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Finalista do Benvirá, João Batista Melo cria labirinto em clima de II Guerra Mundial

“Malditas Fronteiras”, vencedor do Prêmio Governo de Minas Gerais, desfia o fio de Ariadne em simbiose temporal e espacial entre Alemanha e Brasil do passado e futuro

A duradoura poesia de José Décio Filho, o insone “São Francisco agnóstico” de Goiás

Depois de 35 anos desde a publicação da 2ª edição de “Poemas e Elegias”, a Editora Caminhos relança o título e reacende o debate sobre o poeta goiano

23 de abril: o Dia Mundial do Livro

[caption id="attachment_33710" align="alignnone" width="620"]Foto: Fernando Leite/Jornal Opção Foto: Fernando Leite/Jornal Opção[/caption] Yago Rodrigues Alvim Sabe que dia é hoje? Ah, não vale só dia 23 de abril. Hoje é dia de passar numa biblioteca ou livraria e levar para casa uma encadernação vistosa recheada de uma boa história. É que a Unesco criou a data “Dia Mundial do Livro” para encorajar as pessoas a justamente ler um livro e descobrir o prazer da boa literatura. Além disso, hoje é o “Dia dos Direitos de Autor”. Também criado pela Organização, a data é para valorizar o trabalho dos autores realizado há tantos séculos. Foi em Paris, no ano de 1995, que a Unesco escolheu a data. Além de coincidir com a morte de três grandes escritores William Shakespeare, Miguel de Cervantes e Inca Garcilaso de la Vega, o dia 23, na tradição catalã, é dia de dar uma rosa a quem comprar um livro. Que tal então, comprar um livro e trocar flores? É uma boa para uma tarde de quinta-feira, não é mesmo?

Registros raros da voz de Mário de Andrade são encontrados nos EUA

Além de ser possível escutar pela 1° vez a voz do poeta, em 2015 completam 70 anos de seu falecimento; Mário de Andrade será o autor homenageado nesta edição do Flip

Escritor uruguaio Eduardo Galeano se despede do mundo

[caption id="attachment_32988" align="alignnone" width="620"]Foto: Reprodução Foto: Reprodução[/caption] O Mundo

Um homem da aldeia de Neguá, no litoral da Colômbia, conseguiu subir aos céus. Quando voltou, contou. Disse que tinha contemplado, lá do alto, a vida humana. E disse que somos um mar de fogueirinhas. — O mundo é isso — revelou —. Um montão de gente, um mar de fogueirinhas. Cada pessoa brilha com luz própria entre todas as outras. Não existem duas fogueiras iguais. Existem fogueiras grandes e fogueiras pequenas e fogueiras de todas as cores. Existe gente de fogo sereno, que nem percebe o vento, e gente de fogo louco, que enche o ar de chispas. Alguns fogos, fogos bobos, não alumiam nem queimam; mas outros incendeiam a vida com tamanha vontade que é impossível olhar para eles sem pestanejar, e quem chegar perto pega fogo. — Eduardo Galeano
Yago Rodrigues Alvim Internado na sexta-feira devido a um câncer de pulmão, Eduardo Galeano resistiu sábado e domingo. Na manhã desta segunda-feira, 13, não deu mais. O escritor se despediu dali mesmo onde nascera, em Montevidéu. O uruguaio é autor do clássico da literatura política latino-americana “As Veias Abertas da América Latina” e deixa outras obras (mais de 30) como “O Livro dos Abraços”, que abre este texto. Jornalista, ensaísta, historiador e ficcionista, Gaelano exerceu outros ofícios, antes que se ocupasse da escrita. Trabalhou como operário industrial, desenhista, pintor, mensageiro, datilógrafo e caixa de banco. Já aos 14 anos, ele vendia as primeiras charges aos jornais uruguaios. O golpe militar no Uruguai, em 1973, marcou a vida do escritor. Ele foi preso, exilou-se na Argentina e, sob o golpe de 1976, refugiou-se na Espanha, voltando ao Uruguai apenas em 1985. Na Espanha, Galeano começou a escritura de “Memória do Fogo” (Trilogia que engloba “Os Nascimentos”, “As Caras e as Máscaras” e “O Século do Vento”), premiado pelo Ministério da Cultura do Uruguai e vencedor do American Book Award de 1989. Na época da ditadura, o clássico “Veias Abertas” foi proibido no país. Em 2009, Hugo Chávez presenteou o já presidente dos EUA Barack Obama com um exemplar. No mesmo dia, o livro estava entre os dez mais vendidos da Amazon. Dois anos antes, Galeano já se recuperava de um primeiro quadro de câncer no pulmão. O escritor completaria 75 anos no dia 3 de setembro.

Eli Brasiliense, o centenário que se fez conhecido pelos “garimpos de Goiás”

Este é o segundo dos quatro escritores goianos que completariam 100 anos neste ano. O primeiro foi José J. Veiga

