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Jason Tércio sugere que Mário de Andrade era bissexual, não homossexual

Layout 1O “Estadão” publicou que o escritor e pesquisador Jason Tércio disse que Mário de Andrade não era homossexual. Fica-se, pois, a insinuação de que era heterossexual. O jornal não apresentou nenhuma outra nuance. “O Globo” acrescentou outra informação, e do mesmo biógrafo: Mário de Andrade era bissexual. A biografia de Jason Tércio, que pretende ser ampla, sai até o fim deste ano. Dizê-lo “bissexual” — ou melhor, “não homossexual” — seria uma estratégia para impedir a possível publicação da obra? Talvez sim. Mas há indícios de que, embora manifestasse mais interesse por homens, manteve relacionamentos afetivos e sexuais com mulheres. O psicanalista Sigmund Freud não sugeriu que os seres humanos são mais bissexuais do que heterossexuais e homossexuais? Enquanto não sai a biografia “exaustiva” de Jason Tércio, pode-se consultar “Eu Sou Trezentos — Mário de Andrade: Vida e Obra” (Edições de Janeiro, 256 páginas), de Eduardo Jardim. Trata-se de um dos mais importantes estudiosos da obra e da vida do pai da Semana de Arte Moderna de 1922 e espécie de guia espiritual dos avanços modernistas posteriores — tanto os de Carlos Drummond e João Cabral de Melo Neto. Drummond e João Cabral, juntos, talvez sejam mais importantes do que a Semana de 22.

Biografia conta a vida de Pepe, que tinha um canhão no pé e fez 450 gols jogando pelo Santos

A jornalista Gisa Macia lança em maio a biografia “Pepe — O Canhão da Vila” (Realejo). Ela é filha do ex-jogador. Pepe, segundo maior artilheiro do Santos, com 450 gols em 750 jogos, usava o pé como se fosse um canhão, tal a potência de seu chute. Ele jogou durante 15 anos no time “de” Pelé. Uma campanha de crowdfunding pretende arrecadar 25 mil reais para bancar a edição do livro. Quem quiser contribuir — com valores de R$ 15 a R$ 1 mil — deve acessar o site www.kickante.com.br. Os colaboradores poderão se encontrar com o ex-jogador, de 80 anos, ou receber, em sua residência, o livro autografado pela autora e artilheiro. Numa entrevista ao “Estadão”, Pepe lamentou “a pouca aptidão ofensiva “ de técnicos e jogadores. “Você vê jogos naEuropa com muitos gols e aqui a gente fica economizando, 2 a 0 é goleada. Precisa melhorar. Os técnicos ficam satisfeitos em jogar com dois atacantes. A gente jogava com cinco”.

Edival Lourenço lança livro com sua poesia reunida. Com bela edição da Ex Machina

O romancista, contista e poeta Edival Lourenço lança na sexta-feira, 13, às 19 horas, o livro "Poesia Reunida (1983-2013)", numa bela edição da Editora Ex Machina, de São Paulo. O lançamento será feito na sede da União Brasileira de Escritores-Seção de Goiás, na Rua 21, nº 262, Centro, ao lado do colégio Lyceu de Goiânia. Edival Lourenço surpreende pela sua, digamos, polivalência. Há poetas que escrevem contos e romances, mas não com a mesma desenvoltura da veia poética. Assim como há prosadores que se aventuram pela poesia, mas nem sempre com a mesma qualidade. Pois Edival Lourenço consegue a proeza de escrever bem tanto prosa quanto poesia. Fica-se com a impressão, aqui e ali, de que se tratam de autores diferentes. Mas há certo entrelaçamento entre a prosa e a poesia de Edival, mas claro que o autor percebe as duas "instâncias" como autônomas. Daí a impressão de que são duas personas por trás da prosa e da poesia.

Morre Armênio Guedes, jornalista que foi um dos grandes quadros políticos intelectuais do PCB

O jornalista baiano Armênio Guedes morreu na quinta-feira, 12, aos 96 anos, em decorrência de falência múltipla dos órgãos. Armênio Guedes foi dirigente do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e um de seus quadros intelectualmente mais bem preparados. Raro num comunista: era democrata, portanto contra a luta armada. Exilado no Chile e na França, Armênio Guedes, ao voltar ao Brasil, trabalhou na revista “IstoÉ” e no jornal “Gazeta Mercantil”.

