Taxação de bilionários não é mais de direita ou esquerda, diz Nobel de Economia

15 abril 2024 às 11h50

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A economista francesa Esther Duflo afirma que a cobrança de imposto sobre a fortuna de super-ricos e o aumento da tributação de multinacionais podem gerar, em todo o mundo, US$ 500 bilhões ao ano para financiar medidas de mitigação de impactos da crise climática sobre populações e países pobres. “Quando analisamos as pesquisas, o apoio é muito forte. Taxar grandes empresas ou bilionários para ajudar os países pobres a lidar com as mudanças climáticas tem mais de 80% de popularidade. Vai além de direita ou esquerda. É senso comum”, afirmou à Folha de São Paulo.
Na próxima quarta-feira, 17, os ministros da Fazenda dos países do G20 reunidos em Washington ouvirão uma proposta que alguns anos atrás seria inimaginável em um fórum do gênero: usar um imposto sobre os bilionários para lutar contra a pobreza e as consequências da crise climática. Esther Duflo, autora da proposta, foi vencedora do Nobel de Economia de 2019 e atualmente está na presidência rotativa do G20. Segundo a economista francesa, chegou a hora para articular as duas questões, pobreza e aquecimento global.
Nos últimos anos, propostas de taxação dos super-ricos têm ganhado apoio. Em fevereiro, Fernando Haddad adotou uma dessas propostas, criada pelo economista francês Gabriel Zucman, colega de Esther Duflo na Escola de Economia de Paris e especialista em paraísos fiscais.
De acordo com Duflo, aplicar uma taxa de 2% sobre a fortuna dos super-ricos e aumentar os impostos sobre as multinacionais geraria uma arrecadação anual de US$ 500 bilhões. Esses recursos poderiam ser direcionados para ajudar os mais pobres do mundo, especialmente os mais afetados pela crise climática. Parte do dinheiro seria destinada diretamente às contas digitais dessas pessoas, parte seria reservada para os governos lidarem com os custos das catástrofes e o restante seria investido na adaptação ao calor extremo nas regiões mais impactadas.
Esther Duflo busca ter um impacto prático no mundo. Ela é uma das fundadoras do J-PAL (Laboratório de Ação contra a Pobreza Abdul Latif Jameel), uma rede global de pesquisa que possui uma representação no Brasil, no Insper, em São Paulo. Além disso, lançou uma série de livros infantis na França no ano passado, com histórias voltadas para conscientizar as crianças sobre os problemas da pobreza.
A entrevistada enfatiza a viabilidade de suas propostas devido à urgência da mudança climática e aos danos já visíveis, especialmente nos países mais pobres. Ela destaca a necessidade de pragmatismo, argumentando que argumentos teóricos e morais não são mais suficientes diante da realidade presente. A proposta de um imposto sobre os super-ricos é apresentada como uma solução concreta para financiar iniciativas de combate à mudança climática e à pobreza global, com base na tributação da renda gerada por grandes fortunas.
Esther rejeita associações políticas à sua proposta, enfatizando seu apoio bipartidário e alta popularidade. Ela sugere que a tributação proposta é justa e minimamente impactante para os bilionários, podendo ser vista como um investimento no tecido social e na prevenção de revoltas populares. Quanto à aplicação dos fundos arrecadados, ela propõe uma abordagem em três frentes: assistência individual, adaptação local e investimentos em infraestrutura.
No Brasil, lei foi sancionada com veto
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou, com veto, a lei que modifica o Imposto de Renda (IR) aplicado a fundos de investimentos fechados e à renda obtida no exterior por meio de offshores. A Lei nº 14.754/2023 entrou em vigor em 1º de janeiro de 2024.
A nova lei estabelece a tributação ou aumento das alíquotas sobre fundos de investimentos que possuem apenas um cotista (conhecidos como fundos exclusivos) e sobre investimentos em offshores, que são empresas localizadas no exterior que investem no mercado financeiro. A Receita Federal será responsável pela regulamentação das novas regras.
Segundo o Palácio do Planalto, as mudanças visam promover a igualdade tributária, aumentar a eficiência econômica e estão em conformidade com as recomendações de organizações internacionais. Além disso, as novas medidas buscam acabar com a prática de adiar indefinidamente o pagamento do Imposto de Renda sobre juros e outros rendimentos, uma estratégia frequentemente utilizada por pessoas com alto poder aquisitivo.
O veto presidencial eliminou um trecho que definia bolsas de valores e mercados de balcão como “aqueles que operam como sistemas centralizados multilaterais de negociação”. A justificativa apresentada pelo governo foi que a lei “deixaria de fora da regulação outros participantes que podem funcionar com sistemas bilaterais de negociação”.