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[caption id="attachment_18913" align="alignleft" width="620"] Klester Cavalcanti: o repórter escreveu um livro meticuloso e surpreendente sobre um matador de aluguel / Foto: Divulgação[/caption]
Depois de participar da Guerrilha do Araguaia, em 1972, Júlio Santana voltou para a casa dos pais, em Porto Franco, “decidido que não mataria mais ninguém”. Cícero Santana o procurou mais uma vez e convidou-o para participar de um assassinato. Leandro levou um tapa no rosto e contratou Cícero para matar o agressor, Aníbal. Júlio perguntou para o tio: “O senhor vai matar o cabra só porque ele deu um tapa na cara do outro?”. O tio explicou-se: “Não, Julão. Eu vou matar o cabra porque alguém me pagou para fazer isso. Aprenda uma coisa. Nesse negócio, não importa se o camarada é bonzinho ou se é um peste. Não quero saber se ele deu um tapa na cara do outro ou se estuprou a filha de alguém. O que importa é que a pessoa me paga e eu faço o serviço”.
Nesse tempo, Júlio começou “a sentir uma ponta de admiração e respeito pelo trabalho do tio pistoleiro”. Aceitou matar Aníbal. Ao encontrá-lo, Júlio perguntou: “O sr. sabe onde posso comprar uma Coca-Cola?”. Aníbal respondeu e Júlio o matou. Ele e o tio fugiram numa bicicleta. “Cícero pedalava com calma, como se nada tivesse acontecido. Júlio não conseguia esquecer a imagem daquele homem estendido a seus pés, com a cabeça lavada de vermelho. Mas seu tio demonstrava uma tranquilidade impressionante. Como, depois de tirar a vida de uma pessoa, ele poderia estar tão sereno? Era frieza. Ou seria coragem demais.”
Depois de ouvir que a polícia da região do Maranhão não se metia com pistoleiros e acreditando que poderia ficar rico, Júlio aceitou a proposta de se tornar matador profissional. Depois, recuou: “Sei não, tio. Acho que não quero entrar nesse negócio”. Cícero insistiu que, se rezasse dez ave-marias e 20 pai-nossos, a alma seria “limpa”.
Ao aceitar ser sócio de Cícero, Júlio ouvia, no rádio, uma música do goiano Odair José. Ele lembra que o refrão dizia: “Eu vou tirar você desse lugar. Eu vou levar você pra ficar comigo”. O tio garantiu que Odair José era o “melhor” cantor do Brasil.
Cícero disse para Júlio economizar para comprar uma motocicleta e sugeriu que usasse apenas uma arma (como parece ser o caso do serial killer goiano Tiago Henrique Gomes da Rocha, de 26 anos). “Isso lhe daria mais segurança e precisão no tiro.” O tio deu-lhe um revólver calibre 38. Cícero explicou que Júlio devia atirar nas suas vítimas bem de perto — “porque é importante que o tiro seja certeiro, de preferência na cabeça”.
Orientado pelo tio, o pistoleiro-chefe, Júlio viajou para Açailândia para matar Caetano, vendedor de frutas que devia dinheiro a um comerciante. Como Caetano atendia todas as pessoas com um “sorriso largo”, Júlio sentiu pena dele. Seguiu Caetano até sua casa e chamou-o. Depois de fazer uma pergunta, acertou um tiro no seu rosto e “saiu correndo matagal adentro. Enquanto corria, rezava as dez ave-marias e os 20 pai-nossos que deveriam tirar de sua alma o peso da morte daquele coitado. Mas parecia que, quanto mais rezava, mais culpado se sentia”.
O primeiro crime como profissional ocorreu em 27 de julho de 1972. Pelo assassinato, recebeu 300 cruzeiros. “Ganhar 300 cruzeiros por um dia de trabalho era algo que ele jamais imaginara ser possível. Além disso, havia gostado da emoção que sentira ao matar Caetano.” Ele “queria ganhar mais dinheiro”.
Depois de assassinar um menino de 13 anos, em 1978, em Paragominas, no Pará, Júlio foi contratado por José Mariano, o Índio, para matar o garimpeiro João Baiano, no garimpo de Serra Pelada. João Baiano havia roubado ouro do patrão. Recebeu informações de que João Baiano era negro e tinha um dente de ouro. Matou o garimpeiro errado. Em seguida, matou o verdadeiro João Baiano.