Herberto Helder, o poeta que tinha como obsessão arrancar palavras da alma

Adelto Gonçalves Especial para o Jornal Opção [caption id="attachment_31722" align="alignleft" width="250"]Herberto Helder foi o autor de uma obra consistente, mas que viveu uma vida em construção | Foto: publico.pt Herberto Helder foi o autor de uma obra consistente, mas que viveu uma vida em construção | Foto: publico.pt[/caption] Se Fernando Pessoa (1888-1935) foi a figura de proa da poesia portuguesa na primeira metade do século XX, na segunda es­se espaço foi ocupado por Herberto Helder (1930-2015), um poeta fascinado pelo poder encantatório da linguagem, decorrente do uso ritual da palavra, como observou Maria Estela Guedes num dos dois livros que escreveu sobre essa personagem mítica, “Herberto Helder, o poeta obscuro” (Lisboa, Moraes Editores, 1979). De fato, como observa a autora no segundo livro que dedicou à produção do poeta, “A obra ao rubro de Herberto Helder” (São Paulo, Escrituras, 2010), em todos os seus poemas está presente um tipo de magia fundada no trabalho poético sobre as palavras. E que, especialmente, procura imagens na Natureza. Esse trabalho pode ser sintetizado nestas palavras de Helder, que estão no o prefácio de seu livro “As magias”: “(...) Mas as palavras não são apenas palavras. Tem longas raízes tenazes mergulhadas na carne, mergulhadas no sangue, e é doloroso arrancá-las”. Arrancar palavras da alma parece ter sido a obsessão desse poeta que, a exemplo de José Saramago (1922-2010), único Prêmio Nobel da Literatura Portuguesa, não colocou na parede diploma de nenhuma universidade. Se Saramago, que também foi bom poeta, além de excepcional romancista, não frequentou os bancos de nenhuma faculdade, Helder chegou a matricular-se na Universidade de Coimbra, mas não concluiu ne­nhum dos cursos que fez. Formou-se, isso sim, na universidade da vida. Sem contar que sempre foi um ávido leitor, não só de poetas e romancistas europeus, como de poetas latino-americanos como o mexicano Octavio Paz (1914-1998), o argentino Jorge Luís Borges (1899-1986) e o chileno Vicente Huidobro (1893-1948). Como se lê na biografia “Her­ber­to Helder, a obra e o homem” (Lis­boa, Arcádia, 1982), que escreveu a professora Maria de Fátima Marinho, vice-reitora da Universidade do Porto, o poeta, nascido no Funchal, sempre esteve na contramão da sociedade bem comportada. Por isso, sua figura, a partir da notoriedade de seus versos, passou a ganhar uma aura mítica, que só aumentou nos últimos anos, depois que se refugiou num pretenso anonimato, recusando-se a receber prêmios literários, como o Fernando Pessoa, na década de 90, e a conceder entrevistas e até a deixar-se fotografar. Em linhas gerais, viveu uma vida em construção, sem muito apego a valores burgueses: foi propagandista de produtos farmacêuticos, redator de publicidade e outros ofícios. Sabe-se também que viveu precariamente como imigrante em países como França, Holanda e Bélgica, onde igualmente desempenhou trabalhos que os naturais do lugar se recusam a fazer. Em Antuérpia, teria sido guia de marinheiros e turistas nos meandros da zona do meretrício. E até cantor de tangos. Só em 1960, depois de voltar a Lisboa, conseguiu um emprego mais estável como encarregado das bibliotecas itinerantes da Fundação Calouste Gulbenkian que viajavam pelas vilas e freguesias do país. Foi ainda repórter e redator por dois anos de uma revista em Angola, às vésperas da derrubada do regime colonial. Morto o poeta, naturalmente, agora abundam os elogios das fontes oficiais, mas a verdade é que Herberto Helder, ainda que tenha publicado uma vasta obra, foi um poeta marginal e desconhecido em Portugal por muito tempo – e mais ainda pelo público e até mesmo pelos acadêmicos brasileiros. Só nos últimos tempos passou a ser mais reverenciado e seus livros procurados – um ou outro chegou a alcançar tiragem de cinco mil exemplares, o que é surpreendente em se tratando de poesia. Se sua poesia transcendeu a de Fernando Pessoa, ainda não se pode dizer. Se não chegou a tanto, passou perto. Adelto Gonçalves é doutor em Letras na área de Literatura Portuguesa pela USP

Os 5 melhores poemas goianos, segundo o poeta Carlos Willian Leite

 