Virginia Woolf tentou “curar” sua loucura pelo suicídio

Na manhã de sexta-feira, 28 de março, um dia claro, luminoso e frio, Virginia foi como de costume ao seu estúdio no jardim. Lá, escreveu duas cartas e atravessou os prados até o rio.  Deixando a bengala na margem, ela esforçou-se para pôr uma grande pedra no bolso do casaco. Depois encaminhou-se para a morte
Em 28 de março de 2015, completará 74 anos que a escritora inglesa Virginia Woolf se matou. Virginia Woolf, que hoje tende a ser comparada (desfavoravelmente) a James Joyce, que ela considerava (invejosamente) um operário autodidata, morreu aos 59 anos, jogando-se no Rio Ouse, em 1941. A obra de Virginia permanece gerando polêmica. Para alguns, ainda é inovadora. Para outros, teria envelhecido. A revolução de Virginia estaria obscurecida pela revolução de Joyce. Talvez o mais justo seja não comparar os dois autores, percebendo, antes, que há diferenças, apesar de estarem próximos (literalmente), entre eles. Sobre sua vida, é possível saber alguma ou muita coisa, principalmente depois da sensível e abrangente biografia de Quentin Bell. Infelizmente, a autobiografia de Leonard Woolf ainda não foi traduzida para o português. Leonard foi a pessoa que mais entendeu Virginia. É provável que ela tenha escrito a maioria de suas obras porque teve o apoio firme do marido e amigo. Leonard sacrificou-se pelo talento de Virginia. Trata-se do sacrifício do menor talento pela afirmação do maior talento. O casamento sequer lhe proporcionou prazer sexual. “Virginia Woolf — Uma Biografia” (1882-1941), do escritor Quentin Bell, sobrinho de Virginia e filho de Vanessa e Clive Bell, é um livro belíssimo e traz fotografias excelentes. O meu texto é uma pálida síntese da esplêndida obra de Quentin Bell — publicada no Brasil pela Editora Guanabara, com tradução de Lya Luft. O único senão é a revisão, catastrófica, como de hábito no “nosso” doce Bananão. Para sorte dos leitores, a biografia, embora esgotada, pode ser encontrada em sebos. Um detalhe relevante para os preguiçosos leitores brasileiros, filhos diletos da televisão: a biografia tem 614 páginas. É um cartapácio. Um detalhe convidativo: o texto de Quentin Bell é agradável e não tem ranços acadêmicos.
Virginia Woolf e Leslie Stephen
Virginia Woolf e Leslie Stephen
Como disse, meu texto é uma pálida síntese do livro de Quentin Bell. Há histórias interessantíssimas sobre Virginia, que tinha o apelido de “Cabrita” , mas, se fosse contar todas, precisaria de mil páginas e o leitor não leria o livro. Registrarei mais o “crescimento” efetivo e literário de Virginia. Os familiares de Virginia, por parte de pai, eram todos escritores. Eram da alta classe média inglesa. Virginia Stephen nasceu no dia 25 de Janeiro de 1882. Só aprendeu a falar depois dos 3 anos. Aos 6 anos, falava bem e contava estórias deliciosas. Era uma espécie de Hemingway de saias. Mas nada sacava de aritmética. Ainda jovenzinha, foi bolinada pelo meio-irmão George. Pode ter sido a causa de sua permanente frigidez sexual. Antes dos 13 anos, depois de várias leituras, buscando sem conseguir um estilo próprio, começou a copiar Nathaniel Hawthorne. Aos 16 anos, apaixona-se por uma mulher, Madge. Nada de sexo. Puro amor. Afeto. Paixão adolescente. Virginia era uma leitora compulsiva. Queria compensar, em tempo recorde, o fato de não ter educação formal, universitária. Os irmãos Thoby e Adrian estudaram em Cambridge. Ela não pôde estudar lá. Ficou ressentida a vida inteira. A saída foi ler bastante, aprender sozinha ou com o pai, Leslie Stephen, um homem sábio mas de personalidade frágil e difícil. Depois da morte do pai, em 1904, Virginia tenta se matar, pulando de uma janela, mas não consegue. A janela era baixa e ela se machucou muito pouco. Mas a alma estava profundamente ferida. A garota estava tão maluca que ouvia os pássaros cantando em grego. E já estava apaixonada por outra mulher — Violet Dickinson. De novo, nada de sexo. É o que diz o informadíssimo Quentin Bell. Seu sobrinho, vale ressaltar. Entretanto, apesar de parente, Quentin aparentemente não esconde fatos, o que pode ser comprovado lendo outras biografias de Virginia. O autor é franco e claro, embora Lya Luft, a tradutora, procure termos mais suaves para falar do “lado” lésbico de Virginia e do homossexualismo dos amigos da escritora. Safismo e sodomita são palavras que estão registradas nos dicionários brasileiros, mas não no vocabulário do nosso leitor médio. No lugar de sodomita, para ficar mais claro, a tradutora poderia ter ousado e escrito “viado” (com i) ou, pelo menos, “homossexual”. Mas isso não importa tanto. São detalhes de nenhuma importância. Em 1904, por interferência de Violet, Virgínia começa a escrever críticas (não assinadas) para o “The Guardian”. Em 1905, Thoby começa as noites de quinta-feira, no famoso bairro de Bloomsbury, com a presença de Saxon Sydney-Tuner, Leonard Woolf, Lytton Strachey (irmão do grande tradutor de Freud, James Strachey), Clive Bell e Desmond MacCarthy. Jack Pollock, E. M. Forster, Bertrand Russell e John Maynard Keynes também participavam da “farra” intelectual. Henry James, amigo do pai de Virginia, não gostou do grupo de Bloomsbury, que achava de baixo nível. Rebelde, o grupo usava roupas esdrúxulas e falava palavrão. Vanessa, pintora, mãe de Quentin Bell, também participava das reuniões e era adepta do “sexo livre”. Ela própria era chifrada por Clive Bell e chifrava o marido. Nenhum dos dois, porém, gostava das chifradas. O liberalismo na prática é uma piada.
Julia Stephen e Virginia Woolf, aos 2 anos
Julia Stephen e Virginia Woolf, aos 2 anos