Júlio matou quatro menores de 16 anos, 59 mulheres (“a maior parte delas teve a morte encomendada pelos próprios maridos, que acreditavam ter sido traídos”) e 424 homens. Sem contar “as três pessoas [Amarelo, Maria Lúcia Petit e Caetano] que matou antes de 1974, quando começou a anotar seus trabalhos” num caderno. Esse caderno era mantido escondido numa mochila, atrás do guarda-roupa, e nele havia um relato pormenorizado com os nomes de suas vítimas e as circunstâncias de suas mortes.
Após de matar tantas pessoas, como se estivesse numa guerra particular, Júlio amealhou um patrimônio que ele considera ínfimo — uma voadeira, um Fiat 147 e 100 mil reais. “Aos 51 anos, dos quais quase 35 trabalhando exclusivamente como matador de aluguel — ele jamais teve outra atividade profissional —, achava que tudo aquilo era muito pouco para tanta desgraça e miséria que viu e fez na vida. Se soubesse que terminaria assim, jamais teria ouvido os conselhos do tio.”
Embora tenha matado tantas pessoas, Júlio só foi preso uma vez. Matou uma mulher, em Tocantinópolis, mas subornou o delegado, dando-lhe uma motocicleta, e fugiu.
Em junho de 2006, Júlio prometeu à sua mulher, evangélica, “que não cometeria mais nenhum homicídio”. Klester Cavalcanti diz que, “aos 52 anos, Júlio se dizia exausto daquela vida desgraçada, de matar um aqui e outro acolá. Além disso, não tinha mais a agilidade, a força e a visão aguçada do passado”. Decidiu sair de Porto Franco, no meio da madrugada, para não deixar pistas. Antes, pegou a voadeira e jogou o revólver e a mochila com o caderno onde anotava os nomes de suas vítimas no Rio Tocantins.
A mulher de Júlio o pressionava, desde 1985, para abandonar a “profissão” de pistoleiro. Menos comedida e discreta do que a Sônia de “Crime e Castigo” — espécie de redenção de Raskólnikov —, ela, que não tem o nome mencionado, possível acordo de Klester com Júlio, “nunca deixou de dizer que o amava. Costumava falar que não entendia como um homem tão carinhoso com a esposa e os filhos poderia tirar a vida de alguém. E, o pior, por dinheiro”. Júlio respondia: “É o meu trabalho, mulher”. Ela dizia, com firmeza: “A maior vergonha da minha vida é ser casada com um assassino”. E ameaçava: “Ou você arruma outro emprego ou um dia eu ainda vou deixar você”.
Após matar um funcionário público, em Carolina, no Maranhão, voltou para casa e, deitando ao lado da mulher, disse: “Acabou”. Ela nada respondeu. Júlio comprou um sítio, onde mora com a mulher. “Não precisava de mais dinheiro. Já tinha tudo o que era necessário para ser feliz: uma boa casa, a roça e a família. E ainda havia guardado parte de suas economias na poupança. (...) Júlio Santana costuma dizer que só não vive totalmente em paz porque, de vez em quando, ainda sonha com algumas de suas vítimas.” O que ele faz? Reza as dez ave-marias e os 20 pai-nossos que aprendeu com o tio Cícero. “E volta a dormir.”
