Maternidades são plurais, únicas e peculiares
08 abril 2023 às 11h40
COMPARTILHAR
Abril chega com a coluna debatendo sobre como as maternidades são “plurais”, “únicas” e, mesmo com experiências em que todas nos identificamos, cada uma de nós a vive de maneira completamente peculiar.
O “Conversas de Mãe”, portanto, recebe hoje Janaína Leslão que se define como “escritora, psicóloga, lésbica, feminista, antirracista e mãe (não necessariamente nesta ordem).
Uma mulher generosa com as palavras e com afetos. Um ser humano que ao construir histórias por meio de seus livros vislumbra um mundo melhor e mais igualitário para se viver. Janaína é uma mulher corajosa, inteligente, linda de todas as formas e seus livros refletem essas características tão necessárias nos dias de hoje. Ela é o exemplo de que maternar é plural e único.
…ser alguém para ouvir sem julgar, ser para outras pessoas o que gostaria de ter tido para mim…
Janaína Leslão
Aqui é um espaço para mães conversarem e para quem não é mãe também. Afinal, o mundo é povoado de crianças e todas as vozes importam! Venha conosco nesse bate-papo e trazer muitos debates sobre maternidades, carreira, justiça social e afetos. Vamos conversar?
Manda um e-mail para [email protected] e venha construir esse espaço conosco!
Ana Carolina Coelho – Quero começar afirmando que é uma alegria e uma honra receber uma escritora comprometida com a Educação Plural e diversa. Muito obrigada pelo aceite.
Janaína Leslão – Obrigada, adoro ser lembrada, mas por pessoas que admiro e tenho carinho, é muito, muito, muito melhor!
Ana Carolina Coelho – Fale para as pessoas um pouco sobre como você começou. Qual a sua trajetória como escritora e a sua profissão?
Me formei em psicologia e a exerço no SUS. Quando fui escolher uma faculdade para prestar vestibular, entre tantas coisas que pensei em fazer, queria “ser alguém para ouvir sem julgar, ser para outras pessoas o que gostaria de ter tido para mim”… Depois, já como profissional, atendia um grupo de pré adolescentes e conversávamos sobre questões da sexualidade (gravidez, prevenção as ISTs, abuso sexual, homofobia). Neste momento, procurei textos no estilo de “conto de fadas” para conversar sobre essas questões e não encontrei. Trabalhei com o grupo com outros recursos, mas mais tarde, resolvi “escrever os textos que precisava para trabalhar como psicóloga, mas não encontrei” e, de alguma forma, esses contos seriam os que eu gostaria de ter encontrado quando mais nova, mas não existiam. Agora, tem conto de fadas sobre amor entre mulheres, sobre princesinha trans, sobre rainhas lutando para decidir sobre o parto e conto sobre adoção. Eu os escrevi para outras crianças e para as minhas: a que fui e as que tenho.
Ana Carolina Coelho – A maternidade teve qual impacto em sua vida profissional? Quais são “as alegrias e dores” desse processo materno?
Janaína Leslão – A maternidade me fez ser mais consciente do meu tempo. Como diz Mujica, tempo não é dinheiro, tempo é vida. Então, sempre mensuro o meu tempo de vida junto a meu filho frente a possíveis mudanças em minha rotina de trabalho. Meu tempo para a militância presencial, feminista e LGBTQIA+, também diminuiu drasticamente. Mas o meu desejo de ser mãe foi acalentado por anos, e ainda teve o tempo de espera na “fila” da adoção, então olho e vejo que valeu cada minuto.
Eu já sabia muito sobre as dores e delícias da maternidade porque já era madrasta e acompanhava a maternidade de minha companheira daquela época. Mas cada criança tem seu jeito e sua história, de forma que ser mãe também é uma construção diária. Há momentos que gostaria de ser mais paciente, em outros, mais firme, essas coisas de toda mãe. Também descobri que não gosto muito de brincar e nem de lição de casa, ops! E que sou a mãe possível, assim como a minha também foi. Fui amada, cuidada, e creio que melhorou algumas coisas ao fazer o mesmo com meu filho. E, caso um dia ele deseje ser pai, espero que aperfeiçoe o jeito de amar e cuidar.
Ana Carolina Coelho – Você tem rede de apoio? Como funciona? Você acha que poderia ser diferente ou melhor em outra conjuntura social?
Janaína Leslão – Minha rede de apoio é super restrita. Sou migrante e meus familiares moram em outro estado, então não posso contar com uma rede familiar. Todavia, há alguns meses, minha ex-companheira, com quem divido a maternidade de meu filho, se mudou para a mesma cidade onde eu e ele já morávamos. Isso foi ótimo e nada menos. Assim, eles podem conviver um pouco mais, nos auxiliamos nos perrengues do dia-a-dia com uma criança e, de quebra, posso ter mais tempo para mim mesma e outros projetos para além da maternidade. Ter mais tempo só para mim me faz muito bem. E uma mãe feliz é uma mãe bem melhor.
Apesar da rede de apoio restrita, o que ajuda muito é que divido a maternidade com uma pessoa que, além de ser bastante responsável, tem ideais e valores muito parecidos com os meus. As instituições escolares são muito importantes também em nossa rede e, até hoje, pudemos contar com ajustes, apoio e diálogos por onde nossa criança estudou. Sabemos que temos amigos que, apesar do pouco convívio diário, podemos contar em momentos em que precisarmos de uma ajuda. Isso também é um descanso. Se vivêssemos aquele ensinamento nigeriano que diz “é necessário uma vila inteira para se educar uma criança” seria muito melhor, mas, no momento, estamos ainda lutando pela aceitação e respeito às diferenças. A responsabilidade coletiva pelo bem estar de todos está um pouco além.
Ana Carolina Coelho – O que você identifica que é único em sua maternagem e o que você repara que é um processo coletivo?
Janaína Leslão – Uma coisa bem diferente na minha maternidade é que dividi com os leitores três anos de nossas vidas, publicando um livro chamado “Crônicas da infância: em lorenzês”. Isso, tanto nos expôs para os de fora quanto nos encheu de afeto de “nós por nós”.
Tem outras peculiaridades, claro, sou lésbica, meu filho chegou por adoção, mas outras mulheres também vivenciam isso. E o que, creio, seja algo coletivo é que, via de regra, todas nós estamos tentando melhorar a maneira de cuidar, amar, ensinar e respeitar nossas crianças e adolescentes.
Ana Carolina Coelho – Sua participação hoje abrilhantou demais a coluna Conversas de Mãe. E como aqui é um espaço plural, agora é a hora que te pergunto: o que mais você gostaria de falar sobre Maternidades?
Janaína Leslão – Podem saber mais sobre meus livros na internet ou me perguntar via redes sociais. A ideia é contribuir com um mundo melhor. Todas as obras foram publicadas pela Metanoia Editora. Deixo os títulos:
- A Princesa e a Costureira (2015)
- Joana Princesa (2016)
- A Rainha e os Panos Mágicos (2017)
- Crônicas da infância: em lorenzês (2020)
- A Grande Árvore (2022)