Por Redação

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Pra não dizer que não falei da corrupção

[caption id="attachment_89145" align="alignleft" width="620"] "Justiça combatendo a Injustiça” (1737), pintura de Jean-Marc Nattier[/caption] Leonardo Teixeira Especial para o Jornal Opção Articula-se pelas redes sociais um movimento aparentemente apartidário para protestar nas ruas brevemente. Seria um déjà vu (na tríade “Fora Collor, Fora Dil­ma, Fora Temer”), como se algum dos políticos engravatados fosse compadecer da situação e abrir mão (e a carteira) das suas regalias no reino. A exemplo dos 30 mi­lhões anuais (em média), quantia gasta com um único político. Ou ainda mais esses exemplos: a aposentadoria rápida, os as­sessores nepotistas, as verbas indenizatórias, os planos médicos, os litros diários de gasolina, as passagens aéreas ou a imunidade parlamentar. Reza a lenda caótica que santo de casa não faz milagre. Mas o texto de hoje não tinha a pretensão ácida no mesmo tom dos dedos apontados – tão rijos e castos –, rumando alvos distantes, diretamente nos erros alheios; ou da velha verve que se diz julgadora superior da errante raça humana. Atiraram a primeira pedra e um turbilhão de achincalhes é metralhado em plena era digital sem fakes ou melhores looks. Nem a rebelião de Luke Skywalker, ou suas palavras sobre a força podem amenizar os desvios de conduta humana e seus gostos pelo lado negro e bizarro da coisa toda. Se até mesmo a nossa ficção parte de uma premissa mentirosa (que o diga qualquer ator teatral), nosso entretenimento também prioriza o riso grotesco. Cito como exemplo o apreço pelos vídeos idiotas do WhatsApp, as pegadinhas e cacetadas e demais similares. Quan­do o show de um mágico está ficando sem graça, ele apela para a guilhotina de braço. A ameaça de decepar o braço alheio craveja os olhos de suspense e emoção. To­dos os humanos são bipartidos à ma­neira yin-yang de ser. Essa é uma das poucas regras sem exceção. Eis o lado malvado, sem ser favorito, que brota quando ninguém está vendo. O jeitinho malandro de levar vantagem ultrapassa limites racionais. Sendo capaz, inclusive, de estar presente no momento de uma catástrofe ou grave acidente, quando mais é necessária a ajuda alheia. Quantos relatos não há sobre algum ser humano iluminado (pelas chamas infernais) que furta a mala, aliança, carteira, celular, óculos e roupas, em vez de prestar socorro? Por isso, ante um tombamento de caminhões, as pessoas frequentemente ameaçam ou machucam os motoristas e levam as cargas derramadas. Há poucos dias mesmo, vi a notícia de que dezenas de pessoas pararam os seus carros e os encheram com frascos de óleo de cozinha (que seriam distribuídos nos supermercados) que estavam dentro de um caminhão tombado. Não imagine que tais saques são novidades modernas. No museu de Turim há um papiro do reinado de Ramsés V (1145 a.C.) que menciona os roubos, saques e greves. Sem falar do antecessor Ramsés IV, cuja corrupção “endêmica” no governo do antigo Egito foi mencionada em um papiro (Harris) de mais de 40 metros de comprimento. Este sujeito saqueador é o mes­mo indivíduo que critica a corrupção brasileira, fala mal dos outros, dos partidos, dos bandidos. Tem uma noção tosca sobre errinhos e er­rões, pecadinhos e pecadões. Não se pode desviar dinheiro público, des­viar verbas, superfaturar obras, abusar de propinas robustas, levar van­tagens ilícitas, mas muitos acham que é normal falsificar carteirinha de estudante, furtar e burlar sinal de TV a cabo, comprar e vender produtos falsificados, furar filas, colar e passar