Celg é o ponto nevrálgico
16 maio 2015 às 12h36

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Por razões diametralmente opostas, governo e oposições apostam todas as fichas na privatização da estatal

Afonso Lopes
O que o Palácio das Esmeraldas e os partidos oposicionistas tem em comum neste momento de crise nacional de liquidez? A Celg. Mas por motivações exatamente opostas uma da outra. Para o governo, o plano federal de privatizar a elétrica ainda este ano é tilintar mágico. Para os opositores, a não privatização agora ou no ano que vem é néctar a ser saboreado a cada gota de tempo. Traduzindo isso tudo para o mundo da política, a venda dos ativos da empresa deve movimentar intensamente tanto governo quanto oposição.
A falta de dinheiro extra nos cofres estaduais é inegável. Aliás, é o próprio governo quem tem falado sobre as dificuldades, e não foi por outro motivo que promoveu um rigoroso plano administrativo que podou boa parte da máquina. Os sintomas estão por toda a parte, seja na liberação do pagamento dos servidores em duas etapas, com quitação integral no quinto dia útil do mês trabalhado, seja na antecipação do prazo para recolhimento do ICMS do dia 10 para o dia 5, seja no ritmo mais lento das obras ainda inconclusas.
Esse panorama de dificuldades é tudo o que a oposição mais queria para poder fazer barulho apesar de ter sido bastante reduzida nas eleições do ano passado. Ainda no recesso, e mesmo antes da posse, em fevereiro, deputados opositores chegaram a falar que conseguiriam pelo menos 14 votos em plenário, suficientes para atender quóruns vitais, como nos pedidos de CPI, Comissão Parlamentar de Inquérito. Quando a poeira baixou, descobriu-se que a bancada oposição, liderada por petistas e peemedebistas, chegou inclusive a perder um membro, que embora eleito com discurso oposicionista, decidiu seguir a orientação de seu partido.
É nesse cenário que a Celg entra como uma poderosa arma, tanto para um lado como para o outro. A venda dos ativos da empresa, que pertencem ao Estado, 49%, e à Eletrobrás, 51%, deverá render pelo menos 500 milhões de reais ainda este ano para os cofres estaduais, com a maior parte ficando para 2016. Para o governo estadual, esse dinheiro faz uma enorme diferença, principalmente em um ano que deve resultar num brutal enxugamento da liquidez nacional. Para as oposições também significa muito. Seus membros vão perder boa parte do discurso já preparado para ser entoado este ano.
Um dos melhores cérebros da bancada oposicionista na Assembleia Legislativa, em bate papo informal no início da semana passada, explicou como vê esse quadro. “A Celg é o segredo, a tábua de salvação do governo. Sem a privatização, o governador vai passar muito tempo apenas administrando as folhas de pagamento, sem poder agir. Com (o dinheiro da venda da) Celg, muda tudo”.
Às vésperas do final de semana, outros líderes oposicionistas disseram que vão desembarcar em Brasília para brecar a intenção do governo federal de se associar ao governo do Estado na venda dos ativos da Celg. Vai ser difícil, eles próprios reconhecem.
Em Brasília, a presidenta Dilma Roussef já avisou que vai mesmo providenciar a privatização da empresa ainda este ano, e agora está se debatendo o formato dessa venda. A discussão sobre vender a empresa ou não, portanto, está superada.
Apesar do franco pessimismo dos opositores com a privatização da Celg este ano, e da importância dos 500 milhões de reais iniciais para os cofres do Estado, esse dinheiro não será suficiente para aliviar as pressões de caixa de maneira a criar alguma folga. É apenas um refresco numa época de seca absoluta. A situação é diferente quando se analisa o efeito dessa venda no ano que vem, quando o Estado deverá receber o montante principal. Aí, sim, o cenário será bem mais promissor.
Não é apenas em Goiás que os opositores tentam se mexer para evitar, ou pelo menos adiar ao máximo, a privatização da elétrica. Na bancada federal oposicionista, o senador Ronaldo Caiado teria sondado o ambiente para se posicionar contra a venda. Recuou, segundo se especula, por causa do apoio que percebeu existir dentre os empresários.
Ninguém está contra a privatização da empresa, considerada hoje a pior distribuidora de energia elétrica do país, principalmente porque nas mãos dos governos federal e estadual não existem perspectivas positivas a curto ou a médio prazos quanto à retomada de investimentos em níveis compatíveis com a demanda.
Isso significa que os opositores locais vão ter que brigar, em Brasília, praticamente sozinhos contra essa privatização. É briga grande demais. Resta apenas marcar posição.