Esta crônica é dedicada a todos os lobos travestidos de cordeiros, que em nome do amor cultivam ignorâncias, vaidades e ganâncias.

Certa vez, não faz tanto tempo assim, nas peregrinações que fazíamos pela imensidão do Cerrado, ocorreu de montarmos o acampamento de estudo e repouso, bem longe, lá no centro do Tabuleiro da Tamarana.

Era setembro e quando a noite chegava, a lua refletia seu clarão, como um espelho nas flores esbranquiçadas das mangabeiras, que pingavam gotas de esperança no lago do meu coração e no coração dos companheiros.

Essa visagem clareava um caminho que tinha uns barulhos que ficam em silêncio, mas que traziam força, libertando a reprimida busca constante pelo conhecimento e reforçavam os ideais da luta voraz, que por quase meio século, travamos contra os gigantes da destruição e mecanismos controladores do poder, que nunca se cansavam de entulhar nossos caminhos com lixo sórdido e malcheiroso.

Enquanto isso, o futuro foi chegando, com seus disfarces camuflados e, quando pensávamos que seguíamos à frente, estávamos era voltando.

A força da ganância, destruiu o Tabuleiro, tirou dele as mangabeiras e as vaidades, quais lanças cravadas no peito, cuidaram do resto. Não sobraram ilusões, nem sonhos, nem amores, nem fortunas, nem conhecimento para a gente que ali vivia.

O tempo obscuro podou a esperança. Alguns companheiros se acomodaram pelo caminho, outros sentaram na pedra da desilusão. Poucos ainda carregam no coração a coerência da esperança, irradiada pelas gotas confortantes das flores das mangabeiras.

Num desses dias, em meu sonho, lá estava eu no Tabuleiro da Tamarana, quando a noite trouxe no clarão da lua a esperança da ilusão. Era só boniteza, mas depois de certo tempo percebi que algo estranho acontecia: das gotas das floridas das mangabeiras pingavam lágrimas, que ferviam no lago do meu coração.

Quando acordei,
Ainda desorientado,
Vendo um céu azulado,
Busquei na magia um pincel,
E, com tintas do coração,
Pintei a desilusão.