cola nas provas (ou copiar trabalhos, textos e artigos da internet), bater ponto e assinar lista de presença para colegas de trabalho ou de estudo, apresentar atestados médicos falsos, inventar uma justificativa (as mentiras tidas como socialmente necessárias), vender ou comprar o voto, estacionar em vagas especiais (ainda que seja rapidinho), falsificar assinaturas, declarar informações falsas no imposto de renda (omitir ou comprar notas), receber troco a mais e não devolver, não dar nota fiscal (ou o valor correto), desrespeitar lugares reservados em ônibus, cinema, teatro, estacionamento etc, levar para casa enfeites de festa que não são cortesia, tentar subornar o policial ou guarda de trânsito, burlar normas de trânsito (sinais, parar em filas duplas, andar pelo acostamento ou em pistas reservadas a ônibus, e “gatos” por exemplo), desrespeitar normas trabalhistas, pagar multas e continuar desobedecendo a lei, jogar lixo pela janela ou nas ruas, receber auxílios sem necessidade (moradia, deslocamento, verbas de gabinete, despesas extras) etc. Ufa! Que textão! Você ainda está aí? Esse é o mesmo ser humano que se acha no direito de queimar um índio, um menor abandonado, um mendigo, ou qualquer outra pessoa que esteja numa pior, na sarjeta do mundo, ou sofrendo os preconceitos de uma minoria. Uns se diferenciam dos outros pelas escolhas diárias, pelos limites comportamentais etc. Mas é a mesma criatura humana, benevolente quando quer, mas diabólica ao extremo, frequentemente encontrado numa situação extremista ou terrorista. É o mes­mo que sai bradando o seu legítimo protesto, com cartazes e tintas típicas da bandeira, sem conhecer a própria hipocrisia, como um peixe que nada pelo rio sem saber que está na água... No livro “Raízes do Brasil” (1936), Sérgio Buarque Holanda cita nossos ancestrais e colonizadores europeus imersos nas imoralidades históricas e isso se “refletiria nas suas relações com outros indivíduos, instituições, leis e a política”. Curioso o fato de Platão, em sua “utopia republicana” ter falado que “a justiça e a honestidade apenas acontecerão na política quando os governantes forem amantes da sabedoria (filósofos), ou os amantes da sabedoria assumirem o governo”. Depois, em seu livro “As Leis”, ele já não confiava mais na incorruptibilidade de um governante sábio. Isso no mundo onde os filósofos sofistas foram acusados de corruptores da linguagem. Aristó­teles escreveu sobre corrupção no livro “A Geração e a Cor­ru­pção”, apesar de cunho mais metafísico e biológico. Em tese, todos os seres naturais possuiriam uma su­bstância e uma finalidade. Quando a substância de algum ser, ou sua finalidade, se modifica, este ser se corrompe, degenera, se perverte. A morte é a corrupção da vida, e tudo se corrompe quando não cumpre sua finalidade, ou a deturpa. Moral da história: corrupção é um problema ético, pessoal e cultural. Qualquer reflexo político é mero esparramar de fragmentos humanos. Podemos ao menos frear pequenos impulsos diante do que chamamos de corrupções menores. Se colocar verdadeiramente na frente de outra pessoa e pensar algo como “se fosse comigo, eu gostaria disso?” Era pra ser um texto mais ameno, talvez algo sobre o formato tosco e irregular de um brócolis, uma miniárvore antes de ser digerida. Antes que a música, de apenas dois acordes, símbolo das manifestações (“Caminhando e cantando...”) — seja amplificada a plenos e múltiplos pulmões — sigam nas várias direções do país, quem sabe possamos refletir como melhorar nossas próximas ações e condutas? Até a próxima página! Leonardo Teixeira é escritor

