Assessor do Ministério da Saúde, Neilton Araújo é um médico e líder político tocantinense que percebe, no momento atual, estar o Brasil resgatando a participação popular na elaboração de políticas públicas – processo que, segundo ele, sofreu um desmantelamento sistemático nos últimos tempos. “Em cinco, seis anos, as políticas públicas todas foram muito desmontadas, com retrocessos em arranjos institucionais, diminuição de financiamento, negação da ciência, um monte de coisas terríveis”, comenta o médico, observando que o campo da saúde foi o que mais resistiu ao desmonte institucional.

Neilton Araújo aponta que o descaso com a saúde causou profundos prejuízos. “No governo passado, perdemos mais de R$ 2 bilhões em vacinas que eles demoraram a comprar. Mesmo depois de comprar, não fizeram o trabalho de mobilização que sempre houve”, lamenta o assessor, que aponta a reorganização do Sistema Único de Saúde (SUS), no que diz respeito à recuperação dos índices de vacinação em massa que levaram o Brasil a ser referência mundial, como um dos grandes desafios da Saúde.

O assessor fez questão de destacar o comprometimento dos líderes tocantinenses que participaram de forma efetiva das conferências municipais de saúde. “Aqui no Tocantins isso foi um processo extremamente vitorioso. Fomos um dos Estados que conseguiram fazer 100% das conferências municipais. Agora, a etapa estadual vai tirar 56 delegados para ir à etapa nacional”, ressalta o médico, que esteve no Estado especialmente para acompanhar a realização da Conferência Estadual de Saúde.

Neilton Araújo de Oliveira é médico especialista em Saúde Pública e em Políticas e Estratégias Nacionais. Também tem mestrado em Saúde Coletiva e Doutor em Ciências (Ensino de Biociências e Saúde) e é professor da Universidade Federal do Tocantins (UFT), onde coordenou a criação do curso de Medicina, com uma proposta inovadora: criou e coordenou o Núcleo de Estudos da Saúde no Tocantins (Nest-UFT) e colaborou na criação de outros cursos de saúde da UFT e na articulação intersetorial Educação, Saúde e Desenvolvimento Regional. Araújo também tem passagem pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa); foi diretor substituto de Programa e secretário-executivo do Ministério da Saúde. É militante ativo do SUS e da promoção da cidadania. Em Palmas, foi secretário de Saúde, além de candidato a governador do Tocantins pelo PT em 1994.

Nesta entrevista exclusiva ao Jornal Opção, Neilton Araújo fala da importância da retomada da Conferência da Saúde, que deve inspirar conferências de outros segmentos e reanimar os movimentos sociais. Neilton fala ainda dos motivos que o levaram a abandonar a militância partidária e ideológica e focar na luta pela democracia por meio na militância social na área da saúde. A entrevista foi concedida durante um intervalo da Conferência Estadual da Saúde, realizada nos dias 31 de maio e 1º de junho no Parque Arnaud Rodrigues, em Palmas.

Nos últimos cinco, seis anos, as políticas públicas foram todas desmontadas 

Como o sr. avalia a volta das Conferências da Saúde, depois de um período de desmobilização da participação popular nas políticas públicas?

A saúde é uma área muito estratégica. Historicamente sempre teve uma participação maior da sociedade. A 8ª Conferência, em 1986, foi num processo de reconstrução democrática. Era a oitava, mas foi a primeira que contou com a participação da sociedade. Ou seja, a população ocupou os espaços. Hoje, nós estamos vivendo um contexto semelhante. Nos últimos cinco, seis anos, as políticas públicas todas foram muito desmontadas, com retrocessos em arranjos institucionais, diminuição de financiamento, negação da ciência, um monte de coisas terríveis. E a saúde foi o campo, considero, que mais resistiu. Por exemplo, fizemos a 16ª Conferência da Saúde ainda em 2019, no começo desse período complicado. O Conselho Nacional de Saúde (CNS) foi o único a não ser desmantelado. Os demais conselhos – de Direitos Humanos, Pessoa Idosa, Consea [Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional], tudo foi desmantelado. Nós resistimos, defendendo sempre a participação da sociedade. Ouvir a população é direito, temos história, temos desafios.

