Medidas para consertar quatro anos de equívocos na condução da economia brasileira podem prejudicar o partido em 2016, principalmente nas capitais e grandes cidades

Ministro da Fazenda, Joaquim Levy: medidas econômicas na contramão do que o PT pregou na campanha / Foto: Wilson Dias/ Agência Brasil
Ministro da Fazenda, Joaquim Levy: medidas econômicas na contramão do que o PT pregou na campanha / Foto: Wilson Dias/ Agência Brasil

Cezar Santos

Lançar candidato à Pre­fei­tura de Goiânia em cha­pa solo ou manter a alian­ça com o PMDB? Este é um dilema que já preocupa os petistas goianos para a disputa municipal de 2016, cuja definição vai demandar muita discussão interna. Certamente que o partido vai analisar com muita precaução as possibilidades, haja vista que no pleito estadual no ano passado a sigla se deu muito mal com a candidatura de Antônio Gomide.

Mas a eleição municipal não é preocupação exclusiva dos petistas goianienses. Na verdade, o PT nacional tem esquadrinhado o cenário e vê motivo para tomar muito cuidado em relação a 2016. Trata-se do pacote de “maldade” do governo federal no sentido de arrumar os estragos da equivocada política econômica nos quatro anos do primeiro mandato de Dilma Rousseff.

A própria presidente admitiu, durante a primeira reunião ministerial, na terça-feira, 27, que as medidas têm “caráter corretivo”, ou seja, são mesmo para corrigir estragos. O temor de petistas graduados é que a repercussão do ajuste fiscal, principalmente nas medidas que tiram benefícios trabalhistas, prejudique o partido nas eleições municipais.

Em resumo, uma parte do PT teme que seja alto demais o custo político do ajuste do ministro Joaquim Levy para o partido. No início de semana passada, integrantes da corrente majoritária Cons­truindo um Novo Brasil (CNB) fizeram uma avaliação do cenário eleitoral e tentaram afinar um discurso otimista ao eleitorado de que as medidas na economia não vão causar prejuízos aos trabalhadores.

Como o ajuste pode agravar um quadro de recessão econômica, o temor é de aumento do desemprego e de redução da renda das famílias. Um prato cheio para a oposição e que pode minar candidaturas petistas principalmente nas capitais e grandes cidades. Lembrando que no ano passado, em Goiânia, o candidato Antônio Gomide teve menos de 40 mil votos, o que mostra que o partido sofre um sério déficit eleitoral na capital goiana.

“Temos que dar atenção especial para os governos municipais. Em 2014 o resultado eleitoral foi ruim para nós. Ganhamos a eleição perdendo. Vencemos a disputa presidencial, mas tivemos regressão no desempenho do PT, com redução das bancadas federal e estaduais e desempenho abaixo do nosso histórico nos grandes centros”, disse há poucos dias o ex-deputado Paulo Ferreira, um dos coordenadores nacionais da CNB, ao jornal “Valor Econômico”.

O agravamento do cenário está no ar, uma vez que o ajuste pode levar à recessão em 2015, com impacto no emprego e perdas para os trabalhadores. Lem­brando que as primeiras medidas da equipe “levyniana” foram mudanças no seguro-desemprego (Dilma já recuou um pouco nesse ponto, diante da péssima repercussão da medida), abono salarial e pensões, seguidas por aumento de impostos sobre gasolina, movimentações financeiras, importações e cosméticos.

Foto: Ceser Donisete, presidente regional do PT: “Eleitor sabe separar o local do federal, ainda bem”
Foto: Ceser Donisete, presidente regional do PT: “Eleitor sabe separar o local do federal, ainda bem”

A oposição, como é seu papel, tem batido duro nas medidas. Mas o problema para o PT é que também petistas já estão protestando contra o pacote do ajuste fiscal. Boletim de análise econômica publicado no dia 20 pela Fundação Perseu Abramo (FPA), do partido, faz críticas às medidas anunciadas pela equipe econômica do segundo governo Dilma para estimular o crescimento da economia. O informativo sustenta que o governo corre o risco de aprofundar as “tendências recessivas” da economia ao adotar uma estratégia “bastante conservadora e ortodoxa na política econômica”.

A senadora Marta Suplicy (PT-SP), dia sim, dia sim de novo, também está fazendo ataques à presidente Dilma Rousseff e a condução da política econômica, gerida sem “transparência”, “confiança” e “credibilidade”.