Eduardo Lourenço: um ensaísta inigualável

O pensamento do professor Lourenço, ao longo de uma carreira acadêmica invejável, voou tão longe e alcançou tantos ângulos que hoje é impossível imaginar um ensaio sobre poesia portuguesa sem levar em conta o que ele já escreveu

20 aforismos de Karl Kraus sobre mulheres. Não são nada politicamente corretos

O jornalista e intelectual austríaco era um polemista de primeira linha. Hoje, seria crucificado. Ele não perdoava ninguém — nem homens nem mulheres

Marconi: “Se tem uma coisa que deu certo em Goiás foram as OSs na saúde”

Em Aparecida de Goiânia, o governador afirmou que pretende ampliar o número de OSs em Goiás, com a participação de grupos bem sucedidos em outros estados

Justiça goiana afasta delegado e agente de polícia por suspeita de cobrança ilegal de fiança

Segundo investigação, os dois teriam exigido R$ 8 mil de um comerciante de Morrinhos, que chegou a ser algemado e preso

Apesar dos furos, “Logan” se resolve muito bem na telona

Se não tivesse furos de roteiro, este não seria um filme da Fox. Porém, é um excelente pontapé inicial para a nova era da franquia X-Men nos cinemas [caption id="attachment_88767" align="alignleft" width="620"] "Logan" não é apenas uma despedida, mas uma passagem de bastão do velho Wolverine para a nova geração de X-Men[/caption] Ana Amélia Ribeiro Especial para o Jornal Opção Na crítica que escrevi sobre “X-Men – Apocalipse” falei que a franquia da Fox deveria parar de persistir nos mesmos erros – muitos personagens e pouco tempo de tela para desenvolvimento, pirotecnia exacerbada e problemas cronológicos por causa de furos do roteiro – e construir um novo enredo para a nova fase dos filmes de mutante. Afinal, depois de 17 anos, precisavam mudar. Bem, com o novo filme de Wolverine isso finalmente aconteceu. “Logan” é uma mistura de faroeste com drama familiar, uma carta de despedida com um novo recomeço. O filme do Carcaju – é o animal no qual Len Wein se inspirou para criar o personagem Wolverine – é uma conquista incrível. É brutal, mas ao mesmo tempo muito mais emocional do que sua raiva devastadora de sempre. “Logan” deixa de lado aquela pirotecnia habitual para os filmes X-Men, e foca no que realmente importa: trabalhar o psicológico das personagens nas passagens de tempo sobre passado e presente, juventude e velhice, saudosismo e novidade. E, claro, com um pouco de problema cronológico – se não tem problemas cronológicos, não seria um filme da Fox. [relacionadas artigos="88503"] E isso só foi possível porque o estúdio resolveu chutar o balde e fazer “Deadpool” com classificação para maiores de 17 anos, o que fugiu totalmente do formato padrão usado nos filmes do gênero. A Fox, então, percebendo o sucesso estrondoso de crítica, público e bilheteria do mercenário tagarela, resolveu arriscar o personagem mais memorável da franquia: o Wolverine. Após o inexpressivo “X-Men Origens: Wolverine”, e de “Wolverine: Imortal” – nenhum dos dois faz jus aos quadrinhos –, “Logan” finalmente ganha a sequência que os fãs sempre pediram, mas, claro, com algumas restrições. O derradeiro filme do Carcaju marca também a despedida do ator Hugh Jackman que interpretou o personagem nove vezes em 17 anos de franquia. Assim, para a última jornada de Wolverine, Jackman e o diretor James Mangold adaptaram para as telonas a HQ “O Velho Logan” (Old Man Logan), roteirizada por Mark Miller e ilustrada por Steve McNiven – dupla que também assina “Guerra Civil” – e publicada de 2008 a 2009, entre as edições #66 e #72 da revista “Wolverine (volume 3)” e no especial “Wolverine: Old Man Logan Giant-Size”. A história dos quadrinhos é encaixada no universo dos X-Men do cinema, já o roteiro de “Logan” aproveita do arco da HQ apenas o estado de saúde do personagem principal e a ideia de um futuro distópico. A personagem X-23/Laura Kinney (Dafne Keen), por exemplo, surgiu na série animada “X-Men: Evolution” e, devido ao sucesso, ganhou espaço nos quadrinhos, mas não faz parte do universo de “O Velho Logan”. Nos cinco primeiros minutos do filme, é possível perceber que não é se trata de um tradicional longa sobre quadrinhos. O filme já começa mostrando a que veio: briga, brutalidade, sangue, decapitações, crise da meia idade e medo do que o futuro reserva. O ano é 2029, os mutantes deixaram de nascer e os poucos restantes são perseguidos pelo governo, encolhendo significativamente a população e, diferente de como foi apresentado em “Dias de Um Futuro Esquecido”, os X-Men foram extintos. Embora não seja inteiramente explicado no filme, a aniquilação dos mutantes fica subentendida como responsabilidade da instabilidade mental de Charles Xavier (Patrick Stewart), que teve uma convulsão que acabou matando os membros dos X-Men. O episódio em questão foi