvez por isso mesmo nunca tivesse o beneplácito da imprensa de Brasília. Waldir Soares, o delegado Waldir, mais votado em Goiás, teve 7,4% dos votos goianos. Mostrou durante sua campanha ser um confrontante das políticas equivocadas de direitos humanos, que valorizam bandidos. Mais votado no Pará, Eder Mauro, com 5,7% dos votos, também delegado, está na mesma linha do nosso Waldir. Celso Russomanno foi o campeão em SP. É um apresentador, o que lhe facilitou amealhar votos. Centrista, defensor do consumidor, teve 5,5% dos votos paulistas. Jair Bolsonaro, o combativo-conservador, terror das esquerdas e das minorias ditatoriais, teve 4,2% dos votos cariocas. Foi o mais votado. O pastor Marcos Feliciano, a quem a imprensa de esquerda sempre negou até a voz, como se não fosse um deputado honesto e como se não pudesse ter suas opiniões, teve 1,4% dos votos paulistas. Foi o terceiro, depois de Russomanno e Tiririca. O gaúcho mais votado foi Luiz Carlos Heinze, com 2% dos votos do RGS. É conhecido por suas firmes posições conservadoras. Como se vê, a patrulha da imprensa esquerdista está na contramão do eleitorado.
As sociedades evoluem de maneira continua. As descontinuidades sociais, as inflexões políticas bruscas, as revoluções radicais, nunca foram de molde a produzir a grandes e permanentes progressos em qualquer corpo social. Ao contrário, no mais das vezes serviram como fator de atraso para esses progressos. A Revolução Francesa, a Revolução Soviética, o nazismo, o fascismo e a Revolução Cubana serviram apenas para trazer sofrimento ao povo que teoricamente pretendiam fazer progredir, ou para frear um desenvolvimento lento mas seguro que num tempo mais longo, organicamente, tenderia a corrigir injustiças ou desigualdades.
Os países escandinavos (Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega e Suécia) nunca sofreram, ao longo de sua história recente, esses abalos revolucionários, embora tivessem experimentado as agruras das guerras europeias. Estão os cinco, hoje, entre os 25 Estados de maior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano).
Observe o leitor que quando falo de revolução radical, não me refiro à guerra movida por outro Estado, que em geral é de curta duração e não dirigida à alteração do tecido social. Falo dos movimentos, em geral internos, que se propõem a criar um “homem novo”. Esses movimentos sociais, em geral deflagrados com o pretexto de destruir uma quase sempre falsa “elite opressora” e “libertar o povo”, acabam gerando uma verdadeira elite que passa, ela sim, a exercer por muito tempo a mais cruel das opressões, criando no povo de que se diz “a vanguarda” milhões de vítimas inocentes, aqueles que não querem ou não sabem como se tornar o “novo homem”.
A elite pode ser a nobreza, como na Revolução Francesa, ou um segmento racial, como os judeus no nazismo. Em geral, qualquer subconjunto social que detenha parcela de poder ou riqueza pode ser tachado de “elite” e ser demonizado sob acusação de “opressão”: banqueiros, proprietários de terras, industriais, religiosos, donos de meios de comunicação. Eles costumam pagar caro por terem construído com seu trabalho algo maior e mais duradouro. Pode ser considerado “elite” até algo difuso, ou quase inexistente, como no Peronismo: “Tudo que não seja o trabalhador”.
Os EUA cresceram, e chegaram à posição de maior economia do planeta por um processo contínuo de exercício democrático, acumulando conquistas sociais, corrigindo desvios (como o racismo), com tolerância e contida presença do Estado na vida dos indivíduos e das famílias. E com muito trabalho e muita dedicação. Sem revoluções.
Se um operário alemão hoje desfruta de mais conforto e lazer de melhor qualidade do que desfrutava, 140 anos atrás, o rei Ludwig II da Baviera, um dos soberanos mais ricos de que se tem notícia, não o deve ao nazismo, pois sua elevação econômica, tecnológica e social foi uma conquista dentro da democracia, e obtida apesar dele, nazismo, e do comunismo, responsáveis um pela guerra e outro pela ocupação.
Felizmente, por um processo natural de fadiga humana, esses processos radicais chegam a um ponto de exaustão. Implodem, amontoando internamente os escombros de sua experiência social, como na Revolução Francesa, são esmagados, como no nazismo, ou explodem em vários pedaços como na União Soviética.
O fundamentalismo islâmico parece ser um desses movimentos dispostos a modificar a sociedade. Só que o “novo homem” que pretende criar obedece a um figurino antigo, próximo àquele da Idade Média. Terá que ser culturalmente atrasado, obediente até a morte, humilde ao extremo, temeroso de um Deus implacável e de uma elite religiosa que aplica sem piedade a lei mais dura desse Deus que tudo dirige e tudo vê. Felizmente, essa pretensa experiência terá lugar, se é que o terá, a dezenas de milhares de quilômetros daqui.
O mesmo não podemos dizer do bolivarianismo, aqui vizinho, que já está nos contaminando, suprema ignorância que também quer ver surgir na América Latina um “homem novo”, só que sob a efígie de uma caricatura como Hugo Chávez. E o “homem novo” bolivariano é também um homem velho, aquele que sofreu sob Stálin ou sob Mao-Tsé-tung toda a sorte de indignidades que pode uma criatura humana experimentar.
Uma revolução radical pode fazer mal a muitos povos (o nazismo fez mal ao mundo quase todo. O comunismo fez e faz), mas faz mais mal a seu próprio povo. Traz dentro de si a própria destruição. A Alemanha tinha a tecnologia mais avançada do mundo no século 20, até que o nazismo fosse implantado em 1933. Os cérebros dele fugidos para os EUA permitiram que fosse construída ali a bomba atômica com que Hitler poderia ter vencido a guerra.
Lavoisier (1743-1794) — o pai da Química — foi um dos maiores cientistas da humanidade. Introduziu a balança como instrumento básico dos laboratórios, descobriu a composição da água, formulou a teoria exata da combustão. Emitiu o conceito químico, hoje erroneamente generalizado, de que “na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”. Tinha estudos avançados, que não chegou a publicar. No período do Terror (1792-1794), na Revolução Francesa, Lavoisier foi preso. Como vinha de família rica, só podia ser parte da “elite”.
Levado ao tribunal revolucionário, uma farsa, pois já se sabia condenado, Lavoisier ouviu do presidente Coffinhall: “A Revolução não precisa de sábios!”. Foi guilhotinado no dia seguinte, 8 de março de 1974. Houve uma comoção geral em todos os círculos científicos europeus. O grande matemático italiano Lagrange, contemporâneo de Lavoisier, comentou que mais de um século seria preciso para que surgisse uma cabeça como a que o Terror havia feito rolar em um segundo. Assim são as revoluções.
Cardozo merece ir para o Supremo?
O notório Paulo Abrão aprontou mais uma. Como se sabe, o secretário nacional de Justiça é distribuidor e defensor da “bolsa ditadura”, mecanismo criado para distribuir generosas quantias de dinheiro público a torto e a direito (menos para vítimas de terroristas de esquerda), sob o pretexto de indenizar quem se diz perseguido pelo regime militar. Regime que ele chama de “ditadura”, como se fosse comparável a uma verdadeira ditadura, como a cubana. Como denunciou a revista VEJA, esse cidadão esteve na Polícia Federal, em horário extra expediente, na tentativa de obter dados sobre um processo em segredo de justiça, envolvendo a candidata Marina Silva. Ao que consta, não teve êxito. Teria feito isso de moto próprio ou a mando do chefe, o ministro José Eduardo Cardozo? Vale dizer: a malandragem ilegal foi simples ou dupla? E José Eduardo Cardozo ambiciona a cadeira no Supremo que foi de Joaquim Barboza. No critério petista, tem qualidades para a pretensão.Exportador brasileiro não recebe da Argentina
Os exportadores brasileiros para a Argentina não estão recebendo por suas mercadorias. Fala-se em mais de 4 bilhões de dólares em atraso. A loja de dona Kirchner está quebrada e não paga seus fornecedores. E ficamos presos ao Mercosul enquanto o Chile, por exemplo, que não se amarrou nesse complicado mercado, faz seus acordos bilaterais de comércio.Liberação do porte de armas
Notícia dos EUA: o Estado de Illinois liberou, em julho deste ano, o porte de armas para seus cidadãos. Na maior cidade do Estado, Chicago, a criminalidade caiu em mais de 20% e o número de assassinatos em mais de 50%, desde então. Uma notícia de entristecer qualquer desarmamentista.Mais uma inversão de valores
Em Cascavel, no Paraná, um homem de 76 anos, José Peixoto, e seu filho reagiram a um assalto. Conseguiram desarmar um dos bandidos (era um casal) e baleá-los. Os meliantes morreram e o filho de Peixoto, também baleado, está hospitalizado. A delegada Mariana Vieira efetuou a prisão de Peixoto, que foi algemado para o cárcere. Aguarda a alta do filho para prendê-lo também. É a inversão total e completa de valores. As esquerdas estão exultantes.
[caption id="attachment_16358" align="alignleft" width="300"] Dilma Rousseff: o tinhoso parece rondar as mais altas esferas do governo da presidente petista / Foto: Ichiro Guerra/ Dilma 13[/caption]
A semana que passou deixou algumas recordações.
1 – Não se pode dizer que Dilma Rousseff não seja mulher de palavra. A presidente vem cumprindo com afinco a promessa feita em março do ano passado de “fazer o diabo” nas eleições. Não sabemos o que vem urdindo o tinhoso às escondidas, mas o que aparece na campanha de Dilma à reeleição já é bem obra em parceria com ele.
Os Correios distribuíram milhões de impressos da campanha da presidente à reeleição sem a devida chancela, descobriu-se. E receberam uma remuneração por isso? Não se sabe. Algo deveras endiabrado. Ataques rasteiros e forjados à candidata Marina Silva não faltam. Nessas horas o capeta parece estar trabalhando lado a lado com o marqueteiro oficial, João Santana.