o beijo de Klimt – Yêda Schmaltz
[caption id="attachment_31551" align="alignright" width="300"]Klimt_site O beijo, quadro do pintor austríaco Gustav Klimt[/caption]   No pulso da noite resvalam as minhas estruturas. Na noite, das mais escuras, meus espantos, maus espasmos e o impulso de ver-te. Na geografia do meu quarto, procuro outro canal. Maçãs, nádegas e seios me observam pelo grande espelho desfeito. Estradas, rios, os chapéus e os livros de cabeceira: uma legião de kamikazes no pulso da noite e na geografia do meu leito.   Aqui, onde me deito, procuro outro canal, um colírio, um milagre de imagem neste mundo de TV cansada e mínima. Por um caminho escuro, estreito, Entro no quadro de Gustav Klimt: um exército de estrelas no céu me ilumina; um discurso é consumado; um verso arremessado, exíguo e ébrio; e a mentira, capengando, sai por outro lado. Um filme abstrato e poético, O Beijo, de Klimt; toda a fotografia e a música de um poema, postura de Giotto, no que revoluciona, cores, formas e luzes.   Dentro do quadro de Klimt, tomo a postura da imagem feminina, a envolvida, e me ajoelho: estou nos braços no deus-beijo. Qualquer retórica seria ilógica ou tão possível, como desejou Gertrud Stein: “A rose is a rose is a rose" e o beijo de Klimt. Leda amando a glande do pescoço- pênis do amado cisne. As coisas vão crescendo: um poeta e seu mundo de fermento.   Pingos de luzes e ouros, tesouros abraçados, pedaços dos meus vestidos envolvidos, retalhos da melhor ternura, a que me faz falta. Porque o beijo que me beija Klimt é o beijo do meu Namorado, mas é também o beijo de tudo o que me ama e que desejo — meu pai que foi pra guerra e me deixou, minha mãe que não ficou madrasta me matando, pelos figos da figueira que o sabiá beliscou.   Oh, excitação do nervo óptico, o óptimo do beijo de Klimt, chuva de cores e amores em mint. Imaginação virtual, ícone de sempre, virtude, vírgula, virtuose, vitória total. O amor reciclado: olhar de novo o céu estrelado, estrelar-se, deslocar-se, implantar-se, chover-se, colorir-se, ser-se. O mundo e o amor, o fogo num simples beijo e tudo no meu olhar.   A natureza da imagem seria algo nomeável? Ou um receptáculo, um campo minado ou granulado de luzes? Centelhas brancas e vermelhas. O Beijo de Klimt é um filme extenso, que determina o intenso, na minha retina indômita; igual quando vejo as luzes e, em seguida, elas permanecem brilhando, mesmo fechando os olhos: princípio da bomba-atômica.  
Canção do Pont Neuf – Afonso Félix de Sousa
Como a juntar meus próprios ossos debrucei-me sobre lembranças que acreditava em frias poças mas nunca em águas assim mansas nem neste rio longe e próximo. É tão bom quedar-me em tais margens junto de águas que nunca bebo, onde por muito contemplar-se o céu da tarde ficou bêbado e entortaram-se aquelas árvores. Meu Sena amigo, tantas vezes parei neste cais dolorido, que uma possível correnteza levará em meio a detritos, toda minha alma pelo avesso. Perguntas, silêncios e fomes - tudo te trago qual um filho. E algo de mim se desmorona aqui nestas bordas tranqüilas, pois ci-gît mon coeur vagabond Barcos de solidões flutuam sobre tuas noites - e afogas louros fantasmas de uma lua mais longínqua, mais melancólica, mais de outro mundo do que a Lua. De ti me abeiro, e me dissolvo, mas nunca me sinto sozinho. Os que têm ouvido aqui ouvem palavras que um dia o destino prendeu a trechos de Beethoven.   Ou são falas de amar que escuto? Meu rio, de mim o que guardas? Sei de meu coração sepulto nalgum ponto de tuas margens, mas sei que de há muito está mudo. Em volta a cidade, profunda, vai pelos dois lados do rio. Para lá da cidade, o mundo. Mais para lá, o amor que tive ... meu rio como eu vagabundo.  
Melodias – Gilberto Mendonça Teles
Ternas melodias de longínquas plagas, nas manhãs da vida fascinando a gente, sois o desafio de revoltas vagas pela alma ecoando como um som ausente.   Ternas melodias, de que mundo ignoto, de que estranhas terras vindes me encontrar? Sois a transparência que no sonho noto? Sois a ressonância do poema, no ar?   Ou vindes dos astros — de uma Sírius? Vênus? De que firmamento, de que céus surgistes? Quérulos gemidos de amarguras plenos só podem ser ecos de meus sonhos tristes.   Essas melodias cheias de tristeza são talvez saudades que em meu peito eu tinha; são as confidências dessa natureza de milhares de almas que possuo na minha   Essas melodias que a minh'alma douram , que a meus sonhos beijam com tamanho ardor, essas melodias tão sonoras foram de remotos tempos vibrações de amor.  
Sem Título – Heleno Godoy
Adentrar a casa, pelo portão: pórtico finca- do entre grades, gran- de o muro em torno; entre o porão e o ático, a casa se estende e se protege: um projeto ou uma proposta (a porta a ser fechada), a casa se constrói no que acumula — um cedro no jardim e outro na sala, cortado e revestido; como o musgo a recobrir a casa e seus súditos: um súbito susto, de medo — sua medida.  
As Escarpas do Olimpo – Valdivino Braz
Os dias, os dias e os dias. Os dias-ossos, duros de roer, que o dentro é o que rói seus dias de cão. As letras, moscas, máculas de ósseos ofícios. Os degraus da rocha por onde desço: Sísifo, cansaço de artifícios. Ombros de chumbo, como nas costas de Atlas a bola do mundo. Nas escarpas do Olimpo, carrego a pedra dos rins e bebo a água do (ab)sinto: a ilusão de consolidar-se uma obra, toda uma vida, que se tira do nada pérolas de madrepérola, ou leite das pedras, ao avesso das cabras. Sobras de uma, sombras de outra, vida e obra se consolidam na ilusão de ambas, tão certo quanto incerto o futuro, tão claro quanto surpreender-me no escuro. Mas que diabos! Há um cão mais arcaico do que lamber-se o branco, feito coito? Já devia ter-me acostumado à idéia da inutilidade de tudo — esquecer-se de si, matar-se de vida por uma obra. Tenho moído as pedras desta vida, e soprado os fantasmas do pó. Mão e mó de moer-se sozinho, o sonho é que move os moinhos. Prevalece o branco — a óssea resistência, a imponência da rocha — onde a vassoura dos ventos junta a ciscalha dos signos. Tenho varrido as folhas de tudo, as quedas do tempo, as sobras do sonho, a munha, no moinho dos ventos. Nos bolsos ainda apanho sustos, ainda alguma ilusão de Olimpo, o cisco do redemoinho das formas. Ainda uns fogos da noite, sonâmbulos relâmpagos, incendeiam meu quintal de figos efêmeros, os maduros imaginários do relógio. Ocupado em viver a morte que me vive, vivo enquanto agonizo. O tempo é um maestro de facas, e a vida o gemido rasgado de galos que morrem, mas agora a tudo tempero com a salsa da indiferença: já nem ligo para os furos nos bolsos, por onde tudo vazou: as pedras moídas nas horas desertas desta porfia à revelia de ampulheta. Toda perda, os frutos que perdi. Todo branco, a poeira que comi. Mas não se eleva do pó o Olimpo dos reveses? Vá que ainda me limpo na fortaleza dos deuses. Ah, pendurar-me o suor num prego, me banhar com a água do sossego!

