Opção cultural

O Jornal Opção publica, nesta edição, o último conto da série literária “Quatro Estações”. Trata-se de quatro contos em que dois autores escrevem, a quatro mãos, uma breve narrativa inspirada em uma estação do ano. Anteriormente foram publicados “Primavera”, de Luisa Geisler e Débora Ferraz; “Verão”, de Anderson Fonseca e Mariel Reis; e “Outono”, de Mauricio de Almeida e Rafael Gallo.
[caption id="attachment_28954" align="alignnone" width="620"] Natural de Inhumas, Matheus Antunes é ilustrador, designer gráfico e estudante de Arquitetura. Atualmente, reside em Natal, no Rio Grande do Norte[/caption]
Olhava para a aba do ar-condicionado split, que oscilava, para cima e para baixo, mas também para a boca da Cleide, a dona, que nunca fechava. Movimentos similares e ininterruptos. Frio demais, falar demais, pra quê? Cleide e a mesma história, a mesma opinião, a mesma piada, e ria alto. Maria sabia tudo de cor: as entonações, a hora da risada estridente. Mas não tinha tempo para conversa fiada, preferia fazer contas, mentalmente, todos os dias, para ver se elas fechariam (sem precisar contar com a pensão, que tinha destino certo: o aluguel), se poderia pagar a escolinha do menino e se sobraria algum dinheiro. Ou quantas unhas precisava fazer para cumprir sua meta do mês. Não precisava ser simpática, Cleide já era por todo o salão: com uma frase feita, sorriso de ponta a ponta e os peitos recheando os decotes. Já Maria era pura ação: cortava as unhas, geralmente quadradas ou redondas, e acertava com a lixa, com movimentos rápidos e certeiros, de um lado para o outro, evitando mover a lixa para cima e para baixo, como a aba do ar-condicionado ou a boca da Cleide.
O senhor quer mesmo que eu ligue o ar? Desculpe a pergunta, mas é que não é muito comum os passageiros pedirem isso. Se deixo ligado, pedem pra desligar. De São Paulo? Sei, lá as pessoas vivem nos escritórios, com ar refrigerado. Aqui em Brasília qualquer ventinho faz as pessoas morrerem de frio. Eu vou fazer o caminho por trás dos ministérios, pela via dos anexos, tá bom? A esplanada está bloqueada por causa da montagem das arquibancadas. Estão preparando o desfile de amanhã. O povo fica ali, naquele calorão, esperando pra ver os carros e os soldados passarem. No ano passado eu vim, trouxe meu piá, mas não consegui ver quase nada. Só os aviões, passando bem baixinho em cima das pessoas, ele adorou. Ih, já vai fazer três meses que ele não está mais comigo! Não se preocupe, chegamos lá em dez minutos. A via dos anexos tem um monte de lombadas, mas não tem sinaleiro, daí a gente entra num túnel, sobe uma rampa e eu deixo o senhor na entrada principal. Ah, Moacir, tomara que seu carro pegue fogo e você queime, lentamente. Assim você vai ver como é bom o calor. Pimenta e sol, a minha Bahia. As pontas precisavam ficar levemente arredondadas e também as laterais, sem estreitá-las. A lixa precisava dançar por baixo da unha, para remover rebarbas, e a lixa polidora removia as estrias da superfície. Que diabos o menino iria fazer da vida, aqui? Taxista? Como o pai? Nem a pau. Aqui não tem porra nenhuma para os ferrados, como a gente, mas voltar para Santana também não dá. Talvez Salvador, mas estão matando muito lá, dá não. Aqui não presta, não tem praia, e usam o ar-condicionado por qualquer calorzinho, até no inverno. Chacoalhava a cabeça, enquanto amolecia as cutículas da ruiva, usando creme emoliente e água, empurrando-as com a ajuda de uma espátula de unha, com muito cuidado. Mas ainda é melhor que o sul, quantos graus deve estar agora em Curitiba? A seca tá braba. Todo ano é a mesma coisa. Meses sem cair uma gotinha e agora só mesmo lá para pelo fim de novembro, quando a cidade já estiver enfeitada com os foquinhos de Natal. Até lá eu quero ver se economizo uma grana e chamo meu guri pra passar o Natal comigo. Eu me separei da Maria já faz três meses. Ela foi embora porque não suportava o frio, o senhor acredita? Disse que queria voltar pra Bahia. Eu também disse que ia voltar pra Curitiba, não suporto este calor desgraçado, 35 graus no inverno, o que é isso? Veja como são as coisas, o que é calor pra mim é frio pra ela, assim