Outras vezes o pé-de-bode exagera, como quando, publicada mais uma corrupção, sopra no ouvido esquerdo de Dilma, e ela dá declarações contra a imprensa, como aquela (que tentou consertar depois): “Não cabe à imprensa o papel de investigar!”. Cabe sim, presidente Dilma. A sra. está confundindo Brasil com Cuba, como já fez outras vezes em que ouviu o capiroto, como quando levou para lá nosso dinheiro, em vez de tomar bem conta dele e o aplicar por aqui, onde há tanto por fazer.
Aliás, uma das melhores coisas que a imprensa faz é justamente isso: investigar. E o IBGE, hein? Errou mesmo na questão da distribuição de renda, ou está “aparelhado”, com a ajuda do bode-preto, como quase tudo no governo? Qualquer das duas opções é horrível. E a ordem do coisa-ruim é minimizar, esconder, ignorar a questão Petrobrás até passarem as eleições.
“Diga que não sabe de nada”, sopra o cão no ouvido (sempre o esquerdo) de Dilma, quando Graça Foster transfere seus bens para escapar de uma indisponibilidade ou quando se descobre que o inacreditável Cerveró mora num milionário apartamento cujo dono é um fantasma, pois foi comprado por uma empresa uruguaia que não se sabe de quem é, e que representa algum brasileiro também incerto e não sabido, tanto quanto o é ainda quem recebe os aluguéis.
“Diga que ignora”, sopra o canhoto quando escapa mais um detalhe horroroso da delação premiada de Paulo Roberto da Costa sobre a roubalheira petista em nossa petroleira. Com o demo aprontando tantas, precisamos urgentemente de um padre exorcista, mas que não seja da Teologia da Libertação.
2 – O bem informado blog brasiliense de Cláudio Humberto, “Diário do Poder”, publicou o espanto: há uma longa fila de embaixadores estrangeiros aguardando que a presidente os receba para entrega de credenciais. Seriam vinte e dois. Displicência, descaso, ignorância? Instruções do tosco assessor Marco Aurélio Garcia? Vontade de se dar uma importância internacional que não se tem? Qualquer que seja o motivo da demora em agendar esses encontros, a imagem do Brasil sofre danos. Não creio que haja comportamento parecido em lugar nenhum do mundo.
3 – Carlos Lacerda, que não suportava Juscelino Kubitschek, dizia, antes das eleições de 1955, que fizeram o ilustre mineiro presidente: “Juscelino não pode ser eleito. Se for eleito, não pode tomar posse. Se tomar posse, deve ser deposto”. Declaração muito pouco democrática, e imerecida. Em nosso caso atual, pode-se dizer, merecida e democraticamente: Dilma não pode ser eleita (para o bem do Brasil), mas, se o for, deve tomar posse (democraticamente), embora seja certo que dificilmente terminará bem o governo (ou o não terminará).
4 – Dilma não sabe, mas pensa que sabe (tudo). Daí a corrupção e os desastres na energia, na economia. Eleita, será uma repetição. Já mostrou não aprender nada de bom e não esquecer nada de ruim.
Já Aécio, acha que ser neto de Tancredo Neves é o suficiente para governar um país. Não é, e um país não se governa em cima do muro. A esperança é de que Marina Silva saiba que não sabe (muita coisa) e se assessore bem, se eleita. Ou estaremos perdidos por mais quatro anos (no mínimo). Olhemos a Argentina.
5 – A Escócia optou, no plebiscito do último dia 19, por permanecer integrando o Reino Unido. Uma separação seria uma incógnita para os escoceses, mas sem dúvida um dano ainda difícil de dimensionar para a Comunidade Britânica. Prevaleceu o bom senso.
6 – Só posso considerar fraude uma comissão criada para emitir relatório histórico sobre uma situação de combate entre dois lados, mas que tem todos os membros de um lado só. Quer se intitular Comissão da Verdade, mas quando muito será Comissão da Meia Verdade. Nessa semana correm em socorro da Comissão, no atacar as Forças Armadas, um neoradical, Paulo Abrão, o das indenizações fartas, que compram a honra com dinheiro público. E José Gregori, o ex-ministro da Justiça de Fernando Henrique, já um tanto mumificado, mas sempre incompetente.
7 – E o governo, mais uma vez está fechando no martelo suas contas. A credibilidade do país está correndo pelo ralo.
Operação Peter Pan: o êxodo de crianças cubanas para os EUA
Estou certo que pouquíssimos, entre os leitores, terão ouvido menção à Operação Peter Pan. Contudo, esse é o nome de batismo de um dos fatos mais dramáticos e sofridos de toda a Guerra Fria. Vamos resumi-lo (resumamo-lo, diria Euclides da Cunha, e mais tarde Jânio Quadros): quando Fidel Castro assumiu o poder em Cuba, em 1959, com apoio popular generalizado, dizia-se não comunista. Quem tinha melhor percepção, logo viu que não era verdade. Medidas socializantes e antirreligiosas surgiram sem demora, e o estado policial instalou-se com todo o rigor totalitário. O fechamento das escolas particulares, a pregação marxista para os jovens e o envio de contingentes de alunos para visitas doutrinárias na União Soviética (o próprio filho de Fidel Castro foi um dos primeiros a seguir esse roteiro) deixaram os pais conservadores em polvorosa. Insinuações do governo cubano de que o pátrio poder era uma criação burguesa e de que cabia não à família, mas ao Estado a educação e a orientação da juventude, vieram completar o receio e instalar o pânico. Um movimento subterrâneo para livrar os jovens do caminho ateu e comunista, enviando-os para os EUA, teve franco apoio da Igreja, principalmente do prelado de Miami, monsenhor Bryan O. Walsh (1930-2001), então um jovem padre irlandês de 30 anos. O governo americano também colaborou na empreitada. O plano era enviar esses jovens para lares cubanos nos EUA, ou para lares americanos que se dispusessem a recebê-los, até que Fidel caísse (o que – quanto engano – pensava-se, ocorreria em um ou dois anos), e eles pudessem ser repatriados. Não se esperava a adesão no nível em que ocorreu: mais de 14 mil crianças e adolescentes, de até 16 anos, entre dezembro de 1960 e outubro de 1962, separaram-se de seus pais, desenraizaram-se de sua terra e se trasladaram para uma terra estranha, onde tiveram que aprender outra língua, viver em lares que não eram seus, mas moradas de favor, às vezes simples abrigos ou creches, espalhados por 36 Estados americanos. Duro e doloroso câmbio, regado com muitas lágrimas de lado a lado: trocava-se o carinho sem liberdade em Cuba pela liberdade sem promessas de carinho nos EUA. Dezenas de milhares de pais e mães tiveram que fazer sua escolha de Sofia. E, como tudo que é ruim ainda pode piorar, agravou-se o desastre: Fidel aferrou-se ao poder e as crianças e jovens cresceram e se tornaram adultos longe dos pais, em terra estranha. Fechadas as fronteiras cubanas aos seus cidadãos, os pais sequer podiam visitar os filhos nos EUA. Dorido êxodo, sem precedentes no Ocidente, que só recentemente pôde ser avaliado, graças a alguns pesquisadores, eles próprios “Peters Pans”, que conseguiram localizar parte desses colegas, agora adultos (cerca de 2 mil foram encontrados) e promover encontros com parentes ainda vivos em Cuba. Essa gigantesca operação é quase desconhecida, pois a ninguém interessava divulgá-la: nem aos pais, nem aos governos cubano e americano.[caption id="attachment_15732" align="alignleft" width="561" class=" "] Lino Hernández Trigueros: o advogado protegeu a esquerda, mas, quando esta chegou ao poder, começou a persegui-lo, chegando a prendê-lo[/caption]
Uma das personalidades mais marcantes que encontrei em minhas andanças quando parlamentar chamava-se (ou chama-se, pois creio que ainda vive) Lino Hernández Trigueros, da Nicarágua. Antes de apresentá-lo, conto em que circunstâncias o conheci. O ditador nicaraguense Anastasio Somoza havia sido derrubado em 1979 por uma vasta frente de partidos, organizações e guerrilhas, onde estavam representados de todos os credos políticos do país. Não tardou, porém, que uma dessas organizações, a Frente Sandinista, assumisse o governo e afastasse as demais.
Os sandinistas eram radicais de esquerda, sustentados por Cuba, marxistas convictos que nutriam verdadeiro ódio pelos Estados Unidos. Uma de suas primeiras ações foi mandar executar Somoza, que havia se homiziado no Paraguai. Para tanto contrataram um grupo guerrilheiro, chefiado por Gorriarán Merlo, conhecido terrorista argentino que operava na América Latina. A operação, muito bem planejada com auxílio da KGB soviética, foi (do ponto de vista dos terroristas) um sucesso, e o ex-ditador foi abatido a tiros de fuzil e disparos de bazuca numa pacata rua de Assunção, em 1980.
Os sandinistas, apossando-se do poder, e “nomeando” um dos seus como presidente (o mais tarde tristemente famoso Daniel Ortega), seguiram de imediato a velha cartilha marxista: estatizaram bancos e indústrias, promoveram uma reforma agrária radical, censuraram a imprensa, encarceraram sem processo os discordantes.
A reação logo surgiu, com o apoio dos conservadores nicaraguenses, de uma tribo indígena (os altivos Misquitos que não aceitavam ver suas terras confiscadas) e dos EUA. E surgiu sob a forma de um grupo guerrilheiro que ficou conhecido como “Os Contras”. O agravamento do conflito armado e a piora da situação econômica foram levando os sandinistas a um beco sem saída.
O desabastecimento era a face mais visível da crise, que o governo tentou controlar pela força, seguindo os conselhos de Fidel Castro. O exército chegou a ter 120 mil homens, quase o tamanho do Exército brasileiro, embora a população fosse apenas de 3 milhões. Os prisioneiros políticos passavam de 4 mil, um enorme exagero.
A pressão externa e interna fez com que Tomás Borge, o radical e prepotente ministro do Interior, tivesse uma ideia que julgou brilhante: os sandinistas convocariam eleições, que, com a força do governo, venceriam facilmente, “reelegendo” Daniel Ortega. Assim legitimados, conseguiriam ajuda externa, liquidariam os “Contra” e seguiriam a vida, aboletados no poder.