O dia em que o mundo dedica um pouco de seu tempo para ler Tolkien

Hoje, em diversos países, pessoas dedicam um pouco de seu tempo a ler a obra de um dos autores mais célebres da literatura mundial: J.R.R. Tolkien. Leia você também Marcos Nunes Carreiro [caption id="attachment_31506" align="alignright" width="300"]Tolkien J.R.R. Tolkien: o autor é celebrado neste 25 de março[/caption] “Num buraco no chão vivia um Hobbit”. Foi com esta frase que o mundo conheceu John Ronald Reuel Tolkien, o homem que não apenas colocou a escrita de fantasia de volta nas prateleiras de todo o mundo, como também criou as bases para que fosse considerado o “pai da fantasia moderna”. Geralmente lembrado como o autor de “O Senhor dos Aneis”, Tolkien possui uma obra que abrange mais de 50 livros — grande parte deles publicados postumamente. Essa vasta obra contém a criação de um autor que formou uma mitologia completa para compor o mundo que mudou a forma de escrever sobre fantasia e, até os dias atuais, serve de guia para diversos autores, músicos, cineastas, pintores etc. Por isso, Tolkien é o motivo que levou à formação de várias sociedades ao redor do mundo, como a Tolkien Brasil, que divulga o trabalho do autor no País e aglomera fãs e pesquisadores de sua obra. A principal dessas sociedades, como não poderia deixar de ser, é a internacional Tolkien Society, que tem sede na Inglaterra. Em 2003, essa organização deu início ao dia que motiva a escrita desta matéria: o Dia de Ler Tolkien. O dia comemorativo foi escolhido pela Tolkien Society depois que um jornalista perguntou ao comitê: “Existe um dia dedicado informalmente para ler o autor, da mesma forma que o ‘bloomsday’ é dedicado a Joyce?”. Bloomsday é o único feriado no mundo dedicado à leitura de um livro não religioso, em que milhares de pessoas param o trabalho na Irlanda para ler James Joyce. Por isso, o comitê da Tolkien Society, liderado à época por Chris Crawshaw, escolheu o dia 25 de março como o marco para ler a obra do autor britânico. Em homenagem a este dia, o Jornal Opção reproduz um dos trechos mais marcantes de “O Silmarillion”, obra central da mitologia tolkieniana, em que o autor descreve a criação das árvores que regem as histórias do mundo antigo, as Árvores de Valinor:

E enquanto olhavam, sobre a colina surgiram dois brotos esguios; e o silêncio envolveu todo o mundo naquela hora, nem havia nenhum outro som que não o canto de Yavanna. Em obediência a seu canto, as árvores jovens cresceram e ganharam beleza e altura; e vieram a florir; e assim, surgiram no mundo as Duas Árvores de Valinor. De tudo o que Yavanna criou, são as mais célebres, e em torno de seu destino são tecidas todas as histórias dos Dias Antigos.

Uma tinha folhas verde-escuras, que na parte de baixo eram como prata brilhante; e de cada uma de suas inúmeras flores caía sem cessar um orvalho de luz prateada; e a terra sob sua copa era manchada pelas sombras de suas folhas esvoaçantes. A outra apresentava folhas de um verde viçoso, como o da faia recém-aberta, orladas de um dourado cintilante. As flores balançavam nos galhos em cachos de um amarelo flamejante, cada um na forma de uma cornucópia brilhante, derramando no chão uma chuva dourada. E da flor daquela árvore, emanavam calor e uma luz esplêndida. Telperion, a primeira, era chamada em Valinor; mas Laurelin era a outra.

Leia mais: Tolkien: de fato o senhor da fantasia Jackson reinventa Tolkien O Hobbit e a eterna dualidade entre literatura e cinema Tomado pela “doença do dragão”, Peter Jackson destruiu a obra de J.R.R. Tolkien

“Violeta velha e outras flores”: a obra de quem não queria apenas contar, mas representar histórias

Em seu primeiro livro, o publicitário paulista Matheus Arcaro busca o refinamento das palavras com o objetivo de significar a paisagem escarnecida ao redor de suas personagens

Na contramão de Kubrick, mineiro condena a violência de mãos dadas com a civilização

Matheus Moura faz, em seu romance gráfico, o que Coetzee não fez: explicita sua militância a favor dos chamados Direitos dos Animais