chamado de “Acidente de Westchester”, que é a localização da Mansão-X. Nessa realidade amargurada e de desesperança, um Wolverine decrépito, debilitado, esgotado fisicamente e emocionalmente, além de um alcoólatra semi-funcional que tem dores musculares e visão desvanecida, é apresentado. Ganhando a vida como chofer de limusine para cuidar do nonagenário Charles Xavier, Logan planeja juntar o dinheiro que ganha para comprar um barco e viver junto com seu mentor no mar, já que as convulsões de Charles vêm ficando cada vez mais fortes. Essa é a forma que o Carcaju acredita ser mais fácil de proteger a todos das constantes crises do antigo professor. Durante seu trabalho como chofer, Logan é procurado por Gabriela (Elizabeth Rodriguez), uma enfermeira mexicana que pede a ajuda do X-Men aposentado. Ao mesmo tempo em que se recusa a voltar à ativa, ele é confrontado por um mercenário, Donald Pierce (Boyd Holbrook), que está interessado em algo que Gabriela possui, a X-23/Laura Kinney — no decorrer do filme, acaba descobrindo que descobre a pequena garota é, na verdade, sua filha/clone. Depois do longo dia exaustivo de trabalho, o mutante volta para o esconderijo e ajuda Caliban (Stephen Merchant) a cuidar do Professor X. Enquanto Logan está dando sua medicação contra convulsões, Charles conta que está conversando através de seus poderes com uma jovem mutante chamada Laura e diz a Logan sobre uma profecia em que a jovem mutante precisa dele, mandando-o encontrá-la na Estátua da Liberdade. Logan, porém, responde à menção da estátua com “a Estátua da Liberdade se foi há muito tempo, Charles...”, fazendo referência aos primeiros filmes dos mutantes. De volta ao trabalho de chofer, Logan é chamado para mais uma corrida e mandado para o Liberty Motel. Chegando lá, ele se lembra da visão do Professor X e encontra Laura em companhia de uma Gabriela seriamente ferida. A enfermeira explica que precisa dos serviços de Logan para levá-las a um local chamado Éden, e oferece uma recompensa muito alta para que ele aceite o serviço. Wolverine concorda em levá-las ao Éden, um refúgio utópico para mutantes em Dakota do Norte — no decorrer do filme ele descobre que Éden se originou nos quadrinhos X-Men, o que o faz questionar se o Éden realmente existe. Enquanto leva a garota para o Éden, ele, Laura, e Professor X são perseguidos e passam boa parte do longa fugindo de Dr. Zander Rice (Richard E. Grant) e dos Carniceiros de Donald Pierce. O diretor Mangold, nesse ponto do filme, atinge um bom equilíbrio entre “Os Brutos Também Amam” e “Mad Max: Estrada da Fúria”, com uma pequena virada estilo “O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final.” A partir da cena da fazenda tudo muda. Esse não é um filme de final feliz — aliás, cenas em celeiros nos filmes do Wolverine significam apenas uma coisa: morte. O terceiro ato de “Logan” significa que agora tudo se foi, e o que restou são sombras, poeira e uma filha/clone. É quando você percebe que o filme não é apenas uma história de despedida, mas uma representação simbólica da passagem de bastão do velho Wolverine para a nova geração de Laura. É uma conclusão digna para o mutante que esteve na maioria das vezes no centro dos filmes X-Men. É claro que a história deixou algumas pontas soltas, mas isso é tão recorrente na franquia da Fox, que a gente acaba relevando, pois é justificado com “muito enredo e pouco tempo para desenvolvimento”, apesar de ser um filme de 2h17minutos. É um filme de início, meio e fim que, apesar dos pequenos furos, se resolve muito bem na telona. Com os dois pés no chão a direção de James Mangold trouxe o que há de melhor das atuações de Hugh Jackman, Patrick Stewart e da surpreendente Dafne Keen. E isso é o que importa. Não teve o Wolverine vestido com o uniforme clássico, mas teve várias representações disso durante o filme. Não teve uma explicação mais profunda do acidente de Westchester, mas ficou ali subentendido. Não dá para ficar preso nessas questões. A franquia “X-Men” da Fox está nas telonas há 17 anos com esse problema de furos de roteiro e agora ela terá oportunidade de trabalhar essas pontas soltas já que tem três linhas temporais para trabalhar o enredo: “X-Men: Supernova”, que se passará no final dos anos 1980, início dos 1990, contando a saga da Fênix Negra; “Deadpool 2”, com o enredo focado no presente com a aparição do vilão Cable; e no futuro com o filme “X-Men: The New Mutants”. “Logan” foi um excelente ponta pé inicial para os filmes de quadrinhos desse ano e só nos resta esperar que os próximos filmes sigam o mesmo caminho de qualidade. Afinal, o mundo já não é mais o mesmo, e os filmes de quadrinhos também não. Ana Amélia Ribeiro, jornalista, fã incondicional de quadrinhos, DCnauta, Marvete e muito apaixonada pela Turma da Mônica