Foi quando, designado pelo Senado como observador daquelas eleições, fui, por duas vezes, ao país. Os observadores internacionais haviam sido convidados pelos sandinistas, certíssimos de que venceriam as eleições. Na minha primeira viagem à Nicarágua, três meses antes das eleições, em 1989, entrevistei 24 autoridades, entre as principais do país, incluindo a candidata de oposição, Violeta Chamorro, o presidente da Suprema Corte Eleitoral, Mariano Fiallos Oyangurén, o ministro do Interior, Tomás Borge, o arcebispo de Manágua, Miguel Obando y Bravo, e Lino Hernández, que agora posso apresentar ao leitor.
Lino Hernández era advogado e presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos da Nicarágua desde meados dos anos 1970. Tive longa conversa com ele, em seu acanhado escritório no centro de Manágua.
De saída, Lino transmitia uma impressão de humildade, ressaltada por suas roupas modestas e pelo local de trabalho. Mas impressionava pela maneira sóbria e segura com que falava, pelo encarar sem pestanejar o interlocutor, por narrar sem exageros os fatos presenciados ou vividos. Transmitia, sem preocupar em fazê-lo, uma sensação de altivez e confiança que se mostra presente nas figuras sem dissimulação, que falam sem pretensão de agradar ou desagradar o interlocutor, e apenas transmitem, fiel e seriamente, suas impressões ou testemunhos. Seu espanhol perfeito, sem erros de sintaxe, ajudava na boa impressão, que sua história de lutas ia consolidando ao longo de sua fala. Dedicara-se aos Direitos Humanos desde sua formatura em Direito, o que transformara sua profissão, de saída, em sacerdócio. Noventa por cento de seus clientes não tinham como pagá-lo, e ele não tinha como cobrar.
Em pouco tempo, Lino fundou a Comissão de Direitos Humanos, a que passou a se dedicar em tempo integral. Ela sobrevivia de doações oriundas de uns poucos nicaraguenses prósperos ou de entidades internacionais. Ainda vivia a Nicarágua sob a ditadura de Somoza, o que significava violações, prisões sem o devido processo legal, espancamentos e mesmo mortes. Por outro lado, significava dificuldade na obtenção de recursos para a Comissão, e liberdade de seu trabalho.
Mais de uma vez, Lino Hernández, acusado de comunismo, foi preso pela polícia de Somoza e fez companhia nas prisões aos que defendia. Algumas vezes mesmo — relatou com evidente desconforto — essas prisões eram acompanhadas de castigos físicos. Foi quando passou a ser conhecido no exterior, o que lhe valeu certa proteção, embora ela nem sempre fosse respeitada pelos esbirros de Somoza. Foi quando, também, conheceu e prestou assistência àqueles que viriam a serem os chefes do futuro governo sandinista. Assistiu, escondeu e ajudou a saírem do país muitos jovens que seriam no futuro altas autoridades e até ministros do governo. Salvou-lhes a vida, em resumo.
Foi então que caiu Somoza e Lino respirou aliviado. Poderia agora exercer sua profissão de advogado. O alívio durou pouco. Durou até os sandinistas se apossarem do poder. Logo começaram as prisões dos integrantes do governo Somoza, principalmente dos amigos do ditador e de elementos de sua antiga polícia, sem o devido processo, o que ocasionava muitas injustiças. Recomeçaram também os maus tratos e espancamentos de presos, e com o surgimento dos “Contras” a prisão de camponeses e pequenos sitiantes acusados sem provas de apoiá-los. Não raro, os presos eram mulheres, que sofriam violações dos carcereiros.
Recomeçaram também os assassinatos políticos. Lino retomou, agora redobrados, seus trabalhos de Direitos Humanos. Protegeu muitos policiais que havia conhecido e por cujas mãos havia passado quando preso e agredido na ditadura Somoza. Insistiu, junto aos sandinistas, para que agissem dentro da lei, formando processos, evitando violações, propiciando julgamentos justos, em vez de longas prisões, às vezes por anos, sem sequer uma denúncia escrita. Não lograva êxito, e com o avanço dos “Contras”, as prisões aumentavam. Eram agora três ou quatro vezes maiores que no tempo de Somoza.
As sevícias eram orientadas por experimentados e sádicos policiais cubanos, e Lino se desdobrava.
Suprema (trágica) ironia: Lino agora era tratado, pelos sandinistas que havia protegido de Somoza, alguns dos quais lhe deviam a vida, como “agente dos EUA” ou “lacaio do imperialismo”. Não tardou que voltasse a ser preso, e a sofrer os mesmos maus tratos que experimentara sob Somoza.
Quando o entrevistei em Manágua, havia deixado a prisão poucos dias antes. Fora preso quando dava assistência a manifestantes em um protesto de rua, que estavam sendo ferozmente espancados e presos pela polícia sandinista.
Contou-me que vivia um momento de grande agrura financeira, pois o governo impedia que recebesse doações externas.
Na minha volta à Nicarágua para as eleições, cuidei de levar a ele uma contribuição. Pelo menos era um alívio momentâneo. Era admirável ver como ele, altruísta, diante de tanta barbárie, injustiça e ingratidão, seguia sereno em seu verdadeiro sacerdócio e em sua inabalável fé na humanidade. Mantivemos contato durante algum tempo, via do embaixador brasileiro Sergio Queiroz Duarte, que ainda permaneceu por um período em Manágua.
Só com a vitória de Violeta Chamorro sobre Daniel Ortega (vitória essa que é assunto para outra história), encontrou a Nicarágua alguma democracia, e Lino teve alívio em sua luta pelos Direitos Humanos. Espero que hoje esteja entregue em paz à sua profissão de advogado.
Atribuir violência à desigualdade, ideologia tão cara à esquerda, não é apenas utopia, mas um equívoco
Livro de Lira Neto resgata a história do general goiano que lutou para manter o presidente Getúlio Vargas no poder. Ele é avô do secretário de Cultura do governo Marconi

Publicada em três volumes, com 1.694 páginas, a biografia conta a vida de um político e resgata parte da história do século 20 brasileiro. Uma obra de respeito
[caption id="attachment_13483" align="alignright" width="400"] Neste livro, a especialista Joyce Lee Malcolm sugere que até quem não gosta de armas se beneficia quando há muitos cidadãos armados em uma comunidade[/caption]
Uma sugestão de leitura para os desarmamentistas: o livro da americana Joyce Lee Malcolm, professora e doutora em direito do Estado da Virginia. Chama-se “Violência e Armas — A Experiência Inglesa” (Vide Editorial, 325 páginas, tradução de Flávio Quintela). Foi traduzido agora, e encontra-se impresso ou em e-book.
Joyce Malcolm faz um minucioso apanhado da violência no Reino Unido (embora faça muitas referências, no texto, aos EUA) no período que vai da Idade Média ao século 20. O foco maior do estudo está no período absolutista dos séculos 15, 16 e 17, quando as armas de fogo tornaram-se populares, pelo baixo custo, no século 19, quando entra em vigor a Lei da Licença (1870), liberando as armas para a população, e no século 20, em que essas armas, agora mais modernas, passaram por períodos de liberação e proibição (que está em vigor).
Os resultados da extensa pesquisa são os já conhecidos: não existe relação entre nível de criminalidade e número de armas em mãos corretas. Pelo contrário, até quem não gosta de armas se beneficia quando há muitos cidadãos armados em uma comunidade. Criminosos se sentem naturalmente temerosos em assaltar, por ignorarem quem estará armado. Os desarmados pegam “carona” com os armados e ficam mais protegidos.
A professora demonstra que os séculos 16 e 17, quando as armas de fogo foram introduzidas e se tornaram comuns na sociedade inglesa, foram aqueles em que os homicídios e outros crimes violentos declinaram sensivelmente. Falando do século 18, a doutora Joyce informa: “Concluindo, no tempo exato em que o direito individual de possuir armas se tornava bem estabelecido, e em que armas de fogo substituíram armas mais antigas, a taxa de homicídios continuou seu declínio acentuado”.
O capítulo sobre o século 19 termina com comentários da estudiosa como este: “O século 19 terminou com as armas de fogo plenamente disponíveis ao mesmo tempo em que as taxas de crimes armados haviam declinado e atingiam uma baixa recorde. Mesmo aqueles inclinados a exagerar sobre a criminalidade foram atingidos durante o século pelo baixo nível de violência”.
No século 20, até o final da Primeira Guerra Mundial, melhor dizendo, até 1920, prevaleceu o direito tradicional dos britânicos possuírem armas. Nesse ano, surgiu a Lei de Armas de Fogo, de iniciativa do governo, temeroso de uma rebelião. Como no Brasil, o governo exigindo docilidade dos cidadãos, e se esquecendo de que o armamento dos bandidos é também fora da lei. Foi o ponto de partida para o aumento da criminalidade. Crimes violentos, tomando como base o ano de 1905, cresceram 174% até 1938 e 386% até 1948. Entre 1900 e 1974, o crescimento foi de 1.300%, segundo estudos acadêmicos. Em 1954, o controle sobre armas curtas era grande, e começaram as restrições à posse de espingardas.
Em 1967 houve um banimento legal de praticamente todas as armas curtas. Pois bem: em 1954, em Londres, apenas foram registrados quatro roubos armados. Eles subiram para 1.400 em 1981 e 1.600 em 1991. E a criminalidade continuou crescendo, enquanto o governo britânico, via do Home Office, instruía secretamente a polícia para dificultar cada vez mais a posse de armas pelos ingleses.
Exatamente o que faz hoje o governo petista com a Polícia Federal, para dificultar, ainda que contra a lei, a compra de uma arma pelo cidadão brasileiro desprotegido. E com o Exército, que ergue obstáculos até a compra de armas de competição por atletas atiradores ou simples colecionadores. Não temos espaço para mais comentários sobre o estudo da professora Joyce Malcolm. Mas as semelhanças com o que ocorre no Brasil com uma Lei do Desarmamento claramente favorável aos bandidos e pesando sobre as cabeças dos honestos como uma espada de Dâmocles, podem ser vistas por quem vier a ler o livro.
