“Nunca vi maternidade ter que fechar as portas por falta de alimento”, lamenta diretor
13 março 2017 às 10h04
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Sem atendimento ambulatorial, Maurício Viggiano relata cenário desolador na Maternidade Dona Íris
A partir de segunda-feira (13/3), o Hospital da Mulher e Maternidade Dona Íris (HMDI), de Goiânia, não realiza mais consultas, exames e atendimento ao público em geral.
A unidade, que é referência em todo o Brasil na área, não tem recursos para continuar operando, já que a gestão Iris Rezende (PMDB) deixou de repassar o valor previsto em contrato à Fundação de Apoio ao Hospital das Clínicas da UFG (Fundahc), gestora do hospital.
Em coletiva de imprensa, o diretor do HMDI, médico Maurício Viggiano, afirmou que, em toda sua vida profissional, jamais viu uma maternidade ser fechada por falta de alimentos: “A vida todo passei por dificuldades, um dia faltava funcionário, outro dia remédio, mas fechar as portas dessa maneira nunca vi”, lamentou.
Segundo ele, mais de 250 consultas deixarão de ser feitas apenas nesta semana pela ingerência da Secretaria Municipal de Saúde. Pré-natal, ginecologia, casos de violência doméstica e oncologia são algumas das áreas de atendimento prejudicadas. “Todas as prefeituras estão em crise, eu sei, mas como essas pessoas que precisam vão fazer?”, questionou.
E não só o ambulatório está prejudicado: a emergência não conseguirá continuar sem algum aporte de recursos. “Na sexta-feira fizemos 12 partos, no sábado, 10, ontem, 8. Cada dia vai diminuindo mais, não temos comida para dar para as pacientes”, completou.
Atualmente, informa o diretor, são realizados 3 mil partos por mês pelo SUS em Goiânia. A Maternidade Dona Íris, como previsto no planejamento feito em 2012, quando foi inaugurada pelo ex-prefeito Paulo Garcia (PT), chegou a realizar 600. “Essas crianças continuaram nascendo, agora, para onde elas vão eu não sei, pois os partos não deixaram de acontecer”, explicou.
Crise
O Jornal Opção detalhou a crise financeira que assola o Hospital da Mulher e Maternidade Dona Íris (HMDI) na semana passada. Em entrevista, o diretor da Fundação de Apoio ao Hospital das Clínicas da UFG (Fundahc), José Antônio de Morais, explicou que a dívida ultrapassa os R$ 22 milhões — até fevereiro, pois os custos de março ainda não foram faturados.
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A maior parte (cerca de R$ 13 milhões) diz respeito a passivo trabalhista, acordos para demissão de funcionários, que se arrasta desde a gestão passada, do ex-prefeito Paulo Garcia (PT). Os outros R$ 9 milhões é que são o verdadeiro problema: fornecedores atrasados e dívida com a própria fundação.
Na última sexta (10), a prefeitura repassou R$ 1,8 milhão para a Maternidade Dona Íris e R$ 200 mil para a Nascer Cidadão. Contudo, o valor só deu para pagar a folha de funcionários do mês passado e quitar os benefícios atrasados. “Não sobrou quase nada para pagar fornecedores. Justamente por isso resolvemos manter a decisão de paralisação, não há como continuar”, explicou.
Morais havia pedido o aporte de pelo menos R$ 4,7 milhões para que os serviços de atendimento não fossem suspensos.
Em nota-resposta, a secretária de Saúde, Fátima Mrué, alegou que a pasta “não tem condições” para manter a unidade e solicitou a redução dos atendimentos ofertados para conseguir arcar com o convênio. De acordo com a SMS, o valor aumentou em mais de 110% desde 2012.
Tal alegação é confirmada pelo diretor da Fundahc, mas explica que isso estava previsto no contrato. “Há cinco anos, a maternidade era nova, estava pronta para abrir, mas para tanto precisaria do convênio. Então, foi estabelecido um planejamento anual para que todos os serviços estivessem sendo colocados em práticas pouco a pouco. Os aditivos estavam previstos”, asseverou.
O diretor lembra que, se apenas os serviços iniciais tivesse sido mantidos, o HMDI atenderia com 30% de sua capacidade. “Ela [a secretária Fátima Mrué] quer adequar para metade dos curtos hoje da maternidade. Entendemos, se trata de uma decisão política, que é de competência da gestão municipal, mas precisamos de recursos para nos adequar: fazer as demissões, diminuir os serviços”, relatou.
Questionado se isso não prejudicaria o atendimento das mulheres, José Antônio de Morais diz que esta é a pergunta que todos estão fazendo: “Trata-se de uma escolha política. A atual gestão está mudando tudo que a gestão passada fez. O ex-secretário [Fernando Machado] que manteve e ampliou o convênio por entender que se trata de um hospital de referência”, arrematou.