Uma lista impossível: os 15 melhores poemas de amor

Yago Rodrigues Alvim Sabe aqueles textos que te inquietam, agoniam sem sequer uma palavra estar escrita? E nem precisa ser texto. Sabe aquela coisa que te bota medo, antes mesmo que exista uma ínfima possibilidade que aconteça? Que te estremece mesmo, que te deixa perdido, sem qualquer indicação de caminho? Foi bem assim ter que elencar alguns poemas e intitulá-los como “os melhores poemas”. Por isso, alguns jornalistas, escritores, artistas ajudaram a preencher as próximas linhas de mais puro amor. Para esclarecer, não seguem uma hierarquização de “qual é o melhor”, até porque, às vezes, o melhor poema de amor pode ser um olhar, um sorriso, um abraço. Pode ser qualquer coisa que te diga, te faça sentir que “te amo”. Antes, bem vale dizer que só seria uma lista definitiva se todas as poesias fossem conhecidas e se fosse possível todas lê-las e, ainda, se todas escritas já tivessem sido. Como não, é efêmera a lista, breve, tal qual um susto de amor. E, ainda há o alerta: é quase impossível não repetir Drummond, não repetir Vinícius, assim como é quase impossível viver sem amar ou não ser ridículo, caro Pessoa, ao falar de amor. [caption id="attachment_29916" align="alignnone" width="620"]"O Beijo" de Gustav Klimt "O Beijo" de Gustav Klimt[/caption] As sem razões do amor - Carlos Drummond de Andrade Eu te amo porque te amo. Não precisas ser amante, E nem sempre sabes sê-lo. Eu te amo porque te amo. Amor é estado de graça E com amor não se paga.   Amor é dado de graça É semeado no vento, Na cachoeira, no eclipse. Amor foge a dicionários E a regulamentos vários.   Eu te amo porque não amo Bastante ou demais a mim. Porque amor não se troca, Não se conjuga nem se ama. Porque amor é amor a nada, Feliz e forte em si mesmo.   Amor é primo da morte, E da morte vencedor, Por mais que o matem (e matam) A cada instante de amor.   Quero - Carlos Drummond de Andrade Quero que todos os dias do ano todos os dias da vida de meia em meia hora de 5 em 5 minutos me digas: Eu te amo.   Ouvindo-te dizer: Eu te amo, creio, no momento, que sou amado. No momento anterior e no seguinte, como sabê-lo?   Quero que me repitas até a exaustão que me amas que me amas que me amas. Do contrário evapora-se a amação pois ao não dizer: Eu te amo, desmentes apagas teu amor por mim.   Exijo de ti o perene comunicado. Não exijo senão isto, isto sempre, isto cada vez mais. Quero ser amado por e em tua palavra nem sei de outra maneira a não ser esta de reconhecer o dom amoroso, a perfeita maneira de saber-se amado: amor na raiz da palavra e na sua emissão, amor saltando da língua nacional, amor feito som vibração espacial. No momento em que não me dizes: Eu te amo, inexoravelmente sei que deixaste de amar-me, que nunca me amastes antes.   Se não me disseres urgente repetido Eu te amoamoamoamoamo, verdade fulminante que acabas de desentranhar, eu me precipito no caos, essa coleção de objetos de não-amor.   Um poema de amor - Charles Bukowski (Tradução: Jorge Wanderley) todas as mulheres todos os beijos delas as formas variadas como amam e falam e carecem.   suas orelhas elas todas têm orelhas e gargantas e vestidos e sapatos e automóveis e ex- maridos.   principalmente as mulheres são muito quentes elas me lembram a torrada amanteigada com a manteiga derretida nela.   há uma aparência no olho: elas foram tomadas, foram enganadas. não sei mesmo o que fazer por elas.   sou um bom cozinheiro, um bom ouvinte mas nunca aprendi a dançar — eu estava ocupado com coisas maiores.   mas gostei das camas variadas lá delas fumar um cigarro olhando pro teto. não fui nocivo nem desonesto. só um aprendiz.   sei que todas têm pés e cruzam descalças pelo assoalho enquanto observo suas tímidas bundas na penumbra. sei que gostam de mim algumas até me amam mas eu amo só umas poucas.   algumas me dão laranjas e pílulas de vitaminas; outras falam mansamente da infância e pais e paisagens; algumas são quase malucas mas nenhuma delas é desprovida de sentido; algumas amam bem, outras nem tanto; as melhores no sexo nem sempre são as melhores em outras coisas; todas têm limites como eu tenho limites e nos aprendemos rapidamente.   todas as mulheres todas as mulheres todos os quartos de dormir os tapetes as fotos as cortinas, tudo mais ou menos como uma igreja só raramente se ouve uma risada.   essas orelhas esses braços esses cotovelos esses olhos olhando, o afeto e a carência me sustentaram, me sustentaram.   