Benyamin Netanyahu discursará pela terceira vez no Capitólio americano e isso pode não ser nada bom

Primeiro-ministro israelense, Benyamin Netanyahu, e presidente dos Estados Unidos, Barack Obama: o que divide os dois líderes é que um calcula como as coisas podem piorar; o segundo pensa em como podem melhorar
Primeiro-ministro israelense, Benyamin Netanyahu, e presidente dos Estados Unidos, Barack Obama: o que divide os dois líderes é que um calcula como as coisas podem piorar; o segundo pensa em como podem melhorar

Daqui a menos de um mês, o primeiro-ministro de Israel fará um discurso no Congresso americano. Será a terceira vez, em sua longa carreira política, que o líder israelense vai falar aos congressistas, se igualando, em número de vezes, ao ex-premiê britânico Winston Churchill, que também discursou três vezes no Capitólio, mas em outras circunstâncias. Benyamin Netanyahu, às vésperas das eleições aqui em Israel, que acontecem no mês que vem, está sendo acusado pela oposição de utilizar o palco americano como plataforma política. Ele foi convidado pelo porta-voz da Câmara, o republicano John Boehner, para reafirmar a tese de que os congressistas americanos têm de aplicar sanções ainda mais pesadas sobre o Irã a fim de impedir o avanço do programa nuclear do país.

A decisão de ir a Washington em março já foi confirmada pelo próprio Netanyahu, que, segundo ele, como representante máximo de Israel, tem a obrigação de alertar os colegas americanos (pelo menos os republicanos) sobre o fiasco de um acordo final entre a República Islâmica e as potências mundiais.

Vai começar, então, mais um capítulo da saga que conta a relação desastrosa entre o líder de Israel e o presidente Barack Obama. Depois de seis anos de desavenças e humilhações, Obama e Bibi estão novamente, frente a frente, num confronto político que pode azedar de vez a já abalada relação entre os dois países.

Cada embate entre os dois líderes é sempre descrito como o ponto mais baixo das relações entre Israel e os Estados Unidos. Mas para muitos americanos, desta vez parece que Netanyahu foi longe demais. No Congresso, quase todos os democratas, e até alguns republicanos, ficaram enfurecidos com o premiê israelense, que, segundo eles, coordenou, nas costas de Obama, a visita a Wa­shington exatamente duas semanas antes das eleições em Israel.

Autoridades israelenses insistem em afirmar que os laços com os Estados Unidos nunca estiveram tão estreitos, e que a tensão é entre os líderes, mas não entre os dois países aliados.
Obama e seu secretário de Estado, John Kerry, já disseram que não vão receber ou se encontrar com Netanya­hu. O que se diz nos bastidores da Casa Branca é que as tentativas do go­verno Obama em retomar às boas com Bibi estão encerradas. Situação parecida aconteceu em 1996, quando o então presidente Bill Clinton, depois de se encontrar com Netanyahu, que na época cumpria seu primeiro mandato, exclamou para os seus assessores “Quem diabos ele pensa que é? Afinal, quem é a superpotência aqui?”

Mas apesar das divergências e dos confrontos frequentes, Oba­ma e Netanyahu não são tão di­ferentes um do outro. Na verdade, os dois têm algo em comum: são políticos calculistas. Obama não tem o carisma de Bill Clinton e Bibi não tem a habilidade de Ariel Sharon. Mas os dois criaram círculos políticos impenetráveis, cheios de suspeitas dentro e fora deles, e acreditam que têm um papel importante a ser escrito na história de seus respectivos países. Obama é o primeiro presidente afro-americano, cujo lema de campanha era “change” (mudança), que na prática se tornou uma missão bem difícil e praticamente impossível para o americano concretizar. Já Ne­tanyahu considera sua maior missão (às vezes com ares messiânicos) defender Israel. Os dois sabem que não podem tomar decisões drásticas num mundo cada vez mais perigoso, onde Irã, Hezbollah, Hamas, Estado Islâmico e Al Qaeda podem estar em qualquer esquina. Essa é a diferença entre o liberal que ocupa a cadeira na Casa Branca e o conservador de Jerusalém: Obama pensa o que pode ser mudado para melhor, enquanto Netanyahu teme e calcula o quão pior pode ficar. O que divide os dois é a ideologia. Suas visões de mundo são contraditórias em todos os sentidos, e correm em linhas paralelas.

As preocupações do líder de Israel sobre o programa nuclear iraniano têm mérito. Mas a forma agressiva como Bibi coloca o problema para os americanos é que vem sendo criticada. Muitos políticos americanos afirmam que, se o Congresso quisesse uma consultoria israelense de como lidar com o Irã, então deveria convidar um militar ou agente da inteligência do país aliado. Aliás, o primei­ro-ministro recebe críticas frequentes de ex-diretores do Mos­sad e de militares aposentados sobre as ameaças constantes em utilizar a força militar para resolver a questão com os aiatolás.

É quase certo que um acordo pleno não vai acontecer. Os Estados Unidos sabem que não vão conseguir desviar o Irã de seu programa nuclear para uso militar, mas podem atrasá-lo de várias maneiras, entre elas postergando as negociações, que é o que tem sido feito nos últimos dez anos. A República islâmica quer a bomba nuclear, e todos sabem disso. Se o acordo falhar, as consequências serão seriíssimas, e podem culminar com a decisão dos Estados Unidos de utlizar sua força militar e atacar as instalações nucleares iranianas a fim de impedir uma corrida nuclear no Oriente Médio.

Mas, mesmo que use a força, as garantias de sucesso absoluto são imprevisíveis, assim como a retaliação iraniana. Por isso, é importante que Israel não dê a mínima chance de parecer que está empurrando os Estados Unidos e o mundo para um conflito com o Irã. Os israelenses deveriam é ficar bem longe quando essa decisão for tomada, deixando bem claro que o Irã é problema dos americanos. Se um ataque às instalações nucleares iranianas realmente vier a acontecer, muitos americanos não ficarão felizes. Se falhar ou se as consequências forem além do imaginável como um Amargedon, outros tantos americanos também estarão insatisfeitos e vão se perguntar “como chegamos até aqui?” Uma das respostas que vão encontrar entre os escombros de um mundo destruído pelo conflito certamente será o discurso de Netanyahu no Congresso, que muitos avisaram para que não fosse feito, entre eles Barack Obama.