“Os juros poderiam cair mais, porém já vemos um ambiente propício à volta do crescimento”

Ex-deputado federal diz que o gasto dos governos, em todas as esferas e Poderes, são os maiores culpados pela crise que atrasou o Brasil em uma década

O jornalista Doracino Naves era múltiplo; acima tudo, um ser decente. Era gente

Intelectual dedicado à cultura, dirigiu um programa de televisão e editou uma revista. Foi vereador e secretário de Cultura. Fará falta

Há um princípio universal que a família Le Pen tem dificuldade em entender: um voto conta

Marine Le Pen deve ir ao segundo turno, mas sua velha política encontrará dificuldade nas urnas [caption id="attachment_88263" align="aligncenter" width="620"] Filha de Jean-Marie Le Pen, Marine deve ir ao segundo turno, mas enfrentará dificuldades | Foto: Charles Platiau[/caption] Frank Wan Especial para o Jornal Opção Parece ser evidente, para muitos que se fiam à contagem tradicional de votos, que Marine Le Pen passa ao segundo turno das eleições presidenciais francesas. Coloca-se então a questão: quem é o melhor candidato para derrotar a filha de Jean-Marie Le Pen, partindo do princípio –  coisa que a gigantesca maioria da mídia faz – que derrotar Le Pen é defender algum estado da civilização que, com a vitória dela, se perderá? Os leitores já estão habituados a estes axiomas: se Donald Trump vencesse eram também anunciados diversos apocalipses e tsunamis, mas, na lógica midiática, a grande catástrofe vem sempre a seguir. A Frente Nacional (Front National, FN) não é apenas um partido político, tem também os traços antropológicos de uma religião. Não é incomum perpassarem no discurso dos seus apoiadores expressões como “até ao sangue”. Tal como todos os movimentos religiosos, a Frente Nacional  também tem uma visão particular da história (e de certos momentos chave da história) e esta leitura histórica é uma referência permanente no seu pensamento. Tendo um discurso anti-estruturas políticas, a FN bate-se permanentemente com o grave problema das fontes de financiamento, mas, como muitas magias que a política faz, o dinheiro sempre aparece e, desta vez, voltou a aparecer sob o título de “dinheiro russo” — e aqui os menos distraídos já se recordam do “fantasma russo” na eleição que levou Trump ao poder. [relacionadas artigos="87921"] Pelo mundo afora, o momento das eleições parece ser um momento de depuração. Há uma súbita febre de honestidade e denúncia, sempre ausente em tempos não eleitorais, onde a pureza ética parece tirar férias. Nos EUA, por exemplo, as mulheres só se lembram que foram vítimas sexuais de algum candidato no período eleitoral — com a dupla perversidade de, não apenas lançar suspeitas, provavelmente injustas, sobre algum candidato, mas também de fazer um péssimo serviço às vítimas reais desse tipo de crime, descredibilizando-as. Recentemente uma socióloga nos chamava a atenção para o fato de, nos anos 1980, com uma dada ficha de inquérito, 30% das pessoas acreditarem que os políticos eram todos corruptos e, com a mesma ficha, em 2010, o resultado ter dado acima de 75%. Mas, curiosamente, isso não altera significativamente o sentido do voto tomando um conjunto de eleições — embora, na minha opinião, não deixe de ter repercussões no número de abstenções. Seja como for, em período eleitoral alguma lama será sempre mutuamente atirada. Se François Fillon é acusado de desvios financeiros pessoais pouco consideráveis, mas eticamente muito pesados, Marine Le Pen e seu pai já têm um patrimônio de peso. Também sobre a família Le Pen pairam fortes suspeitas de gigantescos desvios de dinheiro, normalmente, sob a forma de desvalorização dos bens patrimoniais para fuga aos impostos. É surpreendente para muitos que Fillon esteja sob tantos holofotes por quantias irrisórias enquanto que Le Pen há anos passe incólume, embora recaiam sobre si somas muito mais avultadas. Diria que Le Pen usa a arma da pureza financeira com algum equilíbrio, o que é até estranho para esta família política, mas os telhados de vidro, provavelmente, a isso obrigam. Já Fillon usou e abusou dos bonecos conceituais tão do gosto dos políticos modernos: a honestidade, a transparência, as diversas incompatibilidades dos cargos políticos, etc. Isso levou-o onde o levou, mas agora está pagando uma gigantesca fatura pelo discurso moralista. Os pecados dos políticos “santos” aparecem sempre que eles deixam o poder e, concomitantemente, de controlar a aparição dos pecados. Afinal, Trump também não pagou impostos e ganhou as eleições! Não só não pagou, como, quando lhe perguntaram se usou um certo fundo para evitar impostos, deu a famigerada resposta: Of course