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“Como Começou a Guerra Fria — O Caso Igor Gouzenko e a Caçada aos Espiões Soviéticos” (Editora Record, 362 páginas), da doutora em Política Russa (pela London School of Economics) Amy Knight, é uma pequena obra-prima. Knight escreve com o rigor do historiador, apura como o mais preciso dos repórteres investigativos, especula com certa liberdade, mas dizendo ao leitor que está especulando, e explica os limites da documentação. Põe a nu, sem estardalhaço, conclusões sobre, entre outros Alger Hiss, considerado espião pelo FBI. Gouzenko era criptógrafo da Embaixada Soviética em Ottawa, no Canadá, quando, pressionado para voltar para seu país, optou por desertar, junto com sua mulher Anna, em setembro de 1945. Levou vários documentos da inteligência do Exército, o GRU, para o qual trabalhava e entregou-os ao governo canadense. Naquele momento, depois de ter lutado bravamente ao lado das democracias ocidentais, como Inglaterra e Estados Unidos, a União Soviética, apesar do tirano Stálin, era considerada uma nação amiga, com a qual era lícito partilhar informações. Mas o desconfiado Stálin — todo ditador é desconfiado e paranoico — não queria saber de “amizade verdadeira” e colocou um batalhão de espiões para roubar segredos militares e científicos dos ingleses e, sobretudo, dos norte-americanos. Esses espiões recrutaram cientistas, como Klaus Fuchs e Alan Nunn May, que, direta ou indiretamente, contribuíram para que os soviéticos pudessem desenvolver a bomba atômica. Stálin deu autorização para Beria recrutar os melhores cientistas, a quem foram dadas excepcionais condições de trabalho, mas tinha pressa para fazer a bomba atômica, acreditando que, sem ela, o país estaria permanentemente ameaçado pelos Estados Unidos. Como resultado disso, Stálin articulou uma gigantesca operação de espionagem em vários países. O Canadá era usado como base para se obter informações dos Estados Unidos e, também, da Inglaterra. Mas, ao desertar, Gouzenko pôs quase tudo a perder, porque canadenses, ingleses e americanos, além de outros povos, descobriram que Stálin era o mesmo de antes e que não queria relações diplomáticas transparentes. A “ovelha” Stálin havia virado “lobo” novamente. Esta é a grande contribuição de Gouzenko, ao revelar que o ditador soviético trapaceava o tempo todo. A Guerra Fria surge do desencanto dos aliados (ingleses e americanos) com Stálin, de quem o sábio Winston Churchill, embora tenha chegado a elogiá-lo, sempre desconfiou, tanto que criou a expressão Cortina de Ferro. Há quem diga que a descoberta da bomba atômica pelos soviéticos “segurou” os americanos e que a bomba atômica americana “segurou” os soviéticos e que, assim, evitou-se a Terceira Guerra Mundial. Há um filme sobre a história de Gouzenko — “Cortina de Ferro” (The Iron Curtain), de 1948, com direção de William Wellman e os atores Dana Andrews (Gouzenko) e Gene Tierney (Anna). Um dos relatos mais impressionantes do livro tem a ver com o diplomata canadense Herbert Norman. Acusado sobretudo pelos americanos de ter sido comunista, portanto suspeito de espionagem, Norman matou-se. Eis o relato quase literário de Knight: “Na manhã quente e ensolarada de 4 de abril de 1957, Norman acordou cedo, despediu-se da mulher e foi a pé de sua casa no Cairo até um edifício alto no fim da rua, com vista para o Nilo. Tomou o elevador para o último andar e subiu as escadas para a cobertura. Tirou o paletó, os óculos e o relógio. E arremessou-se do terraço para a morte”. Norman nem havia sido comunista, no máximo, sentira-se atraído pelo marxismo, quando muito jovem, na universidade. O cientista americano Arthur Steinberg, também acusado de espionagem pelo FBI de Edgar J. Hoover, foi perseguido e perdeu vários empregos. Não era comunista nem espião. O espião verdadeiro, o inglês Kim Philby, amigo do escritor Graham Greene, passou informações para os soviéticos durante muitos anos e, depois, escapou das garras da espionagem de seu país e morreu, como herói, na União Soviética. Ele próprio era um espião-chefe dos espiões ingleses. Knight é erudita, como observam os historiadores Margaret MacMillan e Simon Sebag Montefiori, autor do ótimo “Stálin — A Corte do Czar Vermelho”, e, como tal, discute os assuntos com extrema facilidade, mas sem o pedantismo de alguns acadêmicos.