não podia mesmo dar certo, né? Mas acabei não voltando, ainda. Só que ela não sabe, ela acha que eu estou lá, naquele frio do cão, como ela diz. Eu ligo no celular dela, mas a gente nem conversa muito, é só pra saber como é que está o piá. Ele vai fazer quatro anos, eu quase morro de saudade. Que ela quisesse ir embora, eu entendo, mas me deixar sem meu filho, lazarenta! O amigo me desculpe. Com o alicate de cutícula removia o excesso de pele, retirando toda a cutícula externa de uma vez só, para evitar o aparecimento de pelinhas esbranquiçadas. Eu vou voltar para o sul, ele disse. Foi o jeito de se livrar de mim. Eu não quis Curitiba, você não quis a Bahia, e por fim não quis a baiana. Ele nem sonha que eu acabei ficando por aqui mesmo. Ele me liga e pergunta por que eu ainda uso o celular com número de Brasília e eu digo que não tive tempo de mudar. Mas eu vou embora, juro, é só juntar um dinheirinho, pegar o menino e cair fora. Dizem que é impossível tomar banho em Curitiba, no inverno. Olha, vou dizer pro senhor uma coisa que eu nunca disse pra ninguém, eu sou de Curitiba, lá o pessoal fala pouco, mas esses anos em Brasília me deixaram com a língua solta: minha vida melhorou depois que eu me separei dela. Eu até comprei este carro aqui, um Bravo, último modelo da Fiat, novinho. Antes eu tinha um Meriva 2002, caindo aos pedaços, nunca fiquei tanto tempo sem trocar de carro. Sabe como é, duas bocas, depois três, tudo fica mais difícil, e olha que a Maria trabalhava pra ajudar. Olha lá a catedral, com céu ao fundo. É bonito, não vou dizer que não é. Em Curitiba eu tinha um Astra, calotas com aro cromado, uma teteia. Meu sonho é ter um Honda Civic com câmbio automático. Um dia eu vou ter e aí já vou estar dirigindo de pulôver e meia de lã. Passa a base em toda a unha, extrapolando a linha da cutícula, para facilitar a etapa de limpeza com o palito. Por que aceitei vir para cá? Burra, isso sim, minha mãe sempre disse que eu era burra. Ao passar o esmalte, puxa a pele lateral do dedo para garantir que não sobrem espaços brancos na unha. Três camadas de esmalte cremoso para ficar da cor e cobertura extra brilho para o esmalte durar mais. Uma camada logo após a pintura. Ele está bem, carro novo, taxista dos bacanas. Paga pensão e tudo, mas não o perdoo. Gostava, gostava dela, sim, mas ela queria ir pra Bahia, voltar pra terra dela, e eu nem aqui consigo viver direito. Olha aquela árvore ali, olhe a grama: tudo estorricado. Está certo, o céu é bonito, na esplanada é lindo, pena que não dá pra ver hoje por causa da preparação do desfile, mas e as queimadas? A estiagem vem, o mato queima e a fumaça esconde o céu. E aí, adeus beleza. Agora a loira falsa, seios siliconados, rosto repuxado. Essa gente não tem vergonha de ficar toda torta e esticada? Mas a unha, em dia. Passa o palito em seguida para limpar os cantos, limpa com o algodão e acetona. Será que estou gorda como essa morena? Não pode ser, não. Apoia o palito no vão entre o polegar e o indicador e enrola, encharca na acetona novamente, remove o excesso com batidinhas na toalha e esfrega levemente nos dedos, fazendo pressão. No Natal fica tudo verde de novo, e eu vou estar com o meu piá. Já comprei até um pinheirinho pra colocar os presentes que ele vai ganhar do Papai Noel quando vier. O senhor tem trocado? Facilita. Muito obrigado. Olha, vai com Deus e obrigado por ter pedido pra eu ligar o ar!Carlos Henrique Schroeder é autor dos romances “Ensaio do vazio” (7Letras), adaptado para os quadrinhos, e “A rosa verde” (Editora da UFSC), adaptado para o teatro, e do recém-lançado “As fantasias eletivas” (Record), dentre outros. Sua coletânea de contos “As certezas e as palavras” venceu o Prêmio Clarice Lispector 2010, da Fundação Biblioteca Nacional. Tem contos traduzidos para o alemão, espanhol e islandês.
Mário Araújo nasceu em Curitiba-PR. Publicou os livros de contos “A Hora Extrema” –– prêmio Jabuti em 2006 –– e “Restos”. Tem contos publicados em revistas e antologias na Alemanha, Espanha, Finlândia, EUA e México. Atualmente escreve crônicas para o site Vida Breve e finaliza seu primeiro romance. Sua página na internet é www.marioaraujo.net.

