Opção cultural

“O Tribunal”, de Álvaro Alves de Faria, de 1971, traz um pungente relato sobre a opressão; sua reedição em 2015 mostra a importância atual da obra, quando vozes se levantam para defender o regime de exceção da época

Raymond Carver é o autor das minúcias da vida, da violência e dos sentimentos que bombeiam nosso sangue, o criador da atmosfera cotidiana mais próxima da realidade comum, onde lateja a existência por ela mesma

Toda mulher que empreende uma obra literária exerce sob o domínio da arte da escrita uma literatura feminina? Por que ainda hoje as resenhas literárias e as listas dos grandes prêmios divulgam mais escritores do sexo masculino?

"Com o pé na estrada" não seria o mais apropriado para descrever as viagens intercontinentais, mas se aplica como expressão meio surrada, mas ainda válida para mostrar ao caminhante que quando se ganha mundo, dos pés vêm-nos as melhores metáforas da viagem.

Antes de compor “A Casa”, música que se encontra em seu álbum infantil “A Arca de Noé”, o grande poeta e compositor carioca passeou pelo rio do riso inglês nas invenções poéticas do artista britânico do século 19

Ver os 114 filmes que vêm abrindo janelas na mostra que acaba na quarta-feira é uma missão impossível, mas há vários recortes possíveis, dentro dos quais pode-se falar de tudo, da qualidade estética à participação da mulher

A história de um homem que vivia na miséria e descobriu um tipo de grandeza que lhe colocaria em contato com a vida nababesca dos ricos, mas os riscos estavam na mesma altura das facilidades

Rodrigo Hasbún cria uma distopia contemporânea, traço característico de quase todas os romances do século 21, metaforizando os lugares não atingidos ou desfeitos, como os sonhos, os ideais e até a família

Um diário de viagens incluiria a América como meu destino preferencial, caminho regular que a vida me ofereceu e eu de bom grado o tomei: onde “duas estradas separavam-se num bosque e eu —//Eu segui pela menos viajada//E isso fez a diferença toda.”



Fontes: Livro de RATHER, Dan. e Elliot Kirschner, Algonquin, 2017. Sobre Tocqueville, ler a resenha de Felipe Pimenta, neste link.

Em três sessões na programação de “O Amor, a Morte e as Paixões”, são exibidos filmes produzidos por membros do CAM, criado em 1977, responsável pela formação de uma boa safra de cineastas e críticos de cinema em Goiás

Em caráter de pré-estreia, “O Turista no Espelho” tem exibição na mostra “O Amor, a Morte e as Paixões” dentro da mini-mostra em comemoração aos 40 anos do Cineclube Antônio das Mortes

Lançado em 2017, “Folhas Secas sob Meus Pés” fala da transformação da mulher da infância à velhice, exaltando a vivacidade do amadurecimento, em que, ao contrário das folhagens outonais, as seivas da vida não se secam

Com cores e aromas do verão em uma Itália dos anos 80, o filme finalista de quatro categorias do Oscar 2018, dirigido por Luca Guadagnino, encena o drama do despertar da sexualidade na adolescência

