Adolescente de 13 anos que teve aborto legal negado corre risco de suicídio e aborto clandestino

19 julho 2024 às 10h06

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A adolescente de 13 anos que teve o pedido de aborto legal negado em Goiás expressou desejo de realizar a interrupção da gravidez de forma clandestina e está em risco de suicídio, segundo relatou um funcionário do hospital ao jornal Folha de São Paulo, onde ela foi atendida, que pediu para não ser identificado.
O funcionário disse que a última vez que a menina foi ao hospital para uma consulta pré-natal foi em 9 de julho. Ela recebeu orientações sobre a entrega voluntária do bebê para adoção e a gravidez é considerada de alto risco.
A menina, que não estava comparecendo aos exames pré-natal, foi ao hospital após uma decisão judicial, acompanhada de uma equipe técnica do Juizado da Infância e Juventude. O pai dela também estava presente, com advogados, e afirmou que ela não seria mais levada ao hospital, pois estaria recebendo atendimento em uma clínica particular, segundo o funcionário.
A menina engravidou após ser vítima de estupro por um homem de 24 anos e a Justiça negou o pedido de aborto legal. Ela manifestou desejo de interromper a gravidez, mas o pai dela foi à Justiça contra o procedimento.
A desembargadora Doraci Lamar Rosa da Silva, do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO), seguiu o pedido do pai, que defendeu que o feto tem direito à vida e ainda afirmou que o crime de estupro ainda está “sob investigação”. Ainda que o pai tenha essa posição, a lei brasileira considera qualquer relação sexual com uma pessoa menor de 14 anos como estupro de vulnerável. A lei permite o aborto em casos de estupro.
O Ministério Público entrou com um pedido para reverter a decisão. A Promotoria afirmou que está acompanhando o caso, mas que o processo corre em segredo de Justiça, por isso não seria possível disponibilizar informações.
De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, uma mulher é estuprada no Brasil a cada seis minutos em 2023, sendo que 62% das vítimas tinham até 13 anos. O número de estupros de vulnerável aumentou 7,5% no Brasil de 2022 (59.761 casos) para 2023 (64.237).
Sobre o caso da menina de 13 anos que foi estuprada, funcionários do hospital afirmam que o pai da adolescente disse que a filha havia desistido de fazer o aborto e que entregaria o bebê para ser cuidado pelo avô. Porém, pessoas que conversaram com a jovem dizem que ela mantém a vontade de interromper a gravidez e afirmam que as declarações do pai não são verdadeiras.
Ela também relatou que, se não conseguir fazer o aborto e o bebê for colocado para adoção, não quer que a criança fique com seu pai, pois não acredita que ele vá cuidar bem. O criminoso de 24 anos nunca acompanhou a adolescente no hospital.
Segundo fontes internas do hospital, a adolescente disse aos funcionários que o pai parou de trabalhar por 30 dias para vigiá-la, mas que ela quer estudar para ter uma vida diferente da mãe, que vive em outro estado. Ela também afirmou sofrer assédio sexual por outros homens próximos da família.
Na decisão da desembargadora Doraci Lamar Rosa da Silva Andrade, é mencionado que o pai da menina afirmou que sua filha se “sentiu pressionada pelas imposições do Conselho Tutelar” para interromper a gravidez.
A pessoa colaboradora do hospital ouvida pela matéria, entretanto, diz que a jovem nega ter sido pressionada e afirma que decidiu interromper a gravidez após conversar com a mãe.
O pai da jovem é representado por três advogados: Viviane Porto Pereira, Apoena Nascimento Veloso e Jennifer Puls Gama. Apoema integra a Comissão de Defesa da Vida da Associação dos Juristas Católicos de Goiás.
Não é o primeiro caso de abuso sexual sofrido pela menina. Segundo documentos do Conselho Tutelar, de abril deste ano, a menina já denunciou outro caso, quando tinha 12 anos. Segundo o texto, um adolescente contou o ocorrido para uma professora e manifestou medo de ter engravidado.
Na ocasião, ela foi encaminhada ao Instituto Médico Legal (IML) para fazer exames e seguir protocolos de proteção contra Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST). Também foi registrado um boletim de ocorrência sobre o caso, e o exame de gravidez deu negativo.
O Conselho Tutelar considera que a adolescente está afastada da escola desde 2023 e que ela já foi acompanhada por um conselheiro devido às faltas. O pai foi alertado sobre o perigo da ausência na escola. Frente a isso, o Conselho Tutelar vai exigir matrícula especial para a adolescente na escola. Foi pedido em março que a menina iniciasse exames pré-natais mensais que até abril não foram feitos.
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