No Capitulo III do conto “Sem Palavras”, Larissa Mundim escreve: “No princípio, havia dito que preferia as sutilezas, mas entregou-se ao naturalismo. Me mordeu inteira, explorou minha geografia conforme anunciado. Deixou marcas na epiderme. Não me esquecerei da movimentação cheia de sensualidade, como a sua capoeira”. Virou livro. A prole cresceu, Larissa escreveu “Agora Eu Te Amo” e a cada passo, a goiana Nega Lilu Editora se consolida. No ano que passou, selecionou 40 poemas e apenas 10 contos. Por isso, o edital para Coleção "e/ou" abre suas páginas outra vez. “O número de finalistas não foi suficiente para a composição de um livro, por isso, decidimos reabrir o edital, agora com foco na prosa”, diz ela. A ideia é publicar textos corajosos, livres em forma e consistentes no conteúdo. A iniciativa lança o selo literário Naduk, uma vitrine para a produção de autores inéditos, que procuram espaço para publicação. Por isso, desengavete seus textos, perambule sua criatividade, pois o período de inscrições encerra em 16 de março.
Bubu, Índio e Pimenta. Já ouviu esses nomes? Bem, você só precisa saber que eles se reúnem na última sexta deste mês para colocar o trio de metais original, que acompanhou Camelo, Amarante, Medina e Barba, num tributo para lá de bem arranjado para matar a saudade dos Los Hermanos. A noite, de quem fecha os olhos e não erra uma letra sequer, será no Bolshoi Pub. Ramon Matheus, nos vocais, Gustavo Martelli, voz e guitarra, Guilherme Cysne, no baixo, e Zé Mari, na bateria, completam a banda que começa a tocar à meia noite. Os ingressos estão sendo vendidos, antecipadamente, nas franquias do Fran’s Café e na Livraria Nobel, do Shopping Bougainville. É hora de chamar os amigos.
Fica em cartaz, até o dia 21 de abril, o projeto “Curta ao Meio-Dia”. Trata-se de uma seleção de curtas cujo objetivo é oferecer mais entretenimento ao público durante os fins de semana em um horário “meio morto”. As exibições acontecem no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), em Brasília, entrada franca. Em março o tema é Curtas Universitários; em abril, para fechar, serão exibidos os Clássicos de Brasília. Então, se estiver na capital federal, lembre-se: ao meio-dia, seu lugar é no CCBB.
- Lá se vai fevereiro e se achega a edição 2015 do Literatura no Eixo! É, galerinha, se você usa o transporte coletivo que corta Goiânia de leste a oeste, se prepare para uma tarde cheia de poesia, música e, claro, muitos livros! O sarau ambulante sai ali do Grande Hotel, às 15 horas, no sábado, 28.
- Tem palestra aberta nos dias 2 e 8 de março. Tema: cinema. É o II Icumam Lab – Laboratório de Fomento à Produção Audiovisual no Centro-Oeste. Serão realizadas três palestras, ministradas por renomados profissionais do mercado nacional de audiovisual.

