A possibilidade de rompimento do grupo da senadora Kátia Abreu (pP) com o governador Wanderlei Barbosa (Republicanos) se mantém como o assunto mais comentado no meio político do Tocantins. Não é sem razão.

O afastamento da senadora pressupõe a aproximação da deputada federal Professora Dorinha (UB), até então pré-candidata ao Senado na chapa do ex-prefeito de Araguaína, Ronaldo Dimas (PL), principal adversário do governista. Como se pode observar, o descolamento de Kátia do governo para a oposição altera a composição das duas principais chapas que concorrem ao Palácio Araguaia.

Dimas perde a pré-candidata dos sonhos ao Senado. A deputada federal Professora Dorinha, presidente regional do União Brasil, lidera as pesquisas de intenção de voto para o Senado, rivalizando com a senadora Kátia Abreu. A verdade é que Dimas perde o que nunca teve. Dorinha não fez nenhum compromisso de compor com o ex-prefeito. O pré-candidato pressupunha que a professora não tinha outra opção, já que na chapa do governador a vaga do Senado já estava comprometida.

A imagem real do processo era essa: Wanderlei refém do clã Abreu e Dimas contando como certo que Dorinha acabaria em seus braços. O quadro atual mostra outra imagem, bem diferente, daí a perplexidade do meio político. Um quadro de que se pode depreender várias interpretações.

Wanderlei atrai Dorinha para sua chapa e revela que não estava refém do clã Abreu, como se imaginava. Essa possibilidade desmistifica a ideia de líder fraco que se deixa levar pelo rolo compressor dos acontecimentos políticos, em vez de assumir a condição de protagonista na construção desses fatos. Dimas perde o nome dos sonhos ao Senado simplesmente porque nunca a teve – mas poderia ter tido.

Dorinha fica mais perto de conquistar a cadeira do Senado e Kátia Abreu mais distante. Wanderlei demonstra firmeza na tomada de decisão. Dimas entregou a outros a função de liderar o processo e o fracasso dessa operação deve ser creditado ao senador Eduardo Gomes (PL).

Wanderlei, se confirmar Dorinha em sua chapa, estará mais forte para a corrida ao Palácio Araguaia do que com a senadora Kátia Abreu. Dimas, sem a Dorinha que nunca a teve, estará mais fraco. Como assim? Como mais fraco, se ele perdeu algo que ainda não tinha? Por isso mesmo. Perdeu para o seu principal adversário alguém que esteve associado ao seu projeto. Não havia nada formal, mas havia a expectativa que agora foi frustrada. Mesmo se conseguisse atrair Kátia Abreu, não compensaria a perda.

Dimas, por enquanto, não terá outro nome à altura para preencher a vaga que nunca foi da professora. Não foi competente o suficiente para atrair o União Brasil e promover a indicação de Professora Dorinha para sua chapa. Apenas aguardava a deputada se decidir: não a ajudou na decisão nem confiou na decisão imposta. Será mais um insucesso da tentativa de ingerência do Palácio do Planalto na política do Tocantins, via líder do governo, senador Eduardo Gomes (PL).

Entre Wanderlei e Dimas, porém, não há como definir quem é mais ou menos apoiador de Bolsonaro. Usar a imposição do Palácio do Planalto como argumento para negociação política é confessar a inexistência de projeto ou coisa que o valha.

Um nome de peso que começa a ser aventado para a vaga da Dorinha, por aliados do Dimas, é o do ex-governador Mauro Carlesse (Agir), que ainda não tem candidato a governador. Aí surge um grande problema de identidade da pré-candidatura de Dimas: o ex-prefeito promoveu uma forte campanha para mostrar que o governador Wanderlei Barbosa era continuidade do carlessismo, que virou sinônimo de corrupção e má gestão. Wanderlei contestou a campanha e até a Justiça Eleitoral considerou procedente.

Com Carlesse na chapa, Dimas pode até ganhar eleitoralmente, mas perde politicamente. Estará junto com alguém a quem chamou símbolo de corrupção e de má gestão. Um erro estratégico que terá desfecho imprevisível. Carlesse ainda tem a desvantagem de ser um candidato que pode ganhar, mas não levar. A renúncia evitou o impeachment, mas o tornou inelegível.