As reuniões de Bloomsbury ajudaram imensamente na formação da “inculta” Virginia. Os participantes eram intelectuais, alguns em formação e, outros, com alto preparo. Ela absorvia, “antenada” e “babando”, tudo que eles falavam ou sugeriam. Mas a morte de Thoby, o irmão e amigo adoradíssimo, bagunça a família Stephen, que nunca fora muito ajustada. Vanessa, desesperada, se casa com o garanhão come-tudo Clive Bell. Virginia não gostou do casamento. No início. Ela e Adrian, o mais moço dos irmãos e o mais atrapalhado, vão morar juntos. Os amigos e parentes declaram: “Virginia precisa casar”. Queriam arrumar uma pessoa para cuidar da “incuidável” Virginia. Irritada, Virginia escreveu à amiga Violet: “Eu queria que todo mundo não me ficasse repetindo que devo casar. Será uma irrupção da rude natureza humana? Eu acho repulsivo”. Apesar de sua ira, os amigos e parentes continuaram insistindo para que ela se casasse. Entre 1907 e 1908, Virginia começa a escrever “Melymbrosia”, mais tarde publicado como “The Voyage Out” (este primeiro romance de Virginia foi editado no Brasil sob o título de “A Viagem”). Exigente, Virginia queimou sete versões de “The Voyage Out”. Ela não publicou ficção até os 33 anos. “Seu laconismo literário era em parte resultado de timidez; ainda ficava aterrorizada com o mundo, aterrorizada de se expor. Mas unia-se a isso outra emoção, mais nobre — um alto conceito de seriedade de sua própria profissão. Para produzir algo que atingisse seus critérios particulares, era necessário ler vorazmente, escrever e reescrever continuamente, e, sem dúvida, se não estava escrevendo na hora, agitar as ideias que expressava em sua mente”, nota Quentin Bell. No plano afetivo, a vida de Virginia continuava difícil. Lytton Strachey quis se casar com ela, mas não deu certo. Outro amigo de Virginia, o competente e célebre economista John Maynard Keynes, embora tenha se casado com uma bailarina, também era sodomita (palavra bastante usada por Quentin Bell). Keynes morou na casa de Virginia e Adrian. Em 1912, Leonard Woolf e Virginia se casam. Leonard se apaixonou por Virginia. Doce e perdidamente. O casamento foi um grande “negócio” para Virginia. A união com Leonard aumentou o seu equilíbrio emocional e a sua segurança como escritora. O curioso é que a família Stephen não avisou Leonard dos problemas de saúde de Virginia. Tudo indica que a família procurou esconder que Virginia era “meio louca” com medo que Leonard desistisse do casamento. O casamento não agradou Clive Bell. Clive andou tirando umas casquinhas de Virginia. Mas sossegue: o vigoroso marido de Vanessa não conseguiu papar Virginia. Só tirou casquinhas. Virginia, diga-se, gostava do atrevimento de Clive. Leonard adorava Virginia, sua capacidade intelectual, e não se preocupava com a frigidez sexual dela. Quentin Bell, um biógrafo às vezes discreto, sugere que Virginia “considerava o sexo não tanto com horror, mas com incompreensão; havia em sua personalidade e em sua arte uma qualidade estranhamente etérea, e, quando as necessidades literárias a compeliam a considerar o prazer sexual, ela se afastava ou nos revelava algo tão distante de bolinas e empolgações quanto a chama de uma vela é distante de seu sebo”. Virginia conclui “The Voyage Out” e o entrega à editora. Doente, pensa que a libertação (a cura) está no suicídio. Toma 6,5 gramas de veronal e quase morre. Quentin Bell registra que até 1913, data da tentativa de suicídio, Freud era pouco conhecido na Inglaterra. “Ernest Jones começou a praticar em Londres em 1913”, informa Quentin. Virginia não se interessava muito por Freud. Mas Leonard achava que o conhecimento das ideias de Freud poderia ser útil no seu tratamento. “The Voyage Out” foi publicado em março de 1915. Os amigos de Virginia e a crítica gostaram. Edward Morgan Forster (autor de “Passagem Para a Índia”, mais conhecido no Brasil pelo bom filme de David Lean), que também era gay renitente, elogiou o livro de Virginia no “Daily News”: “Eis finalmente um livro que chega ao mesmo patamar de ‘O Morro dos Ventos Uivantes’, embora por um caminho diferente”. A critica era esperada ansiosamente por Virginia. Queria ver se seu talento era confirmado. “Virginia”, escreve Quentin Bell, “estava sempre imaginando que, para o mundo exterior, [seus romances] pudessem parecer simplesmente doidos ou, pior ainda, fossem realmente doidos, seu horror à zombaria rude do mundo continha o medo mais profundo de que sua arte, e por isso ela mesma, fosse uma espécie de impostura, um sonho imbecil sem valor para os outros. Por isso, para ela, uma nota favorável valia mais que o mero elogio; era uma espécie de certificado de sua sanidade mental”. “O problema”, continua Quentin, “deve estar presente quando pensamos em sua extrema sensibilidade à crítica, uma sensibilidade que podemos considerar mórbida e que realmente, em certo sentido, era mórbida, pois nascia de um estado enfermiço. Os ataques e acoites da crítica, que seriam facilmente enfrentados por um organismo mais robusto, no caso dela podiam reabrir feridas que jamais se tinham curado inteiramente e que nunca deixariam ser muitíssimo delicadas”. Quentin Bell nota que a saúde de Virginia melhorou em 1915 por causa das criticas favoráveis. Virginia, temendo a crítica, escreveu: “Imagine acordar e descobrir que se é uma fraude. Esse horror era parte da minha loucura”. Em 1917, um tanto ranzinza mas admirada, Virginia escreveu à adorada e protetora irmã Vanessa: “Tive um breve encontro com Katherine Mansfield; que me parece um caráter desagradável mas enérgico e absolutamente inescrupuloso”. Quentin Bell explica bem: “Elas [Virginia e Mansfield] sempre tendiam a discordar, mas na verdade nunca discordariam. Unidas pela devoção à literatura e divididas na sua rivalidade como escritoras, achavam uma à outra sobremodo atraentes, mas muito irritantes. Ou pelo menos eram esses os sentimentos de Virginia. Ela admirava Mansfield; também estava fascinada por aquele lado da vida de Katherine que ficava além da sua própria capacidade emocional”.