O filho mais velho de Júlio morreu aos 19 anos, num acidente de motocicleta. “Júlio acredita que a morte do seu primogênito foi um castigo de Deus por todas as desgraças que fez na vida.” Por não ter sido preso pela polícia e julgado e condenado pela Justiça, pode-se dizer que Júlio, autor de vários crimes, não foi castigado? Por mais que se diga “tranquilo”, um homem que se sente vigiado, que teme a própria sombra, está irremediavelmente preso numa cela invisível. O “já” do título indica que, mesmo aposentado, Julão pode voltar a matar? Não se sabe. Nem Júlio, sua mulher e Klester certamente sabem. (Euler de França Belém)
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Livros fundamentais para entender a Guerrilha do Araguaia
Aos leitores que se interessam pela história da Guerrilha do Araguaia, recomendo seis livros: “O Coronel Rompe o Silêncio” (Editora Objetiva, 224 páginas), de Luiz Maklouf Carvalho; “A Lei da Selva — Estratégias, Imaginário e Discurso dos Militares Sobre a Guerrilha do Araguaia” (Geração Editorial, 384 páginas), de Hugo Studart; “Operação Araguaia — Os Arquivos Secretos da Guerrilha” (Geração Editorial, 656 páginas), de Eumano Silva e Taís Morais; Guerrilha do Araguaia — A Esquerda em Armas (Editora da Universidade Federal de Goiás, 241 páginas), de Romualdo Pessoa Campos Filho; A Ditadura Escancarada (Companhia das Letras), de Elio Gaspari, e “Mata! — O Major Curió e as Guerrilhas no Araguaia” (Companhia das Letras, 443 páginas, publicado em 2012), de Leonencio Nossa. O excelente livro de Maklouf contém o relato de Lício Augusto Ribeiro, o coronel que comandou a operação para prender José Genoino (o relato sobre a prisão pode ser lido entre as páginas 89 e 102). É o militar durão, citado por Júlio Santana, que mandava no delegado Carlos Marra. O livro de Leonencio Nossa faz referência direta ao pistoleiro Júlio e ao delegado-militar Carlos Marra. (E. F. B.) Leia mais: O pistoleiro brasileiro que matou 492 pessoas e não foi preso pela polícia e condenado pela Justiça Assassinou Nativo da Natividade e foi roubado pelo tio pistoleiro Jovem matou guerrilheira do PC do B e atirou em José Genoino No garimpo de Serra Pelada, Júlio Santana matou quatro homens
Em outubro, com apenas duas edições, o Jornal Opção obteve quase 1 milhão de acessos. Jornal Opção impresso e o Jornal Opção Online, com uma cobertura extensa, rápida e ricamente informativa, conquistaram os eleitores goianos. Mais: o número de acesso do jornal em outros Estados, sobretudo São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, está crescendo. São Paulo superou Brasília como segunda colocada. A cidade campeã em acesso é Goiânia. Rio Verde, dos municípios do interior, é o que mais acessa o jornal, seguido de perto por Anápolis.
Espantoso que uma jornalista, como uma de televisão, fique perguntando para um homem que matou de 29 a 39 pessoas se está arrependido e se quer pedir perdão. A repórter da TV Anhanguera não deve ler os jornais, pois, se estivesse lendo, saberia que Tiago Henrique supostamente fala em matar mais pessoas. Pode até pedir perdão, para obter alguma compaixão, mas isto não quer dizer que está dizendo a verdade. Alguns repórteres de televisão (e não só) ou são muito ingênuos ou fingem muito bem. Talvez, na busca frenética pela audiência e transformando tudo em espetáculo — inclusive a dor e a malandragem alheias —, tenham se tornado cínicos.
A diferença entre o jogador Walter, do Fluminense, e Paulo Baier, do Criciúma, é que o primeiro só pensa no presente, como se fosse uma criança, e o segundo soube se resguardar e está jogando bem aos 40 anos. Em entrevista ao “Estadão”, publicado no domingo, 19, Baier comentou sobre sua passagem bem-sucedida pelo Goiás e revela o segredo de sua longevidade.
“Há quatro anos, eu mudei um pouco a parte de musculação e isso está fazendo a diferença para eu ainda jogar em alto nível. Pelo menos três vezes por semana eu procuro fazer um trabalho forte para ter o suporte e evitar lesões”, afirma Baier. “Em 12 edições dos pontos corridos” do Brasileirão, “o jogador fez 106 gols, tornando-se o maior artilheiro desse período”, conta o “Estadão”. Ele fez mais gols do que Fred (97 gols), do Fluminense, e Luiz Fabiano (68 gols), do São Paulo.
[caption id="attachment_18689" align="alignleft" width="600"] Tiago Henrique Gomes da Rocha[/caption]
Na cobertura da história do serial killer Tiago Henrique Gomes da Rocha, de 26 anos, o “Pop” continua a publicar as melhores reportagens. Repórteres concorrentes podem dizer que seus jornalistas são favorecidos pela Polícia Civil. Pura bobagem. O que falta a outros profissionais é experiência. E talvez agressividade.
