Artigo de Opinião

Período eleitoral na Venezuela abre janela de oportunidade para líderes globais interromperem regime absolutista do chavista

Herbert Moraes
Desde 1997, dia 9 de julho é feriado no Estado de São Paulo. Naquele ano, Lei 9.497 foi aprovada pela Assembleia Legislativa e promulgada pelo então governador Mário Covas, que instituiu o 9 de Julho como Data Magna do Estado. A guerra civil que ganhou ares de revolução durou 90 dias e terminou com a rendição dos paulistas em 2 de outubro de 1932. Na capital paulista, duas avenidas que, até hoje, são uma das principais artérias do caótico trânsito da cidade, foram batizadas com as datas que marcam a Revolução Constitucionalista de São Paulo: a 9 de julho e a 23 de maio.
A primeira é considerada a data em que estourou a rebelião armada e quando voluntários começaram a se apresentar para a formação do exército que lutou pela causa paulista. Já a segunda data, lembra o dia considerado o estopim da fase armada do levante, quando 4 estudantes morreram após a invasão de tropas federais ao escritório do Partido Popular Paulista.
Os quatro universitários, da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, tornaram-se mártires do movimento, que adotou as iniciais dos seus nomes como a sigla da causa: MMDC. O que pouca gente se lembra, e que foi extirpado dos livros que contam a História do país, é que, há exatos cem anos, em 9 de julho de 1924, os paulistas também foram às armas e provocaram uma outra guerra que, assim como em 1932, terminou em uma derrota sangrenta, após o bombardeio da capital paulista por aviões da Força Aérea Brasileira, por ordem do governo federal, à época sob a tutela do mineiro Arthur Bernardes, considerado o pior e mais cruel Presidente do Brasil.
Em 05 de julho de 1922, eclodiu no Rio de Janeiro, a famosa "Heroica Revolta dos 18 do Forte", uma insurreição militar liderada por tenentes do Forte de Copacabana contra a fraude das urnas, a corrupção (que nessa época passava longe dos quartéis) e contra partidos considerados de centro, que na época estavam nas mãos da bancada ruralista que desde 1897 comandavam o Brasil através da República do café com leite, quando a cada quatro anos era eleito um Presidente que vinha de Minas Gerais ou de São Paulo. o Movimento dos 18 do Forte, marcou os tenentes como militares progressistas, que lutavam por um país menos arcaico, desigual e mais industrializado. Um movimento que acabaria por ser a faísca inicial de uma série de outras revoltas que, ao fim, destituiu a República Velha, em 1930, com a revolução que levou Getúlio Vargas ao poder, dando início ao Estado Novo.
Em 1924, a data que lembrava o levante dos 18 do Forte, 05 de julho, tornou-se tão simbólica que o dia foi instituído por grupos rebeldes, para marcar o início de várias insurreições militares que eclodiram pelo Brasil, em estados como no Sergipe, Bahia, Amazonas e São Paulo. No norte e nordeste, o Governo Federal retomou o controle do poder rapidamente mas, em São Paulo, os grupos rebeldes conseguiram tomar a capital que foi ocupada durante três semanas. O movimento era comandado por um gaúcho, General Isidoro Dias Lopes, um veterano da Revolução Federalista de 1893, no Rio Grande do Sul. O Major Miguel Costa, comandante do regimento da Cavalaria da Força Pública de São Paulo, também liderou a revolta. Pouco tempo depois, ele viria a ser o líder da Coluna Miguel Costa- Prestes, que no início não era Coluna Prestes como ficou conhecida.