Eu Te Amo - Chico Buarque  Ah, se já perdemos a noção da hora Se juntos já jogamos tudo fora Me conta agora como hei de partir   Se ao te conhecer, dei pra sonhar, fiz tantos desvarios Rompi com o mundo, queimei meus navios Me diz pra onde é que inda posso ir   Se nós, nas travessuras das noites eternas Já confundimos tanto as nossas pernas Diz com que pernas eu devo seguir   Se entornaste a nossa sorte pelo chão Se na bagunça do teu coração Meu sangue errou de veia e se perdeu   Como, se na desordem do armário embutido Meu paletó enlaça o teu vestido E o meu sapato inda pisa no teu   Como, se nos amamos feito dois pagãos Teus seios inda estão nas minhas mãos Me explica com que cara eu vou sair   Não, acho que estás te fazendo de tonta Te dei meus olhos pra tomares conta Agora conta como hei de partir   Poeminha Amoroso - Cora Coralina Este é um poema de amor tão meigo, tão terno, tão teu... É uma oferenda aos teus momentos de luta e de brisa e de céu... E eu, quero te servir a poesia numa concha azul do mar ou numa cesta de flores do campo. Talvez tu possas entender o meu amor. Mas se isso não acontecer, não importa. Já está declarado e estampado nas linhas e entrelinhas deste pequeno poema, o verso; o tão famoso e inesperado verso que te deixará pasmo, surpreso, perplexo... eu te amo, perdoa-me, eu te amo...   Todas as cartas de amor… - Fernando Pessoa Todas as cartas de amor são Ridículas. Não seriam cartas de amor se não fossem Ridículas.   Também escrevi em meu tempo cartas de amor, Como as outras, Ridículas.   As cartas de amor, se há amor, Têm de ser Ridículas.   Mas, afinal, Só as criaturas que nunca escreveram Cartas de amor É que são Ridículas.   Quem me dera no tempo em que escrevia Sem dar por isso Cartas de amor Ridículas.   A verdade é que hoje As minhas memórias Dessas cartas de amor É que são Ridículas.   (Todas as palavras esdrúxulas, Como os sentimentos esdrúxulos, São naturalmente Ridículas.)   Amar - Florbela Espanca Eu quero amar, amar perdidamente! Amar só por amar: Aqui... além... Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente Amar! Amar! E não amar ninguém!   Recordar? Esquecer? Indiferente!... Prender ou desprender? É mal? É bem? Quem disser que se pode amar alguém Durante a vida inteira é porque mente!   Há uma Primavera em cada vida: É preciso cantá-la assim florida, Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!   E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada Que seja a minha noite uma alvorada, Que me saiba perder... pra me encontrar...   Amor que morre - Florbela Espanca O nosso amor morreu... Quem o diria! Quem o pensara mesmo ao ver-me tonta, Ceguinha de te ver, sem ver a conta Do tempo que passava, que fugia!   Bem estava a sentir que ele morria... E outro clarão, ao longe, já desponta! Um engano que morre... e logo aponta A luz doutra miragem fugidia...   Eu bem sei, meu Amor, que pra viver São precisos amores, pra morrer, E são precisos sonhos para partir.   E bem sei, meu Amor, que era preciso Fazer do amor que parte o claro riso De outro amor impossível que há de vir!   Elegia: Indo para o leito - John Donne (Tradução de Augusto Campos) Vem, Dama, que eu desafio a paz, Até que eu lute, em luta o corpo jaz. Como o inimigo diante do inimigo, Canso-me de esperar se nunca brigo. Solta esse cinto sideral que vela, Céu cintilante, uma área ainda mais bela. Desata esse corpete constelado, Feito para deter o olhar ousado. Entrega-te ao torpor que se derrama De ti a mim, dizendo: hora da cama. Tira o espartilho, quero descoberto O que ele guarda, quieto, tão de perto. O corpo que de tuas saias sai É um campo em flor quando a sombra se esvai. Arranca essa grinalda armada e deixa Que cresça o diadema da madeixa. Tira os sapatos e entra sem receio Nesse templo de amor que é nosso leito. Os anjos mostram-se num branco véu aos homens. Tu, meu Anjo, é como o Céu De Maomé. E se no branco têm contigo Semelhança os espíritos, distingo: O que o meu Anjo branco põe não é O cabelo mas sim a carne em pé. Deixa que a minha mão errante adentre Atrás, na frente, em cima, em baixo, entre. Minha América! Minha terra à vista, Reino de paz, se um homem só a conquista, Minha Mina preciosa, meu Império! Feliz de quem penetre o teu mistério! Liberto-me ficando teu escravo; Onde cai minha mão, meu selo gravo. Nudez total! Todo prazer provém De um corpo (como a alma sem corpo) Sem vestes. As jóias que mulher ostenta São como bolas de ouro de Atlanta: Os olhos do tolo que uma gema inflama Ilude-se com ela e perde a dama. Como encadernação vistosa, feita Para iletrados, a mulher se enfeita; Mas ela é um livro místico e somente A alguns (a qual tal graça se consente) É dado lê-la. Eu sou um que sabe; Como se diante da parteira, abre-Te: Atira, sim, o linho branco fora, Nem penitência nem decência agora. Para ensinar-te eu me desnudo antes: A coberta de um homem te é bastante   Bilhete - Mário Quintana  Se tu me amas, ama-me baixinho Não o grites de cima dos telhados Deixa em paz os passarinhos Deixa em paz a mim! Se me queres, enfim, tem de ser bem devagarinho, Amada, que a vida é breve, e o amor mais breve ainda...   Poema XLIV - Pablo Neruda  Saberás que não te amo e que te amo pois que de dois modos é a vida, a palavra é uma asa do silêncio, o fogo tem a sua metade de frio.   Amo-te para começar a amar-te, para recomeçar o infinito e para não deixar de amar-te nunca: por isso não te amo ainda.   Amo-te e não te amo como se tivesse nas minhas mãos a chave da felicidade e um incerto destino infeliz.   O meu amor tem duas vidas para amar-te. Por isso te amo quando não te amo e por isso te amo quando te amo.   