O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) estaria articulando um plano ambicioso para as eleições de 2026: conquistar a maioria no Congresso Nacional em 2027 e formar um “poder paralelo” capaz de confrontar o Supremo Tribunal Federal (STF).

Ao Jornal Opção, a cientista política, Ludmila Rosa, afirmou que a “bancada bolsonarista já é um poder paralelo que vocaliza as pretensões de um homem só”, capaz de tensionar o ambiente institucional, mas ainda limitado pela Constituição.

Para ela, as movimentações dessa bancada não são apenas ideológicas, mas “um trabalho massivo em torno de uma agenda que gira em torno de Jair Bolsonaro como liderança incontestável”.

“Aparentemente, todo o campo bolsonarista que hoje detém mandatos já se constitui como um poder paralelo no Brasil, na medida em que as pautas que eles defendem são muito mais afinadas às prioridades e à agenda pública do Jair Bolsonaro especificamente”, afirmou Ludmila.

“Para mim, já é um quarto poder, um poder que vocaliza as pretensões de toda a natureza de um homem só.” A cientista política destacou que, mesmo com a força política que possuem, os parlamentares bolsonaristas estão submetidos aos limites constitucionais.

“O Poder Legislativo também se submete a esse arcabouço normativo. Ainda que haja a tentativa de crescer esse grupo paralelo, nós temos anteparos suficientes para qualquer coisa que venha a exorbitar a capacidade legislativa desses sujeitos.”

Segundo Ludmila, o debate sobre anistia aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 é emblemático do funcionamento desse “poder paralelo”. Para ela, a essência da proposta de anistia é “a tentativa atabalhoada de uma absolvição a priori de um sujeito que sequer foi condenado ainda”.

E acrescenta: “Hoje, os embates no Congresso não são meramente ideológicos, mas embates para obstaculizar o governo constituído e fazer remissão a um mandatário de lá de trás, como se ele fosse mais habilidoso para governar.”

Questionada sobre o poder de influência dos presidentes da Câmara e do Senado, Ludmila reconheceu que são posições com “poder de agenda extraordinário”, mas alertou que pedidos de impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal, como defendido pelo ex-presidente Bolsonaro, não podem prosperar sem fundamentos jurídicos claros.

“Seguir o impeachment de um ministro do Supremo simplesmente porque se discorda de suas decisões não é suficiente. É preciso objeto concreto, dolo, conduta que justifique uma punição tão gravosa”, explicou. “Se fosse diferente, abriria-se um precedente perigosíssimo para a República.”

Sobre o fenômeno do bolsonarismo como projeto familiar, Ludmila foi contundente ao comparar a atuação dos Bolsonaro à tradição patrimonialista brasileira: “Você vê uma família em que todos têm atividades vinculadas a um processo eleitoral que é tributário de uma figura icônica. O poder gira em torno de personalismo excessivo, culto à liderança, demagogia e populismo”, criticou.

Para ela, o modelo é “extremamente constrangedor” e um “traço melancólico” da democracia brasileira. A cientista política lembrou o clássico “Os Donos do Poder”, de Raymundo Faoro, para ilustrar a confusão entre público e privado no país.

“Ainda estamos presos a essa lógica patrimonialista, e Bolsonaro conseguiu irradiar isso para além das capitanias hereditárias locais, elegendo filhos em diferentes estados. É um exercício de poder que comprova o quanto precisamos amadurecer o debate sobre a eleição de representantes”, avaliou.

Apesar das críticas, Ludmila acredita que a manutenção da estabilidade institucional e o compromisso democrático do Executivo e do Judiciário são fundamentais para conter abusos: “Se mantivermos a segurança institucional e a credibilidade das instituições, esse poder paralelo fará muito barulho, mas terá pouca efetividade.”

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