O tenente Joaquim Távora também era um dos líderes da guerra paulista. Joaquim era irmão de Juarez Távora, um outro tenente ligado aos rebeldes, assim como o tenente Eduardo Gomes, que tinha sido um dos líderes dos !8 do Forte e havia retornado do exílio na Argentina para participar da Revolta paulista. Muitos anos depois, os dois concorreram duas vezes à Presidência do Brasil, mas foram derrotados nas urnas. Outro líder do levante de 1924, era o "feroz" tenente João Cabanas, um homem perigoso e assassino que liderava a Coluna da Morte e, por fim, o tenente Filinto Müller, um torturador, considerado, até hoje, o homem mais perigoso do país. O objetivo da Revolução de 1924 era derrubar o Presidente Arthur Bernardes, considerado o inimigo número 1 dos militares.
O Presidente havia fechado o Clube Militar, mandou prender o ex-Presidente do Brasil, Hermes da Fonseca que era irmão do Marechal Deodoro da Fonseca (o primeiro presidente do Brasil) e colocou no comando do Ministério da Defesa um civil, algo inaceitável pelos militares. No entanto, embora os militares tenham planejado a Revolução Paulista
detalhadamente, sua eclosão foi caótica. Começou com a tomada, em 5 de julho, por 2600 soldados rebelados, dos quartéis do Exército e da Força Pública no bairro da Luz em São Paulo, assim como a Estação da Luz e a Estação Sorocabana que viria a ser a Estação Júlio Prestes. Mas os rebeldes se esqueceram de cortar algo crucial numa Revolução: a comunicação. Nem as linhas telegráficas ou as telefônicas foram cortadas, e isso permitiu que o Presidente Arthur Bernardes fosse prontamente avisado. Assim, o chefe do executivo pôde reagir rapidamente, dando início a um contra-ataque.
Mas antes da chegada das tropas legalistas à São Paulo, as forças rebeldes abriram fogo contra o Palácio dos Campos Elíseos, sede do Governo do Estado, onde ficava o Presidente do Estado, como se chamava o Governador naquela época. |No dia 6 de Julho, o primeiro contingente das tropas federais chegou ao Estado vindo do Rio de Janeiro para lutar contra os rebeldes, mas acabaram desertando e se uniram aos revoltosos. Enquanto isso, no interior do Estado, fazendeiros e comerciantes armaram grupos paramilitares que ficaram conhecidos como "pelotões patriotas" para lutar contra os rebeldes.
No anoitecer do dia 8 de Julho, ficou claro que os militares não conseguiriam tomar toda cidade de São Paulo porque os blindados que eram utilizados não andavam porque eram pesados demais. O plano de tomar a cidade de Santos, sede do principal Porto do país, também não deu certo. Ao perceberem que a Revolução tinha falhado, os rebeldes resolveram mandar um mensageiro ao Palácio que eles tinham bombardeado 2 dias antes, anunciando a sua rendição em troca de anistia. Mas ao chegar ao Palácio Campos Elíseos, o mensageiro o encontrou vazio. O Presidente do Estado, Carlos Campos havia fugido de madrugada. Foi então que os rebeldes resolveram tomar o poder.
No dia 9 de Julho de 1924, Arthur Bernardes ordenou o bombardeio de São Paulo mesmo sabendo que a ação deixaria dezenas de civis mortos. Espertamente, o Presidente mandou atingir apenas os bairros operários como a Móoca, Braz, Belenzinho e o Ipiranga, livrando bairros nobres como o centro, Campos Elíseos e Higienópolis como alvo. A cidade entrou em colapso. A população, desesperada, saqueou depósitos e mercados, impedindo a entrada das tropas legalistas. Onze dias depois do início do levante, 15000 soldados leais ao Governo Federal cercavam a capital paulista. Os rebeldes, então, pediram armistício condicionando a assinatura de um acordo de paz à entrega do poder e à posse de um governo provisório no Brasil com a imediata convocação de uma Constituinte.
Ao ler a proposta, o Presidente Arthur Bernardes chamou os militares revoltosos de "recalcados" e não aceitou o acordo, até porque ele tinha sido eleito em um pleito democrático. Os militares rebeldes propuseram, então, depor as armas em troca de anistia. Arthur Bernardes não quis conversa e decretou a prisão de todos os revoltosos. Mas na madrugada do dia 27 de Julho, os rebeldes abandonaram as cidades paulistas de trem e seguiram para Foz do Iguaçu.