Bolsão radical do governo Dilma Rousseff insiste em tentar desmoralizar militares
As tentativas de diminuir as Forças Armadas são uma constante nas frações mais radicais do governo. A aceitação bovina com que os chefes militares têm engolido acusações, mentiras, parcialidades, imposições desnecessárias e até humilhantes, já atingiu a fronteira estabelecida para o respeito à hierarquia e à disciplina. A criação da Comissão Nacional da Verdade foi um dos mais fortes golpes aplicados às FFAA. Visivelmente formada para reescrever a história vivida e adaptá-la à crença de uma minoria armada por ditaduras, negando fatos, só poderia cumprir sua função se falseasse a participação do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, como instituições, no Regime Militar. Essa minoria radical foi quem apontou os integrantes da dita comissão, e quem vetou a presença de militares na mesma, num gesto de cínica parcialidade. É ela quem quer, num desejo de vingança, revisar a Lei de Anistia, em benefício apenas de uma facção: a sua. Foi ela quem, por princípio, estabeleceu que a dita comissão nunca, jamais, em tempo algum poderia examinar os crimes mais covardes que a “esquerda revolucionária” cometeu quando pretendia substituir o regime militar brasileiro pela ditadura militar sino-cubana. O governo central — dificilmente seria diferente — demonstrou comungar com essas ideias revanchistas. Criou essa comissão. Nomeou como ministros da Defesa figuras até ofensivas às FFAA, pelo que representam em termos de oposição aos nossos militares, seu preparo cívico, sua dedicação e sua crença democrática. Um, figura de proa de um partido não só marxista, mas ditatorial, stalinista, atrasado. Outro, intelectualmente inexpressivo, responsável por vários desacertos em nossa diplomacia e despersonalizado a ponto de permitir interferência em sua pasta de figuras ainda mais inexpressivas do que ele. O governo distribuiu dinheiro público a terroristas conhecidos e reconhecidos. Exigiu de chefes militares participação em cerimônias desnecessariamente revanchistas, como honras militares extemporâneas à figura menor de João Goulart, um foragido do desprezo dos brasileiros que festejaram à época não sua deposição, mas sua fuga, porque fugiu, covardemente, de suas funções e de seu país. Prova de que as tentativas de diminuir as FFAA estão chegando ao limite, até para chefes escolhidos pela mansuetude e excessiva obediência á hierarquia, está na resposta dos chefes militares à Comissão Nacional da Verdade. Que fez indagação capciosa sobre tortura em instalações militares, tentando a obter afirmação desses chefes de que a cúpula militar brasileira era, sim, conivente com excessos praticados no tempo da luta armada desfechada pela esquerda. Ao se recusar a uma confissão forjada, ao não aceitar uma verdadeira farsa intelectual que lhes seria humilhantemente imposta, esses chefes ao menos demonstram que ainda podem reagir, e que já basta, pois até já aceitaram o descumprimento da lei para não desagradar os poderosos de esquerda, não cassando, por exemplo, comendas de mensaleiros condenados e presos. Essa ação governamental tão deletéria tem outra desvantagem: não é estéril. Reproduz-se em horríveis filhotes. Parte da classe política brasileira, sempre esquecida de seu desgaste, sabendo não servir de exemplo para ninguém, resolve seguir o exemplo dos atacantes de militares, prazerosamente. Como dá fama afirmar que os militares assassinaram Juscelino Kubitschek, Jango Goulart e Carlos Lacerda! Como os políticos, e os mais medíocres, adoram fazer isso. E não há indícios confiáveis sequer de que isso houvesse sido uma hipótese. Ao contrário, as provas todas desmerecem essas suposições, as investigações mais sérias as desmentem. A despeito disso, e sem um fato de peso sequer, um grupo de vereadores, autodenominado Comissão da Verdade Vladimir Herzog, da Câmara de Vereadores de São Paulo, chegou à “conclusão” de que Juscelino havia, sim, sido assassinado. Não se acredita, mas se compreende: essa pirotecnia de maus motivos dá fama a quem não a consegue por bons motivos. A deputada e ex-ministra Maria do Rosário (PT) era há pouco tempo, lembremo-nos, uma figura saltitante, buscando os holofotes, na exumação do corpo de Jango. Fato recentíssimo: o deputado gaúcho do PSB Beto Albuquerque fez um estardalhaço quando a Força Aérea Brasileira, por seus insuspeitos técnicos, respaldados por colegas estrangeiros, descobriu que havia um defeito no sistema de gravação do avião acidentado de Eduardo Campos. Segundo o deputado, a culpa seria da FAB, interessada em ocultar as causas do acidente. Ligou para o ministro da Defesa, Celso Amorim, essa figurinha carimbada do governo, que ficou de interpelar o chefe da Força, o brigadeiro Juniti Saito. Quem sabe, deputado, essa queda de avião não é coisa da Operação Condor? Ou do presidente Médici e da linha dura do Exército? Quem sabe de Costa e Silva? E esse deputado é candidato a vice-presidente pelo PSB. Essa falta de discernimento é sinal do nível de nossos políticos, e de que teremos que esperar muito pela maturidade de nossa democracia.
O autor, além de escrever prosa, poesia e teatro, era apaixonado pela literatura brasileira
[caption id="attachment_12943" align="alignleft" width="233"] Júlio Dantas, um dos maiores escritores portugueses, escreveu histórias comparáveis à melhor prosa de
Alexandre Herculano e Eça de Queiroz[/caption]
Júlio Dantas (1876-1962) foi um dos escritores portugueses de maior produção literária, embora grande parte de sua fama venha apenas de uma pequena peça teatral, traduzida para uma vintena de línguas: “A Ceia dos Cardeais” (1902).
Médico que praticava a medicina, Júlio Dantas escreveu teatro, romances, história, poesia, contos e crônicas. Traduziu Shakespeare para o português. Foi deputado e diplomata. Casou-se aos 66 anos, e viveu até os 86. Além da vasta obra que viu publicada, três livros seus são póstumos: “Revoada das Musas” (1965), “Lisboa de Nossos Avós” (1966) e “Páginas de Memórias” (1968).
Seu livro “Pátria Portuguesa” (1914) reúne um grupo de novelas históricas que vão da formação de Portugal, no século XII, até a era dos descobrimentos, contando, em linguagem entre atraente e emocionante, os principais episódios da epopeia portuguesa que elevou o pequeno país a nível de império. É uma das mais belas e importantes obras no gênero, que não fica atrás das escritas por Alexandre Herculano, Eça de Queiroz ou Henrique Lopes de Mendonça.
Júlio Dantas tinha muitos laços com o Brasil, atados pela literatura e pela diplomacia. Cultivou muitas amizades brasileiras. Viu seus livros exportados para cá ou editados aqui, onde nunca lhe faltaram leitores. Foi condecorado pelo governo brasileiro com a comenda da Ordem do Cruzeiro do Sul e era membro honorário da Academia Brasileira de Letras e da Academia de Medicina do Rio de Janeiro.
No seu livro “Eles e Elas” (1918), Júlio Dantas, mais que comenta, festeja o livro de Martins Fontes — “O Verão” —, lançado naquele ano, e dedica ao poeta brasileiro todo um capítulo. Lembra, no comentário, outros poetas patrícios: Olavo Bilac, Alberto de Oliveira, Raimundo Correa, Luiz Murat; e os prosadores Coelho Neto e Euclides da Cunha.
Em outro livro, “Mulheres” (1916), Júlio Dantas comenta o livro “Trovas Populares”, reunião folclórica feita por Afrânio Peixoto, e a poesia de Catulo da Paixão Cearense, que lhe causou enorme impressão, a ponto dele se referir a Catulo como “Vergílio caboclo”, adaptar algumas trovas para o português clássico e divulgá-las, quando a intelectualidade portuguesa nelas encontrou similitude com a obra do famoso poeta luso Antônio Correia de Oliveira (1879-1960).
Em “Páginas de Memórias”, Júlio Dantas faz muitas menções afetuosas ao Brasil, que visitou várias vezes, a primeira em 1923. Dedica um capítulo a sua atuação no diário carioca “Correio Da Manhã”, onde escrevia a convite de Edmundo Bittencourt, fundador do jornal e seu amigo. O escritor dizia que de todas as profissões que havia exercido, a mais gratificante ao espírito era a de jornalista. “Não sei de função mais nobre, nem de magistratura mais elevada do que aquela que se destina a dirigir a opinião, a esclarecer as inteligências, a elevar os corações, a estimular as energias coletivas, a acordar na alma do povo sentimentos generosos, a formar nas consciências o culto da justiça, da fraternidade, da ordem e da paz”, dizia.
(A opinião é diametralmente oposta à que têm os radicais de esquerda incrustados hoje no governo brasileiro. Não veem nobreza na atividade jornalística independente, a ponto de agredirem até jornalistas que lhes dedicam simpatia, como a colunista de economia Miriam Leitão. Para eles, simpatia é pouquíssimo. A orfandade do stalinismo só aceita a subserviência. Afinal, Stálin reunia no Kremlin a nata da literatura soviética, para dizer a ela o que escrever. E a desobediência acabava no Gulag, na Lubianka ou no paredão.)
Voltemos a Júlio Dantas. Ainda em “Páginas de Memórias”, o ilustre português conta como conheceu Olavo Bilac, de quem ele admirava já de sobra a obra poética. Foi na última viagem de Bilac à Europa (1916?), na visita que o poeta patrício fez à Academia de Ciências de Lisboa. A admiração, diga-se, era mútua. Festejaram terem se conhecido pessoalmente e o encontro redundou em amizade e correspondência. Mas Bilac morreu logo depois (em 1918), bem antes de Júlio Dantas.
No mesmo “Páginas de Memórias”, Júlio Dantas conta ainda como foi assinado o acordo Brasil-Portugal para a unidade da língua portuguesa escrita. Foi um trabalho de Fernando de Magalhães, presidente da Academia Brasileira de Letras, e do próprio Júlio Dantas, presidente da Academia de Ciências de Lisboa, que coroou o acordo, assinado em 30 de abril de 1931 pelos dois presidentes e pelos embaixadores José Bonifácio de Andrada e Silva, do Brasil em Portugal, e Duarte Leite, de Portugal no Brasil.