O material extenso, com poucos erros, sugere que, quando quer, a redação do “Pop” é capaz de produzir, e rapidamente, material de qualidade.
O único problema do “Pop” é a revisão. Há erros de ortografia e concordância.

[caption id="attachment_18903" align="alignleft" width="620"] Eudora Welty e Virginia Woolf: a contista americana influenciou Nadine Gordimer, mas não tinha uma cabeça política, possivelmente devido à estabilidade dos Estados Unidos; já a autora inglesa, autora dos romances “Orlando” e “Ao Farol”, buscou e entendeu a magnitude da vida / Fotos: Wikipédia Commons[/caption]
Nadine Gordimer, uma das poderosas escritoras sul-africanas e Nobel de Literatura de 1991, morreu em 13 de julho deste ano, aos 90 anos. Sua literatura é celebrada por críticos do gabarito de Susan Sontag e John Maxwell Coetzee, ambos também prosadores. Escreveu, entre outros, “A Filha de Burger” (Editora Rocco), “Uma Mulher Sem Igual” (Rocco) e “O Melhor Tempo É o Presente” (Companhia das Letras). Convencionou-se dizer que um de seus principais temas é o Apartheid e suas consequências. Mas seus livros contam histórias mais amplas, sobre a vida cotidiana dos indivíduos, inclusive no pós-Apartheid.
No livro “Os Escritores — As Históricas Entrevistas da Paris Review” (Companhia das Letras. O diálogo com a escritora, exposto em 32 páginas, foi traduzido por Alberto Alexandre Martins), Jannika Hurwitt mantém ótima conversa com Nadine Gordimer, entre 1979 e 1980. Trinta e três anos depois, permanece como uma entrevista muito bem feita e atual.
Nadine Gordimer revela que, antes de ser escritora, pretendia ser bailarina. Porém, acometida de uma doença, menos grave do que pensava sua mãe, começou a ler freneticamente e decidiu escrever livros. “Quando converso com jovens escritores e digo: ‘Já leu isso ou aquilo?’, ‘Bem, não, os livros estão tão caros...’, eu digo: “Deus do céu! A biblioteca central é uma excelente biblioteca. Pelo amor de Deus, use-a! Você nunca vai ser capaz de escrever se não ler.”
O leitor iniciante deve seguir algum método? Nadine Gordimer sugere que, quando não se é especialista, não se deve ser rígido. “Costumava ir à biblioteca e vagar por lá, e um livro levava a outro. Mas penso que essa é a melhor forma.” Quando criança, ela lia os livros — como “... E o Vento Levou” e “Diary”, de Samuel Pepys — e escrevia pequenas críticas. Além da leitura, que é formativa, a autora já começava a observar como seus ídolos escreviam.
Na universidade, à qual frequentou um ano, relacionou-se pela primeira vez com negros e leu Henry Miller e Upton Sinclair. “Foi ‘The Jungle’, de Sinclair, que realmente me fez pensar em política.”
Como não conseguiu ser bailarina, Nadine Gordimer decidiu ser jornalista, depois de ter lido “Scoop” (publicado no Brasil como “Furo!”), de Evelyn Waughan. Em 1949, aos 26 anos, publicou um livro de contos, na África do Sul, e começou a escrever contos para a prestigiosa “New Yorker”. Um editor da Simon and Schuster interessou-se por sua prosa ao ler um conto na revista norte-americana.
Busca-se às vezes, na prosa de Nadine Gordimer, um óbvio engajamento político, uma defesa quase panfletária dos negros sul-africanos e uma crítica contundente do Apartheid. Há certo engajamento e a crítica é concreta, mas a autora escapa ao engajamento típico de escritores de esquerda que estão a serviço de partidos comunistas e socialistas. “Na minha literatura, a política transparece de uma maneira didática muito raramente. [...] A verdadeira influência da política na minha literatura é a sua influência nas pessoas.” A política está presente em sua literatura, é um dos alicerces, mas não é a casa inteira. Porque a política é apenas uma faceta da vida de um indivíduo. A vida é mais rica e diversificada. Mas na África do Sul, de fato, dadas as condições políticas e humanas radicalizadas, envolver-se com a política, não raro subordinando a literatura, era, até certo período, inescapável. Talvez ainda seja, porque os efeitos do Apartheid não desapareceram inteiramente. No romance “Desonra”, J. M. Coetzee sinaliza que mesmo um escritor possivelmente mais refinado — mais literário, digamos — não escapa aos tentáculos de aço da política.