Dois meses depois, em Outubro de 1924, alguns tenentes gaúchos, inconformados com o desfecho da Revolução Liberal de 1923, fugiram em direção à Foz onde se juntaram aos rebeldes paulistas. Em abril de 1925, os dois grupos se juntaram para formar a Coluna Prestes. A guerra paulista 1924 acabou sendo esquecida pelos próprios paulistas que, por coincidência do destino, oito anos depois, iniciaram um outro conflito em 9 de julho de 1932. A Revolução de 1924 acabou virando uma ferida esquecida.

Em 18 de junho celebramos o Dia do Orgulho Autista, como forma de marcar a importância do respeito à neurodiversidade e ao incentivo a espaços de acolhimento na sociedade. Falar sobre a inclusão e construção de pontes de compreensão entre o mundo neurotípico e a pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
O autismo, espectro amplo e complexo, se manifesta de diferentes maneiras em cada indivíduo. E mesmo havendo muito ainda a ser conhecido, precisamos desmitificar preconceitos que o cercam, reconhecer que ele não define quem a pessoa é, mas sim como ela interage e percebe o mundo ao seu redor. Uma pessoa com autismo possui talentos, habilidades e desafios únicos, que merecem ser celebrados e apoiados.
A neurodiversidade é um conceito que celebra as diferentes maneiras como os cérebros humanos funcionam. Ao reconhecermos e valorizarmos essa diversidade, abrimos espaço para a inclusão e a aceitação, pois cada mente é única e valiosa, e o autismo representa apenas uma das muitas formas de neurodiversidade. São pessoas com a sua subjetividade singular, como todas as demais.
Para construirmos uma sociedade verdadeiramente inclusiva, precisamos garantir o acesso daqueles com autismo aos seus direitos. O que significa educação de qualidade, assegurando que todas as crianças tenham acesso a um ensino inclusivo e adaptado às suas necessidades individuais.
Também é preciso viabilizar oportunidades de emprego, incentivando a contratação de pessoas com autismo, reconhecendo suas habilidades e potencialidades. E ainda promover a participação plena dessas pessoas na vida social, criando ambientes acessíveis e acolhedores em todos os aspectos, incluindo cultura e lazer.
O apoio da família e da comunidade é outro ponto fundamental para o desenvolvimento e bem-estar das pessoas com autismo. Pais, amigos, educadores e profissionais de saúde devem estar munidos de conhecimento e ferramentas para auxiliar no processo de aprendizado, na superação de desafios e na construção de uma vida plena e significativa.
E os governos também tem papel crucial na criação de políticas públicas que garantam os direitos das pessoas com autismo. Isso inclui o acesso a diagnóstico precoce e preciso, por meio de equipes multidisciplinares bem preparadas. Também inclui o acompanhamento especializado para desenvolver suas habilidades e alcançar sua autonomia. Além de dar acesso a terapias adequadas, principalmente da rede pública de saúde.
O Dia do Orgulho Autista foi celebrado pela Secretaria de Desenvolvimento Social do Estado de Goiás (Seds) com informação e entretenimento, em um evento que reuniu servidores, representantes de entidades, pessoas autistas e familiares. A banda Os Lanternas, da qual sou um grande fã, formada por integrantes com autismo e outras deficiências, interpretou sucessos musicais nacionais e internacionais. A plateia interagiu durante toda a apresentação, aplaudindo e cantando junto, numa demonstração de que a inclusão traz ganhos para todos.
Em um segundo momento, o jornalista, pesquisador e autor do livro “O que é a neurodiversidade?”, falou sobre o tema, contribuindo com informações qualificadas para um melhor entendimento sobre o assunto. Mais do que um evento, foi uma vivência de inclusão e compreensão real da neurodiversidade, envolvendo todos os que estavam presentes.
