Por Elder Dias

Quem tenta ser neutro no espectro ideológico atual e não gosta da “Carta Capital”, do jornalista Mino Carta, frequentemente a chama de — ou pelo menos a considera — a “Veja” da esquerda. Isso porque, mesmo nos dias atuais, em que se posiciona claramente de lado contrário ao governo, a revista da Editora Abril continua sendo referência.
Na edição que circula esta semana, a “Carta” joga para o alto as possíveis conquistas do ajuste fiscal com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, à frente e aposta alto no fracasso do plano de estabilização e crescimento. A manchete é “Desajuste – como era previsível, a austeridade de Dilma faz água”.
Alguns podem dizer que “até” a “Carta Capital” perdeu a paciência com o Planalto. Na verdade, é uma sinalização de que a publicação quer o governo mais à esquerda do que tem se colocado. Quem não conhece a revista pode inferir isso; já quem conhece Mino Carta tem certeza.

[caption id="attachment_41171" align="alignright" width="620"] Professor Altair Sales Barbosa concedeu entrevista ao Jornal Opção em 2014 e abordou preocupações com desmatamento do Cerrado | Foto: Fernando Leite/Jornal Opção[/caption]
Na terça-feira, 21, o “Valor Econômico” publicou uma importante entrevista com a professora Mercedes Bustamante, da Universidade de Brasília (UnB). Com doutorado em Geobotânica pela Universidade de Trier, na Alemanha, ela fez um grave alerta sobre o Cerrado: desmatá-lo é como “fechar a torneira” da água do País. Em uma página inteira, de forma bem didática, ela descreve a complexa engrenagem que faz o bioma ser algo único, ao mesmo tempo de aparência tão rude e de essência tão sensível.
Pareceu um “déjà vu” da longa entrevista que o Jornal Opção publicou, em outubro do ano passado (edição 2048), com outra autoridade nacional em Cerrado, o professor Altair Sales Barbosa. O título, retirado da fala dele, foi bombástico e replicado nacionalmente por personalidades como o cantor Gilberto Gil, a atriz Letícia Sabatella e o jornalista Chico Pinheiro: “O Cerrado está extinto e isso leva ao fim dos rios e dos reservatórios de água”.
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Mercedes Bustamante (UnB): levando a causa do Cerrado à mídia | Foto: Wilson Dias/ABr[/caption]
Até hoje, a forte entrevista concedida pelo docente da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO) é um dos textos mais lidos no site do semanário. A diferença entre Altair e Mercedes é que a professora adota um tom mais ameno ao denunciar o que está sendo feito com o bioma. E a coincidência de linha de pensamento entre Altair e Mercedes só reforça o óbvio: ou o Brasil cuida pra valer do Cerrado e o recupera ou estaremos condenados à escassez de água e à morte dos rios. No Centro-Oeste, a “terra natal” dele, mas também com total reflexo no restante do País, especialmente no Nordeste e no Sudeste.