O pesquisador inglês Ben Lewis assegura que as piadas foram importantes para mostrar o fracasso das ações dos governantes comunistas, como Stálin e Leonid Brejnev, e para desnudar sua propaganda
O vice-presidente nacional do PT, Alberto Cantalice, publicou um texto e arrolou como “pitbulls da mídia” Reinaldo Azevedo, Arnaldo Jabor, Demétrio Magnoli, Guilherme Fiúza, Augusto Nunes, Diogo Mainardi, Lobão, Gentili, Marcelo Madureira. Azevedo disse que vai processá-lo.
O artigo é fraco, e, se não tivesse citados nomes, certamente teria sido ignorado. Menciona “propagadores do ódio”, mas não que perceber que, ao citar os profissionais — jornalistas e humoristas —, espalha sua cota de ódio.
As nove pessoas citadas pensam da mesma maneira. Alguns dos críticos do governo petistas são mais radicais, ou enfáticos, porém pelo menos dois são mais moderados e analíticos.
Publico o artigo de Cantalice para que o leitor possa avaliar sua fragilidade. Seu título deveria ser outro: muito barulho por nada.
A desmoralização dos pitbulls da grande mídia
Alberto Cantalice Três vezes derrotados nos pleitos presidenciais, por Lula e Dilma e o PT, os setores elitistas albergados na grande mídia, ao se verem na iminência do quarto revés eleitoral, foram ao desespero. Diurtunamente lançam vitupérios, achincalhes e deboches contra os avanços do país visando desgastar o governo federal e a imagem do Brasil no exterior. Inimigos que são das políticas sociais, políticas essas que visam efetivamente uma maior integração entre todos os brasileiros, pregam seu fim. “A hora é de renovar as esperanças e acreditar no Brasil”. Profetas do apocalipse político, eles são contra as cotas sociais e raciais; as reservas de vagas para negros nos serviços públicos; as demarcações de terras indígenas; o Bolsa Família, o Prouni e tudo o mais. Divulgadores de uma democracia sem povo apontaram suas armas, agora, contra o decreto da Presidência da República que amplia a interlocução e a participação da população nos conselhos, para melhor direcionamento das políticas públicas. Personificados em Reinaldo Azevedo, Arnaldo Jabor, Demétrio Magnoli, Guilherme Fiúza, Augusto Nunes, Diogo Mainardi, Lobão, Gentili, Marcelo Madureira entre outros menos votados, suas pregações nas páginas dos veículos conservadores estimulam setores reacionários e exclusivistas da sociedade brasileira a maldizer os pobres e sua presença cada vez maior nos aeroportos, nos shoppings e nos restaurantes. Seus paroxismos odientos revelaram-se com maior clarividência na Copa do Mundo. Os arautos do caos, prevendo e militando insistentemente pelo fracasso do mundial – tendo, inclusive, como ponta de lança a revista Veja previsto que os estádios só ficariam prontos depois de 2022, assistem hoje desolados e bufando à extraordinária mobilização popular e ao entusiasmo do povo brasileiro pela realização da denominada, acertadamente, de a Copa das Copas. O subproduto dos pitbulls do conservadorismo teve seu ápice nos xingamentos torpes e vergonhosos à presidenta Dilma na abertura da Copa, na Arena Corinthians. Verdadeiro gol contra, o repúdio imediato de amplas parcelas dos brasileiros e brasileiras ao deprimente espetáculo dos vips demonstra que a imensa maioria da população abomina essa prática. Desnudam-se os propagadores do ódio. A hora é de renovar as esperanças e acreditar no Brasil! Alberto Cantalice é vice-presidente nacional do PT e coordenador das Redes Sociais do partido.Mario Sergio Conti entrevistou um sósia do técnico da Seleção Brasileira de Futebol acreditando que estava entrevistando Felipão. O jornalista admitiu o erro e fez a correção. Por que massacrá-lo? Fica-se com a impressão de que rancores antigos, dada sua posição de mando em pelo menos três redações, “Veja”, “Jornal do Brasil” e “Piauí” — o que sempre gera desgaste com subordinados, mesmo com os mais talentosos (jornalistas detestam ser criticados e corrigidos) —, estão sendo expostos como se fossem críticas isentas.