“A Filha de Burger”, para a autora, “é um livro sobre engajamento. O engajamento não é apenas uma coisa política. É parte de todo o problema ontológico da vida. [...] Aquilo que um escritor faz é tentar compreender a vida. Penso que isso é o que a literatura é. [...] É procurar esse fio de ordem e lógica na desordem, e o caráter de incrível desperdício e maravilhosa prodigalidade da vida”. O romance foi censurado pelo governo do Apartheid.
Por morar na África do Sul, por ter nascido no país, a política ampliou os horizontes da literatura e do indivíduo Nadine Gordimer. A autora de “O Melhor Tempo É o Presente” diz que a escritora Eudora Welty, que considera como “a maior contista norte-americana”, “se tivesse vivido” no país de Nelson Mandela “poderia ter voltado” os “dons incríveis que possuía mais para fora — poderia ter escrito mais, poderia ter atacado assuntos mais abrangentes. Eu hesito em dizer isso, porque o que ela fez fê-lo de modo maravilhoso. Mas o fato é que não escreveu muito; não creio que tenha chegado a desenvolver integralmente seus dons como romancista. Não foi obrigada pelas circunstâncias a ajustar contas com alguma coisa diferente”. O que a sul-africana está a insinuar, com a devida delicadeza, é que, apesar da literatura apurada, há um certo grau de alienação político-social na prosa de Eudora Welty. Um dos motivos é a estabilidade política — ao menos a interna — dos Estados Unidos.
A perspicaz entrevistadora inquire se o mesmo ocorre com a escritora britânica Virginia Woolf. Nadine Gordimer diz que não. “Porque Virginia Woolf se ampliou na outra direção. Realmente se concentrou por inteiro naquele envelope transparente que tinha descoberto para si. Há duas maneiras de amarrar a experiência, que é o ato de escrever afinal de contas. Escrever é tentar entender a vida. Você trabalha a sua vida inteira e talvez tenha conseguido entender um pedaço bem pequenininho. Virginia Woolf fez isso de forma incomparável. E a complexidade das suas relações humanas, a economia com que conseguiu retratá-las.” Noutras palavras, a inglesa não era uma autora engajada, mas tinha uma compreensão aguda do funcionamento da sociedade, com suas implicações políticas. Nadine Gordimer não diz, mas Virginia Woolf participava de um círculo de intelectuais e escritores (Bloomsbury), ao qual pertencia John Maynard Keynes, o mais importante economista do século 20, que discutia — além de literatura — política, economia, a sociedade.
Ao contrário dos autores que se consideram gênios desde os primeiros livros, Nadine Gordimer admite que seus romances iniciais eram fracos. “Foi somente com ‘O Falecido Mundo Burguês’, publicado em 1966, que comecei a desenvolver uma musculatura narrativa. Daí em diante, minha luta tem sido não perder a sensibilidade aguda — quer dizer, a agudeza de captar nuances de comportamento e casá-las com sucesso a um talento narrativo.”

O esquema de corrupção, uma espécie de sistema, desviou pelo menos 10 bilhões da Petrobrás para políticos do PT, PMDB e PP e para diretores da empresa e um doleiro
[Carl Bernstein, Ben Bradlee e Bob Woodward: o trio que derrubou Richard Nixon, em 1974]
A falta de agilidade editorial do “Pop” impressiona. Ben Bradlee, o mítico editor do “Washington Post”, morreu na terça-feira, 21, aos 93 anos. A notícia saiu em vários jornais, mas só foi publicada no jornal goiano na quinta-feira, 23.