Talland House, a casa da família
Talland House, a casa da família
“Katherine”, revela Quentin, “andara pelo mundo, ficara magoada; dera vazão a todos os instintos da fêmea, dormira com todo tipo de homens; tornara-se objeto de admiração — e piedade. Era interessante, vulnerável, talentosa, encantadora. Mas também se vestia e se portava como uma prostituta. Penso que Katherine Mansfield retribuía a admiração de Virginia e também sua animosidade. Virginia com certeza apreciava bastante o talento de Katherine, a ponto de querer editar um de seus contos”. É provável que Virginia tenha lançado um olhar masculino em Katherine Mansfield. O homem em geral deprecia a mulher inteligente e diferente, mas também a cobiça sexualmente. Outra coisa: Virginia não gostava de elogiar escritores vivos. Só deu importância a D.H. Lawrence, o autor de “Mulheres Apaixonadas”, depois que ele morreu. Os vivos eram seus concorrentes. Junto com Leonard Woolf, Virginia foi dona da Hogarth Press, que editou grandes escritores e poetas, como Katherine Mansfield e T.S. Eliot, além do psicanalista Freud. Quentin Bell e os outros biógrafos revelam algo curioso: Virginia escrevia um romance vigoroso (como “As Ondas”) e, em seguida, um romance mais leve e fácil (como “Os Anos”). Parece que tal artifício visava tranquilizar os seus nervos e, ao mesmo tempo, testar novos caminhos para o romance. “O romance peso-pesado é sucedido por um livro peso-pluma — que ela chamava uma piada”, só que Quentin Bell não acha que “Noite e Dia” seja uma piada. Não acha o livro bom. Mas não concorda que seja totalmente ruim. O manuscrito de “Ulysses”, de James Joyce, foi oferecido à editora de Virginia, que não pôde ou não quis publicá-lo. Quentin Bell tenta explicar: “Era uma obra que Virginia não podia rejeitar nem aceitar. O poder e a sutileza da obra eram evidentes o bastante para despertar a admiração dela e, sem dúvida, inveja. Parecia-lhe ter uma espécie de beleza, mas também um brilho rude, arguto, de sala de fumantes. Joyce usava instrumentos parecidos com os dela, e isso era doloroso, pois era como se a pena, sua própria pena, tivesse sido arrancada de suas mãos e alguém rabiscasse com ela a palavra fodano assento de um vaso sanitário”. Virginia “também sentia”, segundo Quentin, “que Joyce escrevia para um pequeno grupo, e, quando se refere a ele, escreve ‘essa gente’ — como se o classificasse tal qual Ezra Pound e não sei que outras figuras do ‘submundo’. A reação dela talvez seja significativa; a rudeza gratuita e impudente de Joyce fazia-a sentir-se, súbito, desesperadamente ‘uma dama’. Mesmo assim foi perspicaz o bastante para ver que era algo digno de ser publicado; era claro, também, que estava absolutamente além da capacidade técnica da Hogarth Press”. Para mim, era o lado mundano de Joyce que não agradava Virginia. Ao contrário de Joyce e de Proust, não sacava muito do lado “sujo” da vida. O leitor pode ler mais sobre o assunto na admirável biografia de James Joyce escrita pelo americano Richard Ellmann. “Os Woolfs disseram-lhe (à emissária de Joyce) que não poderiam imprimir (‘Ulysses’) porque levaria dois anos na sua impressora manual, embora dissessem que estavam muito interessados nos quatro primeiros episódios que leram. Na verdade parecem tê-lo considerado ‘vulgar’, embora Katherine Mansfield, que deu uma olhada no manuscrito certo dia enquanto os visitara, tenha começado ridicularizando-o e depois de repente tenha dito: ‘Mas há qualquer coisa nisso: uma cena que deveria figurar, suponho, na história da literatura’.” A história de Virginia Woolf escritora é tão interessante como a de Virginia Woolf editora. T.S. Eliot foi amigo de Virginia e a Hogarth Press editou seus primeiros poemas e o mais famoso, “A Terra Estéril”. Virginia tentou tirar T.S. Eliot do emprego em um banco. Mas não conseguiu. Mais tarde, ficou irada porque Eliot se tornou editor de uma casa rival, The Criterion. Em 1919, Virginia publica “Noite e Dia”. A crítica não gostou. E.M. Forster (1879-1970) e Katherine Mansfield (1888-1923) odiaram. Mas Forster, amigo, foi elegante e discreto. Disse que o livro não era melhor que “The Voyage Out”. (Forster mais tarde ficou chateado com algumas críticas ferinas de Virginia.) Mansfield foi dura: “Noite e Dia” era “uma mentira da alma. Falando sobre esnobismo intelectual — o livro dela fede a isso. (Mas não posso dizê-lo.) É muito longo e cansativo”. Virginia, que não sabia assimilar criticas, ficou abalada. Mas Virginia se curava dos petardos da crítica de um modo extraordinário: no lugar de ficar bloqueada, produzia mais, e melhor. Se o romance anterior fosse considerado ruim, até pelos amigos que adorava, como Forster, procurava escrever outro melhor, mais inventivo. Foi o que o ocorreu depois de “Noite e Dia”. Em 1922, publicou pela Hogarth Press “O Quarto de Jacob”. T.S. Eliot festejou: “Você se libertou de qualquer compromisso com o romance tradicional e seu talento original. Parece-me que construiu uma ponte sobre certa lacuna que existia entre seus outros romances e a prosa experimental de ‘Monday or tuesday’, conseguindo um sucesso notável”.
Duckworth group, 1892
Duckworth group, 1892
