Em menos de uma semana, cinco mulheres foram vítimas de feminicídio em Goiânia e na Região Metropolitana. Metade das vítimas tinha medidas protetivas contra os agressores — dois tiraram as próprias vidas após os assassinatos. 

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O cenário é um reflexo da escalada de violência contra a mulher em nacional. Segundo o Monitor de Feminicídos do Brasil, do Laboratório de Estudos de Feminicídios (Lesfem), o Brasil registra neste ano 1.178 feminicídios,. Segundo o Monitor,os estados com as maiores taxas de crescimento percentual são Sergipe (171,4%), Tocantins com (150%) e Amapá (100%). Os dados da Secretaria de Segurança Pública de Goiás (SSP) mostram que 20 mulheres foram vítimas de feminicídio entre janeiro e junho deste ano. Em todo o ano passado, a secretaria do estado contabilizou 56 casos. 

“A gente costuma falar que a violência doméstica é democrática, pode ser qualquer mulher.  Passa também por todos os tipos de agressores. Temos aquele agressor que faz as agressões pelo uso de álcool, pelo uso de substâncias tóxicas e aqueles que são pessoas que não têm estudo. A gente tem policiais militares,  juízes. Não é um perfil que a gente possa traçar”, diz a comandante do Batalhão Maria da Penha da Polícia Militar de Goiás (PMGO), Major Dyrlene Seixas. 

Responsável por acompanhar as mulheres que possuem medidas protetivas — uma forma judicial de evitar novas agressões de companheiros e ex-companheiros às vítimas — o batalhão chefiado pela major viu crescer 60,8% o número de mulheres atendidas, em 2024. A solicitação pode ser feita tanto com a PM, quanto com a Polícia Civil (PC). 

Ao todo, foram deferidas ou renovadas pelo Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO), 19.677 medidas protetivas entre 01 de janeiro e 24 de novembro deste ano; em média, uma a cada 30 minutos. No mesmo período do ano passado, o número chegou a 12.231 registros.

“Temos um sistema próprio da Polícia Militar para fazer a gestão dessas medidas protetivas. Todas as mulheres com medidas protetivas são cadastradas. A gente tem todo o controle se essa medida está ativa ou se já foi advogada. Fazemos um acompanhamento virtual ou presencial, que é ir até a casa da mulher”, conta.

O batalhão faz visitas periódicas para averiguar se a medida está sendo cumprida à risca pelo agressor, que deve manter distância e não se comunicar com a agredida, que também pode solicitar o Botão Anti-Pânico. Em alguns casos, o investigado é obrigado a deixar a residência e usar tornozeleira eletrônica, além de frequentar oficinas com temática voltada ao crime praticado. 

“Fazemos, em média, de 4,5 mil a 5 mil visitas por mês. A Polícia Militar fez, até agora, mais de 190 mil acompanhamentos em todo o estado (em 2024). A gente deve fechar o ano com mais de 200 mil acompanhamentos”. 

Medidas protetivas 

As medidas protetivas, de acordo com o juiz vice-coordenador da Coordenadoria da Mulher do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO), Vitor Umbelino, não possuem data de validade. A decisão judicial só é revogada a pedido da própria vítima ou quando o órgão entende que não é mais necessário.

Além de maior proteção, às mulheres assistidas também podem solicitar ajuda financeira, caso sejam dependentes dos agressores. Neste caso, são disponibilizadas cestas básicas para garantir o sustento da residência da vítima, segundo Vitor. 

“As mulheres que são acometidas de feminicídio, 97% delas não tinham medidas protetivas de urgência. Apesar de não significar a proteção absoluta, o Estado diminui sensivelmente os riscos da mulher sofrer novos atos de violência ou crimes de feminicídio, até porque, se o agressor descumprir a medida protetiva de urgência, ele é priso”, afirma.

O juiz diz que a fim de manter o agressor distante, o Estado conta com uma central de monitoração eletrônica, que funciona 24 horas por dia. Eles são responsáveis por acionar a polícia, principalmente o Batalhão Maria da Penha, em caso de descumprimento – identificado por meio do Botão Anti-Pânico, da tornozeleira eletrônica e acionamento da vítima. 

Vale ressaltar que a medida, assim como outras ferramentas de segurança, podem ser solicitadas quantas vezes forem necessárias, mesmo a vítima optando por uma desistência anterior. O processo leva em torno de 48 horas. 

“No mês passado entrou em vigor a lei que aumenta a pena do feminicídio de 20 a 40 anos, a maior pena do Código Penal Brasileiro. Antes, era de 12 a 30 anos”, contou.

Ciclo da violência

A violência contra a mulher possui um ciclo com três etapas, de acordo com a comandante do Batalhão Maria da Penha:

  • Construção das tensões: ocorrem o controle do comportamento, o isolamento da mulher, ofensas verbais e humilhações;
  • Explosão da violência: há agressão física, violência patrimonial, violência moral, violência sexual ou violência psicológica;
  • Lua de mel: o homem pede perdão, tenta convencer a parceira com promessas de mudança, há reconciliação e reconstrução do vínculo. Nesta etapa, a violência cessa, normalmente, após a prisão do agressor ou a morte da vítima.

“Há a necessidade das mulheres de romper esse ciclo da violência logo nas primeiras violências. O feminicídio nunca acontece na primeira vez, não existe isso. Sempre é uma crescente”, concluiu.