É provável que, como na quarta-feira, 22, o “Jornal Nacional” deu destaque à história de Ben Bradlee, algum editor do “Pop” acordou e decidiu publicar a notícia (de uma agência, acrescente-se). O Jornal Opção divulgou a informação junto com as publicações nacionais e internacionais na terça-feira.
Um texto mais longo sobre a fonte que contribuiu para a renúncia do presidente Richard Nixon — o calvário do republicano correspondeu ao sucesso do “Post” — pode ser lido no link: http://bit.ly/1sSLWGx (sobre o Garganta Profunda, a fonte decisiva do jornal).
[Ben Bradlee, à esquerda, e seu pupilo, o experimentado Bob Woodward]
Bob Woodward e Carl Bernstein não eram repórteres do primeiro time em 1974. Mas o jornal “Washington Post” tinha um editor-executivo e uma publisher excepcionais: Ben Bradlee e Catherine Graham. Os dois bancaram as reportagens de dois focas – Bernstein era um pouco mais experiente – e resistiram às pressões do presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon. Revelado o envolvimento direto do republicano no Caso Watergate, não havia outra saída: para não sofrer impeachment, Nixon renunciou. Ben Bradlee, experiente e talentoso, acompanhou de perto as apurações e deu integral apoio aos repórteres. Na terça-feira, 21, morreu Benjamin Crowninshield Bradlee, de 93 anos. O mítico jornalista era vice-presidente do “Post”.
Recentemente, a Editora Três Estrelas lançou uma bem cuidada nova edição do livro “Todos os Homens do Presidente”, de Woodward e Bernstein. A obra foi transformada em filme, com Robert Redford e Dustin Hoffman nos papéis principais.
Em 1972, espiões pagos pela equipe de Nixon invadiram o Watergate (conjunto de edifícios), em Washington, com o objetivo de grampear os telefones do Partido Democrata.
No link https://jornalopcao.com.br/colunas/imprensa/mark-felt-o-homem-que-derrubou-o-presidente-dos-estados-unidos, pode-se ler um texto que escrevi a respeito de um livro de Woodward no qual revela suas relações com sua principal fonte, o diretor adjunto do FBI Mark Felt, o célebre Garganta Profunda.

A presidente petista também está batendo, mas preserva a imagem de seriedade, sem deboche, e de estadista
O site Blue Bus (www.bluebus.com.br), dirigido por Júlio Hungria, lista, no texto “Os 7 pecados capitais do marketing nas mídias sociais”. A lista foi elaborada por Tom Fishburne, do Marketoonist.
Luxúria – “Vamos pagar seguidores para fingirem que curtem a nossa marca”
Preguiça – “Podemos tratar todas as redes sociais da mesma forma”
Gula – “Vamos encher os feeds de todo mundo com spam”
Orgulho – “Nós somos incríveis. Por favor dê RT”
Avareza – “Nós somos incríveis, assim como essa promoção”
Inveja – “Vamos imitar tudo que está bombando #oferta #clooney”
Ira – “Por que ninguém está se engajando? Vamos gritar mais alto”.
Fla-Flu eleitoral
Xico Sá
Se no primeiro turno foi Brasileirão de pontos corridos, agora, camarada, é Copa do Brasil, mata-mata
Amigo torcedor, amigo secador, mesmo com a obviedade ululante de PT x PSDB, eleição não é Fla-Flu, eleição não é sequer Atlético x Cruzeiro, Galo x Raposa, para levar a contenda para as Minas Gerais onde nasceram os dois candidatos do segundo turno.
Eleição não é um dérbi clássico como Guarani x Ponte Preta, eleição é tão mais rico que cabe, lindamente contra o voto, meus colegas anarquistas na parada, votar simplesmente no nada, nonada, como nos sertões de Guimarães Rosa, sempre na área.
Fla-Flu, embora exista antes do infinito e da ideia de Gênesis, nego esquece em uma semana. Futebol nego esquece no 25º casco debaixo da mesa, afinal de contas, como dizia meu irmão Sócrates Brasileiro, futebol não é uma caixinha de nada, futebol é um engradado de surpresas sempre dividido com amigos de todos os clubes.