“O Quarto de Jacob”, para Quentin Bell, marca o inicio de sua maturidade e fama. Em 1925 Virginia publicou “Mrs. Dalloway”, que agradou à crítica. Forster elogiou “Mrs. Dolloway”. Thomas Hardy leu “The Commom Reader” com prazer. Virginia ficou maravilhada. Entre 1925 e 1928, Virginia lança “Passeio ao Farol” e concebe “As Ondas”. Nesse período ela conhece Vita, a sua grande paixão. Vita era lésbica, mas casada, como Virginia. Quentin Bell é discreto e diz pouco sobre o assunto. Tudo indica que as duas não chegaram a ter um caso no sentido moderníssimo. Vita escreveu para Virginia: Você gosta mais das pessoas pelo cérebro do que pelo coração. Fosse hoje, o texto de Vita teria acréscimo: Você gosta mais das pessoas pelo cérebro do que pelo coração e pelo corpo. Na verdade, Virginia era de uma carência extremada e todo mundo que lhe dava atenção recebia alguma esperança, de sexo ou afeto. Só que, afeto, tudo bem, sexo, nada. Pelo menos, a se acreditar na versão do sobrinho. Quem leu “Orlando” sabe que Vita é Orlando. Para Quentin Bell, Orlando é o único dos romances de Virginia que se aproxima da emoção sexual, ou antes, homossexual; pois, enquanto o herói/heroína sofre uma transformação física, sendo no começo um esplêndido jovem e depois uma linda dama, a metamorfose psicológica é muito menos completa. O livro vendeu bem. Mas Orlando, sabia Virginia, não era um grande livro. Julgamento que os leitores de hoje não partilham, sobretudo por que as questões sexuais se tornaram mais importantes, na avaliação do romance, do que as literárias. Em 1931, Virginia, a mulher que adorava charutos, publica “As Ondas”, para os críticos, sua obra-prima. Leonard Woolf, que sempre opinava, criticamente, sobre os livros de Virginia, disse: O livro é uma obra-prima, a melhor das suas obras. Ela adorou. Leonard era suspeito, até por que conhecia a fragilidade emocional de Virginia, mas era, ao mesmo tempo, prudente, justo e rigoroso. O indefectível E. M. Forster escreveu que encontrara um clássico. A opinião dele era muito respeitada por Virginia. Um tinha inveja do outro. Mas, éticos, respeitavam as diferenças entre suas obras. Virginia gostava de conversar sobre homossexualismo com Forster, que adorava rapazes. Virginia não gostava da crítica acadêmica, que achava estéril. Talvez fosse uma vingança por não ter obtido educação universitária. Talvez fosse pela percepção de que, como denuncia Gore Vidal, muitos teóricos da literatura querem substituir a literatura pela teoria literária. Quentin Bell registra um aspecto curioso: Virginia adorava mexericos, fofoca, e dizia o que pensava, não importando as consequências. Outra coisa curiosa: como Joyce e outras, ela aproveitou a história de sua família e as relações com os amigos nos seus romances. Vida e obra, estetizadas, estão ligadíssimas e indissociáveis em Virginia. Mas é óbvio que a escritora não escreve biografias literárias e, claro, tinha uma imaginação poderosa. Na década de 30, alguns críticos atacam Virginia, deixando-a desequilibrada emocionalmente. O mais virulento, Wyndham Lewis, escreve: Ela é sobremodo insignificante. Ninguém mais a leva a sério. Os críticos de esquerda não atacavam Virginia. Stephen Spender e Cecil Day-Lewis (pai de Daniel Day-Lewis, ator de “A Insustentável Leveza do Ser” e “Meu Pé Esquerdo”) gostavam de sua obra. Em 1937, Virgínia pública “Os Anos” e sente a loucura chegando. Leonard achou o livro ruim, mas ficou calado, ou melhor, temendo que Virginia se matasse, mentiu: Acho que é extraordinariamente bom. Virginia sabia que o livro era ruim. O economista Keynes gostou do livro, de forma irrestrita. Em 1939, Virginia foi ver Freud, que estava exilado em Londres. Ele teria impressionado Virginia como um homem alerta. Mas torto encarquilhado muito velho e a velha chama agora bruxuleante. Freud disse a Virginia e Leonard que seria necessária uma geração para eliminar aquele veneno [o nazismo de Hitler]. Por causa da Segunda Guerra Mundial, Leonard e Virginia Woolf chegaram a pensar em suicídio. Obtiveram até uma dose letal de morfina. Mas, com Londres bombardeada, Virginia deixou de falar em suicídio. Numa carta a Ethel Smyth, escreveu: … o que tocou e na verdade feriu o meu coração em Londres [durante os bombardeios dos nazistas] foi aquela velha mulher, suja de fuligem nos aposentos dos fundos, preparando-se, depois de um ataque aéreo, para enfrentar o próximo… E também a paixão da minha vida, a cidade de Londres — ver Londres em escombros, isso também atingiu meu coração. No início de 1941, Virginia estava desesperada, louca. Mesmo assim tentou convencer a médica Octavia Wilberforce, uma amiga, de que não estava doente mentalmente. Mas confessou partes de seus medos. Medos de que o passado voltaria, de que nunca mais conseguiria escrever. É triste e pungente como Quentin Bell fala do fim de sua tia escritora: Na manhã de sexta-feira, 28 de março, um dia claro, luminoso e frio, Virginia foi como de costume ao seu estúdio no jardim. Lá, escreveu duas cartas, uma para Leonard e outra para Vanessa — as duas pessoas que mais amava. Nas duas cartas explicava que vinha ouvindo vozes e acreditava que nunca mais ficaria boa; não podia continuar estragando a vida de Leonard. Ela colocou o bilhete sobre a lareira da sala de estar, e cerca de 11h30 esgueirou-se para fora, levando sua bengala de passeio; e atravessou os prados até o rio. Leonard acreditava que ela já havia feito uma tentativa para se afogar: assim, teria aprendido com o fracasso, e estava decidida a não falhar de novo. Deixando a bengala na margem, ela esforçou-se para pôr uma grande pedra no bolso do casaco. Depois encaminhou-se para a morte, ‘a única experiência’, dissera um dia a Vita, ‘que nunca descreverei’.

