O Tribunal de Justiça do estado de Goiás (TJ-GO) reformou uma decisão sobre caso de violência doméstica em Pontalina. A reforma veio após apelação da Defensoria Pública do Estado (DPE) buscando reforçar o entendimento inicial de combater a culpabilização da mulher vítima. 

Os relatos da vítima apontam constrangimento das forças oficiais no decorrer da apuração inicial da denúncia. “Quando busquei a Justiça para que medidas protetivas fossem tomadas, não esperava que me sentiria tão mal. No dia da audiência de instrução, foi péssimo, porque justamente onde eu esperava ser acolhida, onde esperava imparcialidade na busca por direitos, fui recebida com descaso, sendo novamente revitimizada”.

Segundo relatos da vítima, a busca por socorro foi tardia por falta de coragem no ato de denunciar, destacando o preconceito das pessoas sobre a situação e também o sentimento de vergonha. No meu caso, o juízo praticamente disse que era uma vergonha buscar a Justiça”, relatou à Comunicação da DPE.

De acordo com a decisão de primeira instância, a vítima teria culpa pelas agressões sofridas já que ela reatou o relacionamento com o agressor. O juiz em questão havia sugerido ajuda psicológica ao casal, ignorando os fatores estruturais que levam, muitas das vezes, à reincidência da violência em casos de relacionamentos abusivos. Vale destacar também que o casal possui um filho de cinco anos, o qual já presenciou uma das agressões sofridas pela mãe.  

Na decisão de 1° instância, dizia: “Durante todo o relacionamento, seis anos, brigavam e voltavam novamente. Precisam mais de um acompanhamento psicológico do que do auxílio do Poder Judiciário, já que nenhuma das partes envolvidas possuem discernimento para colocar fim na relação tóxica”. 

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Tatiana Bronzato, defensora pública que coordena o Núcleo Especializado de Defesa e Promoção dos Direitos da Mulher (Nudem) da DPE-GO, explica que “é sabido que o chamado ciclo da violência é uma constante nos relacionamentos abusivos. Após a agressão, o autor promete mudanças e, na fase de ‘lua de mel’, tenta reconciliar-se, o que frequentemente leva a reatamentos sem que o risco de novas violências seja eliminado”.

Ao solicitar a revisão da decisão de primeira instância, Tatiana destacou que o entendimento inicial reforçava estereótipos de gênero e desigualdades estruturais que levam à perpetuação da violência contra a mulher. Além disso, a defensora colocou a urgência da aplicação do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, previsto na Resolução nº 492 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no intuito de dar fim à revitimização das mulheres vítimas de violência em processos na Justiça. 

Após apelo da DPE-GO, a Justiça entendeu que a responsabilidade da violência é única e exclusiva do agressor, reformando a decisão de 1ª instância. “Hoje, me sinto aliviada em saber que a Justiça reconheceu o caso e que, na verdade, não era a minha culpa”, relata a vítima.