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Biografia mostra que depressão levou Primo Levi ao suicídio

[caption id="attachment_12128" align="alignleft" width="300"]Biografia revela o Primo Levi que livros autobiográficos não mostraram Biografia revela o Primo Levi que livros autobiográficos não mostraram[/caption] O judeu italiano Primo Levi foi levado para Auschwitz, mas sobreviveu. Em larga medida, por ser um químico competente. Ao sair, continuou trabalhando como químico e se tornou um dos mais poderosos escritores do século 20. “É Isto um Homem?” (Rocco, 256 páginas, tradução de Luigi Del Re) é um dos livros mais notáveis sobre o cotidiano dos indivíduos no campo de extermínio nazista. O leitor que quiser conhecer a história do campo localizado na Polônia talvez deva começar por esta obra séria e penetrante. Com seus livros sobre Ausch­witz — escreveu ficção sobre outros assuntos —, Primo Levi consagrou-se como um dos principais memorialistas, senão o maior, do horror nazista. Fica-se com a impressão de que sobreviveu para contar, para contar bem, com largueza de visão e certa implacabilidade. Porém, mesmo consagrado e respeitado praticamente em todo o mundo — Philip Roth é um dos mais apaixonados leitores de sua obra, que ajudou a divulgar e estabelecer nos Estados Unidos —, Primo Levi tinha depressão, às vezes chamada de “mal silencioso”. Em abril de 1987, aos 67 anos, Primo Levi matou-se, jogando-se da escada do edifício no qual morava, em Turim. Estava muito deprimido. Não houve testemunhas, mas ninguém o empurrou. A conclusão da perícia técnica de Turim é que se suicidou. Recém-operado de uma cirurgia de próstata, estava mal psiquicamente, e dizia não acreditar que algum dia ficaria bem (da depressão) e admitia que era muito difícil receber visitas. A enfermeira Elena Giordanino, que cuidava da mãe de Primo Levi, Ester, contou à polícia que o escritor estava “muito alterado. Às vezes o via sentado com a cabeça entre as mãos, pensando”. Estava angustiado. Lucia, mulher do escritor, relatou que ele estava “deprimido”. “Primo estava cansado da vida... Fizemos o possível para nunca deixá-lo só. Nunca. Mas só um momento foi suficiente.” Não é fácil contar a vida de Primo Levi, porque ele próprio revelou parte dela, aparentemente “encobrindo” detalhes, quem sabe por julgá-los sem importância, e não com o objetivo de falsificar. Era cioso com sua própria história. O inglês Ian Thomson, de 53 anos, embora desencorajado por algumas pessoas, decidiu pesquisar a vida do escritor com o objetivo de escrever uma biografia não definitiva, porque isto é ficção, e sim a mais ampla possível. Descobriu, por exemplo, que, mesmo antes de ser enviado para Auschwitz, na década de 1940, Primo Levi já sofria de fortes crises de depressão. O campo de extermínio por certo potencializou seu problema de saúde. Porém, mesmo com depressão, trabalhou como químico e se tornou um dos maiores escritores do século 20. A depressão levou-o à morte, mas não impediu que escrevesse bons livros, como “É Isto um Homem?” e “A Trégua” (Companhia das Letras, 360 páginas, tradução de Marco Lucchesi). A Companhia das Letras publicou a ótima coletânea “71 Contos de Primo Levi” (528 páginas, tradução de Maurício Santana Dias). A intenção do biógrafo não é demolir Primo Levi, até porque não há o que demolir, e sim compreender como este homem, atormentado a vida inteira, sobreviveu a Ausch­witz e escreveu uma obra literária e de testemunho a um só tempo bela, dolorosa e poderosamente informativa. O autor italiano é a prova de que o indivíduo — aquelas pessoas ímpares — faz a diferença em qualquer lugar. “Primo Levi” (Belacqva, 743 páginas, tradução de Julio Paredes), do escritor e jornalista inglês Ian Thomson, é uma biografia de alta qualidade, absolutamente imperdível. Citei trechos da história do suicídio, mas a biografia revela muito mais do que a morte, que, claro, não é o centro da vida de nenhuma pessoa. Vale a pena traduzi-la no Brasil. Denise Bottmann se candidataria a transpor a bíblia sobre Primo Levi para o português? A edição comentada saiu em Barcelona em 2007 e o texto original foi publicado em 2002 na Inglaterra. Quando lançada, “Observer” anotou: “Uma das melhores biografias literárias do ano... Soberba... Levi, acreditamos, a apreciaria”. Outra publicação, “London Review of Books”, adotou tom parecido: “Esta biografia é inteligente, brilhante, notável, excelente e importante”. Os adjetivos não são exagerados. As duas publicações têm razão: “Primo Levi” é um exemplo de biografia muito bem escrita, e com um rigor impressionante, digna das melhores pesquisas de scholars americanos e ingleses e da estirpe das excelentes biografias “Chatô — O Rei do Brasil”, de Fernando Morais, e “Nelson Rodrigues — O Anjo Por­no­gráfico”, de Ruy Castro.

Ataque a Miriam e Sardenberg seria uma espécie de ranço autoritário do petismo

A presidente Dilma Rousseff não faz um governo ditatorial e nem o PT é apóstolo da implantação de uma ditadura no Brasil. Tanto Rousseff quanto o PT, apesar de certa má vontade e relutância, aceitam as regras do jogo democrático. Aqui e ali, como se tivessem saudade das ideias comunistas, tentam alguma medida autoritária, com o objetivo de controlar instituições, como o Ministério Público e, mais recentemente, a Imprensa. Porém, pressionados, têm recuado. Teo­ricamente, o ranço autoritário do petismo está sob relativo controle. Mas há as “escapadas”. Na semana passada, o jornal “O Globo” revelou que dois dos mais qualificados jornalistas das Organizações Globo, Miriam Leitão e Carlos Alberto Sardenberg, tiveram seus perfis na Wikipédia modificados pela rede de internet do Palácio do Planalto. As análises econômicas de Miriam são apontadas como “desastrosas” e ela teria ligações com o empresário-banqueiro Daniel Dantas — duas informações, mais do que equivocadas, manipuladas. Sardenberg é citado como responsável por previsões erradas e como defensor de juros altos, supostamente porque tem ligações com o economista-chefe da Federação dos Bancos (Febraban), Rubens Sar­den­berg, seu irmão. Inicialmente, o Palácio do Planalto disse que não havia como investigar o caso, devido a uma questão técnica, porém, dada a repercussão na imprensa, recuou. A Secretaria-Geral da Presidência afirmou que vai investigar, mas é provável que não se chegue ao responsável. Cortar na própria carne, sobretudo em períodos eleitorais, não é muito comum. Uma pergunta não foi feita: por que dois jornalistas especializados em economia foram atacados e não jornalistas de política? A frase “é a economia, estúpido!”, do marqueteiro americano James Carville, explica os ataques a Miriam e a Sardenberg? Talvez. Politicamente, por ter a imagem de ser austera, mesmo que haja corrupção em seu governo, Rousseff não é malvista — exceto por alguns políticos, e não apenas do PMDB. No entanto, como a economia vai mal, porque praticamente não cresce — o crescimento este ano deve ficar abaixo de 1% —, o governo de Rousseff tem sido mal avaliado. Na mente conspiratória de alguns petistas, quem sabe sobretudo daqueles que trabalham no Palácio do Planalto, os analistas econômicos, ao explicarem o que está ocorrendo, estariam contribuindo para aumentar, se não a crise, a sensação de que a crise é muito mais ampla. Daí, portanto, os ataques. A falsificação dos perfis de Miriam e Sardenberg é grosseira e preocupante. Rousseff diz que nada tem a ver com isto, e é provável que não tenha mesmo, mas precisa controlar seus auxiliares. Senão o que parece apenas ranço autoritário, recaída ao estilo stalinista, terá de ser considerado como uma espécie de “ética” do petismo.