Mas e aí, essas medidas po­dem mesmo atrapalhar o PT na eleição de 2016?
O cientista político e professor da Universidade Federal de Goiás (UFG) Pedro Célio Borges lembra que toda medida de ajuste macroeconômico tem uma aparência antipopular muito explícita. Segundo ele, os ajustes do início do governo Dilma vão ser cobrados no momento em que começar o debate político, com sinal negativo para o PT. “Não tem dúvida. É um elemento a mais para agravar, do ponto de vista partidário, de resposta eleitoral.”

Cientista político Pedro Célio: “O PT será cobrado, mas já vem perdendo densidade eleitoral”
Cientista político Pedro Célio: “O PT será cobrado, mas já vem perdendo densidade eleitoral”

Mas Pedro Célio não se arrisca a afirmar que isso seria motivo para diminuir a votação do PT. “Não acredito nisso. Até porque essa diminuição de votos já vem acontecendo. Então o reajuste é um elemento a mais no processo anterior de, digamos, erosão eleitoral e de representação na Câmara dos Deputados, que o PT já vem vivendo.”

Sobre as manifestações contrárias às medidas econômicas dentro do próprio PT, o chamado fogo amigo, o cientista político diz que isso se dá em função da justificativa de integrantes em recuperar um viés partidário para o segundo mandato da presidente Dilma, que ficou meio carente de identidade, principalmente na segunda metade do primeiro mandato. O partido procura recuperar essa bandeira identitária cuja promessa foi feita na campanha eleitoral.

Ocorre que as medidas de ajuste vêm na contramão do compromisso feito durante a eleição.
Pedro Célio diz que esse resgate certamente deve ter sido negociado internamente para obter apoio eleitoral na campanha, ou para diminuir a sangria de apoios que começava a acontecer. “O desgaste interno é o primeiro sinal negativo que aparece, a primeira consequência é essa polêmica interna. Mas isso é rotina, é do jogo político. Não adianta especular em que medida pode prejudicar ou não o partido.”

Sem relação

O advogado Ceser Donisete Pereira, presidente estadual do PT, diz não ver relação entre as medidas econômicas e a campanha eleitoral em 2016, mesmo porque falta muito tempo, praticamente dois anos. Ele até admite que o ajuste fiscal tem impacto, mas não a ponto de afetar ou prejudicar a votação do PT na campanha municipal. “O leitor sabe diferenciar o federal do local, sempre foi assim, é ainda bem que é assim, senão um partido que estivesse bem no plano federal elegeria todos os prefeitos e governadores. E não tem sido assim”, diz Donisete, ressaltando que cada campanha tem dinâmica própria.

Como exemplos de reversão de expectativas que se dá em determinado período, o dirigente petista cita o governador Marconi Perillo (PSDB) e a presidente Dilma Rousseff. Lembra que há pouco mais de um ano Marconi estava muito mal nas pesquisas, ninguém dizia que ele ganharia. “Pois Marconi ganhou, foi uma campanha dura, com dois turnos, mas ele ganhou. Dilma também não estava bem, e acabou se reelegendo, igualmente numa campanha difícil.”

Segundo Ceser Donisete, a conexão entre o ajuste fiscal que está sendo feito agora com a campanha municipal que será iniciada no final do ano que vem, a rigor só mesmo em 2016, é um tanto forçada. Por isso, ele não vê que o PT seja particularmente prejudicado nesse cenário.

O petista afirma que se há problemas na economia, é preciso lembrar que o emprego continua em alta. “O Brasil é um dos países em todo o mundo que tem mais gerado postos de trabalho”, disse Donisete um dia antes de o Ministério do Trabalho (MTE), através do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), divulgar que o País fechou 2014 com o pior resultado em criação de empregos desde 2002.

Segundo órgão, foram criadas no ano passado 396.993 vagas de emprego, queda de 65% em relação a 2013, quando o saldo líquido foi de 1.138.562 postos de trabalho. O balanço do Caged aponta que o mercado de trabalho fechou 555.508 vagas em dezembro, o pior número desde 2008 (corte de 654.946 postos).

Perguntado se o ajuste não seria um fator a mais no sentido de agravar a diminuição da bancada petista na Câmara Federal e nas Assem­bleias, o que ocorreu na eleição do ano passado, Ceser Donisete reconhece que o problema existe, mas contemporiza. “Diminuímos sim, mas ainda somos a maior bancada na Câmara dos Deputados. E os outros grandes partidos também perderam. E também temos o maior número de deputados nas Assembleias. Então, é relativo.”