O erro de Mario Sergio Conti entra para a categoria dos primários, mas possíveis. O que não se deve é avaliar o trabalho anterior e atual do jornalista pela falha — apenas uma. O ex-editor da “Veja” é um dos melhores jornalistas de sua geração, tanto que, sob sua direção, a revista era bem melhor. Assim como a “Piauí”, sua criação, ao lado de João Moreira Salles, é uma publicação de qualidade. Conti escreve muito bem e não é nenhum néscio. Apesar da crítica negativa de Mino Carta, seu livro “Notícias do Planalto” é uma importante crônica dos anos Collor.
Don Altobello ilude, num primeiro momento, o hábil filho de Vito Corleone e se aproximou da Igreja que jogava em dois mundos — o legal e o profano
As editoras “brasileiras”, como Record, Objetiva, Companhia das Letras, Leya e Planeta, não são tão ágeis quanto as de Portugal, que já publicaram três livros apresentados como extraordinários por especialistas: “Fortaleza Vermelha — O Coração Secreto da História da Rússia” (Temas e Debates, 664 páginas), de Catherine Merridale, “Continente Selvagem — A Europa no Rescaldo da Segunda Guerra Mundial” (Bertrand Editorial, 528 páginas), de Keith Lowe, e “A Cortina de Ferro — O Fim da Europa do Leste” (Civilização Editorial, 780 páginas), de Anne Applebaum.
Em “Fortaleza Vermelha”, Merridale conta a histór
ia da Rússia por intermédio do Kremlin, que é o centro do poder no país desde a Idade Média. O palácio foi “construído para intimidar os súditos do monarca e assustar os emissários estrangeiros”, afirma sinopse da editora. O autor do excelente “Stálin — A Corte do Czar Vermelho”, Simon Sebag Montefiore, escreveu sobre o livro: “Esta crônica do Kremlin é na realidade a história fantástica da própria Rússia, desde os primeiros czares passando por Lênin e Stálin até Putin”. A revista “The Economist” cravou: “Merridale é uma historiadora [professora de História Contemporânea no Queen Mary, Universidade de Londres], mas possui um faro de detetive e o talento literário de uma romancista”.
“Continente Selvagem” ganha o elogio de um dos maiores estudiosos da Segunda Guerra Mundial e de Hitler, o historiador inglês Ian Kershaw: “Gráfica e horripilante. Esta excelente obra pinta um retrato pouco conhecido e assustador de um continente mergulhado na anarquia e no caos”.
Anne Applebaum, conhecida por sua magnífica história do Gulag, agora vasculha, em “A Cortina de Ferro”, a história dos povos do Leste Europeu sob o socialismo e sob a dominação tirânica da União Soviética. O livro mereceu resenhas entusiásticas. “‘A Cortina de Ferro’, de Anne Applebaum, é com certeza a melhor obra de história moderna que alguma vez li”, anotou A. N. Wilson, no “Financial Times”. “A descrição que Applebaum faz deste período notável é tudo o que um bom livro de História deve ser: resultado de uma pesquisa extensa e brilhante, muitíssimo bem escrito, de uma abrangência enciclopédica e meticuloso nos pormenores”, escreveu, no “Sunday Telegraph”, o pesquisador Keith Lowe. “‘A Cortina de Ferro’ é uma obra excepcionalmente importante que põe em causa muitos dos mitos sobre a origem da Guerra Fria. É um livro inteligente, perspicaz, notavelmente objetivo e resultado de uma pesquisa brilhante”, disse Antony Beevor, um dos maiores historiadores ingleses.
A Primeira Guerra Mundial (1914-1918) faz 100 anos em agosto e o Brasil está publicando bons livros a respeito, como os de Max Hastings e Niall Ferguson. Vale traduzir “La Gran Guerra — Historia Militar de la Primera Guerra Mundial” (Crítica, 563 páginas, tradução de Juan Rabasseda e Teófilo de Lozoya), de Peter Hart. Este escreve e pesquisa tão bem quanto o notável Antony Beevor.
