Opção cultural

Sagas como "Subterrâneo" incluem no universo literário juvenil reflexões sobre os rumos da humanidade

O objetivo do evento é democratizar a arte fotográfica, ampliando o acesso aos bens culturais do museu na sua pluralidade, criando novos olhares e releituras, contribuindo para uma maior fruição entre o espaço museológico e a comunidade

Com a expansão da China, é antevisto que o fazendeiro chinês e seu contraposto entrem em conflito, certamente a produtividade como um dos campos de batalha

Valéria V. Valle (especial para o Jornal Opção)
A estranheza é um luxo para poucos. O leitor da obra “Breve Segunda Vida de uma Ideia” fica estagnado entre a face do assombro e os ecos do sobrenatural abraçados ao crível da narrativa. O livro de Solemar Oliveira, seu “cemitério de palavras”, circula a roda enigmática do destino e impulsiona a leitura abismal de construções místicas, míticas e surreais.
Nessa breve única vida de leitor, saboreia-se a delícia desses contos que se realizam e nos deixam “Exilados” no rolar infinito da rocha de Sísifo, lendo os textos na sequência linear e, em seguida, de trás para frente, perseguindo essa pedra do sem parar. O início invertido, do final para o começo, em nada obstrui o que o leitor deseja ver: as entrelinhas do infiltrado, do estrábico e do inusitado.
Somos convidados desses contos inexplicáveis que se lançam em si mesmos e nos deixam no embaralhamento da busca de sentido real. Como sujeitos da leitura, projetamos nossas sensações e frustrações nesse universo, ao mesmo tempo familiar e desconhecido, na tentativa de remontar o encantamento textual. Ao ler a jornada dos “Viajantes”, esses loucos Marcianos, com a sua tripulação que os acompanha, sempre amantes contagiados pela idiotice, pela inércia e pelo imbecilismo desperta um alvo certo: o leitor e o escritor.
No processo de ler e reler os contos, observa-se uma viagem com personagens sutis, sombreados de mistério e caos. Continua-se essa conversa na disposição contrária ao sumário, destacando o personagem Hugo, distorcido e ensimesmado, que explora uma performance grotesca e colhe o vermelho insano; existe também o “Eu” cínico do escritor que se arrisca e enfrenta a “metralhadora crítica” dos medíocres; há ainda o Bonarda em sua cova patética, trôpego e deformado, na busca um resgate para a sua loucura.
Vários elementos são evocados para a organização da diégese, ora despertando as emoções, ora eclodindo assuntos inquietantes ou temáticas complexas. Essa sucessão de gêneros surpreendentes adentram uma diversidade de esferas bastante curiosas: São personificações de Raposas eloquentes de olhos profundamente azuis e ardilosos que lutam na trilha do deserto do viver; um extraordinário tumor gêmeo inominado mergulhado na leitura e no silêncio; há também um bloco de poemas ainda “órfãos” que exige um leitor melhor para um escritor ruim e literariamente mutilado; o nonsense e o niilismo de Fibonacci transcende as miríades que minicontam a criação inusitada de outros escritores; a lástima de Francisco/Poema entre o consolo, as chagas e as cicatrizes do sáurio e ainda Abelardo em seu círculo magnífico e sua pirotecnia: inércia e vivas da criação fantástica!
Em uma breve segunda volta do destino, continua-se a girar na tautologia do sombrio e do espanto. Em “Inimigo de toda gente” a invisível existência de pássaros melancólicos, pousados em fios de arames farpados, coexistem com uma dupla decrépita e sinistra nas ruínas do cotidiano; o conhecimento obscuro registrado no “O homem que virou abobrinha” pode ser comunicado no choro inaudível e conectado na metamorfose do pensar no papel desempenhado na grande ordem; e nesse caleidoscópio textual apreciamos os elementos sobrenaturais de “O enigma de Lujan” que percorre uma visão taciturna entre dimensões estranhas de diferentes realidades.
O estranhamento e as alucinações podem ser lidos no conto “Nos caminhos da loucura”, se você “sobreviver à primeira página”. Torna-se difícil mergulhar em um drama denso e demente criado em uma obra que adverte: “só abra se for merecedor”, portanto, cuidado ao abrir; mais que difícil, diria ceifado a sangue, emerge o fado de “Míriam”: um beijo arremessado, cúmplice da terra da foice, na lonjura chorosa dos herdeiros do rubro pesar.
A hesitação do leitor não é interrompida na estrada derradeira e de pedra dura, ela percorre os dois desertos interdependentes do “Mar Morto”, árdua empreitada de angústia revelada na epifania gratuita de miragens; o leitor viaja em “Marília tem um segredo” constituído de um mistério patético e uma divagação sinistra. “Elementar, vou explicar...”; Em “Samsara” observa-se o colapso infernal da coisa de “eus” que vacilam em reescrever suas histórias e desejam o Samadhi.
