Sem solução

04 agosto 2017 às 09h45

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Depois de várias propostas durante décadas, conselheiro do presidente Donald Trump chega à constatação óbvia

A gravação foi na semana passada. Jared Kushner, genro de Donald Trump e conselheiro do presidente americano para os assuntos do Oriente Médio, disse, em uma conversa fechada com alguns parlamentares republicanos e assessores, que não há solução para o conflito entre palestinos e israelenses.
Kushner disse a verdade. Nos últimos cem anos, tantos homens tentaram e nada conseguiram. De intelectuais a homens de guerra, ninguém, até hoje, conseguiu apresentar uma proposta que colocasse um fim na sangrenta disputa entre árabes e judeus na Terra Santa.
Em 1922, os ingleses estavam convencidos que tinham a fórmula que levaria à paz quando passaram uma régua no mapa da região durante o mandato britânico na Palestina. A região foi dividida com o fim da Império Otomano, e a parte que cabia aos ingleses sofreu uma cisão: 78% do território oficial da Palestina deu lugar ao reino Hashemita da Jordânia. Os outros 22% eles estavam convencidos que os árabes aprovariam a doação daquele pedaço de terra aos judeus. Mas se enganaram. E não houve acordo.
Quinze anos depois a Inglaterra tentou novamente e apresentou um novo plano de partilha de 1937. A proposta consistia em dividir os 22% da Palestina original em duas partes. Destas, os árabes ficariam com três-quartos. Os britânicos ainda ficariam com o controle de Jerusalém e Belém, e um Estado Judeu anão se estabeleceria entre os limites que iam do mar da Galileia e uma pequenina faixa de areia que se estendia até o sul, onde hoje é a Faixa de Gaza. Líderes judeus se apresentaram dispostos a negociar míseros grãos de areia, mas novamente os árabes disseram não.
Dez anos depois, em 1947, a Organização das Nações Unidas (ONU) então apresentou a sua solução. Novamente, os árabes ficariam com a maior parte do território. Aos judeus uma parte da Galileia, a linha costeira desde Tel Aviv até a Faixa de Gaza e uma pequena área do do deserto do Negev ao sul.

Na época, logo após o fim da Segunda Guerra Mundial, disseram que era loucura estabelecer um Estado Judeu sem forças de defesa e incapaz de absorver uma quantidade significativa de imigrantes em tão pouco tempo. Desesperados por uma saída para os milhares de sobreviventes do Holocausto e outras disputas com árabes na então Palestina, os líderes judeus aceitaram a proposta das Nações Unidas. Os árabes por sua vez continuaram se negando a qualquer negociação. Foi estabelecido o Estado de Israel, e no dia seguinte os países árabes da região se lançaram numa guerra contra o país que acabara de nascer.
Foram necessários outros 42 anos para que uma nova “solução” para o conflito viesse à tona. Foi em 1989, conselheiros do então presidente Ronald Reagan, que estava de saída, o convenceram e ao novo presidente que entrava George Bush, que a melhor maneira de lidar com o conflito seria os Estados Unidos fingirem acreditar que Yasser Arafat e a Organiazação para a Libertação da Palestina (OLP) de fato queriam a paz, e assim negociarem com líder palestino. Um ano e meio depois, Bush teve que retirar o reconhecimento quando terroristas da OLP foram capturados a caminho de um ataque na Embaixada dos Estados Unidos em Tel Aviv.
Doze anos depois, os mesmo conselheiros, But Kurtzer e Dennis Ross, apresentaram a mesma proposta de solução para o conflito para o outro Bush. E conseguiram a façanha de constranger ainda mais o presidente americano, quando convenceram George W. Bush que Arafat, depois do acordo de Oslo, de fato queria a paz. Mas em janeiro de 2002, Arafat foi pego quando tentava contrabandear mais de 50 toneladas de armas em um navio pela Faixa de Gaza. E assim como o pai, foi a vez do filho Bush declarar que os palestinos deveriam apresentar novas lideranças para que uma negociação pudesse acontecer. Logo após a morte Arafat, assumiu o número dois da OLP, Mahmoud Abbas, que até hoje, aos 82 anos, continua no poder.
Dois líderes israelenses também tentaram apresentar um plano que pusesse um fim à disputa. Em 2000, o então premiê Ehud Barak, e em 2008 o primeiro-ministro Ehud Olmert ofereceram à Autoridade Palestina concessões jamais imaginadas. Não é preciso nem dizer que os palestinos mais uma vez disseram não.
No entanto, o Departamento de Estado americano não se deu por vencido. E no começo do governo de Barack Obama, Marin Indyk e seu assistente David Makovsky apresentaram uma nova “solução” em que ambas as partes teriam que fazer concessões dolorosas para chegarem a um acordo final, mas no meio das negociaçõe, entre 2013 e 2014, Mahmoud Abbas anunciou a criação de um governo de união nacional com o Hamas. E a tal “solução” foi pra lata de lixo.
Há décadas que o governo de Israel afirma que não há com quem negociar do lado de lá. A permanente negativa palestina para qualqueur tipo de acordo deixa claro que qualquer solução que seja apresentada e que envolva a existência de um Estado Judeu, seja ele de qualquer tamanho, nunca terá uma aceitação sincera dos palestinos e do mundo árabe.
Os experts e suas propostas mirabolantes, que nas últimas décadas só tornaram o problema ainda maior, dessa vez parece que concordam com o inexperiente genro do presidente Donald Trump, que rapidamente entendeu que não há solução para o conflito. Um século sangrento já é o suficiente para deixar isso bem claro por aqui. l