O Governo de Goiás, por meio do Goiás Social, promove a inclusão de pessoas autistas em todos os dias do ano. A Seds é responsável pela emissão da Carteira do Autista, que já beneficiou mais de 3.500 goianos. O documento garante que a pessoa com TEA seja legalmente reconhecida com deficiência para todos os efeitos, com direito à assistência social e inclusão, oferecendo condições que garantam o exercício pleno da cidadania. Também tem apoiado diversas instituições filantrópicas em todo o Estado, com os programas Auxílio Nutricional e Auxílio Água e Energia. Além disso, por meio do Cofinanciamento Estadual, municípios recebem verbas para investimentos na área da assistência social, permitindo a criação de ambientes didáticos a todas as pessoas do espectro autista.
Precisamos colocar o a inclusão da pessoa autista na pauta diária. Só assim, poderemos construir um futuro mais promissor para as pessoas com autismo. Um futuro onde cada indivíduo, independente de suas diferenças, tenha a oportunidade de alcançar seu pleno potencial, viver uma vida com autonomia, ser respeitado e verdadeiramente acolhido em todos os espaços da sociedade.
Wellington Matos
Secretário de Estado de Desenvolvimento Social

Cidade de Goiânia, assim como muitas outras capitais brasileiras, enfrenta desafios significativos em termos de representatividade no legislativo


Como disse o filósofo Herbert Spencer “A liberdade de cada um termina onde começa a liberdade do outro", ou na definição de respeito ao próximo, “é um alicerce fundamental para a construção de uma sociedade harmoniosa”.

Herbert Moraes
Ainda há muito a se dizer enquanto o Rio Grande do Sul ainda nem começou a ser reconstruído. Mas para reconstruir é preciso também refletir. Afinal, tudo o que aconteceu nas últimas semanas num dos estados mais prósperos do país, tem uma origem que ainda gera consequências como as que os gaúchos estão enfrentando e o Brasil inteiro está assistindo. Qual é a natureza por trás dessa tragédia?
Pouca gente sabe ou simplesmente desconhece que geograficamente, de Laguna em Santa Catarina à Punta del leste no Uruguai estende-se a maior costa retilínea do planeta. Um lugar de beleza singular e indomável, onde os ventos, tão constantes, fizeram desta costa um deserto inóspito banhado por águas marrons que dão ao mar uma cor achocolatada, nada atraente. Foi ali que, em 1684, que o Rio Grande do Sul começou a ser ocupado por pelos portugueses quando finalmente conseguiram atravessar, com enorme dificuldade, o que chamaram de “Barra Diabólica”, uma estreita e perigosa ligação que dava e ainda dá acesso à Laguna dos Patos (chama-se Laguna e não lago porque tem conexão com o mar).
Foi por esta passagem que os portugueses iniciaram a conquista do que viria a ser a última fronteira da maior de suas colônias: o Brasil. Neste mesmo local, 150 anos antes, o português Martin Afonso de Souza, fundador da Capitania de São Vicente que ,em 1531, durante a primeira expedição de exploração da costa brasileira depois chegada de Pedro Álvares Cabral em 1500, ao chegar nesta mesma entrada “diabólica” não conseguiu avançar mas avistou um vasto estuário que foi batizado de Rio Grande de São Pedro. Anos mais tarde o nome deu origem ao que viria se tornar o Rio Grande do Sul.
A partir daí, esta região começa a ser ocupada de forma desenfreada, violenta e excessiva. Um lugar de natureza exuberante e solo tão rico, palco de guerras épicas que moldaram a História do Brasil.
Como descreveu Érico Veríssimo sobre as histórias que moldaram a terra de Bibiana, Ana Terra e Capitão Rodrigo, foram tantas lutas e conquistas que se deram pelos pampas que ainda permeiam a região entre o “Tempo e o Vento”.