(Curiosidade: os presidentes das academias, por cuja força firmou-se o acordo ortográfico, não eram filólogos. Sequer eram homens formados em letras. Eram ambos médicos.)
No conjunto do trabalho de Júlio Dantas, parece ter sido a obra poética a parte menos expressiva. Talvez por isso apreciava muito a poesia, e seguia o que de bom se imprimia em Portugal e no Brasil. Comentava, como dissemos acima, em seus livros e trabalhos jornalísticos, a produção dos novos poetas que lhe parecessem promissores.
Em outro livro, “Abelhas Doiradas” (1920), dedica uma crônica ao poema “Juca Mulato”, de Menotti Del Picchia, impressionado ao ponto de vaticinar sobre o poeta: “Fixem este nome. Ou me engano, ou há de ser, amanhã, o de um dos maiores poetas brasileiros”. Não se enganava.
Falei antes na peça “A Ceia dos Cardeais”. Se o leitor nunca a viu representada, e se tiver a grata oportunidade, não a perca. Não é à toa que essa pequena peça, em um único ato, com três atores apenas, é um estrondoso sucesso — é a peça escrita em língua portuguesa mais traduzida e mais representada em todo o mundo, mesmo hoje, mais de um século depois de sua primeira apresentação.
Escrita em apenas oito dias, a pedido de um nobre português para uma noite de homenagens, junto com outras peças curtas, a um ator lisboeta famoso, ela é uma obra-prima de cenografia, monólogo e psicologia. Embora os personagens sejam três cardeais que ceiam em deslumbrante cenário interior ao Vaticano, o tema é o amor. E a visão que dele têm — ou teriam — e revelam em aprimorados monólogos, os espanhóis, encarnados no Cardeal Rufo, os franceses, no caso representados pelo Cardeal de Montmorency e os portugueses, no sentimento do camerlengo Cardeal Gonzaga e sua surpreendente visão amorosa. Júlio Dantas escreveu uma vintena de peças, e entre elas várias são apreciáveis. Mas “A Ceia dos Cardeais” é uma obra-prima, uma centelha perene de gênio. (No site do jornal, transcrevo a peça para deleite do leitor.) Publico, a seguir, dois poemas do escritor português.
Os desconhecidos Júlio Dantas (A Manuel Penteado)
Dois cadáveres — vede — aguardam o meu corte: Um homem gigantesco e uma mulher perdida. Dormem nus, sobre a pedra, unidos pela morte, E talvez, sem se ver, passaram pela vida. Ele, o morto, na seca e descarnada espalda Tem nomes de mulher e várias tatuagens; Treme de nojo o sol na sua pele jalda E abrem-lhe a boca verde uns esgares selvagens. De tórax d’esmeralda, asa tecida d’ouro, Uma nervosa mosca, em passos indolentes, Para entrar-lhe na boca aflora o buço louro E começa a descer pela escada dos dentes. Morto há dias, olhai que a rigidez se perde E que o seu corpo está gelatinoso e elástico: Suas costelas são como um teclado verde, Digno das longas mãos dum pianista fantástico! Ela morreu de parto: entre as airosas coxas Que doira como um fruto uma lanugem pouca, Um feto mostra ao sol as suas carnes roxas, Ajoelhado, a rir, sem olhos e sem boca. Tem rugas sobre o ventre, e lembra, cada ruga, As que a pedra ao cair traça nos verdes pântanos: Os seus cabelos são dum ruivo tartaruga, O seu rictus perturba e o seu olhar espanta-nos. Bate-lhe em cheio o sol, como losango d’ouro; Tem no seio listrões de sangue que secou: E pelo flanco enorme, e pelo púbis louro, Lembra os ventres brutais que Van Miéris pintou. Dir-se-ia que o morto a olha, — reparai, E lhe espreita e deseja as carnes violadas; D’aí, quem sabe lá se ele seria o pai Daquele feto roxo a rir às gargalhadas!Virgindade Júlio Dantas
Ó gótica beleza iluminada e viva! Sê esquiva para mim; quero-te sempre esquiva! No amor, a dor é tanta e a volúpia tão pouca! Foge das minhas mãos, foge da minha boca! Ser honesta é vestir uma roupa de estrelas: Há flores no teu peito; hás de ter conta nelas. Nunca me ouças de perto as ânsias e os segredos: Quebram flores de vidro os meus impuros dedos, Rasga sedas, no escuro, o meu brutal namoro… É tão fácil quebrar uma cintura d’ouro! Magoando-te a carne, em ânsias de mordê-la, Serei sempre um leproso a babar uma estrela, Um sapo que polui, arrebentando em pragas, A santa que o buscou para sarar-lhe as chagas.A Ceia dos Cardeais (Parte I )
Peça em um ato em verso, representada pela primeira vez no antigo teatro D. Amélia, em 28 de março de 1902 Júlio Dantas Uma grande sala, no Vaticano. Paredes cobertas de panos de Arras - Amplos tectos de caixão, com apainelamentos de talha doirada - Um retrato de cardeal vermelho, sobre o fogão - À D. baixa, o cravo, o violoncelo e o violino de um terceto clássico - Estantes altas de coro - Luzes - Ao fundo, largo tamborete onde repousam as capas, os chapéus, os bastões - À E. baixa, grande armário pesado de baixela de oiro e prata lavrada - Quase a meio, bufete onde ceiam os três cardeais: toalha de holandilha, picada de rendas; serviço de Sèvres, azul e oiro; cristais. CARDEAL GONZAGA, CARDEAL RUFO, CARDEAL DE MONTMORENCY, sentados ao bufete, ceando; os fâmulos, vestidos de verde e prata, servem-nos, de joelhos. CARDEAL RUFO, visivelmente agastado. Será já amanhã! CARDEAL RUFO, a outro fâmulo Xerez. Continuando, a de MONTMORENCY: Roma! Roma! Que viu pela primeira vez, Benedito XIV, um para receber Conselhos de Inglaterras e cartas de Voltaire! CARDEAL DE MONTMORENCY, grandioso As cartas de Voltaire honram! CARDEAL RUFO, num sorriso de desdém É natural. Fala como francês. CARDEAL DE MONTMORENCY, com dignidade Falo como cardeal! CARDEAL GONZAGA, intervindo de novo Mas, perdão... Não será política demais Para uma ceia alegre? Enfim, três cardeais Não salvam Roma ... CARDEAL RUFO, numa grande atitude Pois, em minha consciência, Bastava um só para salvar! CARDEAL DE MONTMORENCY, com ironia Vossa Eminência? CARDEAL GONZAGA, conciliando docemente Deixemos isso a Deus. E, na divina mão. Roma repousará CARDEAL DE MONTMORENCY, num sorriso Vamos nós ao faisão? Trinchando, com galanteria: Se permitem, eu sirvo. É um faisão doirado, Mau político, sim, mas todo embalsamado De trufas. Nunca fez encíclica nenhuma; Não usou solidéu por sobre a áurea pluma, E, se um dia assistisse a qualquer consistório, Dormiria como eu - e como S. Gregório. AO CARDEAL RUFO: Eminência, não acha? AO CARDEAL GONZAGA, servindo: A perna? A asa? O peito? Muito superior, sobretudo em direito Canônico. _ Uma àsinha, Eminência? Talvez A possa amaciar, regando-a de Xerez. A ave é rija demais para velhinhos doentes... CARDEAL GONZAGA, formalizando Eminência, ainda tenho uns quatro ou cinco dentes. CARDEAL RUFO, provando o faisão Benedito talvez não ande muito mal Ser der ao cozinheiro o chapéu de cardeal! CARDEAL DE MONTMORENCY, ao CARDEAL RUFO Inda agora, a Eminência agastou-se comigo. Confesse... CARDEAL RUFO Eu? CARDEAL DE MONTMORENCY Agastou. CARDEAL RUFO, desculpando-se Voltaire é um inimigo... CARDEAL DE MONTMORENCY E nós amigos. São discordantes fugaces. Eminências... CARDEAL RUFO, abraçando-o Depois... CARDEAL DE MONTMORENCY, beijando-o Vem o osculum pacis CARDEAL RUFO Sobre um beijo outro beijo e sobre um ano outro ano... Como envelhece a gente, o Velho Vaticano! A política... O mal que se faz e desfaz No mistério subtil destes panos de Arrás... A intriga na sombra, os passos sempre incertos... CARDEAL GONZAGA, olhando a estante de música O que nos vale... CARDEAL DE MONTMORENCY Ah, sim...São os nossos concertos. CARDEAL RUFO Música de uma unção espiritual tão grande! CARDEAL GONZAGA, em êxtase Como a alma sobe a Deus nas fugas de Lalande! CARDEAL RUFO, a DE MONTMORENCY Depois, o seu violino... Eminência é artista... CARDEAL DE MONTMORENCY, a RUFO E o seu violoncelo... CARDEAL RUFO Oh! A perder de vista! Num sorriso de beatitude: Só com três cardeais, Roma era um céu aberto! CARDEAL DE MONTMORENCY, tristemente Tão longe a mocidade... CARDEAL GONZAGA, numa lágrima E o trêmulo tão perto!