Alexandra Lima é a substituta de Paulo Lacerda na gerência comercial do Pop

[caption id="attachment_12143" align="alignleft" width="270"]Paulo Lacerda deixa a gerência comercial e vai cuidar  apenas da área de eventos Divulgação/Twitter Paulo Lacerda deixa a gerência comercial e vai cuidar apenas da área de eventos
Divulgação/Twitter[/caption] Uma mudança na gerência comercial do “Pop” foi feita com discrição — exceto por uma leve mexida no expediente. O nome de Paulo Lacerda, gerente comercial durante vários anos, não é mais apontado. Por intermédio do correio eletrônico, ele informou aos proprietários e diretores de algumas agências de publicidade que sua saída da gerência comercial, com a consequente transferência para a coordenação de eventos do jornal, não significa uma queda, como se especulou no mercado, e sim uma promoção. Publicitários falam em “queda para o alto”. Porém, como o Grupo Jaime Câmara vai investir maciçamente em eventos, com a possibilidade de constituir uma empresa para geri-los, é possível mesmo que não se trate de uma “queda”. A empresa, se criada, organizaria eventos do GJC e de outros setores da iniciativa privada. A um publicitário, do qual é amigo, Paulo Lacerda diz que está “satisfeito” e que “aprecia” cuidar de eventos. O que o GJC pretende fazer é transformar os eventos, cada vez mais, em motivos para aumentar o faturamento comercial. A nova gerente comercial, Alexandra Lima, é apontada como uma profissional experimentada. Ela trabalhou na empresa durante algum tempo, depois foi para Belo Horizonte, para acompanhar o marido, e retornou para Goiânia. Devido à “competência”, foi recontratada. No “Daqui”, foi uma das organizadoras das promoções, tidas como bem-sucedidas. Fora do mercado jornalismo, dirigiu o marketing das lojas Novo Mundo. Publicitários dizem que a ascensão de Alexandra não muda quase nada, mas admitem que o “Pop” precisava mesmo de um profissional “mais presente” e, quem sabe, “motivado”. Os publicitários dizem que a equipe do comercial permanece a mesma, assim como a política da empresa, que, com uma tabela comercial rígida, tem sido criticada pelos profissionais do ramo.

Biografia revela um Eichmann “maior” do que o que foi exibido em Israel e explicado por Hannah Arendt

O nazista estava incógnito na Argentina? “Eichmann nunca quis, nem mesmo como fugitivo, a obscuridade. Queria ser visto na Argentina como o símbolo de uma nova era" O Adolf Eichmann que foi julgado, condenado à morte em Israel e dissecado no livro “Eichmann em Jerusalém — Um Relato Sobre a Banalidade do Mal” (Companhia das Letras, 344 páginas, tradução de José Rubens Siqueira), da filósofa alemã Hannah Arendt, pode ter sido um personagem habilmente construído para tentar salvá-lo? É provável. O nazista, aliado de Heinrich Himmler, tinha o hábito, por assim dizer, de construir personagens (ou personalidades), adaptando-se aos ambientes. Hannah Arendt, na sua excelente e problemática obra, pode ter capturado, até à perfeição, “um” Eichmann, mas os “outros”, aparentemente, escaparam-lhe. Ao condenar Eichmann à morte, o tribunal israelense pode, compreendendo ou não o homem complexo e dissimulado, ter acertado mais do que a filósofa judia. “Adolf Eichmann — Historia de un Asesino de Masas” (Edhasa, 642 páginas, tradução de Silvia Villegas), de Bettina Stangneth, de 48 anos, é um livro extraordinário (inédito em português). Seu objetivo não é demolir a obra de Arendt, que a autora admira, especialmente pela coragem e inteligência da argumentação. Pelo contrário, quer ampliar sua compreensão sobre quem era Eichmann. Doutora em Filosofia com uma tese sobre Kant, a alemã Bettina procura entender e explicar Eichmann antes do fuzuê de Jerusalém. “Há uma perspectiva [sobre o nazista] que, em sua maior parte, permanece inexplorada: a esfera pública. Falta verificar o ‘fenômeno Eichmann’ antes de Jerusalém e, em consequência, a imagem de Eichmann nas diferentes etapas de sua vida.” Arendt não tinha como ter uma visão nuançada de Eichmann, porque em 1961, durante o julgamento, havia pouca documentação de qualidade sobre o nazista. Bettina afirma que agora há um “excepcional conjunto de fontes”. “Existem mais documentos, testemunhos pessoais e relatos de testemunhas da época referentes a Eichmann do que sobre todos os demais líderes nazistas.” [caption id="attachment_253349" align="aligncenter" width="620"] Adolf Eichmann: julgamento em Jerusalém | Foto: Reprodução[/caption] “Eichmann concebeu uma nova versão de si mesmo em cada etapa de sua vida, segundo o público e os fins que motivavam suas ações”, escreve Bettina. Na Argentina, ele escrevia e lia muito. À margem dos livros, fazia anotações críticas, às vezes irritadas. Os “Argentien-Papiere” são os textos do próprio Eichamm, escritos no exílio. Ele concedeu entrevistas a Willem Sassen (“Entrevistas Sassen”).e, assim, causar o mesmo impacto que já havia causado anteriormente. (...) Eichmann não era um pária na Argentina”. Na Argentina, Eichmann mantinha contatos com outros nazistas. Os nazistas “elaboraram planos subversivos, construíram com esmero uma rede de simpatizantes, se dedicaram inclusive a falsificar documentos com o objetivo de defender sua visão do ‘glorioso’ nacional-socialismo das críticas e evidências, e Adolf Eichmann era uma figura central entre eles. Era seguro de si mesmo, comprometido e consultado como especialista respeitado devido aos milhões de assassinatos, como quando era assessor da Reichssicher­heit­shauptamt [Escritório Central de Segurança do Reich]. ‘Eichmann na Argentina’ não é, portanto, uma peça unipessoal, e sim a crônica da surpreendente segunda carreira de um tenente-coronel aposentado das SS: sua carreira como especialista em história e, uma vez mais, expert na ‘questão judaica’”. Perspicaz, Eichmann construiu, posteriormente, a imagem de que estava totalmente escondido, isolado e afastado das lides políticas na Argentina. A história fantástica e heroica do sequestro executado pelo Mossad, sugerindo que foi uma operação mais complexa do que realmente foi, colaborou para o mito de que ele não tinha importância, de que não articulava e não se movimentada. “Eichmann nunca quis ser o inofensivo e pacífico Ricardo Klement, exceto quando ocupou sua cela na prisão de Israel. Na Argentina, assinava orgulhosamente as dedicatórias das fotos para seus camaradas como ‘Adolf Eichmann, tenente-coronel aposentado das SS’”, registra Bettina. Ao ler cuidadosamente as atas dos interrogatórios do nazista em Jerusalém, Arendt pode ter caído numa “armadilha” preparada meticulosamente pelo esperto nazista. “Ninguém leu as atas dos interrogatórios e o julgamento com tanto detalhamento. Mas foi assim que [Arendt] caiu na armadilha, porque Eichmann em Jerusalém não foi mais do que uma máscara. E se não logrou dar-se conta, era sumamente consciente de que ainda não havia compreendido o fenômeno como gostaria”, anota Bettina. Talvez seja possível dizer que Arendt compreendeu o Eichmann exibido por Eichmann, mas não o nazista muito mais complexo do que um mero funcionário administrativo, um cumpridor de ordens, quase uma besta quadrada. Bettina diz que é preciso admitir que mesmo pessoas sem inteligência extraordinária podem chefiar pessoas muito mais dotadas e, ao mesmo tempo, “enganar” magistrados, procuradores, jornalistas e filósofos muito bem preparados. Em Jerusalém, Eichmann, por vias indiretas, esculpiu com certa precisão a imagem de que era um funcionário do segundo escalão. “Só ante a Justiça de Jerusalém tentou aparecer como um funcionário menor, subalterno e substituível, sem nome e sem rosto. (...) Há numerosos indícios de que a partir de 1938 Eichmann não era um desconhecido nem lhe interessava ocupar um lugar nas sombras. Quando começamos a seguir esses indícios, aparece a clara imagem do homem que urdiu uma trama criminosa.” Eichmann não era Hitler, Him­mler, Göring ou Goebbels, mas foi uma figura importante na política — tida como parte central do ideário nazista — de extermínio dos judeus. Menor talvez seja a interpretação que fizeram de seu papel na história a partir do que relatou em Jerusalém, quando se tornou um culpado-quase vítima do nazismo.