Em um breve segundo despertamento observamos em “Isolamento” – O enlouquecer da meia-noite decretado no isolamento entre as chicotadas dos berros e o chocoalhar dos grunhidos que espirra o sangue proibido. A navalha afiada do choro rangido e do silêncio restaurador estripa o monstro purgado em cada ser e em cada um de nós. Em “Isis”, somos passageiros na viagem de um solitário que, com nossos medos geniais e invasivos, recriamos o ambiente inóspito para o tripulante de alma sulcada: “Você me ama?”. A fantástica intimidade impregnada na fissura negra pede o beijo analisado no trono de Isis.
O vacilo entre a explicação e o insólito continuam nas construções mágicas de outras histórias de Solemar Oliveira. Em “O espaço-tempo invertidos”, entre a certeza e a digressão, sempre ouvindo o doce canto e o assobio harmonioso, prossegue inexoravelmente a Morte, sepultando as vozes que são insubstituíveis; percebe-se em “Da Vinci” que a ideia é incrustrada e atarracada no segredo do Nada e do Breu, uma ideia materializada no código que se decifra e na esfinge que lhe devora.
Nas várias faces existenciais mitológicas, filosóficas, literárias e de outras áreas destacam-se crespas de assuntos inquietantes como em “Confraria”, no qual vislumbra-se o tempero entre autor e cultura, banhados a fogo e sangue, o artista sempre acompanhado de aplausos e de loucuras. Também no conto “Condenados” presenciamos uma vivência intrigante que vai desde a muda de um simples manjericão ao um sopro de vela numa narrativa inusitada e imprevista; bebe-se ainda, mais uma vez, no ópio da “Carta ambígua”, um singular delírio nos escritos desvairados.
O barqueiro chegou. Com assombro, ouve-se as águas misteriosas e remadas por Dante. “Caronte” aporta com as “Almas danadas” sob a parca luz do poema; em “Benedito” sente-se a dor da invisibilidade, sempre ancorada na língua e na boca e também no sorriso indelicado do heroico defunto em decomposição. Em “Anjos Caídos”, vive-se o triste janeiro de um “garoto de fé”. Num refrão poemático e reavivado surgem elementos aparentemente desconexos: céu vermelho, chave, ira, túnel, chuva, música, raízes, lagos de lama, pênis, criaturas insinuantes, claustro... Um poente de vazio seco para muitos anteriormente emprenhados da terra.
Interessante “desvendar” no conto “Ágata” que há uma gradação crescente em busca de controle e poder, mas para isso, precisamos “guardar os olhos”. Solemar seleciona alguns substantivos, adjetivos, verbos e advérbios que traçam um percurso ascendente de atitudes e planejamentos da astróloga: perguntava, acreditava, esperava, questionava, influenciava, convencia, adestrava e alterava destinos; assim intimamente, estrategicamente, sistematicamente, categoricamente, poderosamente ela conquista o poder. Entre o isolamento e o massacre da multidão, o conhecimento encarnou na “Santa Viva” e, pedaço por pedaço, é devorada saciando o discurso da loucura.
Em uma breve e segunda imprecisão, observa-se em “Abismos” uma situação inusitada - irradia-se o morto. Uma lastimosa verdade reverberada com “voz gutural e gargalhada abismal” anuncia: os ratos e morcegos paralisados e o silêncio sulcado no indivíduo. O conto “Moto Perpétuo” torna-se marcante ao apontar, de maneira sutil, a solução para a Roda do Destino: A instauração sorrateira da instabilidade, da imprevisibilidade e da imponderabilidade das coisas e dos seres. Outro texto envolvente é “A curiosidade é a mãe das armadilhas” na “Ordem do dia” que é sugerida entre um mesclado de caras e bocas, de medos e raivas, de disciplina e ordem, de risos e rudezas, pedidos e conselhos que, por sua vez, incognitamente nada dizem.
“E se...” presente no texto “Doçura dos Tártaros” rumina a possibilidade e o questionamento dos possíveis caminhos inesperados vividos por Caos. . O inverossímil e o crível estão presentes na âncora da mitologia. A ironia e a irreverência criam um “stand up canino”, propõem a companhia do cão Tártaro, fantástico/falador e, quem sabe, colocando uma coleira no protagonista.
Em uma “Breve Segunda Vida de uma Ideia”, nota-se que a utilização de elementos fantásticos perpetra esse livro de Solemar Oliveira, degusta-se um sabor tão especial e surreal, temperado com o insano instável e com a realidade fragmentada. Emerge a crítica reflexiva do autor e a sua feitura escrita como uma Cegueira Branca, como um Memórias Póstumas ou uma Sombra de Poe, ou ainda, como Macunaíma, como Incidente em Antares, como Pirotécnico Zacarias ou Metamorfose, por inúmeras vezes, contrariando a nossa noção de realidade. Realmente, uma “cria do Nada” que habita a “Caverna do Absurdo”, como sugere o autor.

