Opção cultural

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Bariani Ortencio: sem “h” e sem “circunflexo” — eis um homem múltiplo por natureza

Waldomiro Bariani Ortencio é autor prolífico: escreveu mais de 50 livros, entre eles best-sellers como o “Dicionário do Brasil Central”, “Sertão Sem Fim” e “A Cozinha Goiana”

“Quando Éramos Adultos”, de Anne Tyler, discute as relações humanas e familiares

Mariza Santana

Como seria minha vida hoje se eu tivesse tomado decisões diferentes no passado? Creio que esse questionamento é muito comum entre as pessoas que passam dos 50 anos de idade e vivem a chamada crise de meia idade. Afinal, nesse período as pessoas começam a olhar para sua juventude e se perguntar se, caso tivesse feito algo diferente lá atrás, como seria agora o seu momento presente.

A escritora norte-americana Anne Tyler aborda essa temática com leveza e sensibilidade, no livro “Quando Éramos Adultos”. A protagonista é Rebecca Davitch. Aos 53 anos de idade, ela é viúva e matriarca de uma família numerosa — enteadas, filhas, netos e um tio do marido quase centenário; além de ser a proprietária e administradora de uma casa de eventos.

Beck, como é chamada por todos, é filha única. Na juventude, tinha um namorado com o qual pensava que se casaria e juntos seguiriam suas carreiras acadêmicas na universidade. Mas ao conhecer Joe Davitch, durante uma festa na casa de eventos da família dele, tem sua vida totalmente mudada. Ela se casa com o charmoso homem, ganha de cara três enteadas e uma família de muitos integrantes. Mas desiste dos sonhos de cursar a faculdade e se casar com o antigo amigo de infância.

Anne Tyler: escritora | Foto: Divulgação

Mais de 30 anos depois, Beck já está viúva (Joe morreu em um acidente automobilístico) e é a gestora do negócio familiar. Ela tornou-se ainda a guardiã da felicidade e do bem-estar dos integrantes da família. Mas o que aconteceu ao seu antigo namorado? - ela se pergunta. Rebecca sonha com um filho imaginário em um trem, que seria dela e do ex, como se fosse uma vida paralela, aquela que nunca chegou a acontecer.

Ao tentar contato com Will, o ex-namorado da juventude, descobre que ele está divorciado e é chefe do Departamento de Física da universidade. Mas será que é possível retomar naquele ponto do passado onde a decisão tomada mudou o rumo da nossa existência? É aconselhável não adiantar mais do que isso a respeito da narrativa para não atrapalhar o leitor.

No romance, Anne Tyler confirma o que o filósofo grego Heráclito disse na Antiguidade: estamos em constante mudança. O homem que entra em um rio não é o mesmo na próxima vez. Mudou o homem e a água da correnteza do curso d’água também não é mais a mesma.

“Quando éramos adultos” nos convida a refletir sobre o destino, a vida, as relações de afeto. E sobre como, sem perceber, ao longo do tempo nós vamos moldando-nos ao momento e ao ambiente, em constante evolução, também nos relacionamentos interpessoais, seja na família ou no trabalho.

Este não é o primeiro romance que leio da escritora norte-americana. Em 2021 escrevi para o Jornal Opção a resenha do livro “O Carretel de Linha Azul”, da mesma autora, sobre uma família comum da classe média e sua casa. A obra trata também das relações familiares, um tema sobre o qual ela escreve com maestria. Isso porque os romances da escritora contêm aqueles ingredientes cotidianos universais, mas tratados com uma leveza e uma sensibilidade que chegam a ser tocantes.

Anne Tyler é uma romancista, contista e crítica literária norte-americana, vencedora de um Prêmio Pulitzer de Ficção, cujas obras são marcadas pelos detalhes precisos da vida doméstica. Com 82 anos de idade, ela já publicou mais de 20 livros, com destaque para o romance “O Turista Acidental” (1985), que deu origem, em 1988, ao filme homônimo, estrelado por William Hurt, Katlleen Turner e Geena Davis.

Mariza Santana é jornalista e crítica literária. E-mail: [email protected]

Leia mais sobre Anne Tyler por Mariza Santana

https://jornalopcao.com.br/opcao-cultural/romance-de-anne-tyler-narra-a-historia-de-uma-familia-de-classe-media-e-sua-casa-com-varanda-361783/

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Outra gafe do biógrafo Benjamin Moser a respeito da escritora Clarice Lispector

Márwio Câmara

Recentemente, Benjamin Moser, biógrafo norte-americano de Clarice Lispector, publicou na revista “The New Yorker” uma possível entrevista “perdida” da autora de “A Paixão Segundo G. H.”, concedida ao Museu da Imagem e do Som (MIS), do Rio de Janeiro, no ano de 1976. Logo, diferentes portais de notícia, inclusive os brasileiros, replicaram a informação, para o delírio coletivo de uma massa de leitores que pôde se debruçar avidamente no mais longo registro público de Clarice feito para os entrevistadores Affonso Romano de Sant’Anna, Marina Colasanti e João Salgueiro.