Diretora fez o que pôde, mas não salvou “Aos Teus Olhos” do roteiro fraco, que sob o pretexto de que a história deveria ficar em aberto deixou o personagem principal à deriva
[caption id="attachment_116636" align="alignnone" width="620"] Em “Aos Teus Olhos”, Daniel de Oliveira faz Rubens, um professor de natação infantil acusado de dar um beijo na boca de um aluno[/caption]
Carolina Jabor já conseguiu mostrar que é capaz de dirigir um grande filme, ou seja, que se tiver em mãos um roteiro grandioso não vai estragá-lo. Mas não é o caso de seu segundo longa “Aos Teus Olhos”, que peca pela ineficiência do plot. Sob o pretexto de que a história fica em aberto, que o filme é sobre a verdade líquida, o roteirista, que tinha em mãos um argumento interessante, deixou o personagem principal à deriva.
“Aos Teus Olhos”, em exibição na mostra “O Amor, a Morte e as Paixões” é bem dirigido e muito bem editado. Tem um ritmo criador de tensão. O modo como as cenas exploram ora o uso de planos abertos, ora mais fechados para captar as sutilezas, ou cenas abertas com tomadas rápidas, às vezes um pouco mais longas, e cortes precisos entre uma cena e outra, tudo isso cria de fato um movimento pra frente, que impulsiona a ação, mas chega uma hora que é preciso mais que isso. Onde se busca força? No roteiro, que vai sugerir ou guiar a intenção do diretor.
O filme narra a história de Rubens (Daniel de Oliveira) um professor de natação infantil que se vê em meio a uma acusação de beijar um aluno na boca. A mãe diz que o menino contou pra ela esse caso, e, a despeito de falta de provas (por ter sido no vestiário, onde não há câmeras de vigilância) ou um aprofundamento da questão, a mãe expõe o caso no grupo de pais de alunos do WhatsApp. E aí não se tem mais controle. As acusações começam, e aumentam.
Rubens por sua vez, não reage às acusações. O personagem de Daniel de Oliveira é um instrumento usado para se chegar a um fim. É um indivíduo sem alma, que não reage diante de toda a trama de intrigas que vai se construindo em torno dele, nem diante da solidariedade da namorada, como se ele estivesse ali, naquele plot, apenas para que se costurasse um problema moral.
A subjetividade do personagem não é trabalhada, não há profundidade. Daniel de Oliveira ficou amarrado a um fio tênue de interpretação, que não sustentou seu peso. Faltou ao roteiro uma solução para o dilema ético, para que o problema estético fluísse no imaginário do espectador. A única reação possível no fim do filme é dizer algo como “a realidade é isso mesmo”. É muito pouco.
Transcendência
Ainda sem ver o filme, conversei com Carolina Jabor muito rapidamente na coletiva de imprensa, na quarta-feira à tarde. Ela disse uma coisa interessante. Disse que a arte deve ser algo que desperte emoções, mas que transcenda a realidade. “Acho que fazer arte passa por um desejo de transcendência”, diz.
Não há a transcendência desejada pela diretora em “Aos Teus Olhos”. Ficou no rame-rame da ambivalência moral. Jogou para o público a insolubilidade do problema. E quem fez isso foi o roteirista. O ponto de vista neutro de uma história não funciona bem em arte (cinema é arte, certo?), só em jornalismo (teoricamente), sobretudo quando o desfecho fica em aberto sob o pretexto de que o público é quem deve concluir.
Como diretora, Carolina Jabor avança sobre o primeiro filme, “Boa Sorte”, que contava com a sorte de ter sido escrito por Jorge Furtado. Do ponto de vista da direção de cena e de atores, este é melhor que aquele. O ritmo de “Aos Teus Olhos” lembra um pouco o de “Whiplash: Em Busca da Perfeição”, talvez por mérito da edição. Mas há uma direção mais madura neste filme, a meu ver.
O filme não é ruim. Mas também não é bom. Falta alguma coisa. Falta o personagem principal se mexer. É como a Vênus de Milo, aquela escultura grega antiga, magistral, no formato da deusa do amor, em exposição no Museu do Louvre, em Paris, que foi encontrada sem os braços. Com a diferença de que o escultor fizera os braços da peça dele, que se quebrariam com o passar tempo. Já o roteirista de “Aos Teus Olhos” não conseguiu fazer os braços, as ramificações de atitude e subjetividade de seu personagem principal.
Serviço
Filme: “Aos Teus Olhos” (90')
Mostra: O Amor, a Morte e as Paixões
Local: Cine Lumière Bougainville
Ingresso: R$ 15,00
Sessão
12/02/18 - Segunda-feira
Sala 5 – às 17:15