Em sua vigésima edição, o festival envolve 32 companhias nacionais e nove internacionais em sua programação. O evento contempla oito circuitos que percorrem as cinco regiões do país e trinta cidades no Brasil e exterior

Atrações culturais, shows, festival de massas e passeio ciclístico vão compor o 16ª Festival Italiano de Nova Veneza, que será realizado entre os dias 04 a 07 de agosto, com entrada gratuita

Entre o Sonho e a Realidade é o nome do livro de memórias do médico e escritor Hélio Moreira. Trata-se de um mergulho que o autor faz em busca de importantes momentos da sua história de vida.

Interessados podem acessar o edital no site sescgo.com.br. Serão selecionados 25 shows e cinco oficinas para o festival de música de Pirenópolis

Iacyr Anderson Freitas: poeta presente em mais de 20 antologias no Brasil e no exterior

Autora se mostra conhecedora das variadas técnicas da escrita, como o monólogo interior e o fluxo de consciência

Artistas de renome nacional já estão confirmados, como Glória Bomfim, Juçara Marçal e Kiko Dinucci, Pé de Cerrado, Tambores do Tocantins, Anelis Assumpção e Curumin, Zé Mulato e Cassiano e Höröyá.

“Leva-se mais tempo para gestar um livro, do que para gestar um homem.” Alguém poderia ter disso isso, que é uma pura verdade

A programação contempla duas exposições fotográficas acompanhadas por catálogos: “Luiz Pucci: É Favor Olhar com Cuidado”, com fotografias do acervo MIS

Por sua natureza impregnada de estranhamento, o livro de Solemar Oliveira talvez não conquiste facilmente muitos leitores, mas com certeza se insere na seara da prosa muito bem executada.

