Günter Grass é autor de um grande romance, “O Tambor”, que foi levado ao cinema
Günter Grass é autor de um grande romance, “O Tambor”, que foi levado ao cinema

Tornar-se um par de Goethe, Heine, Kafka, Rilke, Thomas Mann, Robert Musil, Hermann Broch e Elias Canetti, escritores de língua alemã, não é nada fácil. Kafka era tcheco; Rilke (nascido em Praga), Musil e Broch, austríacos; Canetti, búlgaro; e Goethe, Heine e Mann, alemães. Em comum três coisas: a língua alemã, a força literária de seus livros e a vitalidade de suas ideias.

Günter Grass, Nobel de Literatura, morreu na segunda-feira, 13, aos 87 anos, e deixou obras-primas, sobretudo “O Tambor”, de 1959. Pode ser colocado ao lado — como espécie de porta-voz informal da consciência da Alemanha — de Goethe e Mann? Se posto ao lado, fica de pé?
Equilibrar-se ao lado de Goethe e Mann, os dois maiores gênios da literatura da Alemanha, com Heine na cola, é possível? Talvez não seja possível dizer que Günter Grass estivesse à altura do trio. Numa “disputa” com Mann, autor de “A Montanha Mágica”, ficaria, por certo, num honroso segundo lugar. “O Tambor” é quase uma obra de Mann — próxima, quem sabe, de “Doutor Fausto” — escrita por… Günter Grass. O romance narra a história de um garoto, Oskar, que não quer crescer. Por que tornar-se adulto sob o nazismo, servindo àquilo, o vilipêndio, de que se discorda? Para além da mensagem política, a crítica ao totalitarismo, trata-se de um romance muito bem escrito e imaginado.

“Um Vasto Campo”, de 1995, trata da reunificação das Alemanhas Oriental e Ocidental. Como sua perspectiva não é nada convencional, o autor permaneceu de esquerda, desagradou muita gente, como o crítico Marcel Reich-Ranicki, que chegou a rasgar um exemplar, ganhando a capa da revista “Spiegel”. A autobiografia “Des­cascando a Cebola”, de 2006, provocou polêmica internacional, pois o veterano combatente da esquerda admitiu pela primeira vez que, quando jovem, na Segunda Guerra Mundial, havia pertencido à SS nazista. Leitores incautos começaram a avaliá-lo não pela obra e pela conduta de uma vida, e sim pela revelação de que havia sido militante — melhor dizer, soldado — nazista. Na época, Günter Grass era um garoto e, mesmo que não quisesse, teria de servir ao seu país, quer dizer, ao regime de Adolf Hitler. Por que Günter Grass demorou a contar a história? Es­taria elaborando a forma de contá-la? Não queria que um pesquisador a relatasse primeiro? É provável. Poderia, porém, ter deixado a história para ser publicada depois de morrer, o que evitaria certo sofrimento. O escritor preferiu publicá-la e aguentar as consequências.