_ Caiu-nos sobre a fronte a neve dos caminhos... CARDEAL RUFO Envelhecemos tanto! CARDEAL GONZAGA, a RUFO Estamos tão velhinhos..._ Já fez sol, para nós.. Sol! Pois não é verdade? CARDEAL RUFO, como num sonho Sol! CARDEAL DE MONTMORENCY, a um dos fâmulos Mais champanhe. CARDEAL GONZAGA Sol! _ Nós que somos a saudade. O pensar que se amou, que se viveu... O amor! — Um tronco envelhecido a cuidar que deu flor! Depois, num embevecimento: Misterioso monte é neste mundo a vida! Todo rosas abrindo, ao galgar na subida, E a velhice, ao descer, toda cheia de espinhos... — Ai, tão velhinhos! CARDEAL RUFO, tristemente Tão velhinhos! CARDEAL DE MONTMORENCY, olhando os dois, com ternura Tão velhinhos! CARDEAL RUFO Relíquias. Devo ter setenta e três, já feitos. CARDEAL GONZAGA Eu tenho oitenta e um. CARDEAL DE MONTMORENCY, sorrindo a, a olhá-los São dois velhos perfeitos! Três... Três velhos sem cor, que a saudade aviventa... CARDEAL RUFO, a DE MONTMORENCY Vossa eminência tem, quantos? CARDEAL DE MONTMORENCY Tenho sessenta. CARDEAL RUFO, ao CARDEAL GONZAGA, olhando DE MONTMORENCY com inveja infantil Sessenta, só! CARDEAL DE MONTMORENCY Sessenta. E a vida já me cansa... CARDEAL GONZAGA Vossa Eminência está ainda uma criança! CARDEAL RUFO, olhando DE MONTMORENCY Também já fui assim! E que rijo que eu era! Sessenta anos! Ainda em plena Primavera! Tal qual assim... Tal qual! CARDEAL GONZAGA E eu! O que direi eu! CARDEAL RUFO Então, ainda compunha ao espelho o solidéu E via com amor, sob a seda vermelha, Uns fios de oiro a rir por entre a prata velha! CARDEAL DE MONTMORENCY Mas, Eminência, não! Com sessenta anos feitos, Não sou, precisamente, uma criança de peitos. Sou um velho, também... Um velhinho, com o ar De quem viveu feliz e envelhece a cantar... CARDEAL GONZAGA É. É uma criança. Em tendo a nossa idade, Verá que o relembrar coisas da mocidade É o prazer maior que podem ter os velhos... Para nós, recordar é cair de joelhos. CARDEAL DE MONTMORENCY Eu sei, eu também sei... Recordar é viver, Transformar num sorriso o que nos fez sofrer, Ressurgir dentro d’alma uma idade passada, Como em capela de oiro há cem anos fechada, Onde não vai ninguém, mas onde há festa ainda... Se eu não hei-de saber como a saudade é linda! Se eu não hei-de saber! _ É curioso, Eminências. Não fizemos ainda as nossas confidências, E somos como irmãos... Tão amigos! CARDEAL RUFO É certo! CARDEAL GONZAGA Confidências? CARDEAL DE MONTMORENCY Então... A morte vem tão perto! Olhemos para trás, lembremo nos da vida... A saudade de um velho é uma estrada florida! CARDEAL RUFO Confidências de amor! CARDEAL DE MONTMORENCY Porque não há-de ser? Em toda a mocidade há um rido de mulher. Contemos esse rido uns aos outros...Nós três... Recordar um amor é amar outra vez! Ninguém nos ouve... CARDEAL GONZAGA Mas, Eminência! CARDEAL DE MONTMORENCY O maior Amor da nossa vida! CARDEAL GONZAGA, com pudor, tapando a cara Oh! CARDEAL RUFO, como quem sonha O maior amor! CARDEAL GONZAGA Mas nós somos cardeais! CARDEAL RUFO, entusiasmando-se O sentimento humano Em toda a parte vive, até no Vaticano! E esta púrpura - ai não, seria crueldade! — Pode matar o amor, mas não mata a saudade! CARDEAL DE MONTMORENCY, ao CARDEAL GONZAGA Principie o mais velho... Eminência... CARDEAL GONZAGA Não, não... Por Deus! CARDEAL RUFO, a DE MONTMORENCY Seja o mais novo. CARDEAL DE MONTMORENCY, escusando-se, polidamente num gesto Oh! CARDEAL RUFO Serei eu, então. Pensando um instante Que lhes hei-de contar? Erguendo a cabeça, os olhos brilhantes, como quem encontrou: Uma aventura linda, Cheia de coração! Ai, não ter eu ainda Mocidade na voz para a saber contar! Eminências, perdão se eu acaso chorar... Se uma lágrima... _ Enfim, são tudo impertinências De velhos... CARDEAL DE MONTMORENCY, convidando-o a principiar Eminência... CARDEAL RUFO, depois de um ligeiro cumprimento a ambos Eu começo, Eminências. — Aos vinte anos, ou vinte e dois, proximamente, Fui eu, por gentileza a um fidalgo parente, Com minha capa negra e minha volta branca, Ler cânones e leis na Douta Salamanca. Era então um pequeno, espadachim e ousado, O feltro ao vento, o manto ao ombro, a espada ao lado, Tendo o instinto da frase e a intuição do gesto — Um Velásquez no trajo, um Quixote no resto _, Que seria talvez, por suprema façanha, Capaz de desafiar o próprio rei de Espanha! Nem pode calcular sequer, Vossa Eminência, Como o meu buço loiro irradiava insolência! Não matei em duelo o Sol, pelas alturas, Só para não deixar Salamanca às escuras! A respeito de amor, como essência divina, Imitei o Don Juan de Tirso de Molina: O amor, por mais ardente ou mais puro que fosse, Morria, ainda em flor, com a primeira posse! Detestava a mulher depois de conquistada: A conquista era tudo: o resto, quase nada. Queria lá saber de aventuras serenas! Para mim, o amor era o duelo, apenas, Batia-me ao acaso, enfim, por qualquer cousa, Um beijo, uma mulher, uma pedra preciosa, Uma flor que se atira, asa de oiro pelo ar, A esmola de um sorriso, a graça de um olhar... Já não tinha valor para mim nenhum bem, Se não fosse preciso ir disputá-lo a alguém, Lutar, vencer, rasgar, ardendo de desejo, Com a ponta da espada o caminho de um beijo, Pomar de assalto o Amor, ao Sol de mil perigos, Como um rubro estandarte entre mãos de inimigos! Assim vivia eu e os outros estudantes, Lendo pouco Platão, lendo muito Cervantes, Quando entrou de jornada em Salamanca, um dia, Sobre carros de bois, a maior companhia De cósmicos que eu vi ainda em toda a Espanha! CARDEAL DE MONTMORENCY, num sorriso Se visse a de Molière... Oh! CARDEAL RUFO, sem se perturbar Não era tamanha, Nem tão rica, por certo. Ah! Foi uma loucura Na Universidade! _ A primeira figura Do bando era uma viva e linda rapariga, Um Rubens precioso, uma beleza antiga... CARDEAL GONZAGA, tapando a cara Oh! CARDEAL RUFO De um loiro flamengo, a cabecita airosa, toda num garavim de seda cor-de-rosa, Como um beijo de luz, rescendia inocência... CARDEAL GONZAGA, estranhando a palavra Oh! CARDEAL RUFO Eu peço perdão se me excedo, Eminência, Mas aquela mulher era um anjo dos céus! Se Deus a pretendesse, eu desafiava Deus! Ver um anjo a dizer-me - ó natureza cega! _ Versos de Calderon e de Lopo de Vega! A representação foi sobre um pátio velho, Todo armado à fidalga em damasco vermelho, Num tapete real de capas de estudantes! Num desfalecimento, escondendo uma lágrima: Ai, o que eu sou agora! Ai, o que eu era dantes! Quanta luz, quanto fogo a velhice nos rouba!_ Representaram não sei bem se a Niña Boba, Um poemazinho leve onde a graça? Nisto, em meio talvez da representação, Ouvi ao pé de mim, dentre um bando folião De escolares, dizer em voz rouca e sumida: O rapto será logo, hem? Será à saída, Na porta dos brasões. Quando a linda “bobinha” Entrar na sua rica e leve cadeirinha, Cairemos sobe ela, e...”Não ouvi mais nada. Inda desembainhei meio palmo da espada, Mas contive-me. ”Não. Logo é melhor” _ disse eu. Quando acabou a peça era noite. Desceu Uma tapeçaria. A cadeirinha, fora, a porta dos brasões, para sua senhora, Era um ninho infantil de lúcido brocado. Perto, o bando escolar aguardava embuçado. Ocultei-me também nas sombras da viela, Desembainhei a espada, e. Nisto, assomou ela. Diz-se: espada e anel, na mão em que estiver. Mas sempre é forte a mão quando é linda a mulher! Atirei-me de um salto, e em rápidos instantes, Sozinho contra vinte e tantos estudantes, Contra uma Faculdade inteira, expondo a vida, A capa ao vento, a espada em punho, a pluma erguida, Talhei, ensangüentei, feri, numa violência... Esgrimindo, com o bastão, por sobre a mesa: Assim! Assim!Parte II
CARDEAL DE MONTMORENCY, defendendo o serviço riquíssimo Por Deus! È Sevres, Eminência. CARDEAL RUFO, sentando-se, num grande gesto fanfarrão E se não os matei a todos, na verdade, Foi p’ra não se fechar a Universidade! CARDEAL GONZAGA, profundamente admirado Sozinho contra vinte! Uma luta sangrenta! CARDEAL RUFO Vinte? Trinta! Ou talvez, contando bem, quarenta! CARDEAL DE MONTMORENCY E então a cadeirinha? CARDEAL RUFO Ah! — Desapareceu. CARDEAL GONZAGA E a cômica? CARDEAL RUFO Sei lá! CARDEAL DE MONTMORENCY Quê! Não a seguiu? CARDEAL RUFO Eu? CARDEAL DE MONTMORENCY Não tornou a ver? CARDEAL RUFO, tristemente Não. Nunca mais a vi. Foi por isso que a amei, _ porque não a possuí! CARDEAL DE MONTMORENCY No se caso, Eminência, eu... CARDEAL RUFO Diga. CARDEAL DE MONTMORENCY Se o consente... CARDEAL RUFO Seguia a cadeirinha? CARDEAL DE MONTMORENCY Imediatamente. E ao atingi-la, então, curvaria o joelho, Tiraria o chapéu em grande estilo velho, E prostrando-me junto à portinha doirada De corpo ajoelhado e d’alma ajoelhada, Diria, num olhar cheio de sonhos loucos: “Senhora, perdoai bater-me... com tão poucos!” CARDEAL RUFO Bela frase! CARDEAL DE MONTMORENCY Não é? CARDEAL RUFO Pena não me ocorrer... Com tristeza: Agora é tarde já para eu lha dizer! CARDEAL DE MONTMORENCY Tinha espírito... _ Enfim, o amor, pensando bem Não é só bravura, é o espírito também, Essa força, essa chama, imperceptível quase, Que é a alma do gesto e a nobreza da