Não nos esqueçamos do Rap de Don L. Nordeste mostrou neste feriado um cenário alternativo ativo que vai muito além da música regional

Na semana de carnaval, a galera do Jornal Opção continua trazendo notícias acompanhadas de muito boas músicas. E, ó, só para começar, que tal "Carnavalia", dos Tribalistas? Beyoncé - Crazy In Love (Fifty Shades of Grey version) Demon Hunter - Follow The Wolves Imagine Dragons - Radioactive (Live) The Paper Kites - Bloom Us The Duo - Call Me Maybe (Studio Sessions)

Com mais de 90 títulos, “O Amor, a Morte e as Paixões” se destaca pela pluralidade de gêneros e temáticas dos filmes. A 8ª edição fica em cartaz até 25 de fevereiro, no Shopping Bougainville

Em “O Capital no século XXI”, PhD questiona Marx, Kuznets e Keynes propondo um novo olhar sobre a atual constituição econômica da sociedade

Yago Rodrigues Alvim
As caixas desempilhadas, esparramadas do pé da cama à porta entreaberta. Fotografias fora da caixa, roupas desbotadas fora do cabide, do fundo da gaveta, amontoadas em livros sobre livros, ao lado de cds, na mesinha sem arranjo. Cama desnuda, de noite atormentada.
Mormaço escalado em paredes de cortina amarrada. Copo meio vazio, no criado mudo em meio a farelos também sem sal. Botou as mãos na cintura, depois de sequer um fio amarelo sobrar na testa suada. Umedeceu os lábios e cerrou os dentes, ante o olhar disparatado a imagem estatelada no espelho. Endurecidas, se entreolhavam até o ínfimo poro do poro da pupila estática. O ar atracara nas narinas, na goela, nos pulmões secos. O ar suspendia-se no ar.
A interferência chiando em preto e branco na tevê da sala, o arroto do liquidificar jorrando ninharias amareladas por todo o piso da cozinha, a descarga desenfreando água pela tubulação do vaso, vasando água pelo chuveiro, uma lesma caminhando no jardim. Ela de pé, no quarto.
Queria esmagar, por tudo, por si, a lerda lesma na lida da grama ao concreto da passarela.
Queria salgá-la, com o sal que derramava dentro de si, em silêncio. Queria salgá-la com a maré de sequer uma grama salgada que gastara com ele. Queria riscá-la feito rabisco de vai-e-vem desenfreado. Máquina descabeçada. Queria riscá-la até as unhas roerem no negro de tantos riscos, enfeitando de sangue o risco, o risco, o risco, o risco, o risco, o ris-co. E solfejar amarga, um “uh” aliviado.
Queria entender as tralhas, desvendar as travas que a emperravam sempre no meio do caminho. Aos trancos, queria tropeçar num pulo e alcançar outro lugar. Que não fosse ali, que apagasse a fumaça, antes mesmo do trago. Queria um cigarro. E a dor no meio da testa surgia estúpida e deselegante ante a imagem intacta. Acrescia no fosso do crânio. Enegrecia-a e ariscava a sede no céu da boca. Chorou sem lágrimas.
Chorou até que escorresse nas maçãs pálidas do rosto coragem suficiente para arremessar longe as caixas, desempilhando-as, abrindo a porta. Chorou até sobrar fiascos de memórias rasgadas dentro da caixa. Chorou desabotoando os retalhos sem cor junto aos cabides. Chorou até que nenhuma palavra sequer sobrasse sobre as linhas. Chorou até a cama atormentar-se com a noite. Chorou até o mormaço cair morto pelo chão do quarto. Chorou, muda, o sal.
Desligou a tevê, bateu um suco de maracujá. Banhou-se. E sentou na varanda com seu cigarro aceso.

[caption id="attachment_28693" align="aligncenter" width="620"] Foto: Divulgação[/caption]
Solar-verbo conjuga bem a reação dos olhos ao ver um trechinho qualquer de vídeo de Denise Stutz. A bailarina faz poesia no linóleo com a presença e ausência de movimento e, feito os batimentos, vai “tum-tum-teando” a plateia em “Finita”. Pode “googlar” sem receio até que a espera acabe e o sábado 21 anoiteça.
Às 20 horas, outra angústia começa, mais leve; vem da dança de Denise que perambulou a arquitetura cênica para laborar a perda, o envelhecimento e a falta do que um dia existiu. Já há dois anos concebido, o espetáculo chega parte de “Manga de Vento”, circuito encabeçado por Kleber Damaso sob os ombros do Sesc.
E é ali mesmo, no palco do Sesc Centro, que ela sola. Num videozinho, Denise põe palavras no movimento: “Foi feito para minha mãe, que morreu há um ano. Pensei em fazer uma homenagem a ela e a várias saudades e faltas e ausências que a gente tem. Nós só podemos entender a ausência pela presença, por isso estou sempre ali”.
A galera do El Club resolveu sair de casa e pular carnaval na rua! Ou melhor, ali pertinho do pub mesmo, no Cepal do Setor Sul. E, ó, mandou avisar que vai ter Ivete, marchinha, enfim, a micareta toda com boas doses também de indie e hip hop. Alimentação e segurança estão garantidas! Então, pode pôr sua fantasia que a festa “eXtação Primeira da Zueira” começa às 17 horas, na terça-feira de carnaval, e termina às 22 horas. A entrada é free. E se você quiser continuar a festa, anota aí que vai ser ali pertinho mesmo, no pub do El Club. É porque lá acontece a parte II da tal “eXtação Primeira da Zueira”. Mas, ó! Lá só entra maiores de 18 anos, então, se esquecer a identidade em casa, nem adianta reclamar.
No carnaval do Casulo Moda Coletiva vai ter axé, dendê e piscina liberada! O pessoal se juntou ao Retrô Food & Drinks e descolou uma line-up divertidíssima com carimbó e regionalismos de Bruno Caveira; marchinhas, samba e axé de Pri Loyola; afros e afoxés de Mateus Dutra; e o projeto Úh! Lalá’s com bases eletrônicas de Loyola e os vocais de Grace Carvalho. Se liga que é na terça-feira, 17, de meio-dia 12 às 22 horas. E o ingresso? Custa R$20.
Daí que o Nação Cerrado e o Coró de Pau resolveram esticar o carnaval lá no Loop Studio Pizza Pub. E, como se não bastasse, Igor Zargov ainda discoteca clássicos de samba, maracatu, samba-reggae para animar o sábado, 21. A “Ressacarnaval” do Loop começa às 22 horas.
Para quem não gosta de pular carnaval, não se esqueça que está acontecendo no Shopping Bougainville a mostra de cinema O Amor, a Morte e as Paixões. Dá para passar a semana na poltrona do cinema. Afinal, são mais de 90 filmes. Não dá pra ficar em casa.