Carlesse, para o Senado, corre o risco de repetir Marcelo Miranda, que, após a cassação em 2009, insistiu em ser candidato ao Senado em 2010, para mostrar que ainda tinha força política. Foi eleito senador, mas não tomou posse. A vaga foi ocupada pelo terceiro colocado na disputa, Vicentinho Alves. Agora, para as próximas eleições, Miranda, que brigava novamente pelo direito de disputar o Senado, já rebaixou seu projeto eleitoral. Achou mais prudente disputar uma cadeira da Assembleia Legislativa. No fim, pode ser também o caminho de Carlesse e, quem sabe, também de Kátia Abreu.

Quem ganha, quem perde

A síntese desta análise vem em forma de pergunta. Quem perde e quem ganha com essa mudança que está sacudindo a pré-campanha? A priori, a senadora Kátia Abreu (pP) é a mais prejudicada com o rompimento com o governador e Professora Dorinha (UB) é quem mais se fortalece. Fora da chapa governista, Kátia Abreu perde por completo a possibilidade de conquistar o terceiro mandato consecutivo para o Senado. Mesmo na chapa do governador e com toda a força da máquina, sua eleição já vinha sendo ameaçada. Fora da chapa governista, indiscutivelmente a mais competitiva, o sonho do terceiro mandato fica comprometido.

Para se ter uma ideia da importância desse fato político, o afastamento impacta diretamente pelo menos dois pré-candidatos ao governo – Wanderlei Barbosa (Republicanos) e Osires Damaso (PSC) – e indiretamente os outros pré-candidatos – Ronaldo Dimas (PL) e Paulo Mourão (PT) –, ainda que se diga que não houve rompimento porque ainda não havia uma chapa consolidada. 

A senadora Kátia Abreu é uma máquina de fazer campanha. Possui estrutura invejável e uma disposição enorme para mobilizar pessoas. Controla quatro partidos – pP, PSD, Avante e PRTB – conta com apoio de 33 prefeitos e um grande número de vereadores em todo o Estado. Desde que venceu a primeira eleição, em 1992, para a presidência do Sindicado Rural de Gurupi, não parou de crescer até alcançar o comando do Ministério da Agricultura, no governo Dilma Rousseff (PT), em 2017. Foi deputada federal, senadora e presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA). No Estado, a senadora comanda ainda a Federação da Agricultura do Estado do Tocantins (Faet) e o Sebrae. Foi eleita duas vezes senadora, tendo ocupado lugar de destaque no plenário do Senado, e elegeu o filho, Irajá Abreu, o senador mais jovem do Brasil.

Kátia é hoje uma líder que se tornou indispensável para o Tocantins. Por seu conhecimento e rede de relacionamento político, é peça fundamental na governabilidade de qualquer governo. Kátia é uma grande vencedora. Mas precisa saber a hora de parar, ou de mudar de cargo. Kátia enfrenta enforme rejeição no meio político tocantinense. E não é de hoje. A sua maneira de fazer política – discurso ríspido, confrontos constantes e modelo profissional e pragmático de atuação – é extremamente eficiente em curto prazo, mas chega à exaustão, por falta de empatia.

Talvez seja a hora da senadora deixar de ser motivo de crise para ajudar a resolver crise. Aceitando disputar qualquer outro cargo na chapa governista, Kátia Abreu, juntamente com Dorinha e Wanderlei, selam uma campanha vitoriosa ainda no começo da corrida. Separados, deixam a disputa mais equilibrada e aberta.

Prefeitos aliados defendem que a senadora deveria ser candidata a deputada estadual. Entraria para a história como a deputada mais votada do Parlamento estadual e poderia ser eleita presidente da Assembleia Legislativa e ajudar na governabilidade, debatendo projetos e políticas públicas que os governos têm deixado de realizar por falta de cobrança dos líderes políticos e falta de mobilização popular. Assim, Kátia continuaria sendo muito útil à política do Tocantins, sem correr risco de forçar uma derrota previsível por muitos, só não por seus marqueteiros.

Do ponto de vista eleitoral, Kátia divide opiniões. Tanto soma para eleger alguém, como para derrotar.