I do, of course I do (Claro que sim, claro que sim). Afinal — e Trump acaba de demonstrá-lo, na puritana  América do Norte —, não pagar impostos e, talvez, andar por aí atrás de umas garotas, não incapacite quem quer seja de ganhar eleições. Em política tudo é assimétrico, o que é válido para Fillon, mas não para Le Pen. Como em todas as eleições presidenciais no mundo, embora no caso de Portugal isso nunca tenha sido muito evidente, tirando as bizarras eleições de Mário Soares e Freitas do Amaral, o resultado no segundo turno raramente esteve em jogo, o importante é continuar no pleito obtendo o famoso “ingresso” (ticket). Como o equilíbrio partidário na França está muito mais estilhaçado do que em qualquer outro país europeu, depois de obtido o “ingresso”,  o jogo muda quase a cada 24h, entra-se num “xadrez relâmpago” vertiginoso de negociações, jogadas e golpes espetaculares. Se, para o primeiro turno, o importante é ter uma boa base fixa, que é o caso máximo de Le Pen, para o segundo, o importante é a flexibilidade. É por isso que Le Pen, e seu pai já tinha esse fantasma, tem o perfil da eterna derrotada no segundo turno. Ainda ecoa nos ouvidos franceses o famoso bordão eleitoralmente suicida de Jean- Marie Le-Pen: não quero nem um voto de esquerda! Marine fez imensas maquiagens à filosofia e métodos do pai, mas, para as eleições presidenciais nunca (digo eu) tocará no eleitorado de centro e centro-esquerda que decide eleições. Estratégia cínica: quem tiver o ingresso contra Le Pen “arrisca-se” a vencer,  nem será uma vitória do próprio, será sempre uma derrota do extremismo lepenista. O que os adeptos do Apocalipse aguardam é que à vitória de Trump se siga a de Le Pen, mergulhando o mundo em trevas políticas. São diversos os temas que apartaram a FN dos outros partidos, entre eles contam-se  os tradicionais temas queridos da extrema direita: a agricultura, a segurança, os imigrantes, entre outros. No quadro europeu, Marine volta ao grande cavalo de batalha de todos os extremistas: a saída da “zona do euro”. A “saída” tem, ultimamente, numa tentativa  de mitigar  a violência da medida, tomando formas bizarras como: a França mantinha o velho franco no seu território, mas negociava em euros nas exportações ou entre as grandes empresas. Claro que isso é visto como um imenso recuo face às posições que a FN já defendeu no passado — recordo que a saída era quase a bandeira primeira do movimento em tempos recuados, a tal ponto que, nos bistrôs se dizia que Marine era “moeda, moeda, moeda” (“monnaie, monnaie, monnaie”). Marine defende-se dizendo que é uma medida mais prática, uma vez que a saída do euro seria mais violenta. Le Pen e todos os europeus assistem com perplexidade à incapacidade da Inglaterra de sair da “zona do euro” após o referendo. Marine também agita a bandeira do referendo na França e esta é, aliás, a primeira medida que diz tomar, se sair vitoriosa. A verdade é que a França padece de todos os males dos países europeus desde a implementação da moeda euro: dívidas pública e privada altíssimas, difícil acesso ao crédito, etc. Na França, país com uma democracia velha e astuta, o discurso mágico tradicional dos políticos de “aumentar os salários dos professores, policiais e médicos e baixar os impostos”, decididamente, não pega. Marine vê-se na contingência de recorrer a propostas dentro da sua cultura política: não tratar os estrangeiros em situação irregular (muitos brasileiros) nos hospitais públicos! Recorre a estes estratagemas argumentativos porque sabe perfeitamente que a maioria das outras medidas faraônicas que propõe teriam custos incomportáveis. Marine recorre à relação “tratamento médico/estrangeiros” para manter vivo o simbolismo fascista da xenofobia porque, neste momento, está  provado para a sociedade que não é possível, por exemplo, fazer um automóvel sem recurso a peças e materiais oriundos de diversos países — lembrando que a indústria do automóvel na França tem um peso importante. É preciso ver tudo o que Marine Le Pen propõe com uma pitada de sal porque ela, normalmente,  sabe que não vai ganhar e pode, portanto, dar-se ao luxo de dizer qualquer coisa. Estas medidas, propostas e ameaças servem apenas para capitalizar votos.  Muitas vezes também se usa com a FN uma medida diferente da que se usa com os outros partidos, leem até aos últimos caracteres tudo o que está no programa da FN e põem-se a acusar Marine Le Pen de cada detalhe programático. Ora, é sabido: os eleitores não leem programas de partidos, guiam-se por muitas outras coisas. No limite dos argumentos de Marine está sempre o bordão: a Europa não funciona por causa da imigração...