frase, Qualquer coisa de fino, e flexuoso, e ardente, Que nos faz ajoelhar irreflectidamente, Perturba, vence, infiltra, e, mal afora à boca, Veste de seda e oiro a confissão mais louca... Que seria o amor sem espírito, Eminência? Uma paixão brutal ou uma impertinência, Sem pureza, sem tudo aquilo que resume O coração num beijo e a alma num perfume! Com uns punhos de renda, até a ofensa é linda! Pode ser fina a espada; a frase é mais ainda: Uma escola subtil de esgrima delicada... Procura o coração, a frase, como a espada, E desfaz-se, ao ferir, em pedras preciosas, Como os raios de Sol quando ferem as rosas... Se ao homem vence a espada e se é belo vencer, O espírito faz mais, _ porque vence a mulher! No meu tempo, no tempo em que amei e vivi, Fui o que ainda hoje são os de Montmorency, O grande espirituoso, o leão da nobreza, Cabeleira em anéis e gola à genovesa, Passeando o meu orgulho e o meu bastão solene Pelos vastos salões da Duquesa de Maine. Ah! Como já vai longe! _ Um dia, o velho Philidor Dedilhava no cravo um certo minuete, Um mimo, o que há de mais século XVII... Querendo recordar-se e cantando: Lá-ri la-ra, la-ri... Suspendendo, tristemente: Já não me lembro bem... Tudo passa! Tentando de novo recordar-se: Lá-ri-la... — Nesse instante, alguém, Uma bela mulher que eu já tinha encontrado Nas ruas de Versalhe, em seu coche encontrado A embaixatriz da Áustria, uma deusa, um assombro, Poisou, num doce gesto, a mão sobre o meu ombro, E disse numa voz desdenhosa: “Marquês, Detesto-os”. Sorri. Nisto, segunda vez: “Aborreço-os” Ri ainda. Ah, Eminências! Uma mulher bonita a dizer insolências É a coisa mais galante e mais deliciosa Que pode imaginar-se. É como se uma rosa Soltasse imprecações, vermelha e melindrada, Contra as asas de Sol de uma abelha doirada... Nisto, terceira vez: “Marquês, tenho-lhe horror”. Já não ri. Junto ao cravo, o velho Philidor Tocava o seu minuete ingénuo e palaciano... Querendo ainda lembrar-se: La-ri, la-ra, la ... Não... La-ri... Numa expressão dolorosa: Há já tanto ano! Não me lembro... A velhice! Vendo de repente o cravo, e erguendo-se: Ah, talvez, sim... Talvez O consiga tirar neste cravo holandês. Ferindo as teclas com a mão esquerda, de pé, e continuando a falar para os dois cardeais, enquanto vai tocando: La-ri, la-ra... — então, decidi-me, Eminências. Compus a cabeleira, e em duas reverências. O pé atrás, a mão na espada, à moda antiga, Curvei-me ante essa bela e fidalga inimiga, E disse: “A sua mão. Venha minha senhora. Não me detestará daqui a meia hora” _ Dançámos o minuete. Ela _ era singular! _ Dava-me a impressão de uma renda a dançar, Uma renda ligeira, um Saxe transparente Onde se iam poisar, perturbadoramente, Como um enxame de oiro, espirituoso e leve, Desde a breve ironia ao epigrama breve, A frase à Marivanx, ardente e complicada, O eterno quase tudo _ apenas quase nada_ O espírito-mesura, o sorriso eloquência... Ao CARDEAL RUFO, que está mais próximo: Não sei precisamente o que disse, Eminência, Mas devia ter sido um requinte de graça, Galanteio que voa ou perfume que passa, Poema cor-de-rosa, apaixonado e brando, Que nos dá a ilusão de que se diz sonhando, Eloquência d’amor, que perturba a mulher, E vence quando ajoelha, e beija quando fere! La-ri-la... Terminou o minuete, por fim. Meia hora depois, nas sombras do jardim, A embaixatriz de Áustria, apaixonada, louca, Unindo à minha boca a pequenina boca, Dizia-me, a sorrir _ “Como o adoro, Marquês!” _ O espírito vencera ainda mais uma vez. E enquanto Philidor, junto ao cravo... Tocando, à procura, com ansiedade: Não sei... La-ri-la... Depois, numa expressão de súbita alegria, sentando-se ao cravo, a tocar: O minuete! Achei! Achei! Achei! La-ri-ra, la-ri-ra ,la-ra... CARDEAL RUFO , erguendo-se e aproximando-se do CARDEAL DE MONTMORENCY Vossa Eminência Perdoa-me, talvez, mais uma impertinência... CARDEAL DE MONTMORENCY , levantando-se do cravo Era belo, o minuete! CARDEAL RUFO, sorrindo É que, para vencer Nesse jogo floral uma simples mulher Parece-me demais a sua meia hora... CARDEAL DE MONTMORENCY Oh! Pois acha, Eminência? CARDEAL RUFO O espírito... demora! Trinta e tantos brigões, fortes e resolutos, Venci eu, a poder de espada, em dois minutos! CARDEAL DE MONTMORENCY, ao CARDEAL RUFO Seguisse a Niña Boba... A Eminência veria... Passava a meia hora e não a venceria! Ao CARDEAL GONZAGA, que pensa, em êxtase: A Eminência que diz? CARDEAL RUFO, acercando-se também do CARDEAL GONZAGA Em que pensa, cardeal? CARDEAL GONZAGA, como quem acorda, os olhos cheios de brilho, a expressão transfigurada Em como é diferente o amor em Portugal! Nem a frase subtil, nem o duelo sangrento... é o amor coração, é o amor sentimento. Uma lágrima... Um beijo... Uns sinos a tocar... Uma parzinho que ajoelha e que vai se casar. Tão simples tudo! Amor, que de rosas se inflora: Em sendo triste canta, em sendo alegre chora! O amor simplicidade, o amor delicadeza... Ai, como sabe amar, a gente portuguesa! Tecer de Sol um beijo, e, desde tenra idade, Ir nesse beijo unindo o amor com a amizade, Numa ternura casta e numa estima sã, Sem saber distinguir entre a noiva e a irmã... Fazer vibrar o amor em cordas misteriosas, Como se em comunhão se entendessem as rosas, Como se todo o amor fosse um amor somente... Ai, como é diferente! Ai, como é diferente! CARDEAL RUFO Também vossa Eminência amou? CARDEAL GONZAGA Também! Também! Pode-se lá viver sem ter amado alguém! Sem sentir dentro d’alma - ah, podê-la sentir! _ Uma saudade em flor, a chorar e a rir! Se amei! Se amei! _ Eu tinha uns quinze anos, apenas. Ela, treze. Uma amor de crianças pequenas, Pombas brancas revoando ao abrir da manhã... Era minha priminha. Era quase uma irmã. Bonita não seria... Ah, não... Talvez não fosse. Mas que profunda olhar e que expressão tão doce! Chamava-lhe eu, a rir, a minha mulherzinha... Nós brincávamos tanto! Eu sentia-a tão minha! Toda a gente dizia em pleno povoado: “Não há noiva melhor para o senhor morgado, Nem em capela antiga há santa mais santinha...” E eu rezava, baixinho: “É minha! É minha! É minha” Quanta vez, quanta vez, cansados de brincar, Ficávamos a olhar um para o outro, a olhar, Todos cheios de Sol, ofegantes ainda... Numa grande expressão de dor: Era feia, talvez, mas Deus achou-a linda... E, uma noite, a minha alma, a minha luz, morreu! Numa revolta angustiosa: Deus, se ma quis tirar, p’ra que foi que ma deu? Para quê? Para quê? CARDEAL DE MONTMORENCY, ao vê-lo erguer-se, amparando-o: Oh! Eminência... CARDEAL RUFO, curvando-se também para o amparar, comovido: Então... CARDEAL GONZAGA Ai! Pois não via, Deus, que eu tinha coração! CARDEAL RUFO Eminência CARDEAL GONZAGA, caindo sobre a cadeira, a soluçar Não via! Ah!, não via! Não via! Julgou que de um amor outro amor refloria, E matou-me... E matou-me! CARDEAL DE MONTMORENCY Eminência... CARDEAL GONZAGA Afinal, LITERATURA[caption id="attachment_12203" align="alignleft" width="300"] Emilio Botin, dono e presidente do Santander, e a presidente Dilma Rousseff: negócios são mais importantes do que a correção ética?[/caption]
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Sinara Polycarpo Figueiredo e Lula da Silva: o ex-presidente pediu a cabeça da superintendente de investimentos do banco Santander[/caption]
Episódios há em que todos os envolvidos são perdedores. Exemplo: o do comunicado feito pelo banco Santander a seus clientes prime, de que todos tomamos conhecimento. O folheto prevenia os correntistas aplicadores daquilo que todos os analistas de mercado vinham observando: a trajetória eleitoral da presidente Dilma Rousseff e o gráfico das bolsas deslocam-se em direções opostas: Se as possibilidades eleitorais de Dilma caem, as bolsas sobem, puxadas principalmente pelas ações da Petrobrás. Algo claro, racional, indiscutível.
O petismo, de quem hoje a presidente é a segunda expressão (a primeira é ainda Lula), tratou muito mal a petroleira, e vem estiolando a olhos vistos seu patrimônio. Agrava mais a questão o fato de Dilma estar no centro dos acontecimentos mais recentes de prejuízo da companhia, os da refinaria de Pasadena. O que era um fato natural passou a escândalo. Dilma investiu contra a realidade, ao considerar análise “inadmissível, lamentável”. Ao combater canhestramente algo tão claro e concreto, interno a uma empresa privada, Dilma mostrou (uma vez mais) seu caráter autoritário. Diminuiu-se como presidente. Dilma perdeu.