Ex-editora do Jornal do Brasil se mata

Rozane Monteiro, de 47 anos, apontada como jornalista brilhante, matou-se na segunda-feira, 4. A profissional teve um aneurisma cerebral, conseguiu recuperar-se, mas, ao receber o diagnóstico de outro aneurisma, optou pelo suicídio. Profissional experiente, especializada em jornalismo nos Estados Unidos, ex-correspondente na República Tcheca, Rozane foi editora de Internacional do “Jornal do Brasil”, trabalhou em “O Dia” e, daí, foi para o “Extra”.

Sob o pretexto de explicar Getúlio Vargas, Lira Neto faz sólida radiografia da história do Brasil

[caption id="attachment_12116" align="alignleft" width="255"]O último volume da trilogia do balacobaco sobre o líder político Getúlio Vargas O último volume da trilogia do balacobaco sobre o líder político Getúlio Vargas[/caption] Está nas livrarias o último volume da trilogia biográfica que o jornalista e escritor Lira Neto escreveu sobre o presidente Getúlio Vargas. “Getúlio — Da Volta Pela Consagração Popular ao Suicídio: 1945-1954” (Companhia das Letras, 464 páginas. O livro impresso custa R$ 49,50 e o e-book sai por R$ 34,50). Nenhum personagem histórico sai incólume das biografias feitas com rigor e o máximo de objetividade possível. Porque todos os seres humanos, não apenas os políticos, são um poço de contradições. Pesquisador do tipo que avalia que Deus está nos detalhes, mas precisa-se do conjunto para avaliar, Lira Neto pesquisou minuciosamente e, depois, evitando o relatório puro e simples, escreveu um livro de história, que aqui ganha o nome de biografia, do balacobaco. Getúlio é exposto por inteiro e o resultado final é um político importante para a história do país, mas com seus (e dos aliados) problemas devidamente apontados. Os três livros (na verdade, um só dividido em três partes), mais do que uma biografia de Getúlio, é uma alentada radiografia da história brasileira, dos fins do século 19 ao século 20 (até 1954, quando o presidente, para não ser afastado ou não ter de enfrentar uma grave crise política, preferiu se matar. Sua morte abortou o golpe civil-militar... por dez anos). O site do Jornal Opção (www.jornalopcao.com.br) publica um capítulo do livro. Leia AQUI

Getúlio Vargas: Se for jornalista, mando enforcar

A tocaia dos repórteres em São Borja depois da queda de Getúlio Vargas em 1945 - Capítulo da biografia de Getúlio Vargas escrita

Lira Neto

Ao meio-dia, sentado no banco de cimento à sombra de uma árvore – um secular cinamomo –, Getúlio ouviu o ronco do bimotor Junkers que se lançou em voo rasante sobre o dorso de uma coxilha e, em meio à nuvem de poeira vermelha, aterrissou na improvisada pista de pouso da Estância Santos Reis, a cerca de 20 quilômetros do Centro de São Borja. O ex-presidente, com botas pretas de cano alto, largas bombachas e camisa branca de mangas arregaçadas, levantou-se para recepcionar os passageiros, recém-chegados de Porto Alegre.

Era 1o de novembro de 1945, Dia de Todos os Santos, quinta-feira. Na véspera, no mesmo local, o próprio Getúlio fizera idêntico desembarque – mas do Lockheed Lodestar presidencial da Força Aérea Brasileira (FAB), proveniente do Rio de Janeiro, após esgotado o prazo de 48 horas concedido pelos militares para que abandonasse o Palácio Guanabara.

“Entrei para o governo por uma revolução, saí por uma quartelada”, queixava-se.

O irmão Protásio – um dos três homens que acabavam de descer do pequeno Junkers – era quem administrava o local e respondia pela saúde financeira da fazenda, dedicada à compra e venda de gado de leite e de corte. A casa propriamente dita era simples, térrea, pintada de amarelo. Na área central, após a sala, ficava o quarto de Getúlio, mobiliado apenas com a cama rústica, uma mesa redonda, a cadeira de balanço e dois criados-mudos adornados com vasos de flores naturais. Em vez de armários, caixas e malas desafiveladas, espalhadas pelo chão. Sobre uma das mesinhas de cabeceira ficava a pasta escura de couro, trazida do Catete, com o brasão nacional, dourado, em alto-relevo. Na outra, repousavam o estojo de óculos, o relógio de algibeira e um bloco de papéis de carta com o timbre do gabinete da Presidência da República. Nas gavetas, frascos de remédios e bisnagas com artigos de perfumaria. Como fazia questão de estar sempre bem barbeado, o estojo amarelo com as lâminas Schick e o aparelho dourado Injector Razor ficava logo à mão. Esquecido em um canto, jazia o saco de tacos de golfe – inúteis, já que não havia, na estância, lugar apropriado à prática do esporte favorito. O gramado rústico era prerrogativa das ovelhas que pastavam logo ali em frente.

Apesar do estilo espartano, o visitante que vislumbrasse o jardim e o pomar bem cuidados, o cata-vento gerador de força e o laranjal em flor teria uma boa impressão de Santos Reis. Se não havia luxo, sobrava esmero. Mas o observador não se deixasse enganar pela placidez e bucolismo da paisagem. O clã se encontrava em estado intestino de guerra. A política, mais uma vez, se colocara no centro de cizânias familiares.

Um dos filhos de Getúlio, Manuel Antônio – o Maneco Vargas –, entrara em rota de colisão com o tio Protásio. Maneco vinha trabalhando dia e noite pela instalação, em São Borja, do diretório do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Protásio, com semelhante afinco, pelo fortalecimento do Partido Social Democrático (PSD) no município. Em vez de dividirem o eleitorado de modo equânime, como era desejo de Getúlio, tio e sobrinho vinham disputando graus e áreas comuns de influência, trocando descortesias, numa autofagia que ameaçava extrapolar a esfera íntima para produzir efeitos colaterais mais amplos.