O que vai acontecer agora, então?
A questão numérica é simples de equacionar: qual é a porcentagem de votantes de Fillon que poderiam eventualmente votar na Marine Le Pen? Segundo números das últimas 48 horas, votariam, dos absolutos, 18% em Fillon e desses votantes em Fillon, 30% dizem-se dispostos a votar na Marine num segundo turno. Tomando como referência geográfica e nacional  todas as votações até hoje, faltariam a Marine Le Pen cerca de 10 milhões de votos. Para uma proposta política tão rígida é difícil vislumbrar que tipo de votante faria toda a viagem do espectro político para aterrar no voto da extrema direita (democrática). O interessante em quase todas as eleições europeias é que quem decide, muitas vezes, é a abstenção e os abstencionistas. A abstenção absoluta desestabiliza as porcentagens relativas e, não há desejo, nem pavor maior para os candidatos do que o cidadão que “finalmente”, portanto, inopinadamente, decidiu ir votar. Não cessa de me espantar que a França tenha tanto candidato, tanto partido, tanto movimento, tantas frentes e haja tanta gente que se não se sente, de todo, representada. Estas pessoas, muitas vezes, decidem eleições. Uma das manobras clássicas nestas eleições é os candidatos mostrarem-se ao lado de políticos no governo ou com peso institucional internacional das suas famílias políticas. Para isso fazem estas vistas relâmpago. Marine Le Pen visitou agora o Líbano e o pormenor de se recusar a usar as roupas tradicionais islâmicas tem sido sublinhado. Uns veem nisso um ato de coragem de defesa dos valores ocidentais. Na França, alguns dizem que é um ato contraditório, uma vez que Marine Le Pen defende que os estrangeiros na França têm que respeitar os valores da França, ora, ela deveria também ter respeitado os do Líbano. Penso que as posições políticas de Marine Le Pen, face ao mundo moderno, se depauperizam. As ideias tradicionais cada vez mais se afastam das necessidades e desafios modernos, as linhas divisórias passam pouco por dicotomias obsoletas, mas — e isso não é irrelevante — a força da FN é a fraqueza de todos os outros. A FN é  obsoleta, mas os partidos e candidatos democratas são de uma fragilidade de cristal: corruptos, carreiristas, totalmente vazios ideologicamente, cínicos, mentirosos, contraditórios, ao serviço de interesses econômicos, ao serviço dos seus interesses, com discursos oficias de plástico, bonitões filhos do marketing, pagos por corporações, e toda a sorte de vícios humanos. O preço é elevado porque, por exemplo, vejo que há cada vez mais pessoas muito atentas, esclarecidas, informadas e com memória. Assim sendo, os velhos truques políticos do tipo “promete-se qualquer coisa atrativa e depois, no poder, faz-se outra” cada vez funcionam menos. Há um princípio universal e eterno que Marine Le Pen e a sua família política têm dificuldade em entender: em POLÍTICA um voto conta! PS: François Bayrou acaba, neste momento, de assinar um acordo de apoio a Emmanuel Macron. Frank Wan vive em Portugal. É ensaista, poeta, tradutor e professor.

