O plenário da Câmara dos Deputados aprovou na última quinta-feira, 28, o Projeto de Lei 3944/24, que altera a Política Nacional de Resíduos Sólidos ao proibir a importação de resíduos sólidos, como papel, plástico, vidro e metal. Com exceções para materiais usados na transformação de minerais críticos e estratégicos, a proposta segue agora para o Senado. O objetivo central é fortalecer a reciclagem nacional, fomentar a economia circular e reduzir impactos ambientais, priorizando o uso da infraestrutura brasileira para gerenciar os próprios resíduos.

A proposta é de autoria do deputado goiano Célio Silveira, do MDB, que concedeu entrevista ao repórter Paulo Henrique Magdalena, do Jornal Opção do Entorno (confira a entrevista completa no final desta matéria). O projeto que modifica a lei de 2010 que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos foi aprovado em votação simbólica e plenário esvaziado. Entre as alterações está a permissão para importar resíduos utilizados na transformação de minerais estratégicos e críticos, essenciais para setores industriais de alta tecnologia.

Além disso, a importação de resíduos sólidos derivados de produtos nacionais previamente exportados será autorizada para fins de logística reversa e reciclagem integral. Essa medida atende a pedidos específicos, como o do setor de baterias, e busca alinhar a legislação com demandas industriais sem prejudicar a sustentabilidade.

Célio Silveira: “Precisamos pensar na liberdade econômica de forma alinhada aos interesses do país, protegendo nosso meio ambiente e os catadores de lixo, que enfrentam uma concorrência desleal, devido à importação desses resíduos” | Foto: Reprodução / Câmara dos Deputados

Debate político e desdobramentos

O relator do projeto, deputado Elmar Nascimento (União-BA), incorporou emendas e redigiu um substitutivo que garantiu maior abrangência ao texto. Segundo ele, as exceções são necessárias para evitar entraves ao desenvolvimento industrial sustentável e garantir competitividade internacional.

Durante a sessão, o deputado José Nelto (União-GO), vice-líder do governo, afirmou que o projeto apresenta avanços importantes, mas reconheceu que o texto poderá ser alterado no Senado. Caso isso ocorra, a proposta retornará à Câmara para nova análise.

As possíveis alterações no Senado refletem os interesses diversos que orbitam a questão. A regulamentação dos termos de importação ficará a cargo dos Ministérios da Indústria e do Meio Ambiente, que precisarão alinhar prioridades para garantir a efetividade da nova política.

Justiça ambiental e economia circular

Para Elmar Nascimento, a proposta vai além de proibir a importação: ela fomenta a reciclagem interna e incentiva uma economia de baixo carbono. “Não podemos restringir a entrada de resíduos de minerais críticos e materiais estratégicos que são necessários para o desenvolvimento industrial baseado numa cadeia de reciclagem, com baixa emissão de carbono e com geração de empregos”, afirmou.

A adoção da economia circular, segundo o relator, reduz a pressão sobre os recursos naturais e fortalece a sustentabilidade. A medida também reflete um esforço para corrigir práticas comerciais desiguais, nas quais países menos desenvolvidos assumem a responsabilidade por resíduos gerados por nações industrializadas.

Com a aprovação na Câmara, o projeto segue para o Senado, onde será discutido e poderá sofrer ajustes. Se aprovado sem alterações, será encaminhado para sanção presidencial. Entretanto, caso o Senado faça modificações, o texto retornará à Câmara para votação final.

Entrevista com Célio Silveira

Paulo Henrique Magdalena – Dados oficiais apontam que o Brasil importou 56 milhões de toneladas de resíduos sólidos na última década. Como o senhor avalia o impacto dessa prática na economia e no meio ambiente do país, e de que forma a proibição pode reverter esse cenário?

Célio Silveira – Eu acredito que essa medida será de grande valia para o país. Primeiro, porque essa enorme quantidade de resíduos sólidos que chegam aqui vem sem rastreamento adequado. Isso facilita a entrada de produtos tóxicos, o que intensifica o desequilíbrio ambiental, que já é grave em nosso país. Além de ajudar a proteger o meio ambiente, essa proibição também terá um impacto positivo na economia, especialmente para os catadores de lixo, que enfrentam forte concorrência com os resíduos importados. Essa medida também fortalecerá as cooperativas de reciclagem.

Esse projeto tem um efeito econômico importante e traz inúmeras vantagens. Foi aprovado com unanimidade no requerimento de urgência, com apoio do governo e de todos os partidos, exceto o Partido Novo, que sempre se opõe. Acredito que será um projeto extremamente útil, melhorando significativamente o meio ambiente, as condições de trabalho dos catadores e o funcionamento das cooperativas, beneficiando todos os brasileiros.