A propósito, naquela tarde, Protásio trazia consigo à estância, como companheiro de voo, o correligionário Valter Jobim, ex-promotor público em Passo Fundo, ex-secretário estadual de Obras Públicas e candidato declarado do partido ao governo do Rio Grande do Sul. Os dois vinham discutir o quadro eleitoral com Getúlio. Uma das primeiras medidas do governo de transição foi revogar o decreto 8063, aquele que, assinado por Getúlio em outubro, antecipara as eleições para governadores fazendo-as coincidir com o pleito presidencial. De acordo com o decidido pelo presidente interino José Linhares, dali a um mês, 2 de dezembro, além dos deputados e senadores que comporiam o futuro parlamento, os brasileiros iriam às urnas para escolher “apenas” o novo presidente da República (as eleições para governador e para as assembleias legislativas só se realizariam em 1947).

O brigadeiro Eduardo Gomes, concorrendo pela União Democrática Nacional (UDN) – frente ampla que se convertera no baluarte de todos os antivarguistas, reunindo desde os mais aguerridos liberais à chamada esquerda democrática –, era apontado pela imprensa como franco favorito. O outro candidato, general Eurico Gaspar Dutra, enfrentava dificuldades para obter até mesmo a adesão de certos quadros do próprio partido, o PSD, constrangidos em sufragar o nome de um dos maiores responsáveis pela derrubada de Getúlio.

“Todos sabemos, os teus amigos, que votar no Dutra é tomar um purgante de óleo de rícino. É necessário fazê-lo, ainda que repugnante”, ponderava o pragmático Protásio Vargas, tentando convencer o irmão a também tapar o nariz e engolir o nome do general como único remédio para impedir a chegada dos udenistas ao poder.

Getúlio, reticente quanto à questão, recebeu Jobim e Protásio com sorrisos e abraços. Poucos passos atrás da dupla, divisou um terceiro indivíduo, a quem não reconheceu. O estranho se aproximou e fez questão de se apresentar. Era jornalista. Viera de carona no avião, como representante dos jornais Folha da Tarde e Correio do Povo, do mesmo grupo de comunicação, a Companhia Jornalística Caldas Júnior, da capital gaúcha. Desejava uma entrevista exclusiva com Getúlio, a respeito da conjuntura política. Seria, nesse caso, um furo de reportagem. A primeira fala do ex-chefe de Estado após colocar os pés na pequenina São Borja – cidade então com menos de 35 mil habitantes, ruas sem calçamento, casas sem água encanada, eterna porta de entrada para o contrabando a partir do rio Uruguai, marco geográfico da fronteira do Brasil com a Argentina.

Com um gesto polido, Getúlio estendeu a mão ao repórter. Pediu-lhe desculpas, mas não iria dar entrevistas a ninguém. Tudo o que tinha a dizer já dissera no dia anterior, por escrito, numa nota concisa aos gaúchos, remetida exatamente ao Correio, pelo rádio, ainda a bordo do avião da FAB que o trouxera a Santos Reis: “Ao sobrevoar o solo do Rio Grande, dirijo-lhes esta mensagem de saudação, declarando que já não sou mais prisioneiro senão do afeto do povo.” Era tudo. Nada mais tinha a declarar.

Ato contínuo, Getúlio dirigiu-se com Protásio e Jobim para o interior da casa, deixando o jornalista sozinho, ao pé da porteira que dava acesso ao jardim. A reunião que se seguiu, a portas fechadas, estendeu-se por cerca de uma hora e meia, sendo interrompida apenas para o almoço, servido à base do tradicional churrasco de ovelha. Durante o cafezinho, o repórter ousou se aproximar da mesa para tentar de novo entabular a almejada entrevista.

Getúlio fez de conta que não entendeu a intenção dele, e lançou uma pergunta ao jornalista, invertendo os papéis de entrevistado e entrevistador: o decreto que assinara pouco antes de ser apeado do poder, instituindo o salário mínimo para os profissionais de imprensa, satisfizera as aspirações da categoria?

Sem dar tempo para o homem abrir a boca, emendou:

“Um dos motivos pelos quais os donos de jornais se voltaram contra mim foi justamente esse decreto…”, sorriu.

Protásio aproveitou a deixa e convidou o enviado especial da Folha e do Correio a se retirar, pois a reunião reservada iria prosseguir, tarde adentro.

“Esta conversa entre os senhores é para deliberar o rumo político a seguir?”, insistiu o jornalista, dirigindo-se a Getúlio. “Depois de tudo o que aconteceu, o senhor aceitará que o PSD continue a dar apoio à campanha do general Dutra, candidato oficial do partido à Presidência da República?”

Getúlio, presidente de honra da legenda, limitou-se a um comentário lacônico: “O PSD do Rio Grandesaberá honrar os compromissos assumidos.”

“E, do ponto de vista estritamente pessoal, o que o senhor acha? O que pretende fazer agora, após ter assinado o termo de renúncia?”

“Mas eu não assinei nenhum termo de renúncia…”, contrapôs Getúlio. “Do ponto de vista pessoal, estou aguardando os desdobramentos dos fatos”, disse, encerrando o assunto.

Não era exatamente uma entrevista. Mas eram declarações relevantes. O jornalista pediu licença a um funcionário de Protásio para utilizar o telefone da fazenda, a fim de enviar um primeiro comunicado à redação. Com alguma sorte, a informação chegaria a tempo de sair estampada na edição vespertina.

De fato, quando a dita reunião foi dada por encerrada, perto do fim da tarde, os leitores da capital gaúcha já tinham em mãos, nas esquinas de Porto Alegre, os primeiros exemplares da Folha, ainda cheirando a tinta fresca, com a estrondosa manchete:

DECLARA O SR. GETÚLIO VARGAS

QUE NÃO ASSINOU

NENHUM DOCUMENTO DE RENÚNCIA

Retransmitida pelo telégrafo ao Rio de Janeiro, a notícia foi interpretada, na cúpula dos quartéis, como uma ameaça de que Getúlio não se submeteria à deposição. O general José Pessoa Cavalcanti de Albuquerque, presidente do Clube Militar, decidiu expressar a inquietação dos colegas de farda e providenciar uma nota à imprensa da capital federal, na qual afirmava, peremptório: “Como participante dos acontecimentos que culminaram com a substituição do governo da República, julgo do meu dever esclarecer a opinião pública sobre a verdade dos fatos.” O título do texto não deixava brechas para ilações, dubiedades ou possíveis reviravoltas: “O sr. Getúlio Vargas não renunciou, foi deposto.”

Ao final da conversa com Protásio e Jobim – e sem ainda ter conhecimento da repercussão de suas palavras ao jornalista gaúcho –, Getúlio decidiu cumprimentar o grupo de são-borjenses que se aglomerava no terreno em frente à casa. O repórter, seguindo-o pelos calcanhares, descreveu a cena, numa segunda mensagem enviada por telefone à redação.

“O sr. Getúlio Vargas recebe afavelmente inúmeros amigos e admiradores. Parece-nos um homem que não dá a mínima impressão de haver vivido estes intensos quatro dias que modificaram completamente o ambiente político brasileiro”, escreveu o jornalista, que infelizmente não teve seu texto creditado pelo periódico gaúcho – a reportagem foi publicada sem assinatura, como era comum à época. “O ex-presidente conserva seu bom humor e sua jovialidade, que já se tornaram proverbiais. Quando uma oportunidade se apresenta, não perde a ocasião e lança um dito espirituoso, que festeja ruidosamente com os circunstantes.”