Ainda hoje, o Rio Grande do Sul passa por um processo de devastação da sua rica natureza. Nas últimas quatro décadas, o estado cedeu 12% do seu território para a expansão agrícola. São mais de 35 mil quilômetros quadrados que se juntaram aos 34 % que já eram ocupados pela economia do agro. Portanto, metade do Rio Grande do Sul já foi cedido à exploração da terra que devastou sua natureza e que, ultimamente, se caracteriza por grandes plantações de soja e milho transgênicos que são exportados para a China alimentar seus porcos.
Quando produzia trigo, introduzido pelos italianos, e arroz, o Rio Grande do Sul era chamado de celeiro do Brasil. Hoje, os compos deram lugar à soja que é quase 100% exportada.
A fundação de Porto Alegre também está ligada a essa devastação. No século XVI, além do nordeste brasileiro, Portugal começou a produzir açúcar na Ilha da Madeira, que ganhou esse nome devido a sua densa e frondosa floresta, totalmente queimada pelos colonizadores em 70 anos ininterruptos, segundo eles, para fertilizar a terra,logo depois introduziram o plantio da cana de açúcar. Mas uma seca devastadora aliada à superpopulação levou os portugueses para outras ilhas, os Açores, onde não havia presença humana até à ocupação de Portugal. Lá, também, a terra foi devastada pela cultura da cana. Foi então que os colonizadores levaram os açorianos para a costa do Rio Grande do Sul a fim de ocupar os Sete Povos das Missões Guaranis que Portugal e Espanha tinham atacado e destruído. Quando saem de Florianópolis e chegam à terrível “Barra Diabólica” os índios guaranis reagem ao plano português de ocupação e iniciam a guerra Guaranitica mas perdem a disputa. Antes disso, os portugueses acabam largando os açorianos às margens de uma das praias do lago Guaíba onde ficam por longos vinte anos sem qualquer assistência do Estado. Começava a ocupação da chamada cidade baixa de Porto Alegre que logo depois passa a ser administrada pelos portugueses que, novamente, voltam à expulsar os açorianos fazendo com que se instalem numa região ainda mais inóspita onde começam a plantar trigo e criam os Moinhos de Vento que, muitos anos depois serviram, também, de alça de mira para regular os canhões do exército usados contra os rebeldes da Revolução Farroupilha, quando o Rio Grande tentou se separar do Brasil Imperial. Porto Alegre, que nunca foi separatista, permaneceu ao lado de Dom Pedro II. Logo após o conflito, onde antes ficavam os Moinhos de Vento foi estabelecido o que ainda é hoje um dos bairros mais tradicionais e incríveis da capital gaúcha que foi batizado com o mesmo nome.
Em seus primeiros anos de ocupação, muito antes da Revolução Farroupilha em 1835, algumas áreas da cidade baixa começaram a ser aterradas. Quase duzentos anos depois, é justamente esta área que foi alagada pela enchente que devastou a capital gaúcha e boa parte do Rio Grande do Sul em 2024: A enchente fez o Guaíba retomar a área que lhe foi tirada e transformada em aterros. A península original, que também dá forma à cidade,e que não foi alterada pelo homem, permanece intacta. Ali, o Guaíba mesmo com excesso d’água, manteve, equilibrada e seca, suas margens.
Os índios guaranis que um dia ocuparam o que hoje chamam de Porto Alegre sabiam e respeitavam os limites do Guaíba. Antes da chegada dos portugueses, as tabas ficavam nas encostas dos morros, na área que depois deu lugar aos moinhos e às margens do Rio Gravataí onde hoje está o bairro da Aldeia na planície de inundação que agora está embaixo d’água, mas há quinhentos anos esta mesma aldeia respeitava os limites da inundação que sempre afetou os níveis do Guaiba, mas nunca foi atingida. Não só os Guaranis mas todos os índios do Brasil sabiam e sempre respeitaram os limites de ocupação da natureza. Não há registros arqueológicos que as sociedades indígenas tenham sido afetadas por qualquer enchente como esta do Rio Grande já classificada como o maior desastre natural da história do Brasil superando até mesmo secas e queimadas que já afetaram outras regiões do país.