Última carta a Leonard Woolf

Leonard e Virginia Woolf
Querido, tenho certeza de que estou enlouquecendo de novo. Sinto que não podemos passar por outra daquelas terríveis fases. E desta vez não ficarei curada. Começo a ouvir vozes, e não posso me concentrar. Assim, estou fazendo o que me parece melhor. Você me deu a maior felicidade possível. Não creio que duas pessoas pudessem ser mais felizes até chegar esta doença terrível. Não consigo mais lutar. Sei que estou estragando a sua vida e que sem mim você poderá trabalhar. E você vai, eu sei. Está vendo, nem consigo mais escrever adequadamente. Não consigo ler. O que quero dizer é que devo a você toda a felicidade da minha vida. Você foi absolutamente paciente comigo e incrivelmente bom. Quero dizer isso — e todo mundo sabe. Se alguém pudesse me salvar, teria sido você. Perdi tudo, menos a certeza da sua bondade. Não posso mais continuar estragando sua vida. Não creio que duas pessoas tenham sido mais felizes do que nós fomos.

Luiz Carlos Bordoni não sofreu infarto. Ele só levou um amigo para o hospital

Carlos Eduardo, amigo do jornalista Luiz Carlos Bordoni, sentiu-se mal e foi internado, mas passa bem. Como foi levado para o hospital por Bordoni — eles estavam no Hotel Bristol, nas proximidades do Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo) —, correu o boato de que o jornalista havia sofrido um infarto. “Bordoni está bem e, no momento, grava um comercial para a Prefeitura de Itapaci, na produtora de Jorcelino Braga”, disse ao Jornal Opção o jornalista e radialista Jorge Kajuru.