Ao entardecer, quando as visitas já haviam partido e as gargalhadas cessado, o repórter teve a oportunidade de flagrar o verdadeiro estado de espírito de Getúlio. Sempre acompanhado de um gato angorá branco que lhe seguia os passos, ele caminhava em seu estilo característico, as mãos postas para trás, o olhar perdido. Fumava então o quinto charuto do dia. Longe da curiosidade pública, trocou o característico sorriso por um semblante mais grave: “Ia pensativo, algo melancólico, olhando para um ponto qualquer que nós não enxergávamos, ou fitando o sol que se escondia, no horizonte plano de São Borja.”

Ao seperceber vigiado, Getúlio lançou um aceno gentil ao repórter: “Vamos caminhar?”

Agora íamos caminhando, lentamente, em direção a um açude, distante uns 800 metros da casa da fazenda. E como de costume – talvez para não dar tempo a que se fizessem perguntas embaraçosas – o sr. Getúlio Vargas começou de novo a entrevistar-nos. Ele seria um bom jornalista…

Já não tinha aquela preocupação de mostrar-se jovial e alegre. Deixou que algumas rugas se instalassem, indiscretamente, na testa. E podemos jurar que mal ouvia as respostas banais que dávamos às suas perguntas também banais. O sr. Getúlio Vargas, afinal, sempre foi um bom jogador.

A certa altura, Getúlio intensificou o bombardeio de perguntas. O que se dizia em Porto Alegre a respeito de sua queda? O que pensava o povo? E os trabalhadores gaúchos? Houve manifestações de rua? Discursos a favor e contra? O repórter, percebendo a oportunidade de granjear a simpatia e a confiança do interlocutor, tentou resumir-lhe a situação em poucas pinceladas.

O interventor gaúcho, tenente-coronel Ernesto Dornelles (primo de Getúlio), assim como todos os governantes regionais nomeados pelo Estado Novo, fora afastado do cargo e substituído por um representante do Judiciário – no caso do Rio Grande, assumira o desembargador Samuel Figueiredo Silva. O secretariado de Dornelles, em bloco, aguardava demissionário a efetivação dos respectivos substitutos. Servidores em funções de confiança, idem. Os prefeitos também estavam em compasso de espera, tendo posto os cargos à disposição, por ordem do novo governo. O general Salvador César Obino, comandante da 3a Região Militar, sediada em Porto Alegre, apoiara o golpe, mas advertira a tropa que se mantivesse alheia a possíveis provocações e se abstivesse de comentários políticos. As ruas estavam calmas. O povo, em cautelosa expectativa. Getúlio ouviu a síntese sem dizer palavra. Ao final, o repórter tentou provocá-lo a sair do mutismo. Sondou-o a respeito da conversa que mantivera ao longo da tarde com Protásio e Jobim. O que tinham decidido, afinal de contas? Os dois pessedistas haviam conseguido convencê-lo a declarar apoio à candidatura do general Dutra?

Mais uma vez, preferiu manter-se em reserva. Apenas voltou a sorrir. O jornalista, imperturbável, resolveu abordá-lo por outro flanco. Comentou que dois meses antes, em 2 de setembro, data na qual se esgotara o prazo de desincompatibilização para os aspirantes ao pleito, muitos getulistas haviam se decepcionado com o fato de o então ditador não ter se licenciado do Catete para registrar-se candidato, construindo as condições legais para permanecer no poder.

“Mas eu não desejava mesmo continuar…”, desdenhou Getúlio.

Os vinte passos seguintes foram dados em novo silêncio. Getúlio Vargas levou o charuto aos lábios. E a mancha de uma baforada pensativa ficou por alguns instantes flutuando entre nós.

“Eu já estava cansado”, disse ele. “Governar mais seis anos… Num período difícil…”

Chegáramos à beira do açude. E o charuto do presidente, jogado com displicência, foi agitar as águas mansas.

[…]

Depois disso, veio o silêncio definitivo. Também o sol desaparecera. E na meia-luz melancólica daquela tarde moribunda, o ex-presidente Vargas perdeu, mais uma vez, o olhar na planície imensa.

A foto que ilustrou a matéria mostrou um Getúlio de sobrancelhas arqueadas, o olhar circunspecto, a comissura dos lábios voltada para baixo. “Aí está o homem que governou o país durante quinze anos”, dizia a legenda. “A fisionomia parece sublinhar uma preocupação.”

Na manhã seguinte, sexta-feira, 2 de novembro, Getúlio cumpriu o ritual que repetiria dali por diante todos os dias, após o alvorecer, em Santos Reis. Pulou da cama às 6 horas, deixando para trás o travesseiro baixo e mole, em cuja fronha se lia o monograma bordado com as iniciais GV. Provou o primeiro gole de chimarrão ainda no quarto, de pijama. Fez a barba, tomou um banho frio, vestiu as bombachas e seguiu para a mesa do café. Depois, mandou selar um cavalo e saiu a campear pela estância.

Não foi sozinho. Entre os companheiros de montaria, três petebistas gaúchos serviram-lhe de escolta. O primeiro era o filho Maneco. O segundo, o primo Dinarte Dornelles, diretor da Caixa Econômica Federal no Rio Grande do Sul. O terceiro, um jovem advogado e fazendeiro de São Borja, amigo da família. Seu nome: João Belchior Marques Goulart – mais conhecido, desde a infância, como “Jango”. A ligação dos Goulart com os Vargas era antiga. O pai de Jango, Vicente Goulart, estudara com Getúlio nos tempos da escola primária do professor Fabriciano Júlio Braga em São Borja. Mais tarde adquirira, em sociedade com Protásio, um frigorífico na cidade vizinha de Itaqui. O empreendimento, todavia, não prosperou. Quando Vicente morreu em 1943, de câncer, quase falido, o filho assumiu os negócios familiares e, por meio de sucessivos empréstimos bancários, passou a comprar gado e arrendar terras ao redor da propriedade original. O método do rapaz fazer dinheiro era tão simples quanto infalível: deixava as vacas no pasto para a engorda – nas chamadas “invernadas” – e depois as revendia para abate, com dilatada margem de lucro. Ao oferecer os próprios animais como garantia, levantava novos créditos e assim, sucessivamente, multiplicava o capital a cada operação. A esse tempo, com 26 anos, calculava-se que Jango já fosse dono de cerca de 15 mil cabeças de gado bovino e outras 5 mil de ovinos, avaliadas então em torno de 10 milhões de cruzeiros (cerca de 16 milhões de reais, em valores atualizados).

Bon vivant, dono do próprio avião Cessna e de um automóvel Ford – um dos únicos dez carros de toda São Borja –, Jango vivia rodeado de belas mulheres. Dado a festas e outros prazeres, contraíra sífilis, doença sexualmente transmissível, o que lhe deixou como sequela uma lesão no joelho esquerdo. Daí o fato de ter manquitolado de uma perna o resto da vida, embora a família preferisse difundir a versão de que o problema fosse oriundo de uma queda de cavalo ou, em outra variante mais prosaica, de um coice de burro. Bem apessoado, dono de uma conversa fácil, não demorou que João Goulart fosse cortejado não apenas pelas moças casadoiras do lugar, como também pelos caciques políticos de São Borja. Protásio tentou arrastá-lo para as hostes do diretório municipal do PSD, mas a amizade com Maneco Vargas influenciou sua decisão de cerrar fileiras no PTB.

