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A recusa de Nero de “encarnar” num político brasileiro

No centro espírito, o marceneiro Zé Henrique Carraspana presencia uma discussão entre um médium e o célebre incendiário de Roma

Tempo de Covid: é melhor ficar em casa

Sair de casa para resolver as questões do dia a dia tornou-se um ato trabalhoso e estressante

O último Natal

Uma crônica sobre o vazio deixado pelas festas de Natal durante a pandemia

Outono no norte da Espanha

A chuva, quando cai suave, anuncia a chegada do outono, uma das estações mais bonitas na Espanha

Apagaram-se as luzes, perdi o show

Meu pai só gostava de músicas sertanejas, mas quando o cantor Roberto Leal aparecia na TV, ele me chamava para assisti-lo e ficava ouvindo junto. Ele sabia que aquele loirinho era o ídolo da filha de 15 anos

O que vivi ao ficar preso no elevador

Por Ton Paulo [caption id="attachment_221328" align="alignnone" width="620"] Foto: Reprodução[/caption] As portas do elevador estacionado no térreo já se fechavam quando, numa corrida rápida, coloco o braço no rumo do sensor a tempo de fazê-las reabrirem. Entro ainda ofegante no cubículo vazio não sem antes soltar um “que sorte!” em voz baixa. Sou apaixonado por elevadores vazios. O intervalo do térreo até o andar escolhido é sempre o momento oportuno do dia para dar uma ajeitada no cabelo no espelho, olhar as mensagens ainda não visualizadas e respirar. Mas não hoje. O elevador parou no meu andar, o 25º, mas as portas não se abriram. Espero, estranhando o delay, e nada. Alguns instantes depois, o ventilador de teto para. Era isso: eu estava preso em um elevador enguiçado. Desato a tocar o interfone, mas no lugar de uma voz humana, só recebo uma luzinha que pisca insistentemente. Do nada, me vem a palavra “claustrofobia” – do latim, claustro phobos: medo de lugares fechados. Eu não tinha aquilo, mas sentia que meus pulmões já puxavam o ar de maneira irregular. Sento, levanto, sento novamente, dou voltas só de meias dentro do cubículo de metal. Exatos uma hora e cinquenta minutos se passam até que um funcionário abre a porta, com o elevador já no térreo e me encontra no chão abraçado às minhas pernas. Ainda um pouco trêmulo e puxando o ar com força, caminho até a recepcionista: “Onde ficam as escadas mesmo?”

Quando poderemos emigrar para outro planeta?

Cientistas dizem que não é possível. Portanto, é muito melhor cuidar do belo planeta Terra

A invenção da memória

A memória é o inferno vivido agora. E a ele nos condenamos. Com a memória criamos tempo na mente. Então passamos a navegar em suas turbulências

Língua de doido

O percurso de casa até a escola infantil onde o Bê estuda dá cinco quilômetros e vamos conversando, eu, Bê e seu primo, por uns 15 minutos. Bê tem quatro anos de idade e seu primo completou recentemente seis anos. Os diálogos entre adultos e crianças são os mais improváveis por cada um ter seu mundo e suas preocupações.

Nesta semana, a caminho da escola, as duas crianças começaram um diálogo sobre o que pessoas de outra nacionalidade conversariam, mesmo que não entendam ainda as diferenças culturais e, principalmente de idioma.

Cada um sentado num banco longe do outro, usando o assento do meio para brincar com bonecos, intentaram uma cena cotidiana envolvendo russos, chineses e americanos. Cena que renderia, por força da história, numa realidade, conversas divertidíssimas. Os dois encenaram os contos assistidos em vídeos de internet.

Um dos bonecos gritou, em tom ameaçador, para o outro: "Xi lin piqui no ma hau", que deve ter alguma tradução do mandarim. Depois do grito, veio uma espécie de soco teleguiado, como uma arma nuclear, nas costas do outro boneco.

O primo não se rendeu. O boneco dele tinha um escudo místico que impediu a agressão do boneco que falava mandarim. Sem perder tempo, revidou com o "tacabum", o soco mais forte do mundo, segundo ele.

Mas sem sucesso, o boneco que falava mandarim e tinha uma cara de americano, com roupas militares, era também um mago com 1 mil anos de idade, que matou centenas de cobras venenosas e todos, frisa-se a quantidade, os dragões vermelhos de Goiânia, capital de Goiás. Por causa do boneco chinês não temos mais nenhum dragão andando pelas ruas da capital.

– Pai, qual língua o meu boneco tá falando? pergunta o Bernardo.

– Mandarim. Idioma que os chineses falam.

– Não é pai. É russo que os chineses falam.

– Ah sim, pode ser também. Sem problemas, é só aprender, né.

– Tio, não é verdade que os chineses falam americano? Ao invés de russo.

– Pode ser também. Se estudar, todo mundo pode falar o que quiser.

– Mas não é verdade também que os brasileiros têm o maior soco do mundo?

– Pode ser também.

– Ainda mais se forem os magos, né pai?

– Isso. Os magos são os mais fortes. E eles voam também.

– Tio, mas eles só voam se o cajado mágico estiver azul, que só fica de noite.

– Não é assim Leonardo –, responde meu filho, ao emendar: – os magos que tem o cajado mágico azul só voam quando falam russo. Eles são doidos.