A mesquinhez de Lula, pedindo publicamente a demissão da analista Sinara Polycarpo Figueiredo (“essa moça não entende p... nenhuma de Brasil e de governo Dilma. Manter uma mulher dessa num cargo de chefia, sinceramente... Pode mandar ela embora e dar o bônus dela para mim”, atacou o ex-presidente), é também autoritária, embora não surpreendente. De Lula pode-se sempre esperar uma atitude pior que a anterior. Lula perdeu. Perdeu Emilio Botin, dono e presidente do Santander, ao demitir a funcionária e mais dois subordinados que apenas cumpriram sua função. E perdeu feio, ao enlamear-se na sabujice aos poderosos. Rebaixou-se sem necessidade, por mais alguns favores de governo e mais alguns reais de lucro. Botin, dono de um banco de renome mundial, não precisava curvar tanto a espinha.
O colunista Augusto Nunes, em seu blog na revista “Veja” resumiu o vexame do espanhol: “Emilio Botin mostrou como se preside um grande banco de joelhos”.
A analista Sinara Figueiredo e seus dois colegas despedidos perderam. Perderam os postos de trabalho sem ter cometido nenhuma falta, nenhuma desonestidade. Enfrentarão os dias de desemprego, que, esperamos, não hão de ser muitos. Mas que sempre são de incerteza, de angústia pelos compromissos assumidos e — quem sabe? — pelos familiares que a medida arrasta nessa vicissitude. As primeiras preocupações de quem perde o emprego são sobre como prover a despensa e pagar a escola dos filhos.
Eles, a analista e seus dois colegas, que menos devem no episódio, terão perdido mais que os outros. Até porque aqueles outros perderam algo a que, parece, não têm muito apego. Não é a primeira vez que o presidente do Santander aparece em rumoroso envolvimento com autoridades públicas.
O jornal espanhol “El Mundo”, em 17 de dezembro de 2009 publicou uma reportagem explosiva: o célebre juiz espanhol Baltasar Garzón, responsável pela prisão de Pinochet na Inglaterra, cultivava com Emilio Botin uma amizade fora dos padrões. Garzón, que adorava — e adora — uma manchete de jornal e uma câmera de TV, havia dado uma escorregadela: pediu a Botin, em 2006, por carta, e conseguiu, um patrocínio milionário do Banco Santander para uns cursos que ia ministrar em Nova York, quando ali passava uma temporada. Algo para alimentar sua enorme vaidade. E o que é pior: voltando à sua cadeira de juiz na Audiência Nacional (o tribunal superior espanhol), havia recebido uma ação contra o Santander e a havia arquivado. Sequer se julgara suspeito, o que acabou lhe rendendo um processo interno na corte.
Governo realça massacre no Oriente Médio e esconde ampla violência no Brasil
O governo é pródigo em paradoxos. Mais um vem a público. Numa destrambelhada ação diplomática, a presidente Dilma Rousseff fez o Itamaraty produzir uma nota só 50% certa, ou melhor, 50% errada: condenou Israel, mas se esqueceu de ou não quis condenar os extremistas do Hamas pelos combates na faixa de Gaza, provocando reação dos judeus. Paradoxo. A presidente, na tréplica, classificou de massacre o que ocorre na região. Paradoxo, outra vez. A presidente se esqueceu ou não quis se lembrar do massacre quotidiano que leva cerca de 140 pessoas por dia (a maioria jovens envolvidos com drogas) a serem assassinadas no Brasil, debaixo da omissão governamental. Massacre maior que o da faixa de Gaza. Enquanto o Ministério da Justiça persegue até a histeria as armas do cidadão honesto e chega até a implicar, via do Exército, com as armas dos atletas atiradores, os traficantes continuam trazendo armas para os seus arsenais, junto com as drogas vindas dos países “bolivarianos”. Ninguém os incomoda, enquanto seguem (noutro paradoxo), matando nossos jovens, depois de viciá-los em maconha, cocaína e crack.Ministra Marta não quer respeitar Igreja Católica
A ministra Marta Suplicy abespinhou-se porque a Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro relutava em liberar a estátua do Cristo Redentor para uma filmagem dirigida pelo cineasta José Padilha. Numa cena, do episódio “Inútil Paisagem”, constante do filme, o ator Wagner Moura, um dos queridinhos da esquerda “chique”, dá uma banana para o Cristo. À Cúria, não podia agradar uma exploração desrespeitosa ou ideológica da imagem do Cristo, nem uma negação da fé, simbolizada no ato grosseiro do personagem encarnado por Moura. Além da devoção, a Cúria vê a sua responsabilidade, pois é curadora da imagem do Cristo Redentor. Segundo o muito bem informado e sério jornalista Merval Pereira, a ministra lançou ameaças (indiretas ou diretas, não se sabe ao certo) de retirar dos religiosos a tutela da imagem. De transferir esse controle para algum órgão de seu ministério, se a permissão para as filmagens não fosse dada. Algo próprio de quem não respeita a Igreja Católica e o credo religioso de outras pessoas. A esquerda brasileira aprendeu o que o stalinismo ensinou. Nada esqueceu e nada mais aprendeu. Stálin, como seus seguidores, e todo marxista, era ateu. Mais que desprezava, odiava a religião e foi responsável por muitos massacres de religiosos e fiéis. Não cultivam seus admiradores respeito à fé religiosa, à Igreja, à Cúria Metropolitana, aos padres, aos crentes e à simbologia natural da estátua do Cristo Redentor, no cume do Corcovado. Mas aqui não há paradoxo. É apenas a natureza autoritária da “esquerda revolucionária” se manifestando. A Cúria acabou concedendo a permissão para as cenas. E a ministra negou o fato, ainda que contra todas as evidências.O governo de Dilma Rousseff e a vergonha da CPI fraudada
A Petrobrás continua sendo a vítima preferencial do governo da presidente Dilma Rousseff. E o governo deve mesmo ter muito a esconder para fazer o que faz nas Comissões Parlamentares de Inquérito criadas para investigar os rombos na empresa. Em primeiro lugar, tentou abortar a criação das CPI. Não conseguindo, enxertou-as com os mais fiéis correligionários, encarregados de paralisá-las. Estava conseguindo, mas não satisfeito, resolveu fraudar a do Senado, como se fosse uma simples prova de ensino médio, onde se compram, se vendem e se passam, desonestamente, gabaritos com respostas certas. E autoridades graúdas, ministro, diretores da maior empresa brasileira (para não dizer sul-americana), que deveriam ostentar honra e dignidade, além de competência, vergonhosamente, participam das falsificações.
Em cálculos simples, é possível estimar que R$ 127 bilhões por ano são surrupiados do erário
Observe o leitor que só falamos até aqui da Petrobrás, embora o setor elétrico, cuja administração foi entregue ao PMDB, isto é, a Sarney, Renan, Jader Barbalho, Romero Jucá e outros, também movimente recursos bilionários. Os ativos do setor petrolífero chegam a 520 bilhões de reais, e os do setor elétrico, a 150 bilhões de reais. Cinco por cento desses ativos (um montante modesto, para a voracidade dos aproveitadores), daria algo como 35 bilhões de reais. Valor modesto, repetimos, pois só em Pasadena, o TCU aponta 1,5 bilhão de reais e em Abreu e Lima, suspeita-se de 30 bilhões desviados. Mas deixemos barato: fique a terceira parcela em 35 bilhões. A quarta parcela não é menos difícil de ser avaliada, estimada, ou, seja “chutada”, pelos esforçados avaliadores de desvios, nós inclusive. Mas para não deixar tarefa incompleta, sigamos em frente. As empresas financeiras do governo federal (BNDES, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Banco da Amazônia e Banco do Nordeste, além de outras menores) movimentam um ativo de 2 trilhões de reais. Se a cifra é astronômica, aqui existem regras mais rígidas, e a fiscalização do Banco Central. O que significa que o roubo é mais difícil. Por outro lado, quando ele ocorre, pode também ser astronômico. Se puxarmos pela memória, vem muita coisa. Muitas empresas “escolhidas” pelo governo Lula para serem exemplos empresariais acabaram explodindo no colo do BNDES, como as do Grupo X, de Eike Batista, e a Marfrig. A Caixa Econômica embarcou no Banco Panamericano, de Silvio Santos (só aqui foram 4 bilhões de reais desviados). No mensalão, um dos canais de desvio passava pelo subterrâneo do Banco do Brasil, via Visanet, administrado pelo finório petista Henrique Pizzolato, hoje descansando numa prisão italiana. E outro tipo de desvio surge aqui, inteiramente de responsabilidade da cúpula do governo federal: financiamentos ditos sociais, na sua origem, mais que permitem, até sugerem o não cumprimento das obrigações, eleitoreiros que são. O Minha Casa, Minha Vida é o exemplo acabado, principalmente nas moradias mais baratas. O que deveria seguir o padrão de inadimplência normal do mercado (inferior a 2%) não o é: neste segmento de habitações quase totalmente subsidiadas, o calote está acima de 20% como demonstrou a revista “Veja” em setembro de 2013. Só esse montante, de difícil recuperação, chega aos 14 bilhões de reais. Se, também aqui modestamente, levarmos em conta apenas o que surgiu nos escândalos, teremos uma quarta parcela de mais de 20 bilhões de reais. Mas fiquemos por aí. A soma das quatro parcelas que nos propusemos a muito grosseiramente estimar, chegaria então a 23+49+35+20= 127 bilhões. É um cálculo estimativo, aproximativo, reconhecemos, pois a corrupção, obviamente, recusa-se a ser medida com maior precisão. Mas não é, convenhamos também, uma estimativa desmedida, diante de tantos escândalos. É considerável esse valor, perante nossos problemas? Dê o leitor a resposta, sabendo que em 2013 os gastos do governo federal foram: Segurança, 66 bilhões, Educação, 65 bilhões, Saúde, 31 bilhões, e Transportes, 19 bilhões. E todo o programa de governo de um presidenciável (Eduardo Campos) prevê um investimento de 125 bilhões de reais.

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O início do fim para os alemães na 2ª Guerra se deu na Batalha de Moscou, ainda em 1941