A cavalgada daquela manhã serviu para Getúlio debater com Jango, Dinarte e Maneco a atitude do partido em face das eleições presidenciais que se aproximavam. O trio compartilhava de uma mesma opinião. À falta de candidato próprio, o PTB deveria se abster de apoiar qualquer uma das duas candidaturas militares já lançadas. Mas, no âmbito federal, os petebistas estavam rachados. Parte do diretório nacional também defendia a tese da abstenção, posição defendida por dois dirigentes do alto escalão partidário, Paulo Baeta Neves e José de Segadas Viana, respectivamente presidente e secretário-geral da comissão executiva. Havia uma parcela considerável de militantes que preferia, ao contrário, apostar numa aliança estratégica com o PSD, para tentar preservar inalteradas – em um possível governo Dutra – as conquistas da legislação trabalhista.

Sempre que instado a se pronunciar sobre o assunto, Getúlio desconversava: “Meu desejo é permanecer calado até as eleições, para não aumentar a confusão já existente.”

Na volta da campeada, perto da hora do almoço, o grupo foi surpreendido com a presença de outro repórter no galpão da fazenda. Em meio à roda de peões de bombachas e facas na cintura, destacava-se um indivíduo de paletó e gravata, o bloquinho de anotações em punho. Em princípio, Getúlio não atinou para a identidade daquele homem miúdo, de cabeçorra quadrada e máquina fotográfica a tiracolo.

“Bom dia, dr. Getúlio, permite bater uma chapa?”, perguntou o homenzinho, apontando-lhe a objetiva.

Houve um instante de tensão. Maneco olhou para o pai, em estado de alerta. Jango e Dinarte se mostraram igualmente apreensivos.

“Pode bater...”, sorriu, entretanto, Getúlio, desanuviando o ambiente. “Quem é mesmo o senhor?”, perguntou, ao descer do cavalo.

O jornalista apresentou as credenciais. Era Edmar Morel, repórter dos Diários Associados, o grupo de jornais de Assis Chateaubriand, o Chatô. Getúlio não o conhecia pessoalmente. Mas é evidente que já ouvira falar do sujeito. Morel, a esse tempo, era uma lenda viva da imprensa nacional. Suas reportagens lhe haviam rendido notoriedade e prestígio, mas também poderosos desafetos. Entre estes, os censores do Departamento de Imprensa e Propaganda, o DIP. No extenso currículo de proezas jornalísticas, Morel entrevistara o tristemente célebre Manso de Paiva, o assassino do senador gaúcho Pinheiro Machado, morto com uma punhalada nas costas em 1915, no Hotel dos Estrangeiros, no Rio de Janeiro. A entrevista, porém, fora censurada pelo Estado Novo, sob a justificativa de que o mau exemplo do criminoso poderia enfiar caraminholas na cabeça de algum outro “lunático” e, dessa forma, pôr em risco a integridade física do então ditador, Getúlio Vargas.

Morel também tivera problemas com os censores do DIP ao denunciar as precárias condições de vida a que foram submetidos os chamados “soldados da borracha”, os nordestinos despachados à Amazônia para garantir o abastecimento de látex ao exército norte-americano durante a Segunda Guerra Mundial. Outra matéria de sua autoria, ilustrada pela foto de um menino disputando com um vira-lata os restos de comida de uma base militar dos Estados Unidos em Pernambuco, também provocara incômodos aos burocratas da censura. Entre tantas reportagens de impacto, o feito então mais recente de Morel fora a cobertura do último dia do Estado Novo, realizada de dentro de um dos tanques de guerra que, em 29 de outubro, cercaram os jardins do Palácio Guanabara.

Getúlio, é claro, entendeu a situação. Chateaubriand mandara um dos melhores repórteres dos Diários Associados a São Borja para retratar o drama de um inimigo caído em desgraça. No dia seguinte à derrocada do regime, em artigo intitulado “O triste fim de Policarpo Vargas”, Chatô tripudiara: “As circunstâncias que cercam o ocaso do sr. Getúlio Vargas oferecem a sensação do fenômeno da decrepitude de um homem.” Em tom de deliciada vingança, o texto zombara do fato de Getúlio ter supostamente alimentado a ilusão de que as massas tomariam as ruas em protesto contra sua destituição. “Entretanto, não apareceu nenhum ‘Trabalhador do Brasil’, ou mesmo um simples malandro dos morros cariocas, para se despedir dele no Aeroporto Santos Dumont”, aguilhoara Chatô.

Nitidamente aborrecido, Getúlio fechou o cenho para Morel. O jornalista, sem perder a desenvoltura – e para forjar uma intimidade inexistente –, informou que o estava aguardando ali desde o início da manhã, após enfrentar uma maratona iniciada dois dias antes, no Rio de Janeiro. Na quarta-feira, desembarcara em Porto Alegre e, durante 48 horas, viajara de trem, sacolejando por mais de 500 quilômetros, até alcançar a estação de São Borja. De lá, chegara à estância a bordo de um automóvel alugado. Estava exausto, comentou Morel.

“O senhor não cansa quando faz um passeio demorado desses pelo campo?”, perguntou.

“Não! Para descansar o espírito, nada como cansar o corpo”, cortou Getúlio.

“Os jornais estão publicando que o senhor não assinou nenhum documento pedindo renúncia…”, prosseguiu o repórter.

Getúlio apanhou a cuia de chimarrão das mãos de um peão da fazenda, chupou a bomba de prata e, após alguns segundos de estudado suspense, resmungou a resposta entre os dentes: “Isso não tem importância…”

Para não aborrecer de vez o entrevistado, Morel mudou de estratégia. Pediu licença para ficar em Santos Reis alguns dias, a fim de acompanhar a rotina do mais novo e ilustre morador da fazenda. Pretendia realizar uma série de “reportagens apolíticas” – conforme definiu –, para oferecer aos leitores da capital federal um relato completo da nova vida daquele que fora, até há bem pouco tempo, o homem mais poderoso do Brasil.

“Em qual rede de jornais o senhor disse mesmo que trabalha?”, perguntou Getúlio, com entonação irônica, dando-lhe as costas e deixando escapar um muxoxo.

Morel, em ato reflexo, levantou a câmera e o fotografou no momento exato em que caminhava jardim adentro, cruzando o portão em direção à casa.

A imagem de Getúlio de costas, pisando duro, estamparia a capa do carioca Diário da Noite, acompanhada da seguinte manchete: ZANGOU-SE COM O REPÓRTER.

Maneco Vargas, ao perceber que o pai estava sendo fotografado em situação desfavorável, pegou Morel pelo braço e convidou-o a se retirar.

“Faça o favor!”, rugiu Maneco, apontando a saída.

A imprensa do Rio de Janeiro fez um escarcéu. Os principais jornais do país – alinhados à UDN e à candidatura do brigadeiro Eduardo Gomes – afirmaram que as longas conversas de Getúlio com representantes regionais do PSD e PTB em São Borjafaziam parte de uma insidiosa manobra política. Havia rumores de que pessedistas e petebistas gaúchos disputavam entre si o direito de lançar a candidatura do ex-presidente ao Congresso, informação que gerou uma maré de editoriais, manchetes e artigos indignados.