Paulo Henrique Magdalena – O projeto proíbe a importação de resíduos sólidos, mas abre exceções para minerais críticos e autopeças destinadas à reciclagem integral. Como o senhor avalia o equilíbrio entre preservar o meio ambiente e atender à demanda estratégica de setores que dependem dessas importações?

Célio Silveira – No projeto original, essas exceções não estavam previstas. No entanto, o relator, o deputado Elmar Nascimento (UB), que é um grande relator, acatou essas alterações. Certamente há dados que demonstram que algumas grandes empresas brasileiras necessitam desses produtos importados. Agora, haverá um rastreamento mais rigoroso e um controle aprimorado, o que trará melhorias para o país. O que não faz sentido é que, sendo um país que gera milhões de toneladas de lixo e recicla apenas 4% disso, ainda importemos milhões de toneladas de resíduos sólidos de outros países. Isso inclui produtos tóxicos que causam graves desequilíbrios ambientais aqui. Esse foi um dos principais motivos que nos levaram a apresentar este projeto, que foi bem recebido pela Câmara e também pelo Senado. Tenho confiança de que será aprovado ainda este ano, contribuindo para melhorar as condições ambientais do Brasil.

Paulo Henrique Magdalena – Uma parte da indústria resistiu ao projeto e o Partido Novo criticou a proposta alegando restrição à liberdade de mercado. Como o senhor responde a essas críticas, especialmente em relação à liberdade econômica e ao impacto na competitividade de algumas empresas?

Célio Silveira – Precisamos pensar na liberdade econômica de forma alinhada aos interesses do país, protegendo nosso meio ambiente e os catadores de lixo, que enfrentam uma concorrência desleal, devido à importação desses resíduos. A liberdade de mercado deve sempre priorizar o que é melhor para o Brasil. Quanto ao Partido Novo, eu estou na Câmara há mais de dez anos e nunca o vi ser a favor de nada. Eles sempre se opõem a tudo e, ironicamente, nunca trazem algo “novo”, que contribua para o desenvolvimento do país ou para a justiça social.

Paulo Henrique Magdalena – O senhor acredita que o projeto de lei, ao proibir a importação de resíduos sólidos, será suficiente para impulsionar de forma significativa a reciclagem no Brasil, ou será necessário adotar outras medidas complementares?

Célio Silveira – Acredito que este projeto já é um grande começo, considerando especialmente a aprovação quase unânime das duas casas legislativas. No entanto, é apenas o início. Nada justifica que um país que gera tanto lixo e enfrenta dificuldades para gerenciá-lo continue importando resíduos. Hoje, apenas cerca de 30% dos prefeitos brasileiros conseguem lidar adequadamente com o lixo; os demais têm dificuldades com a destinação correta. Este projeto nos ajuda a tratar a questão de maneira mais respeitosa e estratégica.

Paulo Henrique Magdalena – O deputado José Nelto (UB) indicou que o texto pode ser alterado no Senado para atender demandas de ministérios, como o de Meio Ambiente e o da Indústria. Quais ajustes ou alterações o senhor considera aceitáveis sem comprometer os objetivos centrais da proposta?

Célio Silveira – Vamos esperar. Não acredito que haverá muitos ajustes, pois o projeto está bem elaborado e o relatório muito bem-feito. Se houver alterações que contribuam para o aperfeiçoamento do texto, não haverá dificuldade da minha parte em dialogar e buscar um entendimento. Tenho certeza de que o relator, deputado Elmar Nascimento, também estará disposto a discutir mudanças que melhorem a proposta.

Paulo Henrique Magdalena – Como a aprovação desse projeto pode beneficiar os municípios do Entorno, considerando que há grandes cooperativas de reciclagem na região?

Célio Silveira – Esse projeto beneficiará muito essas cooperativas, que agregam um grande número de trabalhadores. Atualmente, elas enfrentam forte concorrência dos resíduos importados, o que reduz suas margens de negociação. Além disso, os catadores de lixo também sofrem muitas vezes, precisando baixar demais os preços por falta de opções. Com essa medida, haverá melhores condições econômicas para as cooperativas e para os catadores, além de um impacto positivo para o meio ambiente, que precisa urgentemente de cuidados para evitar consequências graves.

Leia também:

Economistas analisam consequências do corte de R$ 70 bilhões do governo federal

Senado e Câmara terão R$ 50,5 bilhões em emendas orçamentárias durante 2025