Como será a reconstrução do Rio Grande do Sul?
Há muitos planos mas ainda é cedo para entender e compreender rastro de destruição já que as águas ainda inundam muitas cidades, entre elas a capital. Há lugares que nem há mais o que reconstruir como Muçum que praticamente desapareceu do mapa. A enchente histórica do Rio Grande do Sul é o retrato da ocupação marcada pela degradação ambiental, pelo desequilíbrio doentio e equivocado que ainda trata a natureza como inimiga. O Rio Grande conta com geólogos e hidrólogos e outros acadêmicos e cientistas que há décadas estudam o rico sistema de águas do estado, entre eles o inigualável lago Guaíba,seus afluentes e a conexão com a Luguna dos Patos. Até o início do século XIX, numa “ língua de terra” beirando a Laguna, moravam os índios Minuanos e Xarrua que nunca foram afetados por enchentes. Os índios já não existem mais, agora, 200 anos depois, com a tragédia, sem nem mesmo escutarem técnicos e estudiosos, políticos locais erronemente já falam em mudar o regime de águas para o escoamento. Uma estupidez que deverá afetar ainda mais a Laguna onde a ocupação desordenada favoreceu o estado de calamidade que afeta a região.
A enchente do Guaíba é resultado dessa cegueira que afeta os governantes. Ao descartar as conclusões da ciência em nome do progresso, fingem não saber que apesar de vários estudos, o Guaíba nada mais é do que um Guaíba. Não há definição para essa obra da natureza que já foi chamada de estularia porque ali é mistura de um lago com um estuário e um rio. Foram os indígenas que batizaram o Guaíba com esse nome. Na língua tupi-guarani Guaíba é uma referência a cursos d’água, sejam eles córregos, riachos, rios, lagos ou espelhos d’água. A tradução que a imprensa acabou dando para o Guaíba é que é uma enseada a qual recebe todas as águas.
O Guaíba é o único do mundo que acabou classificado como lago que beira um rio, apesar de ser muito mais do que isso. Um lago formado por um sistema único da natureza que deságua na Lugana dos Patos e se conecta com a lagoa Mirim e a lagoa da Mangueira. Um complexo lagunar que ao fim se conecta com o Oceano Atlântico.
É a sociedade civil a verdadeira culpada pelas alterações da natureza que resultaram na tragédia que assola o Rio Grande do Sul. O povo que não conhece a sua história não tem como saber para onde vai, está fadado a repeti-la.
A reconstrução do Rio Grande do Sul tem que passar pela revisão de sua própria história para que as próximas gerações não tenham que sofrer os castigos da natureza provocados pela cegueira dos seus antepassados que não aprenderam a lição. É hora de ouvir a ciência com seriedade. A mudança climática é real e só o conhecimento colocado em prática poderá impedir o impacto que provoca tragédias como a que o Brasil assiste, atônito, e com medo de também ser arrastado pela mesma enchente que devastou o Rio Grande do Sul.
Herbert Moraes é jornalista

Para escoar a produção a mercados internacionais, a logística é a chave. É aí que entram os contratos de afretamento marítimo

Os boatos e mentiras chegaram a criar problemas para o atendimento, socorro e envio de mantimentos para os sinistrados.

*Demóstenes Torres
Em Portugal para uma palestra na segunda-feira, 13, em Coimbra e um lançamento de livro na terça-feira, 14, em Lisboa, vi na prática a repercussão internacional da tragédia no Rio Grande do Sul. Com interlocutores de diversos países, não há outro assunto nem outra pergunta: o que está acontecendo?