Filme conta a história de um professor de natação infantil acusado de beijar um aluno na boca, e é massacrado nas redes sociais como pedófilo; segundo a diretora, lançar um filme sobre o tema nesse momento é uma oportunidade de debater a questão
[caption id="attachment_116630" align="alignnone" width="620"] Carolina Jabor com o ator Daniel de Oliveira (d) e o curador da mostra Lisandro Nogueira: “Fazer cinema é um trabalho que passa pelo desejo de transcendência” | Foto: Gilberto G. Pereira[/caption]
Já houve um tempo em que Carolina Jabor detestava ser reconhecida como filha do Arnaldo. Mas era impossível desfazer a associação. Mesmo sobrenome, mesmo escolha profissional, e Jabor, o pai, é uma figura indissociável da própria agitação cultural brasileira desde pelo menos 1968, o ano que nunca acabou.
Em vez de bater o pé, Carolina resolveu trabalhar. Há 20 anos ela vem construindo uma carreira que começou como assistente de direção com Andrucha Waddington, ao mesmo tempo que fazia filmes publicitários na produtora em que ela e Waddington são sócios, a Conspiração Filmes. Em 2014, dirigiu seu primeiro longa-metragem, “Boa Sorte”, com um elenco de peso, como Deborah Secco, no papel principal, Fernanda Montenegro, Enrique Diaz, Felipe Camargo e Gisele Fróes.
Agora ela lança seu segundo longa, “Aos Teus Olhos”, na mostra “O Amor, a Morte e as Paixões”, nesta noite, às 21 horas, no Cine Lumière Bougainville, com a presença da diretora, que após a exibição, junto com Daniel de Oliveira, o protagonista do seu filme, conversa com o público.
Além desta noite, “Aos Teus Olhos” ainda poderá ser visto por algumas sessões mostra adentro. Num bate-papo informal no hall de entrada do Cine Lumière Bougainville, a diretora e o ator falaram com os jornalistas sobre o filme e sobre o momento atual do cinema brasileiro.
“Aos Teus Olhos” conta a história de um professor de natação infantil que é acusado de beijar um aluno na boca, e é massacrado nas redes sociais como pedófilo, sem que as pessoas de fato tenham acesso a algum tipo de prova.
Dos filmes
Segundo Carolina, seu filme já estava pronto quando surgiu a onda de moralismo e denúncias contra a Exposição Queer Museu, no Santander Cultural em Porto Alegre, o Museu de Arte Moderna de São Paulo, no caso da garotinha levada pela mãe em uma exposição de um homem nu, e no caso do MASP com uma exposição sobre a história da sexualidade. “É uma oportunidade de debater a questão. É interessante lançar um filme sobre o tema em um momento como este”, diz Carolina.
Mas, para além do debate social, a julgar pelo seu primeiro longa, “Boa Sorte”, o novo filme de Carolina terá muito a oferecer em termos de linguagem. “Boa Sorte”, com roteiro de Jorge Furtado, tem uma trilha sonora que imprime um silêncio incrível, quase japonês.
A diretora diz que a comparação é interessante, e não é a primeira vez que ouve isso, embora não se sinta influenciada pelos filmes dos japoneses de que ela gosta, como Takashi Koizumi e Kenji Mizoguchi. “A trilha de ‘Aos Teus Olhos’ é ainda mais silenciosa, porque uso mais a ambiência natural. No outro ainda havia algumas músicas pops”, diz.
Ao falar sobre o sentido da arte que ela faz, Carolina procura analisar o significado da obra de ficção como algo que desperte emoções sem ser piegas, algo que transcenda a realidade. “Acho que passa por aí, por um desejo de transcendência”, diz. “O artista tem de trabalhar o tempo todo perseguindo a tradução daquilo que quer contar.”
Impacto da telona
A obsessão parece ser também o que persegue Daniel de Oliveira. Ator de cinema e de televisão, poucas vezes sobe no palco para fazer teatro. Mas diz que gosta da dramaturgia. Não faz muito teatro, porque não sobra tempo.
Desde o começo, ele conseguiu engatar um trabalho no outro. O ator fez seu primeiro filme aos 20 anos, e nesses 20 anos de carreira cinematográfica (hoje ele tem 40 anos) já fez 20 filmes, na média de um por ano. “Fui chamado pra fazer cinema, e fiquei impactado pelo set de filmagens. Depois, gostei também de assistir ao filme pronto na telona, e falei ‘quero fazer muito, cinema’”, diz.
Às vezes pula algumas temporadas, quando mergulha na televisão, mas depois lança três, quatro filmes de uma só vez. Este ano, por exemplo, além de “Aos Teus Olhos”, Daniel de Oliveira vai lançar ainda outros dois, “Morto Não Fala” e “Dez Segundos”, em que faz o papel do boxeador brasileiro Eder Jofre, campeão mundial de boxe.