“Mal apeado do poder, com uma semana apenas entre o Guanabara e São Borja, já está o ditador numa inquietação reprovável”, condenou o Diário da Noite, que lamentava o fato de os militares não terem deportado Getúlio e lhe cassado os direitos políticos logo após tê-lo afastado do Catete, da mesma forma que ele próprio fizera, em 1930, com o ex-presidente Washington Luís.

“O sr. Getúlio Vargas está sendo imprudentíssimo”, avaliou o Diário. “Enquanto suas futricas em Santos Reis não oferecerem possibilidades de ameaça à marcha normal da redemocratização, poderá beber em paz doméstica sua cuia de chimarrão. Mas, desde que se transforme ou pretenda ser elemento de perturbação política, não lhe restará outro caminho senão, ainda uma vez, correr novos riscos.”

O recado era explícito. Os jornais de Chatô garantiam que uma “fonte digna de crédito”, situada na alta cúpula do novo governo, trabalhava com a hipótese de ordenar a deportação de Getúlio a qualquer instante.

Quanto à possível candidatura do ex-presidente a um cargo eletivo, o udenista mineiro Virgílio de Melo Franco, interrogado pelos jornalistas, disse pôr tal hipótese na conta de uma insolente piada.

“Uma gargalhada sacudirá o país”, previu Melo Franco, caso o ex-ditador esboçasse uma volta ao cenário político.

Ao batalhão de repórteres que depois disso continuaria a lhe bater à porta em Santos Reis, Getúlio repetiu a mesma ladainha: não era candidato a nada. E não estaria disposto sequer a montar uma banca de advocacia em Porto Alegre. Os políticos e advogados podiam dormir sossegados. Ele não lhes faria mais nenhuma concorrência.

“Na verdade, vou fazer concorrência é aos pecuaristas de São Borja”, disse a outro jornalista do Correio do Povo, prometendo dedicar-se unicamente à vida do campo durante o tempo que ainda lhe restasse de vida. “Não aceitarei, em hipótese alguma, a designação de meu nome, seja para o que for.” Chegara a hora de se preocupar apenas com bois e vacas, garantiu.

O jornalista Geraldo Romualdo, enviado de OGlobo a Santos Reis, ainda conseguiu lhe arrancar uma declaração por escrito, datilografada e assinada, que foi reproduzida na primeira página do jornal de Roberto Marinho: “Simples cidadão, não sendo candidato a nenhuma função pública e tendo como única arma meu título de eleitor, envio ao povo brasileiro minha comovida saudação, dizendo-lhe que agora, mais do que nunca, estou do seu lado.”

Nem todo mundo levou a sério a formalização do compromisso. Em editorial, o Diário da Noitevoltou a fustigar:

A experiência desses últimos quinze anos, longa experiência que desvendou muitos dos mistérios da personalidade do ex-chefe de governo. […] Agora, em São Borja, após seus longos passeios e horas de meditação, o grande alquimista do despistamento, técnica em que certamente jamais será superado, reafirma seu desinteresse pela política e, consequentemente, pelo poder. […] Volta o sr. Getúlio Vargas à velha técnica: nada desejar, nada querer, desejando e querendo tudo.

A partir daquele momento, qualquer estranho que chegasse a Santos Reis seria barrado à entrada da estância. Para ultrapassar os limites da porteira, teria que apresentar a carteira de identidade. O documento era então confiscado, para que Maneco Vargas o levasse até o pai, a quem cabia pessoalmente filtrar o acesso de eventuais bisbilhoteiros.

“Se for jornalista que vem aí, mando enforcar”, passou a ironizar Getúlio, sempre que outro avião descia na estância.

Leia Mais: Sob o pretexto de explicar Getúlio Vargas, Lira Neto faz sólida radiografia da história do Brasil

Hugo Brockes troca publicidade pela literatura e lança romance de qualidade

Hugo Brockes, de 77 anos, trocou de amor: a publicidade pela literatura. Na terça-feira, 12, às 18 horas, ele vai lançar o romance “O Réveillon de 3001” na Livraria Nobel, no Shopping Bougainville. A surpresa? Brockes, além de escrever bem, é dotado de uma imaginação criadora impressionante. Trata-se de literatura tradicional de qualidade. Trecho do livro: “... nunca gostei da ideia da eternidade, a existência aprisionando a vida na prisão da monotonia. Penso como aquele obscuro poeta, do início do século 21, seu contemporâneo: ‘Jamais suportaria a vida num horizonte infinito, eterno, monótono, brumoso e frio. Eu exigiria o direito sacrossanto e incoercível de praticar suicídio na minha vida eterna’”. (Hugo é publicitário, poeta, prosador, roteirista e ator. Como ator, fez peças publicitárias impagáveis para o Café Cairo. Vale a pena recuperar os filmes da publicidade, na qual brilhava o “Ferrugem”, para divulgá-los na internet.)

Grupo RBS, que edita o jornal Zero Hora, demite 130 funcionários

O maior grupo de Comunicação do Sul do Brasil, o RBS, dono do jornal diário “Zero Hora” e da emissora que retransmite a programação da Globo, demitiu, na semana passada, 130 funcionários. O presidente da empresa, Eduardo Meltzer, afirma que não há crise financeira, e sim busca de “produtividade” e “eficiência”. Meltzer comentou, por meio de uma nota, que o grupo tem 6 mil funcionários, aparentemente sugerindo que 130 demissões não são significativas. Numa entrevista ao Portal Imprensa, o presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Celso Schröder, criticou as demissões — “é um problemaço” — e a concentração da comunicação no Sul do país nas mãos do Grupo RBS

O dia em que a PM goiana deu diploma de médico ao pirata Jack Sparrow

Notícia satírica sobre overdose de maconha, que usou personagens de filmes no texto, foi reproduzida em portal do grupo antidrogas da Polícia Militar e “caiu na rede”. Não é a primeira vez no ano que instituições policiais sofrem com pegadinhas