O tema dos eventos na área do direito é o bicentenário da 1ª Constituição brasileira, mas querem saber se a atual cuidou dos recursos naturais o suficiente para evitar tragédias como a destes dias.
Falta de lei nunca foi o problema. Era 1605, Portugal e Espanha estavam juntos na União Ibérica e o monarca Filipe 3º foi duríssimo com os infratores, principalmente no parágrafo 4º do Regimento do Pau-Brasil. Determinava pena de morte para quem desmatasse além do autorizado, multa, perda da terra, degredo durante 10 anos em Angola e açoite.
A casa real amava mais as árvores que as pessoas? Não. Nada de amor à floresta ou gente, mas ao dinheiro. Ainda não haviam sido exploradas as minas de ouro e o pau-brasil era a grande riqueza. Quanto maior a disponibilidade no Velho Mundo, mais barato, o que incide em outra lei irrevogável, a de oferta e procura.
A teoria da escassez, tão em voga nas redes sociais, tem “apenas” 420 anos de vigência. Mais de 2 séculos depois, era mantida a saga em defesa da mata: em 9 de abril de 1809, Dom João deu ordem para libertar os escravizados que informassem sobre o contrabando de pau-brasil.
Se tamanho rigor tivesse permanecido nos 2 séculos seguintes, tantos lugares gaúchos paradisíacos estariam convivendo com a dor, o prejuízo, o atraso?
Passou-se esse tempo todo e o Brasil continua abastecendo Ásia e Europa com commodities. A diferença reside na providência. Quando senador, apresentei proposta de emenda à Constituição para incluir o Cerrado e a Caatinga como patrimônio nacional. Integrantes da bancada gaúcha tentaram o mesmo com o Pampa. Em vão.
O Ministério do Meio Ambiente e seu Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis preferem a ampliação de danos. Em vez de liberarem a exploração da Margem Equatorial, uma superfaixa de petróleo que vai do Amapá ao Rio Grande do Norte, os militantes optam por esperar o óleo sair do mercado.
O governador Eduardo Leite estima em R$ 19 bilhões a reconstrução do Rio Grande do Sul. O presidente Lula e seus ministros apresentam soluções. Falta uma, Marina Silva, a do Meio Ambiente.
A Petrobras calcula que existam 14 bilhões de barris no fundo do oceano, a distância prudente do litoral, sem perigo em caso de acidente. A R$ 430 o barril, superariam R$ 6 trilhões. Basta uma fatia mínima para sanar as consequências imediatas no clima, em vez de os burocratas se renderem ao caos da própria incompetência.
O evidente aquecimento global expõe a revolta da natureza em fenômenos recentes como seca na Amazônia, esta e outras cheias no Sul, incêndios do Canadá para baixo e extinções de espécies.
Sobrou para o Brasil o papel de guardião do que resta de sustentável no planeta. As potências gastam mais dólares pesquisando vida fora da Terra do que maneiras de manter a nossa em paz e bem por aqui mesmo. Por isso, o governador tem razão quanto a um Plano Marshall, a salvação no pós-2ª Guerra. Internamente, os Estados dividiram-se de acordo com suas necessidades e com sua taxa de preservação. A Europa não conservou suas árvores, então pague para quem cuida do pulmão verde do mundo.
As imagens do Rio Grande do Sul inundado são chocantes. As demais unidades da federação fizeram um círculo de ajuda porque somos todos beneficiados pelos gaúchos. No Centro-Oeste, tornaram Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul uma sucessão infindável de supersafras. O litoral baiano foi descoberto pelos portugueses, mas o gigantismo econômico do Oeste é fruto dos migrantes do RS. O mesmo relativo à região Norte do Brasil. Os gaúchos desbravaram de verdade este continente tupiniquim. O mínimo que podemos ser com eles é gratos e solidários.