Pesquisador do Imperial War Museum de Londres, Peter Hart diz que “a Grande Guerra [assim era chamada até o início da Segunda Guerra Mundial] foi o acontecimento mais importante do século 20”. O historiador frisa que se trata da primeira guerra que efetivamente pode ser chamada de “mundial”. Milhões de homens morreram nas batalhas — muitos por falta de medicamentos, como antibióticos — e pela primeira vez foram usados aviões, tanques, submarinos e gases asfixiantes. Impérios ruíram e novas ideologias surgiram (o fascismo e o nazismo) ou se fortaleceram (o socialismo, com a Revolução Russa de 1917).
Peter Hart assinala que a Grande Guerra mudou o mundo e contribuiu, de maneira decisiva, para a Segunda Guerra Mundial.
Iúri Rincon Godinho
Longe de ser uma bio de Sócrates, esse livro é uma breve história de amor. Kátia Bagnarelli, uma loira belíssima, capturou o coração do doutor. Viveram cerca de dois anos um amor incondicional, que só a paixão explica — ou não rs.
Kátia revela um pouco das explosivas anotações do ex-jogador, que deveriam, essas sim, virar uma biografia. A autora revela a conturbada relação de Sócrates com a família, em especial os filhos. Sua paixão por Cuba e a terrível decadência física de um ex-atleta com cirrose, vomitando litros de sangue pela madrugada. Em duas partes, discretamente, a autora revela que o doutor continuava a beber e a fumar contra todas as recomendações médicas.
Sobram críticas à Confederação Brasileira de Futebol e ao irmão Raí, que teria pedido que Kátia não falasse por Sócrates enquanto ele estivesse hospitalizado. A pequena parte em que narra um telefonema de Lula é emblemática. O ex-jogador preso a um leito hospitalar recebe a visita de José Dirceu, já enrolado com as denúncias do mensalão, e pede para falar com o presidente. Dirceu, denunciado mas poderoso, liga. Lula atende e conversa rapidamente com Sócrates, que cobra do “barba” sua recente aliança com o ex-presidente da CBF, Ricardo Teixeira. Lula enrola, diz que explica pessoalmente em um futuro encontro.
No final da ligação, Sócrates vira-se para a mulher e diz: “É, o barba já não é mais o mesmo”. Para quem era apaixonado pelo socialismo e colocou o nome de Fidel num filho, até que Sócrates nem demorou muito a perceber a mudança.
Iúri Rincon Godinho, publisher da Contato Comunicação, é jornalista.
Serviço:
Título: “Sócrates Brasileiro — Minha Vida ao Lado do Maior Torcedor do Brasil”
Autoras: Regina Echeverria e Kátia Bagnarelli
Editora: PRUMO
Páginas: 240 páginas
Preço: R$ 34,90

Neymar é o craque da seleção brasileira. Oscar é bom jogador, mas irregular. Thiago Silva é um grande zagueiro. Mas craque mesmo só Neymar. Há uma tendência na imprensa patropi, na adulação frequente ao ex-jogador do Santos, a supervalorizá-lo para diminuir Messi. Ora, o argentino é um craque consumado e tem decidido os jogos.
Neymar é um grande investimento do Barcelona, mas ainda não se firmou no time. Fica-se com a impressão de que o futebol de Messi, mais vistoso e produtivo para o time, encabula e constrange Neymar — que, acostumado a ser a primeira voz, não tem funcionado muito como segunda voz. Na seleção, como único maestro, Neymar tem brilhado, com boas atuações, mas as comparações com Pelé têm sido primárias. A rigor, até agora, não fez nenhuma partida de gênio. Contra o México e o Chile, times melhores do que a Croácia e Camarões, foi inteiramente anulado. Nem os lampejos de gênio apareceram.
Messi também não fez nenhuma partida brilhante, mas, como Neymar, ao menos tem decidido os jogos.
Por que Neymar e Messi, craques incontestes, não fizeram partidas acima da média, exceto se comparados com os jogadores de seus dois times? O óbvio: são muito bem marcados. Contra o México, Neymar estava sempre sob a vigilância de dois a três jogadores, alguns faltosos. Com Messi ocorre o mesmo. Mas, mesmo bem marcados, eventualmente desequilibram as partidas.