Picasso, um jovem padre, inovação e mais de 10 bilhões de euros por ano em cooperativa de Mondragón

No cooperativismo da Espanha, o lucro é um objetivo, mas não está acima de tudo. A diferença salarial entre a base e o topo do organograma institucional é 4,5 a 6 vezes

Cinco sonetos de William Shakespeare traduzidos por Emmanuel Santiago

William Shakespeare (1564-1516), além de ter sido um dos maiores dramaturgos de todos os tempos, foi também um poeta lírico estupendo. Os seus sonetos, em especial, são até hoje paradigmas de excelência poética

A Grande Guerra Patriótica das Mulheres

Svetlana Aleksiévitch trouxe à luz as dores e as intimidades das mulheres soviéticas que estiveram nos campos de batalha da Segunda Guerra Mundial

Em “1985”, Anthony Burgess anteviu a submissão do Ocidente ao Islã

Mais que uma “resposta” ao “1984”, de Orwell, o livro de Burgess parte de observações pessoais, concretas, da vida política e social da Europa dos anos 1970, para mostrar a incapacidade do Ocidente de preservar a sua própria civilização

Polícia quer ouvir Major Araújo sobre ligação com suspeito de assassinato de Ana Clara

Deputado estadual garantiu ao Jornal Opção que informou Polícia Militar sobre caso, fornecendo dados e contatos telefônicos

Governo e Defensoria Pública atuam para melhorar atendimento jurídico aos presos

Termo de Cooperação pretende evitar que detentos fiquem presos além do tempo