Jornalistas “engajados” colaboram para fazer do debate político um Fla-Flu

[caption id="attachment_11645" align="alignleft" width="620"]imp2 Guilherme Boulos, Reinaldo Azevedo e Rodrigo Constantino: guerra verborrágica em “debate” com argumentos que mais se assemelham a uma discussão de torcedor na arquibancada[/caption] “Quando abro o jornal, sintonizo a rádio ou ligo a TV, quero que o jornalista me relate o que aconteceu de fato. Nada mais que isso. A partir do que eu ler, ouvir ou ver, formo minha própria opinião.” A frase vem de um amigo, professor, em uma conversa sobre a função da imprensa. Ele critica a batida expressão “formador de opinião”, muitas vezes atribuída a quem trabalha na imprensa. Não dá para negar que jornalistas tenham acesso a um volume maior de informações que a média das pessoas sobre determinado assunto e, portanto, boa capacidade potencial de análise, o que não quer dizer que se torne uma fonte incontestável — por exemplo, para falar da minicrise diplomática entre Brasil e Israel será sempre melhor um PhD formado no Instituto Rio Branco que tenha uma comunicabilidade eficiente na mídia do que o melhor dos jornalistas. No melhor dos cenários, um jornalista é o que se convencionou chamar de especialista no genérico. A expressão vale para a discussão de teorias políticas. Nesse sentido, um “debate” entre três colunistas de grandes veículos de comunicação da mídia nacional chamou a atenção na semana passada: Guilherme Boulos, professor, filósofo, coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e colunista da “Folha de S. Paulo” contra Reinaldo Azevedo e Rodrigo Constantino, jornalistas e colunistas de “Veja”. Um embate claramente carregado de ideologias, mas de argumentos com a profundidade de um pires. A baixa qualidade do “debate” foi captada pelo jornalista Rodrigo Hirose, que, em seu perfil no Facebook, comentou: “Guilherme Boulos (MTST e Folha) e Reinaldo Azevedo (dispensa apresentações) protagonizam em dois dos maiores veículos de comunicação um debate de altíssimo nível. Um diz que o outro baba e delira. Outro diz que um é ‘vigarista’ e ‘mau caráter’. Talvez essa seja mais uma pista pra entendermos os motivos da chamada ‘mídia tradicional’ ter cada vez menos leitores/telespectadores /ouvintes.” É bom ressaltar que Reinaldo, assim como Constantino — que entrou depois no debate acrescentando o adjetivo “pulha”, para qualificar Boulos — talvez sejam reconhecidos mais por causa da repercussão de seus blogs do que exatamente pelo que sai no papel do jornal. Em um dado momento, passaram a ter fãs. Ter fã é o mais grave dos alertas para qualquer jornalista. Mais sério do que isso, formou-se uma legião de seguidores em torno de suas figuras, o que é um sinal claro de que não restou lauda sobre lauda de jornalismo no que exprimem. Como eles, há vários outros jornalistas nas redes sociais que também se orgulham de ter um lado. Ter lado é algo que nada tem de ilícito ou condenável. Orgulhar-se disso, entretanto, já deixa sob ressalvas tal profissional. E observar o que fazem na prática comprova que, mais do que “ter lado” e se “orgulhar”, muitos se mostram torcedores fanáticos daquilo que apoiam. Acreditaram, de fato, que devem ser, mais e mais, “formadores de opinião”. E, assim como Reinaldo e Constantino cooperam para transformar a discussão política em Fla-Flus pelo time da direita, a esquerda também tem seus “artilheiros” nas redes sociais, como Paulo Henrique Amorim e Palmério Dória. Também eles “têm lado”. O que não se sabe — ou melhor, se sabe — é até que ponto isso converge para o bem do que se chama de jornalismo. É preciso ressaltar que todo veículo tem, mais do que o direito, o dever de mostrar qual é sua linha editorial. Assim, nenhum leitor vai ver um editorial de “Veja” apoiando a estatização nem corre o risco de ver “Carta Capital” destacando os benefícios de incentivar o agronegócio. Mas fazer jornalismo posicionado é bem diferente de “torcer” por meio das informações de que dispõe.

Um exemplo positivo na relação complicada entre repórteres e professores universitários

Entrevistar professor universitário não é tarefa fácil. Primeiro, porque a maioria tem restrição a falar algo fora do que considere de sua alçada acadêmica. Ou seja, um antropólogo que trabalhe com etnias indígenas tende a não se supor habilitado para falar de questões de gênero, por exemplo. Para o jornalista que “quer” um entrevistado, antropólogo é antropólogo e isso basta. Pesando os dois lados, o bom senso indica, de fato, que se fale daquilo sobre o qual se tenha domínio. No caso, o melhor que o repórter tem a fazer é pedir à fonte uma indicação mais avalizada para tratar de sua pauta. Um segundo ponto é que mestres e doutores têm, não raramente, alguma queixa sobre as reportagens em que sejam citados. Muitos deles, então, passam a ficar ainda mais arredios à imprensa, por acharem que os jornalistas não confirmam, no papel, aquilo que eles realmente quiseram dizer ao serem entrevistados. Por isso é preciso ressaltar o comentário do professor Dione Antonio de Carvalho de Souza Santibanez, coordenador do Núcleo de Estudos sobre Criminalidade e Violência da Universidade Federal de Goiás (UFG). Ele foi fonte da matéria “Morte do garoto Bernardo: quais os limites da crueldade humana?”, do repórter Frederico Vitor, do Jornal Opção. Ao ler a matéria, comentou: “É muito bom ler um texto e ver que o repórter foi cuidadoso para escrever exatamente aquilo que a gente repassou.” Da nova safra de repórteres da área política, Frederico formou-se pelas Faculdades Alves Faria (Alfa) e integra a equipe do jornal há dois anos.

E a criancinha “trollou” a repórter

[caption id="attachment_11635" align="alignleft" width="300"]imp1 Imagem do vídeo viral nas redes: jornalista é surpreendida por resposta sincera de menino que preferia jogar videogame a estudar[/caption] Circula, principalmente por meio do aplicativo WhatsApp, um curto vídeo, de dez segundos, em que uma jornalista fala ao vivo sobre a falta de professores em uma determinada escola. En­quanto caminha com algumas mulheres e uma criança, ela relata o problema e resolve emendar com a fala de um menino de cerca de 5 ou 6 anos, a quem, então, dirige o microfone: “...porque não dá para ficar em casa só jogando videogame, né João?” A criança responde, de bate-pronto: “Dá!”. Pautas ao vivo são sempre algo que deixa o repórter com um frio na barriga. Mas muitos profissionais, no afã de se mostrarem simpáticos, alinhados com um jornalismo mais “solto” colaboram para fatalidades como essa. Per­guntar a uma criança dessa idade se ela quer brincar ou ir para a escola, imaginando que ela responderá que prefere estudar, é algo no mínimo temerário. Na gíria das redes, o menino “trollou legal” a repórter.

“O Globo” prova: vaidade mata antes da hora

Depois de Mario Sergio Conti fazer a “bilocação” do técnico Luiz Felipe Scolari, os experientes Ancelmo Gois e Ricardo Noblat também mostram dons sobrenaturais, ao “executar” Ariano Suassuna

Jornais “culpam” Minas pela construção de aeroporto em fazenda de tio de Aécio Neves

Para quem se interessa em enxergar mais profundamente como se elabora uma notícia de acordo com a linha editorial do veículo, Luciano Martins Costa, do portal “Observatório da Im­prensa”, fez uma boa explanação em sua coluna na semana passada. Ele se utilizou, como exemplo, da denúncia sobre a construção de um aeroporto, no valor de R$ 14 milhões, pelo então governador de Minas Gerais Aécio Neves (PSDB) em terra que pertenceria à família dele. No texto “Não foi o governador, foi Minas”, Costa posiciona os três maiores jornais impressos do País — “Folha de S. Paulo”, “O Estado de S. Paulo” e “O Globo” — como tendo um candidato preferencial à Presidência — o próprio Aécio, hoje senador. A tática, segundo ele, é criar na própria notícia as condições propícias para a defesa, já que a denúncia é jornalisticamente inevitável. Assim, o termo que se dirigiria diretamente ao gestor responsável pela obra (“Aécio” ou “governador”) é trocado por outro, “Minas”, um ente abstrato. Resume Costa: “A começar pelos títulos: tanto na Folha como no Estado, não foi o então governador quem autorizou o uso de dinheiro público no interesse da própria família: foi ‘Minas’. Ora, ‘Minas’ não pratica atos de ofício, ‘Minas’ não assina autorização para obras com ou sem licitação. Quem assina é o governante, e o governante é agora candidato a presidente da República.” O que a “Folha”, o “Estadão” e “O Globo” fizeram é, no entanto, algo mais do que frequente no impresso. É uma figura de linguagem chamada metonímia, que faz a gente tomar “um copo d’água” em vez de “um copo com água”.