Faustão, que ameaçou trocar Globo pela Band, passou a ganhar salário de 5 milhões de reais

Faustão, do “Domingão do Faustão”, renovou o contrato com a TV Globo no fim do ano passado. Mas só agora as vísceras da negociação do apresentador com o chefão da rede, Carlos Henrique Schroder, são expostas publicamente. O colunista Leo Dias — às vezes apresentado pelos colegas como sensacionalista, mas é mesmo bem informado — conta que Schroder e Faustão endureceram o jogo e não queriam aceitar as propostas um do outro. Quando o negócio estava pegando fogo, Faustão disse que, se a Globo não aceitasse sua proposta, não teria problema algum: poderia voltar para a Band. Schroder apavorou-se, pois o “Domingão do Faustão”, além de líder em audiência, é um dos símbolos da rede e, sobretudo, um dos campeões em faturamento. O diretor-geral da Globo aquiesceu e aceitou elevar o salário de Faustão de 3 milhões para 5 milhões de reais. É o maior salário da empresa. Faustão continua com participação em alguns anúncios. É o rei do merchandising.

Álvaro Borges substitui Orlando Loureiro no comando do jornalismo da TV Anhanguera

O jornalista Álvaro Borges, da TV Liberal, que retransmite a programação da TV Globo no Pará, será o substituto do diretor de Jornalismo da TV Anhanguera, Orlando Loureiro [foto acima, de seu Facebook]. Este sai no dia 25 deste mês. Orlando Loureiro recebeu convite da Rede Mato-Grossense — parceira da Globo em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Como Orlando Loureiro conseguiu repor a TV Anhanguera na liderança de audiência em Goiás, os dirigentes da Rede Mato-Grossense querem que faça o mesmo nos dois Estados do Centro-Oeste. Fora dezembro de 2014, quando perdeu para a TV Serra Dourada — “Jornal do Meio Dia” —, a TV Anhanguera lidera a audiência desde julho do ano passado. Isto se deve, em larga medida, à visão estratégica de Orlando Loureiro. Um dirigente da TV Anhanguera frisa que ele define as linhas, dá autonomia aos editores e repórteres mas exige saber de todos os detalhes das programações e ações. Se não estiver funcionando bem — o que significa audiência —, muda rápido e traça novos caminhos. Álvaro Borges [foto acima] tem perfil diferente de Orlando Loureiro, pois é mais operacional e dedicado ao trabalho básico da redação da televisão (ele foi decisivo para elevar a audiência da TV Liberal). É uma escolha da TV Globo, mas acordada com a TV Anhanguera. A Globo está buscando unidade em sua audiência nacional, daí as interferências nas emissoras estaduais.

Goiana JBS supera a Vale e é maior empresa privada do Brasil

Revista Exame destaca aumento de 30% em vendas e faturamento de R$ 120 bilhões de reais no ano passado -- cerca de R$ 30 bi a mais que a mineradora

Correio Braziliense perde jornalistas para assessorias de imprensa. Razão: salários maiores

O “Correio Braziliense” está perdendo jornalistas qualificados. O repórter Almiro Marcos deixou o jornal para assumir a chefia setorial de Comunicação da Secretaria de Gestão e Planejamento (Segplan) do governo de Goiás. Sílvio Ribas, subeditor de Economia, deixou a redação para assumir a assessoria de imprensa do senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES). Motivo provável dos profissionais: os salários nas assessorias são superiores aos das redações e, teoricamente, o grau de estresse tende a ser menor. A repórter de Economia Bárbara Nascimento também saiu do “Correio”. “O editor Vicente Nunes diz que ainda não há substituições na equipe, que, provavelmente, deverá se valer de uma solução caseira”, relata o Portal dos Jornalistas. A informação sugere que o jornal, numa fase de contenção de despesas, não está fazendo contratações.

Jornalista Cynara Menezes troca revista CartaCapital pelo blog Socialista Morena

A repórter Cynara Menezes trocou a “CartaCapital”, onde trabalhou por quase oito anos, pela edição do blog Socialista Morena. O blog deixa de ser parte da revista. No Facebook, Cynara Menezes escreveu: “É, ao mesmo tempo, uma nova etapa em minha carreira e uma despedida da mídia impressa, à qual me dedico desde 1987. Inicio agora uma experiência jornalística exclusivamente online, que será muito prazerosa para mim e, espero, para vocês [leitores] também. Fui muito feliz na ‘Carta’ e tive muita liberdade para escrever reportagens, sempre guiada pela honestidade, pela ética e pela responsabilidade. Mas, pela primeira vez, poderei ser a pauteira e a editora de mim mesma, escrevendo apenas sobre os temas que me interessam, provocam e emocionam, sem a pressão do noticiário. Imaginem: fazer jornalismo independente, direto ao leitor, sem atravessadores. De mim para vocês. Não é fascinante?”. Se der certo, se conseguir manter o blog, será mesmo fascinante, pois Cynara Menezes pode ampliar seus interesses. Pode escrever, por exemplo, sobre literatura — o que não era seu foco na “CartaCapital”. Ele escreve bem, posicionada, sobre vários assuntos. Segundo o Portal dos Jornalistas, “os leitores poderão fazer assinatura (mensal ou anual) do blog, colaborar com doações via Paypal ou tornar-se parceiros em campanhas de crowdfunding. Ainda assim, o blog terá conteúdo aberto para todos”.