Doutor Sócrates Brasileiro que foi mais pedagógico, um Paulo Freire da bola, com a Democracia Corintiana, do que muitas escolas. Doutor Sócrates, Casagrande e Vladimir nos ensinaram mais sobre a ideia grega do "poder do povo e pelo povo" do que toda aquela imposição de Educação Moral e Cívica dos generais das trevas.
Foi-se o tempo que viver era Arena x MDB, era Brahma x Antarctica. Até porque eles hoje são a mesma coisa, a mesma fábrica, a mesma Ambev que botou dinheiro de monte até na Marina evangélica –la não queria, mas o tesoureiro, talvez neopentecostal, pegou do mesmo jeito de todo mundo, vai saber, já era.
Eleição é coisa de quatro anos, no mínimo, pois até quem diz que não quer mais compra um aninho de luxúria e sossego iluminista em Paris, como já vimos no caso do FHC, comprovado em um dos maiores furos desta Folha, reportagem do grande Fernando Rodrigues, parlamentar comprado a preço de mensalão superfaturado.
Cadê a memória, a mínima morália, como diria Adorno, jornalismo safado?
Quem dera eleição fosse apenas o Fla-Flu que dizem. Quem dera fosse apenas um cordel que poderia ser resumido na peleja do playboy danadinho contra a mulher durona. É tudo mais complexo, ainda bem, e se no primeiro turno foi Brasileirão de pontos corridos, agora, camarada, é Copa do Brasil, mata-mata.
Como sou favorável à linha dos jornais americanos que declaram voto, coisa que meu jornal aqui teimosamente não encampa, queria deixar claro da minha parte: voto Dilma, apesar do meu pendor anarquista. Perdão, Bakunin, mas meu voto é contra a imprensa burguesa.
Digo que o jornal que me emprega não encampa e justiça seja feita: nunca me proibiu de dizer nada. Nem no impresso nem no blog. "Bota pra quebrar, meu filho", lembro do velho sr. Frias nessa hora, que cabra!
Seria legal que todos os jornalistas, que têm lado sim, se declarassem. Quem se apresenta para tornar as coisas mais iluminadas?
Xico Sá nada tem de ingênuo e, por isso, sabe que as empresas privadas têm suas regras e negócios. Há pouco, para provar que a imprensa censura aqueles que apoiam a presidente Dilma Rousseff, o jornalista e escritor tentou, com certa matreirice e alguma brejeirice, publicar uma declaração de voto num artigo-crônica que escrevia na caderno de esportes da “Folha de S. Paulo”. Ciente da orientação editorial do jornal, o editor da área barrou o texto e comunicou à direção. No lugar de “punir” Xico Sá, com um possível afastamento, por descumprir normas editoriais, o editor Sérgio Dávila propôs que escrevesse um artigo, na página 3, “Tendências/Debates” — espaço nobre —, declarando seu voto na candidata do PT a presidente da República. Xico Sá, evidentemente, não quis. Porque, se aceitasse, não poderia acusar a “grande imprensa” de vendida para o tucanato. Porém, com a prova de que o jornal agiu de maneira democrática e aberta, a situação do “petista” ficou complicada. A esquerda patropi já produziu apparatchiks mais hábeis e menos trapalhões.

[caption id="attachment_18198" align="alignleft" width="400"] Tiago Henrique Gomes da Rocha: um assassino tão assustador que parece ter saído de algum romance policial dos mais exagerados l Foto: André Costa[/caption]
Os melhores romances sobre a crueldade humana — como “Crime e Castigo”, do russo Fiódor Dostoiévski, e “A Sangue Frio”, do americano Truman Capote — são, quase sempre, baseados em casos reais. Mas é a imaginação poderosa dos escritores que tendem a plasmar os crimes e a torná-los emblemáticos. Fica-se, assim, com a impressão de que os escritores exageram e até forçam a realidade. Mas o fato é que esta às vezes é mais fantástica do que a ficção.
No seu romance, Dostoiévski constrói a história de um criminoso intelectualizado, Raskólnikov, que pretende cometer o crime perfeito e lógico. Mata duas mulheres e, muito bem investigado, é preso.