Posto isto, resta dizer que a alegria da Copa do Mundo tem sido, até o momento, exatamente Neymar e Messi e dois ou três jogadores da Holanda, da Alemanha e um da França (Benzema). A Copa tem sido dos jogadores leves e habilidosos. Holanda, Alemanha e França têm bons jogadores, mas craques mesmo, da estirpe de Neymar e Messi, não têm nenhum.
Cristiano Ronaldo, o craque da Seleção de Portugal, não jogou bem. Por dois motivos. Primeiro, não está bem fisicamente. Segundo, a seleção de seu país é muito pior do que o Real Madri. Fica-se com a impressão de que Cristiano Ronaldo passa a bola e recebe uma pedra. O mesmo ocorre com Neymar na Seleção Brasileira: passa a boa com suavidade, rolando macia, e recebe uma paulada. Parece que alguns de seus companheiros acreditam que se trata não de um jogador, e sim de um velocista (o português é um misto de jogador e velocista).
É provável que, se entrevistar Philip Roth, um jornalista goiano faça a seguinte pergunta: “Qual a sua opinião sobre Bernardo Élis, José J. Veiga e Eli Brasiliense?” O escritor americano certamente não saberá responder. Rogério Borges, do “Pop”, entrevistou o pianista Arnaldo Cohen (foto), que atua no Brasil e no exterior, e não hesitou em fazer uma pergunta provinciana. O repórter quis saber se ele conhecia os trabalhos de musicistas goianas. Polidamente, já que estava em Goiânia, Cohen disse: “Como eles [artistas] são muitos, eu teria receio de citar alguns, pois estaria cometendo uma injustiça ao omitir outros, igualmente importantes”. Se fosse no Facebook, ou noutra rede social, o editor poderia ter acrescentado: “Rs.”
O Brasil é um país que impressiona pelo desleixo e desfaçatez com que trata seus grandes escritores. Carlos Drummond de Andrade, seu maior poeta, deveria ter pelo menos umas dez biografias, para que uma fosse incorporando as pesquisas e interpretações das outras, o que permitiria uma compreensão mais adequada tanto de sua vida quanto de sua obra (mais bem analisada, o que é positivo, do que sua vida). “Os Sapatos de Orfeu — A Biografia de Drummond” (Biblioteca Azul, 338 páginas), de José Maria Cançado, não é ruim. Pelo contrário, é, até certo, um trabalho exaustivo, pioneiro, pois não contou com trabalhos anteriores de envergadura, ou mesmo de envergadura. O que se pode desta pesquisa, sem desmerecê-la — e o próximo biógrafo não pode desconsiderá-la —, é que é lacunar. No sábado, 27, “O Estado de S. Paulo” publicou a notícia de que o jornalista Humberto Werneck, que entende como poucos as coisas de Minas Gerais, iniciou uma pesquisa para escrever uma biografia alentada de Drummond, encomendada pela Companhia das Letras. O biógrafo e a editora são referências de qualidade. A biografia de Drummond será lançada em 2017. “Drummond é meu poeta. Ele fala por mim as coisas que não dou conta de falar. Quero juntar os cacos e ver que xícara dá”, disse Werneck ao “Estadão”. O “Estadão” informa que Werneck pretende Manuel Graña Etcheverry, de 98 anos, que foi casado com Maria Julieta Drummond de Andrade, única filha do poeta. O poeta Graña Etcheverry traduziu poemas do bardo mineiro para o espanhol.
A jornalista Laila Navarrete, de 79 anos, morreu na sexta-feira, 27, no Hospital Anis Rassi, em Goiânia. Uma das mais importantes colunistas sociais da história do jornalismo de Goiás, Laila havia sido submetida a uma cirurgia, no Hospital dos Acidentados, para colocar uma prótese num joelho. A operação havia sido bem-sucedida. Pelo menos até sexta, a família não tinha informação precisa sobre a causa da morte. Laila trabalhou em vários jornais, como “Cinco de Março”, “Diário da Manhã”, “O Popular”, Jornal Opção, “Correio do Planalto” e “O Anápolis”. Ela tinha um conhecimento profundo da sociedade goiana — a dos ricos e da classe média — e escrevia muito bem e era uma profissional, acima de tudo, ética, íntegra. Pode-se dizer que era uma espécie de rainha do colunismo social de Goiás. Além do colunismo social, que exercia com raro prazer — era dedicadíssima —, Laila era poeta. Sua poesia era precisa e, ao mesmo tempo, delicada, amorosa e perspicaz.