É importante observar qualquer espaço de destaque na mídia nacional para algo que vem do interior (periferia) do País. O Cerrado é o segundo maior ecossistema do Brasil e, por interesses vários – principalmente econômicos –, não foi incluído entre os que são considerados patrimônios nacionais, como a Amazônia, a Mata Atlântica e o Pantanal. Sem dúvida, falar da conservação dos mananciais e da recuperação de matas é algo que precisa ter espaço permanente nos meios de comunicação, que ainda perdem muito tempo com pautas pouco ou nada aproveitáveis, mas que dão audiência e visualizações. É questão de responsabilidade social.
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A estabilidade por meio de concurso público fez bem aos jornalistas da Agência Brasil Central (ABC), que sucede a extinta Agência Goiana de Comunicação (Agecom). Querem melhorar suas condições de trabalho — o que impactará depois em melhores condições de audiência para a emissora estatal. Ao mesmo tempo, ganharam a possibilidade de lutar por um jornalismo que fuja à pecha de “chapa branca” que o canal sempre teve. Pela mudança, organizam reuniões periódicas que estão se tornando praxe. O principal motivo das últimas, conta uma jornalista, é a falta de condições de trabalho. “Estamos trabalhando à beira do caos”, resume. Na semana passada, ela revelou, não havia rede para interligar os computadores na Rádio Brasil Central. “Isso significa que não compartilhamos nenhum conteúdo. Para fazer o jornal, por exemplo, temos de colocar as matérias num pen drive e carregar para o estúdio. Já houve dia em que todo o material produzido foi para o espaço.” Algo que, além de trabalhoso, nem sempre funciona — o pen drive pode, por exemplo, travar e causar pane ao vivo. “Eventualmente cai a internet e também ficamos sem impressora. O mesmo se repete na TV”. O saldo das reuniões, até o momento, é um documento que será encaminhado à presidência da ABC.
O futebol emociona as pessoas. Mas não deveria contagiar os profissionais da informação. Na segunda-feira, 20, a capa do “Pop” estampou a chamada, aqui reproduzida: “Com gol de falta no melhor estilo de Ronaldinho Gaúcho, Tigre venceu o Salgueiro e ocupa a vice-liderança do grupo.” A comparação a R10 — um talentoso ex-jogador, que agora aproveita o capital do passado para ganhar uma grana a mais, desta vez do perdulário Fluminense — é o de menos. O título da chamada é que foi a verdadeira pisada na bola: “Vila Nova vence no Pernambuco”. Colocar o artigo para se referir ao Estado de origem de Gilberto Freyre e Nelson Rodrigues é algo possível somente na linguagem coloquial — e, mesmo assim, não é algo tão comum dizer “no Pernambuco” como se usa “nas Alagoas” ou “nas Minas Gerais”, ou mesmo “no Goiás”.
A editora-chefe de “O Popular” está com férias esticadas e, segundo uma versão, também em missão para colher subsídios para o incremento do jornal. Algumas pessoas da redação apostam que a coisa é mais profunda: Cileide Alves estaria sendo fritada. “Isso aqui (a redação do Pop) está na mão do povo de São Paulo e do Rio Grande do Sul”, disse um jornalista. Questionado — para checar se era realmente isso que queria dizer — se a editora teria passado a ser como a “rainha da Inglaterra” (tem cargo, mas não tem poder), o repórter confirmou: “Fatíssimo.”