Truman Capote leu no “Times”, em 1959, uma notícia sobre o assassinato brutal de uma família no Kansas e propôs escrever um texto para a revista “New Yorker”. Astucioso, percebeu de imediato que o crime continha material para uma obra mais alentada, mas que precisava ir além do jornalismo tradicional, que faz um recorte rápido da realidade e o apresenta aos leitores como se fosse um retrato preciso da realidade.
No Kansas, Capote começou uma investigação detida sobre as mortes da família Clutter (o casal Herbert e Bonnie e seus filhos Nancy e Kenyon) e a respeito dos assassinos Perry Smth e Dick Hikcock. Chegou a ficar íntimo dos criminosos, sobretudo de um deles, e em 1965, na “New Yorker”, publicou a história que, depois, foi levada ao formato livro com o título de “A Sangue Frio”. Explicar um criminoso à exaustão, suas motivações, não é perdoá-lo, e sim uma forma de entender as ações dos homens — que continuarão matando independentemente de leis flácidas ou rígidas.
Há críticas ao romance de não-ficção de Capote, sugerindo que exagerou e que imaginou mais do que devia, mas, na verdade, seu livro iluminou a história, tornando-a, trágica e humanamente, mais compreensível. Não à toa psiquiatras, psicólogos e advogados-criminalistas o estudaram e estudam detidamente.
Willian Novaes, diretor da editora Geração, sugere que um jornalista de Goiás escreva um livro sobre a história do assassino serial Tiago Henrique Gomes da Rocha, de 26 anos, que matou 22 mulheres e 17 homens (pode ser mais e pode ser menos). É possível escrever dois tipos de livros a respeito. Uma obra de oportunidade, escrita em cima da hora, relatando o básico, os crimes e o sofrimento das famílias, e uma obra mais detida, ao estilo de “A Sangue Frio”.
O momento, claro, é de consternação e a sociedade quer e exige que Tiago Henrique, que trabalhava como vigilante e tem porte de galã, seja condenado. É inescapável: não há outro caminho. A pena do assassino deve ser a mais alta possível.
Entretanto, passada a pressão inicial, talvez seja o caso de se investigar mais a fundo a história. Não se trata de apresentar muitas novidades, por exemplo novos crimes — é provável que se chegará a um número limite —, mas sim de alargar a compreensão de quem é, de fato, Tiago Henrique. A compreensão inicial, o fato de que teria sido abusado sexualmente na infância, daí sua “raiva do mundo” — matar seria uma forma de aplacá-la —, é importante, mas é possível ir além disso.
Para entender e explicar Tiago Henrique, o jornalista (ou escritor) terá de se despir de certo preconceitos e ouvi-lo várias vezes, assim como sua família, para criar um perfil para além do que afirma o criminoso (o jornalista e escritor americano Gay Talese só entendeu a fundo a máfia ítalo-americana ao se tornar amigo de um mafioso, chegando a frequentar sua casa e conviver com sua família). A “raiva do mundo”, como resultante do assédio sexual quando tinha 11 anos, explica alguma coisa, mas não tudo. O jovem criado pela mãe, sem a presença do pai, odiaria mulheres diferentes daquela mulher que o ama incondicionalmente e é seu provável modelo de perfeição feminina? Trata-se de um homem acima de tudo mau?
O rótulo “psicopata” explica muitas coisas, mas não tudo. Psicopatas têm comportamentos parecidos, mas com variantes — daí que é preciso definir o que é específico do caso de Tiago Henrique.
Aquele que quiser escrever sobre o criminoso deverá escavar mais fundo, quem sabe com a ajuda de psiquiatras, psicólogos, sociólogos, antropólogos e linguistas. Policiais e peritos devem ser consultados. O caso é de uma riqueza ímpar e sugere uma abordagem menos perfunctória.
Por que Tiago Henrique preferia atirar no peito (lembraria mãe,maternidade?) de algumas mulheres e não na cabeça? Ele apresentou uma explicação pouco esclarecedora, mas, ouvido com atenção e em circunstâncias diferentes, certamente poderá apresentar uma versão mais detida. Há detalhes, mesmo nas falas curtas publicadas na imprensa, que precisam ser examinados pelo jornalista, o que for escrever o livro, com o rigor de um legista. Entender bem o jovem criminoso possivelmente será útil para que se compreenda outros criminosos e se esclareça crimes parecidos.