As avaliações catastróficas das últimas décadas não assustaram quem de direito, mas é razoável supor que as mortes de pessoas, animais e cidades finalmente mexam com os responsáveis por agir. Não é possível olhar para a Grande Porto Alegre e supor que no próximo ano uma nova tragédia seja recebida à custa de um ou outro lamento. As medidas têm de ser efetivas, estruturantes e duradouras.
“Ah, vamos primeiro refazer as casas, em seguida reflorestar as margens de rios e depois cuidar de nascentes”. Balela. É vital fazer tudo ao mesmo tempo e agora. Até o banco dos Brics, presidido por Dilma Rousseff, vai acudir com R$ 5,7 bilhões. O governo federal suspendeu as dívidas do Estado por 3 anos. Tudo isso era para ontem. Não deu. Passou para amanhã. Temos de cobrar para que se efetive. E já.
O Rio Grande do Sul fez muito pelo Brasil. É a hora de retribuir. Que essa terra tão maravilhosa seja assunto no exterior por suas belezas e suas riquezas, não por sustentar os efeitos do que fazemos com o planeta. É isso o que está acontecendo.

Por Pettras Felício
Que vivemos um momento terrível de polarização política e de ideologias extremadas já sabemos e isso vem de alguns anos. A todo momento os discursos tensionam ainda mais a já esticada corda do debate sobre governo, políticas públicas, pautas abordadas pela cultura, aspectos do comportamento dos indivíduos e das famílias, modelos de segurança pública e outros.
Tudo é tratado com histrionismo de ambos os lados em que a divisão de ideias se entrincheirou. Em todas as falas, as postagens, os textos, vê-se a canalha tática de recortar e descontextualizar a fala do outro, de focar em apenas um aspecto de uma questão complexa e, a partir desse recorte, produzir uma peça panfletária.
Tem sido assim, sabemos. Mas choca e indigna que não se deponha as armas do sofisma, as técnicas de se manipular informações, os artefatos de explosão viral assentados em distorções ou inverdades mesmo diante de uma tragédia ímpar, de uma calamidade com nenhum ou poucos precedentes.
Não respeitamos nem a desgraça.
Ao escritor Otto Lara Rezende é atribuída uma frase contundente: O mineiro só é solidário no câncer.
Ele refuta a paternidade da frase.
Pois é preciso dizer que o brasileiro médio metido em discussão política hoje não é solidário sequer no câncer.
Com o Rio Grande do Sul submerso, afogado naquela que talvez seja a maior catástrofe da sua história, temos preferido caçar culpados (coisa que talvez alguns sejam), fazer proselitismo, fazer legendas demagógicas para fotos que deveriam provocar somente a piedade e a ajuda, a comoção e a doação.
Alguns contabilizam quantos minutos ou em quantas cidades uma autoridade esteve. Outros misturam entidades federativas e questionam cachê de artista que deveria ser usado em forma de auxílio. Outros ainda, deixam de lado a questão financeira e fixam o debate na questão moral do show. Enquanto isso o Guaíba sobe, Porto Alegre afunda, o RS inteiro naufraga.
Na hora em que a humanidade grita por união ante a desgraça, o auxílio diante do caos, os abutres da baixa política se engalfinham para sair com a razão.
Esse pessoal não é solidário nem no câncer, no dilúvio, no Apocalipse. Não importa a vida. Importante é ter razão.
Pettras Felício é professor de literatura do Colégio Arena, e poeta. Autor do livro "Todo mundo é ninguém é todo mundo" (Kelps, 2024).
*Este artigo é de opinião pessoal do autor e não representa, necessariamente, a opinião do Jornal Opção.

Já não é fácil convencer a moçada a acordar às 5 da manhã, arrumar a marmita, correr até o transporte público e passar pelo ponto no minuto adequado. Se a Carta Magna veta, aí não tem mais jeito.

Tratamento policial para diferentes classes sociais não é novidade, mas internet se escandaliza com a desigualdade

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Articulista destaca importância desse programa de capacitação gratuita voltada para profissionais de engenharia civil