Os espaços do sono - Robert Desnos (Tradução de Eclair Antônio Almeida Filho) À noite há naturalmente as sete maravilhas do mundo e a grandeza e o trágico e o encanto. Nela as florestas se chocam confusamente com criaturas de lenda escondidas nos bosques. Há você. Na noite há o passo do caminhante e o do assassino e o do agente de polícia e a luz do revérbero e a da lanterna do trapeiro. Há você. Na noite passam os trens e os barcos e a miragem dos países onde é dia. Os derradeiros sopros do crepúsculo e os primeiros arrepios da aurora. Há você. Uma ária de piano, um brilho de voz. Uma porta range. Um relógio. E não somente os seres e as coisas e os ruídos materiais. Mas ainda eu que me persigo ou sem cessar me ultrapasso. Há você a imolada, você que eu espero. Por vezes estranhas figuras nascem no instante do sono e desaparecem. Quando cerro os olhos, florações fosforescentes aparecem e murcham e renascem como carnosos fogos de artifício. Países desconhecidos que percorro em companhia de criaturas. E há você sem dúvida, ó bela e discreta espiã. E a alma palpável do espaço. E os perfumes do céu e das estrelas e o canto do galo de há 2 000 anos e o choro do pavão em parques em chama e beijos. Mãos que se apertam sinistramente numa luz baça e eixos que rangem sobre estradas medusantes. Há você sem dúvida que não conheço, que conheço ao contrário. Mas que, presente em meus sonhos, te obstinas a neles se deixar adivinhar sem aparecer. Você que permanece inapreensível na realidade e no sonho. Você que pertence a mim por minha vontade de possuí-la em ilusão, mas que não aproxima seu rosto do meu como meus olhos fechados tanto ao sonho como à realidade. Você que a despeito de uma retórica fácil em que a onda morre nas praias, em que a gralha voa em usinas em ruínas, em que a madeira apodrece rachando-se sob um sol de chumbo. Você que está na base de meus sonhos e que excita meu espírito pleno de metamorfoses e que me deixa sua luva quando beijo sua mão. À noite há as estrelas e o movimento tenebroso do mar, dos rios, das florestas, das idades, das relvas, dos pulmões de milhões e milhões de seres. À noite há as maravilhas do mundo. À noite não há anjos da guarda, mas há o sono. À noite há você. No dia também.   Monólogo de Orfeu - Vinicius de Moraes Mulher mais adorada! Agora que não estás, deixa que rompa o meu peito em soluços Te enrustiste em minha vida, e cada hora que passa É mais por que te amar a hora derrama o seu óleo de amor em mim, amada.   E sabes de uma coisa? Cada vez que o sofrimento vem, essa vontade de estar perto, se longe ou estar mais perto se perto Que é que eu sei? Este sentir-se fraco, o peito extravasado o mel correndo, essa incapacidade de me sentir mais eu, Orfeu; Tudo isso que é bem capaz de confundir o espírito de um homem.   Nada disso tem importância Quando tu chegas com essa charla antiga, esse contentamento, esse corpo E me dizes essas coisas que me dão essa força, esse orgulho de rei.   Ah, minha Eurídice Meu verso, meu silêncio, minha música. Nunca fujas de mim. Sem ti, sou nada. Sou coisa sem razão, jogada, sou pedra rolada. Orfeu menos Eurídice: coisa incompreensível! A existência sem ti é como olhar para um relógio Só com o ponteiro dos minutos. Tu és a hora, és o que dá sentido E direção ao tempo, minha amiga mais querida!   Qual mãe, qual pai, qual nada! A beleza da vida és tu, amada Milhões amada! Ah! Criatura! Quem poderia pensar que Orfeu, Orfeu cujo violão é a vida da cidade E cuja fala, como o vento à flor Despetala as mulheres - que ele, Orfeu, Ficasse assim rendido aos teus encantos?   Mulata, pele escura, dente branco Vai teu caminho que eu vou te seguindo no pensamento e aqui me deixo rente quando voltares, pela lua cheia Para os braços sem fim do teu amigo   Vai tua vida, pássaro contente Vai tua vida que estarei contigo.   Namorados no Mirante - Vinicius de Moraes  Eles eram mais antigos que o silêncio A perscrutar-se intimamente os sonhos Tal como duas súbitas estátuas Em que apenas o olhar restasse humano. Qualquer toque, por certo, desfaria Os seus corpos sem tempo em pura cinza. Remontavam às origens - a realidade Neles se fez, de substância, imagem. Dela a face era fria, a que o desejo Como um hictus, houvesse adormecido Dele apenas restava o eterno grito Da espécie - tudo mais tinha morrido. Caíam lentamente na voragem Como duas estrelas que gravitam Juntas para, depois, num grande abraço Rolarem pelo espaço e se perderem Transformadas no magma incandescente Que milênios mais tarde explode em amor E da matéria reproduz o tempo Nas galáxias da vida no infinito.   Eles eram mais antigos que o silêncio...   Soneto de Fidelidade  - Vinicius de Moraes De tudo ao meu amor serei atento Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto Que mesmo em face do maior encanto Dele se encante mais meu pensamento.   Quero vivê-lo em cada vão momento E em seu louvor hei de espalhar meu canto E rir meu riso e derramar meu pranto Ao seu pesar ou seu contentamento   E assim, quando mais tarde me procure Quem sabe a morte, angústia de quem vive Quem sabe a solidão, fim de quem ama   Eu possa me dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama Mas que seja infinito enquanto dure.