O problema da notícia revelada por um dos maiores divulgadores de Clarice Lispector nos Estados Unidos e, possivelmente, no mundo, está justamente na falta de verificação da fonte ou, talvez, no ponto de vista textual, de vocábulos que primam por uma boa relação com a semântica do material discursivo.

Benjamin Moser: mais uma gafe sobre Clarice Lispector | Foto: Reprodução

Afinal, não se trata de uma entrevista rara, muito menos perdida, ao menos em língua portuguesa, uma vez que a mesma fora transcrita na íntegra em duas obras editadas no Brasil: a primeira em “Encontros: Clarice Lispector”, da Azougue Editorial, organizado por Evelyn Rocha, que resgata de forma cronológica um número relevante de entrevistas da escritora concedidas para a imprensa brasileira; e a segunda em “Com Clarice”, livro escrito por Affonso Romano de Sant’Anna e Marina Colasanti, autores que participaram do encontro realizado pelo MIS.

Como pesquisador da vida e obra da escritora ucraniana naturalizada brasileira, Benjamin Moser nunca teve acesso ou conhecimento de tais livros? Caso não, como se chega à confirmação cabal de que o assunto tratado seja de natureza genuinamente recém-descoberta? E, se realmente recém-descoberta, para qual público ou língua estamos falando?

Livro organizado por Evelyn Rocha, com apresentação do biógrafo Benjamin Moser, contém entrevista da escritora Clarice Lispector | foto: Reprodução

Existe uma profunda diferença ao anunciarmos uma entrevista como “rara ou inédita” para “rara ou inédita ao público norte-americano ou de língua inglesa”. Então seria um problema pura e simplesmente semântico? Um pequeno deslize cometido por parte de uma das maiores autoridades midiáticas no assunto Clarice Lispector?

De fato, não há como não falar de Benjamin Moser sem pensar em sua musa, considerada um dos nomes femininos mais relevantes da literatura brasileira e mundial. Porém, não é de agora que o biógrafo norte-americano vem apresentando certa contradição entre os pesquisadores clariceanos ante as afirmações voltadas ao seu material biografado.

Livro antecipa versão do biógrafo Benjamin Moser | Foto: Jornal Opção

Já é de conhecimento de alguns sua omissão em fontes verificadas que legitimam a autenticidade de seu discurso. Assim ocorreu quando ele afirmou na biografia “Why this word?” (em português, “Clarice,”) que Mania Krimgold Lispector, a mãe da autora, teria adquirido sífilis em decorrência de uma violência sexual sofrida na Ucrânia, antes de autoexilar-se com a família no Brasil. E, por conta disso, a paralisia que acometera parte de seus movimentos. Neste sentido, Clarice teria sido “concebida” para salvar a mãe de tal problema, seguindo a crença popular da época. A narrativa aponta uma certa frustração que a escritora teria carregado ao longo da vida, já que ela foi gerada, mas não conseguiu curar a matriarca da família Lispector de sua condição no momento do parto.

Com relação ao seu nascimento, algumas crônicas de Clarice apresentam uma versão medianamente próxima a de seu biógrafo, embora cheias de borrões e lacunas, dificultando a fundura dos detalhes. Logo, o ideal, partindo do ponto de vista de quem reescreve a história de alguém, é trabalhar com o campo da possibilidade e não da afirmação, já que não há documentos ou qualquer outra fonte que comprovem tais fatos.

É legítimo que o áudio da mais longa entrevista de Clarice Lispector ganhou uma edição remasterizada e encontra-se agora disponível para o grande público, o que foi muito bem pontuado no texto de Benjamin Moser para a “New Yorker”. Mas encará-lo como uma descoberta primária seria o mesmo que dizer que o Brasil fora “descoberto” pelos portugueses. Só que não.

Márwio Câmara é escritor, jornalista e crítico literário. Autor de “Solidão e Outras Companhias” (Oito e Meio) e “Escobar” (Moinhos). O texto foi publicado originalmente no “Rascunho” e é republicado no Jornal Opção com autorização do autor e do editor do jornal paranaense.