por Hélio Brasil*

I
A História do Brasil teria que ser contada por um coral de historiadores, apoiados em narrativas de cronistas, aventureiros, viajantes constrangidos ou deslumbrados. Uma inicial e lógica exploração feita a partir da costa, seguida de penosas internações. Todas milagrosamente rápidas, tendo em vista os recursos da época, pois falamos de um passado de meio milhar de anos. Registros, documentos, cartas, mapas (de incrível rigor, em face dos recursos da época), bem como a ansiosa busca de riquezas para uma Europa que experimentara a incubação medieval e a explosão do Renascimento.
Não à toa, Espanha e Portugal, dois países debruçados sobre o mar, como se espichando um pescoço geográfico para o Hemisfério Sul ali dominado pelo Atlântico, lançaram-se à cata de riquezas. A terra lusitana, restrito território, pobre de recursos naturais, mais do que todos, levou a conquista a sério.
Nenhuma colonização é angelical. Antes é fria, cruel e espoliadora. Assim, dizer que o Brasil teria se tornado um país melhor se ficasse com espanhóis, com ingleses, franceses ou (que deslumbramento!) dourados holandeses, nos parece uma conjectura ingênua. Historicamente (ou fatalmente) ficamos com Portugal. E será sobre essa nação e seu povo – tão péssimo como os mais péssimos, tão notável quanto os mais notáveis – que devemos falar.
II
Em O Reino, a Colônia e o Poder: o governo Lorena na capitania de São Paulo – 1788-1797 (São Paulo, Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2019), Adelto Gonçalves concentra seu foco no momento histórico em que a nação lusitana se assentava nos trópicos. O Brasil receberia navegadores com destinos mais definidos. O Rio de Janeiro, embora acossado pelos franceses, politicamente deixou a posição secundária, abrigando a sede do vice-reinado antes assentada em Salvador. E faz parte desse foco a referência à conjura mineira, pois daquela importante capitania se havia desmembrado o território que hoje abriga o Estado de São Paulo.
Nesse contexto, viu-se o autor da obra obrigado a situar a narrativa a partir de governadores que antecederam o astro central – Lorena – com dificuldades em cumprir a missão estruturadora da capitania. Tanto os suspeitos de incúria ou de alcance no dinheiro público (hábito ainda não abandonado em nossos dias) como os sabujos e incompetentes.
O lado positivo das ações de Lorena valoriza a narrativa. E vale a pena registrar uma obra, ainda existente, que surpreendeu por atravessar os séculos: a Calçada do Lorena, estrada pavimentada originalmente com características ousadas para a época e que concretizou a indispensável ligação do planalto paulista com o litoral. Libertava-se a província paulista do porto do Rio de Janeiro. E Adelto nos mostrará quão fecundo foi o governo de d. Bernardo José Maria da Silveira e Lorena (1756-1818) para o despertar desse hoje grande Estado brasileiro.
A construção da hábil narrativa nos mostra os governos anteriores corruptos ou corruptores e com ações mesquinhas, o que faz ressaltar a competência demonstrada por Lorena. O leitor logo estará envolvido pelos episódios que antecedem a entrada em cena do nosso personagem, e verá um perfil descrito sem paixão, mas com o indisfarçável prazer do historiador de reconstruir o protagonista do livro.
III
Não caberia o prolongamento dos comentários acerca do conteúdo histórico tão bem narrado, mas neste breve texto é indispensável focalizarmos também o autor do livro, consagrado como historiador e pesquisador com títulos obtidos no Brasil e no exterior.
Adelto Gonçalves é autor de extensa obra, destacando-se as biografias, largamente premiadas, dos poetas Manuel Maria de Barbosa du Bocage (1765-1805), no livro Bocage, o perfil perdido (Lisboa, Editorial Caminho, 2003), e Tomás Antônio Gonzaga (1744-1810), em Gonzaga, um poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Editora Nova Fronteira, 1999). É também célebre e apreciado no terreno da ficção, trazendo-nos uma bela reconstrução da cidade de Santos nas primeiras décadas do século XX e os movimentos sociais vistos então como “subversivos”.
Barcelona brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher Brasil, 2002) e Os vira-latas da madrugada (Rio de Janeiro, Livraria José Olympio Editora, 1981; Taubaté, Editora Letra Selvagem, 2015) são romances de forte conteúdo político, não discursivos, lidos com agrado. Livros que nos fazem esquecer o tempo, sendo devorados com prazer. Situações e personagens com grande credibilidade, disputando encarnações que lembram o Jorge Amado (1912-2001) dos tempos de Mar morto (1936). Adelto mostra-se à vontade na escrita correta e leve. Não se perceberá o hiato porventura existente entre historiador e criador de histórias.
Da orelha do livro aqui comentado, recorto uma observação precisa de Carlos Guilherme Mota: “…Lorena tem suas origens familiares, a vida e a ação esquadrinhadas com a argúcia que define um bom historiador.” Podemos acrescentar: …e um excelente escritor.
O Reino, a Colônia e o Poder: o governo Lorena na capitania de São Paulo – 1788-1797, de Adelto Gonçalves, com prefácio de Kenneth Maxwell, apresentação de Carlos Guilherme Mota e fotos de Luiz Nascimento. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 408 páginas, R$ 70,00, 2019. Site: www.imprensaoficial.com.br
* Helio Brasil é arquiteto, professor universitário, romancista e contista, é autor de uma trilogia sobre o bairro carioca de São Cristóvão: o livro de não-ficção São Cristóvão: memória e esperança (Prefeitura do Rio de Janeiro, 2004) e os romances A última adolescência (Bom Texto, 2004) e Ladeira do Tempo-Foi (Synergia Editora, 2017)). É autor também de O Solar da Fazenda do Rochedo e Cataguases (Synergia Editora, 2016), em co-autoria com José Rezende Reis; Cadernos (quase) esquecidos (edição artesanal, 2016); Tesouro: o Palácio da Fazenda, da Era Vargas aos 450 anos do Rio de Janeiro (Editora Pébola, 2015), em co-autoria com Nireu Cavalcanti; e Pentagrama acidental, novelas (Editora Ponteiro, 2014). Como contista, publicou O perfume que roubam de ti… e outras histórias (Synergia Editora, 2018) e participou de várias coletâneas.