Os 15 melhores romances brasileiros do século 21. Segundo o Brasil Post

A lista contém obras literárias de qualidade. Mas esquece "Um Defeito de Cor", talvez o romance brasileiro mais importante publicado no século 21

Brasileiro Bernardo Ajzenberg ganha prêmio cubano Casa de las Américas

Bernardo Ajzenberg (foto acima, da Cosac Naify) é um jornalista que escreve bem ou é de fato um escritor a ser considerado? Ex-repórter, editor e ombudsman da “Folha de S. Paulo”, Ajzenberg venceu o prêmio cubano Casa de las Américas, na categoria literatura brasileira, com o romance “Minha Vida Sem Banho” (Editora Rocco). A colombiana Adelayda Fernádez Ochoa levou o prêmio principal, com “La Hoguera Lame Mi Piel Con Cariño de Perro”. O colombiano Nelson Omero Guzmán, com o livro “Bajo el Brillo de la Luna”, levou o prêmio de poesia. O cubano José Ferrán Oliva, autor de “Cuba Año 2025”, ganhou o prêmio na categoria de melhor ensaio de tema histórico e social.

Romance é produto de caçada de Chico Buarque pelo irmão alemão

[caption id="attachment_21474" align="alignleft" width="620"]Chico Buarque de Holanda e Sergio Günther, seu irmão alemão: a imaginação “reconstruiu”  a história do misterioso filho de Sérgio Buarque de Holanda. O jornalista e cantor morreu de câncer no pulmão Chico Buarque de Holanda e Sergio Günther, seu irmão alemão: a imaginação reconstruiu” a história do misterioso filho de Sérgio Buarque de Holanda. O jornalista e cantor morreu de câncer no pulmão[/caption] Poucas vezes um livro — o romance “O Irmão Alemão” (Companhia das Letras, 239 páginas) — mereceu tanto destaque na imprensa brasileira. Os motivos? Primeiro, o autor. Chico Buarque é, além de escritor, um dos mais importantes compositores do País. É uma estrela, embora não queira ser uma celebridade. Segundo, na atualidade, não há tantos autores de qualidade, ou de alta qualidade, no mercado literário patropi. A “Folha de S. Paulo” concedeu três páginas ao lançamento do romance, com reportagens e duas críticas de qualidade, curtas mas sólidas, de Alcir Pécora e Marcelo Coelho. O jornal é responsável, de longe, pela mais rica cobertura da publicação de “O Irmão Alemão”. Logo a “Folha”, que empobreceu sua cobertura literária. A “Ilustrada”, aos sábados abre mais espaço para literatura, é em geral fraca, exceto quando publica as críticas mais contundentes de Alcir Pécora e Luís Augusto Fischer. As críticas dos professores da Universidade de Campinas (Unicamp) e da Universidade do Rio Grande do Sul são consistentes, corajosas e posicionadas. Não ficam em cima do muro — o que tem provocado reações acerbas, às vezes infantis, de alguns criticados. “O Irmão Alemão” é um romance, não uma biografia, sobre o irmão mais velho de Chico Buarque de Holanda, Sergio Georg Ernst (mais conhecido como Sergio Günther), nascido em 1930 e falecido em 1981, aos 50 anos, em decorrência de câncer de pulmão. Ele era jornalista e, como alguns integrantes da família Buarque, cantor. O jornalista, escritor e biógrafo Ruy Castro ouviu sua música, a pedido da “Folha”, e disse que “é uma boa droga, típica do pior pop europeu por volta de 1960”. Correspondente de “O Jornal” (de Assis Chateaubriand) na Alemanha pré-Hitler, Sérgio Buarque namorou a alemã Anne Margerithe Ernst e, com ela, teve o garoto Sergio Ernst, que não conheceu. O celebrado autor do clássico “Raízes do Brasil” voltou para seu País, escreveu críticas literárias e se tornou um de seus mais importantes historiadores. Chegou a receber uma carta de Anne Ernst sobre o nascimento de seu filho, mas os jovens, na turbulenta década de 1930, perderam contato. Possivelmente por não ter condições de criar o garoto, Anne Ernst entregou-o para a Prefeitura de Berlim, que decidiu informar Sérgio Buarque, em 1932. O historiador comunicou que poderia criar o menino ou poderia sustentá-lo em Berlim. Sem receber resposta, o brasileiro continuou tocando sua vida, até que, em 1934, com Hitler no poder, recebeu mais uma carta de uma autoridade alemã. O casal Arthur e Pauline Günther pretendia adotar Sergio Ernst, mas, como a Alemanha estava controlada pelo nazismo, o governo pedia informações sobre a origem do pai, Sérgio Buarque. Queriam saber, lógico, se o brasileiro era ou não de origem judaica. Se era ariano. A documentação foi enviada e, aí, esqueceu-se do assunto por um longo tempo. Em 1967, numa conversa informal, o poeta Manuel Bandeira disse a Chico Buarque que ele tinha um irmão alemão. Desde então, o compositor (e, vá lá, cantor) e escritor ficou matutando sobre a história. Queria saber mais, juntar as pontas e descobrir quem era seu irmão mais velho. Decidiu reconstruir a história, para torná-la inteligível também para ele, por intermédio de um romance. Noutras palavras, decidiu escrever uma história ficcional sobre um assunto real, acabando por iluminar uma história real que, de tão confusa e complexa, era e é meio ficcional. Pode-se dizer que a realidade é a mina de ouro da literatura, porém é preciso escavá-la o mais fundo possível para torná-la ficcional. A imaginação recria a realidade, tornando-a mais luminosa, o que não é o mesmo que copiá-la ou imitá-la (mimese não é isto). No caso do irmão de Chico Buarque, com uma história “curta”, sem dados para sustentar uma biografia precisa, a imaginação é o instrumento mais eficaz para criar uma lógica, ou uma história. O autor de “Estorvo” e “Leite Derramado” decidiu “revelar” quem é o irmão. Adotado, Sergio Ernst mudou de nome, passando a ser chamado de Horst Günther. Aos 22 anos, retomou o prenome inicial, Sergio, mas manteve o sobrenome, Günther. Na década de 1950, o jornalista Sergio Günther se aventurou pelas artes, na televisão estatal da Alemanha Oriental, a Deutscher Fernsehfunk. Além de gravar discos, pois era cantor — “a voz dele era única, muito grave e sonora, e as pessoas reconheciam-na imediatamente, disse o radialista Siggi Trzoss à “Folha de S. Paulo” —, participou de programas de variedade. Era tido como mulherengo — casou-se quatro vezes e teve dois filhos. “Meu avô trabalhou para a TV, cantava muito bem e tinha carisma”, diz Josepha Prügel, neta de Sergio Günther e bisneta de Sérgio Buarque. O comunista Sergio Günther não assistiu a queda do muro de Berlim, em 1989. Morreu antes. As famílias Günther e Buarque de Holanda hoje estão próximas. A partir de certo momento, Chico Buarque sentiu um certo bloqueio e não conseguia mais escrever o romance. Pediu apoio ao editor da Companhia das Letras, Luiz Schwarcz. Este buscou a ajuda do historiador Sidney Chalhoub, que estava na Alemanha. Chalhoub pôs o historiador brasileiro João Klug e o museólogo alemão Dieter Lange no caminho de Chico Buarque e a história “cresceu”. Para romper o bloqueio em definitivo, Schwarcz sugeriu a leitura de “Austerlitz”, do escritor alemão W. G. Sebald. O brasileiro leu também “Paris — A Festa Continuou”, do jornalista Alan Riding. “O Irmão Alemão” chega às livrarias com uma edição de 70 mil exemplares. No domingo, 16, estive na Livraria Cultura, a do shopping Casa Park, em Brasília, e os funcionários me disseram que era um dos livros mais procurados da semana. Mas ainda não estava exposto. Se publicado na Alemanha, o livro certamente se tornará best seller e possivelmente será adaptado para o cinema, lá, aqui ou, quem sabe, em Hollywood.