Impossível discordar de uma lista que põe “O Poderoso Chefão” como principal destaque e cita “Cidadão Kane”. Mas como aceitar “Apertem os cintos... O piloto sumiu” como um grande filme?
A Editora Abril, que publica a “Veja” e a “Exame”, extinguiu mais uma revista. Agora foi a vez da “Info Dicas”, que estava na 126ª edição. A redação da revista informou ao site Comunique-se que os profissionais não serão demitidos. Devem ser remanejados. Maria Isabel Moreira, editora-chefe, irá para a “Info” — assim como a repórter Adeline Daniele. A Editora Abril extinguiu recentemente as revistas “Alfa”, “Gloss”, “Bravo” e “Lola”.
Iúri Rincon Godinho
Las Vegas é o paraíso dos antiquários nos Estados Unidos. Mas não qualquer um. A deliciosa e decadente região central da cidade abriga lojas com raridades ligadas à cultura pop, tipo bonecos do Elvis, revistas antigas, fichas de cassinos e caixinhas de fósforo. Uma delícia para encher a casa de coisas que a gente nunca vai precisar mas que são bacanas mesmo assim. Os antiquários nos Estados Unidos também emprestam dinheiro a juros, uma agiotagem consentida e bastante usada, vendem ouro e joias.
De todas essas lojas, chamadas de pawn shops, a mais famosa fica no início da Sunset Boulevard — praticamente a única rua de Vegas, onde está maioria dos cassinos —, dirigida por Rick Harrison. Seria apenas um antiquário descolado se não virasse seriado no excelente The History Channel, no Brasil com o nome de Trato Feito. A fórmula é simples: pessoas que compram as mais malucas quinquilharias, como um mapa do exército norte-americano da Segunda Guerra e anéis dos jogadores da liga de futebol dos EUA.
Este livro conta história da loja, a primeira a funcionar 24 horas na cidade, e, embora não seja dito, muito provavelmente para salvar com empréstimos na madrugada os viciados em jogo. O pai de Rick, chamado de Velho (sem sentido pejorativo) ou Old Man, serviu a Marinha na Segunda Guerra e abriu sem pretensão o negócio que o filho depois expandiria. Rick é um cara que a leitura e o conhecimento salvaram. Nunca gostou de estudar, mas ama ler. Adquiriu informações vastas, de tudo um pouco, que utiliza no negócio. Ao contrário de seu filho, que também trabalha no local e acabará herdando tudo.
No programa Trato Feito, a grande sensação não é da família Harrison, mas um funcionário gordo, pancada, apelidado Chum Lee. É o saco de pancada da turma, o cara que sabe que beira a imbecilidade e convive bem com isso, o que fica até mais tarde e o mais carismático. Ele pouco aparece no livro, tratado por Rick como uma obra sobre sua família e a pawn shop.
Agora os Harrison têm um show em Las Vegas e quase nunca aparecem na loja, que ficou fácil de ser achada pelas longas filas na porta. Quando vão gravar o Trato Feito, que é bem ensaiado antes e não tão natural quando aparenta, fecham as portas. Nas duas últimas vezes que fui a Vegas passei diariamente no local, o que dá aí umas 10 visitas. A única pessoa da família que vi foi o próprio Rick, que estava na porta. No que estacionei o carro ele já desaparecera.
Agora aqui em casa tem caneco do Trato Feito, camisa do Chum Lee e outras tranqueiras, mas o que eu queria mesmo, o autógrafo do Rick no livro, ainda terei de voltar lá pra conseguir.
Iúri Rincon Godinho é jornalista e publisher da Contato Comunicação.
Serviço:
Livro: “License to Pawn — Deals, Steals, and My Life at the Gold & Silver”
Autor: Rick Harrison
Editora: HYPERION
Páginas: 272