Morre Lü Houmin, o fotógrafo que mostrou a faceta humana do ditador Mao Tsé-tung

Morreu na segunda-feira, 9, Lü Houmin, de 87 anos, o fotógrafo pessoal do ditador chinês Mao Tsé-tung. As melhores fotografias de Mao Tsé-tung, sobretudo do período inicial da Revolução Chinesa, foram feitas por Lü Houmin. O político que é acusado de ter mandado matar cerca de 70 milhões de pessoas permitiu que o profissional fizesse fotos dele jogando tênis de mesa e na praia (acima). O jornal “ABC” diz que “Lü era considerado uma das melhores testemunhas da história recente da China”. Lü Houmin, contratado para fotografar os líderes comunistas em 1950, um ano depois da Revolução de 1949, sobreviveu, milagrosamente, aos expurgos. De 1950 a 1957, Lü Houmin foi praticamente “o” fotógrafo de Mao Tsé-tung e também fotografou outros líderes da Revolução, como o braço direito do Grande Timoneiro, Chu Enlay. As fotografias de Lü Houmin tinha um objetivo: mostrar Mao Tsé-tung de maneira mais humana e, ao mesmo tempo, reforçar o culto à personalidade. “Mao nunca me disse que o que podia e o que não podia fotografar e publicar”, disse Lü Houmin. Como em qualquer ditadura, os profissionais, como jornalistas e fotógrafos, sabem o que é e o que não é possível divulgar. Mao e seus filhos foram fotografados lendo no seu escritório particular ou sorrindo relaxado. Independentemente da política, as fotos de Lü Houmin são de qualidade. Uma das fotografias mais célebres de Lü Houmin mostra Mao Tsé-tung sentado numa cadeira de madeira e fumando um cigarro no pico dos montes Lushan. Turistas até hoje repetem a fotografia do ditador.

Almiro Marcos assume comunicação da Secretaria de Gestão e Planejamento. Pesou salário de R$ 11 mil

O jornalista Almiro Marcos foi nomeado na terça-feira, 10, para o cargo de gerente setorial de Comunicação da Secretaria de Gestão e Planejamento do governo de Goiás. Almiro Marcos deixou o “Correio Braziliense” para trabalhar com o secretário Thiago Peixoto. Pesou o salário: 11 mil reais. Maior do que o que recebia no mais importante jornal de Brasília. Repórter do primeiro time, Almiro Marcos brilhou no “Pop” e, em seguida, no “Correio”.

Obrigada, Inezita Barroso, pelo exemplo de resistência e pelo canto das águas que jorram pra eternidade

Cida Almeida Viola, minha viola. Calou-se a voz de uma guerreira — Inezita Barroso —, que até o fim da vida reinou com sua autenticidade libertária, quebrando preconceitos e a hegemonia da indústria cultural. Deu voz ao Brasil de dentro, ao Brasil dos rincões e dos sertões tão ermos de nossas raízes. Fez de seus programas na TV um ponto de encontro desses brasis desencontrados de si mesmo, inspirou gerações e escancarou portas para muitos que seguiram na coragem de seus passos. Meu pai, Jerônimo Duarte, era um profundo conhecedor de música caipira. Estava sempre sintonizado na Inezita e outros tantos que persistiam no culto e na reverberação de um lirismo musical genuíno de nossas raízes roceiras, perdido nos sulcos das estradas de terra batida pelas boiadas que cortavam os sertões, os cafezais a perder de vista nas longas travessias dos bois carreiros que cruzavam o Paranaíba redesenhando o povoamento do Brasil, o rádio integrando esse Brasil do Planalto Central. Era um tempo de informações de utilidade pública na frequência do rádio: fulano, na Fazenda São Pedro, em Jandaia, aviso que passa bem e pede para buscá-lo no entroncamento da Rodovia Federal com a estrada tal... E tome música nas madrugadas das casas avarandadas em que as pessoas encontravam o sol com o leite tirado e muita música caipira na radiola que se impunha na sala. Era esse tempo, a alma desse tempo, que a Inezita prolongou. Levou para a TV. Prestar homenagem a Inezita é também reverenciar meu avô, meu pai e a porção deles que vive em mim. Sempre me emociono quando ouço Mourão da Porteira, Flor do Cafezal e Poeira. Ara, que esses versos de Poeira digam desse amor que sinto pelo Brasil afinado na voz de Inezita e na viola de meu pai: "O carro de boi lá vai/Cantando lá no estradão. Vai levantando poeira/Poeira vermelha/Poeira do meu sertão/(...)Poeira entra em meus olhos/Não fico zangado não/Pois sei que quando eu morrer/Meu corpo irá para o chão". Fui embalada pela poesia desse mundão na voz doce, doce de meu. Obrigada Inezita pelo belo exemplo de resistência e pelo canto dessas águas que jorram para a eternidade. Cida Almeida, jornalista, é colaboradora do Jornal Opção.

Os melhores da gastronomia em 2015, segundo levantamento da Contato Comunicação

Votaram 47 profissionais ligados de alguma maneira à gastronomia, jornalistas, profissionais liberais, empresários e publicitários