Discussão mostra que, 30 anos depois, parte do Brasil ainda não superou trauma da ditadura e faz ligação automática entre militarismo e repressão

Mesmo com apuração posterior do quadro real de um boato, a velocidade de propagação da notícia falsa e prejudicial é muito maior do que a da publicação de qualquer correção

A sexta-feira, 17, foi bem “animada” entre o deputado Rubens Otoni (PT) e o jornalismo online de “O Popular”. No início da tarde, o diário publicou em seu site: “Único petista da bancada goiana na Câmara, o deputado federal Rubens Otoni diz que, do ponto de vista político, o governo de Dilma Rousseff (PT) já acabou. ‘O caminho é sem volta. Ele [o governo] só subsiste institucionalmente’, afirma.”
A reação foi imediata. O deputado negou até que tivesse sido contatado pela reportagem do jornal e usou o Twitter para rebater o texto, com muita veemência, em vários posts: “Reportagem publicada no site do jornal @jornal_opopular com declarações do deputado federal Rubens Otoni (PT) não condiz com a verdade”; “O parlamentar jamais, em nenhum momento, se manifestou contra o governo da presidente da República, Dilma Rousseff (PT)”;
“Otoni acredita que Governo Federal (sic) já enfrentou as dificuldades e hoje vive a retomada do crescimento econômico em todos os níveis”; “O deputado tem hoje uma visão totalmente otimista do atual momento vivido no Brasil e entende que a pior fase já passou”; “Quem conhece o trabalho e a trajetória de Otoni sabe que o mesmo jamais diria algo como o relatado pelo O Popular (sic), mas sim o contrário”; “Jornalista de O Popular entrou em contato para admitir o erro, pediu desculpas pela matéria deturpada, confirmou que falou com outro deputado”.
Duas horas depois, o “Pop” publicou o que seria a “versão” do parlamentar (“Deputado Rubens Otoni esclarece sua posição”) para depois, no começo da noite, fazer de fato o mea-culpa: “Erramos: Rompimento de Cunha não prejudica governo, diz Otoni — O Popular pede desculpas ao deputado e aos goianos pelo equívoco involuntário.” Ao que um internauta replicou: “Então o jornal publica ‘equívocos’ voluntários?”. Alguns sites locais que fazem sensacionalismo político se aproveitaram da “bomba” para capitalizar visualizações.
Nesses tempos de crise política e acirramento dos movimentos da oposição é verdade que alguns governistas exageram quando falam em golpismo. Mas a coluna política de Eliane Cantanhêde tem sido praticamente monotemática no que diz respeito a questionamentos em relação ao futuro da presidente Dilma Rousseff. Pode não ser uma atitude deliberadamente “golpista”, mas a jornalista não esconde a torcida para que algo aconteça. Seu comportamento se assemelha ao de alguns comentaristas esportivos analisando partidas em que seu clube do coração esteja envolvido. Eliane é colunista do “Estadão” e tem seu comentário replicado em Goiás no “Pop”. Também é comentarista política no canal Globonews.
Vacilo grave na capa da edição da quarta-feira, 15, de “O Hoje”: na chamada para a matéria sobre o desaparecimento da auxiliar de enfermagem Deise Faria (chamada no título de “enfermeira”) depois de uma atividade religiosa, o texto diz que “ela sumiu após participar de um ritual do composto de hervas (sic) conhecido como santo daime”. Talvez o editor, de dieta, estivesse pensando em tomar um shake da Herbalife e tenha acrescentado o “h” à palavra por essa distração.
O segundo maior jornal especializado em economia deixou de existir na forma impressa. Fundado em 2009, o “Brasil Econômico” só perdia em influência para o “Valor Econômico”. A alegação é a mesma que vem afetando meios de comunicação de todo o País: dificuldades financeiras. A publicação é do conglomerado português Ongoing, que também é responsável pelo diário carioca “O Dia”, o tabloide “Meia Hora” e o portal iG. O grupo garante que esses veículos seguirão ritmo normal. A última edição do “Brasil Econômico” circulou na sexta-feira, 18. Com seu fim, 30 profissionais perdem vagas de trabalho.
A capa do Pop da quarta-feira, 15, estampou que “Seis entre dez taxistas já aderiram aos aplicados de celular”. Na matéria, entretanto, o olho falava em “70% da frota”. Tudo leva a crer que o editor da página interna se equivocou.

Nem sempre precisa ser “Correio Braziliense” para fazer uma capa marcante. A edição da quarta-feira, 8, do jornal “Extra” prova isso. O diário se caracteriza por ter muitas chamadas de capa, sempre com temas populares e popularescos. É o “Daqui” carioca — na verdade, é o contrário. Mas a priorização de um tema (o linchamento de Cleidenilson da Silva, de 29 anos, espancado até a morte amarrado a poste em um bairro de São Luís, no Maranhã) e sua alusão a outra imagem histórica (a de um escravo negro torturado em praça pública preso a um tronco) mostraram uma ponte ímpar e uma denúncia da estrutura do próprio País.
Lamentáveis foram os comentários de ódio na página do jornal na internet. “Muito bem, justiça feita com as próprias mãos”; “Imagem forte? Onde? Não vi nada demais”; “Estamos precisando muito aprender com os moradores de São Luís. O Rio de Janeiro precisa de vocês!”; “Parabéns, população de São Luís”; “Leve um desses pra sua casa, então!”. A proporção de acenos favoráveis à execução coletiva do bandido foi muitas vezes superior à da condenação do ato.
O Brasil precisa se repensar como sociedade. Não só com relação à violência de fato, mas também a violência no discurso, que ocorre predominantemente nas redes sociais. E os meios de comunicação precisam se reprogramar, literalmente, para não exacerbar, em nome de uma audiência suja de sangue, os ânimos já naturalmente exaltados de uma população acuada que clama por mais segurança.

Não se sabe até onde iria a fantástica trajetória do maior fotojornalista do mundo sem Lélia, com quem ele está há mais de 50 anos. A certeza é de que não teria sido tão longe