– Sabe o mais é mais doido? Pergunto.

– O quê? Respondem os dois ao mesmo tempo.

Essas línguas de doidos que vocês estão falando. É um brasileiro com o soco mais forte do mundo que fala russo. É um mago americano que fala mandarim, mas só de noite.

– Não é pai. O mais doido é o guerreiro japonês, que luta capoeira e fala russo, e corre o mundo todo montado no dinossauro amarelo com capacete de motoqueiro na cabeça. Mas o capacete fica apertado porque o bico do dinossauro sai pela frente do capacete.

– Vocês dois são doidos. Respondo.

– Não somos não. Somos crianças.

– Esse idioma que os bonecos de vocês estão falando estão muito doidos.

– Tio, sabe o que é mais doido?

– O quê?

– Língua de doido.

Arqueologia da memória: perguntas podem ser mais seminais do que respostas

Cada um percebe ou sente o tempo (que é memória) em consonância com suas emoções. O poeta Charles Baudelaire o sentia com horror e amargura 

Na terceira margem do rio se foi um sonho

“Temi a ira de nossa mãe, mas obedeci, de vez de jeito. O rumo daquilo me animava, chega que um propósito perguntei: — "Pai, o senhor me leva junto, nessa sua canoa?" (Guimarães Rosa, A Terceira Margem do Rio)

Do vizinho

Alguns dias amanhecem irritados. E a gente nem imagina o motivo. Acordamos descansados, saudáveis, numa cama e, muito provavelmente, com um bom cobertor. Minha avó costumava falar que acordar vivo já era bom demais. Eu a entendo. Realmente é preciso estar vivo para acordar. Alguém que morre durante o sono, não acorda. E numa terça ou quarta-feira dessa semana passada tive uns desses dias amarelados. Igual uma pessoa com "sorriso amarelo". 

Foi um dia que tentei entender demais as pessoas. E quando estamos nessa fase deixamos de, literalmente, viver o dia. Ele passa como a última volta de uma corrida de Fórmula 1. Quando o homem levanta a bandeira branca o dia acabou. 

Tinha programado de levar meu filho para cortar o cabelo naquela manhã. Diferente de mim, ele estava animado. 

Saindo da nossa rua, de carro, em direção ao barbeiro, ele apoia o queixo na fileta entre o vidro e a porta e presta atenção na rua. De repente me chama com uma pergunta:

- Pai, de quem é essa casa?

- Não sei. 

A resposta sai ríspida. Mas ele nem liga. Sem entender porque o humor dos adultos está agradável num dia e insuportável num outro, ele já tem presciência dessas coisas da vida. Pergunta novamente, apontando para outra casa:

- De quem é aquela casa amarela?

De novo? O menino acha que eu sei o nome de todos os proprietários de casas em Goiânia. E a pergunta se repetiu inúmeras vezes no caminho de casa ao barbeiro. E no caminho de volta também. 

Ele queria saber o nome das pessoas que moravam em todas as casas que ele via: verdes, amarelas, cinzas, brancas, rosas. Não entendi se ele escolhia a casa pela cor ou pelo tamanho. Talvez por saber identificar a fachada da casa da tia e da avó, de cor, ele queria saber de quem era as casas alheias. 

Na rua de casa já. A pergunta torna a se repetir. 

- Não sei de quem são essas casas -, respondo menos irritado. Quase abrindo um sorriso para ele. Faltava pouco. Como dizem em Goiânia: "falta um beiço de pulga". Nunca ouvi essa expressão na minha cidade natal, Brasília. Acho impressionante a engenhosidade das pessoas que inventam essas expressões tão acuradas. 

- Pai, de quem é a casa mal assombrada? 

Uma casa pegou fogo há uns quatro meses na nossa rua. Bem próxima à minha, umas três de lado do meu vizinho, no máximo. Desde então não mora mais ninguém lá. Na casa mal assombrada. Só o vento ladeia as paradas queimadas fazendo aquele barulho clássico de filme de terror. Não tem mais telhado. Caiu no chão. As portas também. Algumas janelas se seguraram na parede. Todas as esquadrias de ferro ficaram chamuscadas pelo fogo. 

Também não sabia de quem era a casa mal assombrada. Agora, curioso sobre a necessidade em saber quem era os donos das casas, pergunto.

- E você sabe de quem são essas casas todas?

- Sei sim. 

- De quem são?

- Do vizinho. 

- Como assim?

- A casa amarela é do vizinho da casa verde, que é vizinho da casa mal assombrada, que é vizinho da gente. 

Que raciocínio fantástico. Na verdade, o meu entendimento da pergunta estava errado. Ele era muito mais óbvio do que aparentava. A resposta foi "beiço de pulga" que faltava para o sorriso abrir. E o dia amanheceu de novo num céu azul tão lindo quanto a resposta.   

 

 

 

A intolerância se escancara nas instâncias de Poder

Nem os poderosos escapam do preconceito e da discriminação de uma sociedade doente

E se um alienígena descobrisse o Brasil?

Um devaneio de quem vê terras indígenas mais ameaçadas do que nunca

Gota a gota

“Pensava na estupidez que havia sido voltar àquele café. Era tudo mais do mesmo, nada mudara, e esse era o problema” - leia o texto de Elisama Ximenes