A [17ª] Conferência Nacional da Saúde foi convocada ainda em 2020. Conferência é um processo. Muita gente acha que conferência é só aquele momento de reunião. Ali é um momento de síntese, mas há todo um processo: mobilização, debate… A saúde, as políticas públicas e o próprio governo, em minha avaliação, comunicam mal. Nós precisamos trabalhar melhor essa questão. Precisamos ver as coisas de maneira mais direta, mais inteligível, compreensível, de modo que a população se sinta parte do processo. Aqui no Tocantins tivemos um processo extremamente vitorioso. Fomos um dos Estados que conseguiram fazer 100% das conferências municipais e, agora, a etapa estadual. Vamos tirar 56 delegados para ir para a etapa nacional. No Conselho Nacional de Saúde, estou na mesa diretora há sete anos e sou da comissão organizadora da conferência, como fui da 9ª, da 11ª, da 15ª e da 16ª.

Não tem saúde se não tiver moradia decente, transporte adequado, esse é um debate político

Como está sendo a retomada do processo de ouvir a sociedade na definição das políticas públicas de saúde?

Combinamos de fazer o que estamos chamando de conferências livres. Cada segmento ou movimento ou instituição faz uma conferência de saúde livre, no tema que quiser, identificado com o temário da conferência nacional. Desde que tenha participantes de nove Estados brasileiros e de pelo menos três regiões, essa conferência livre pode tirar delegados diretamente para a etapa nacional, sem passar pela via ascendente. Então, esse processo capilarizou demais a participação da sociedade. Além de ser um campo de resistência, de formação, a saúde é o campo mais plural, onde se trabalha mais a articulação intersetorial, interdisciplinar, interpolítica,  porque saúde é multideterminada pela moradia, transporte, condições de vida, saneamento básico, cultura. Não tenho como fazer saúde se não tiver moradia decente, transporte adequado, então esse é um debate político, não político-ideológico, mas político organizador da sociedade, promotor do desenvolvimento. Isso nós estamos travando com a sociedade, com a academia, com o Judiciário, com as mídias.

Foto: Luciana Pires

Quanto mais funcionar bem a atenção básica, menos vai precisar da urgência e emergência

Fiz agora um seminário em Palmas com jornalistas de várias instituições para discutir comunicação, saúde e participação social. Porque a comunicação também não entende essa dimensão ampliada da saúde. Nós temos de ganhar esses profissionais da comunicação para nos ajudar nessa discussão mais popularizada. Aí os problemas são muitos. Situação simples, solução simples; situação complexa, solução complexa. Então nós temos de ter serenidade, temos de ter diálogo, e esta é uma coisa boa: o governo que se instalou agora em janeiro reabriu as portas do diálogo. Está ouvindo governadores, universidades, movimentos de trabalhadores. Está ouvindo a população, os indígenas, rediscutindo políticas públicas. Eu falo muito que o problema não é governo A ou B, partido A ou B, a questão é projeto. Qual é o projeto? Esse projeto está a favor de quem? Esse projeto está voltado para beneficiar quem? Em uma conferência, vamos discutir o que queremos, como faremos, com quem vamos estar juntos para construir isso e para quem. Essa é uma novidade que está ocorrendo este ano, com uma dinamização muito grande. E essa Conferência Nacional de Saúde vai servir inclusive de estímulo para conferências setoriais. Você vai ver o tanto de conferências que vão ocorrer agora a partir do sucesso da 17ª Conferência Nacional de Saúde.

Como o sr. avalia essa reorganização do sistema de saúde com a participação popular pós-pandemia, período que evidenciou a importância do SUS?

O SUS, desde que nasceu até hoje, continua ameaçado. A Covid-19 deu uma visibilidade enorme para o sistema. Ah, se não fosse o SUS! Mas isso não diminuiu os ataques ao SUS nem seus desafios. Então, a pandemia ao mesmo tempo impactou a vida de toda a população mundial, de todos os países, mas ela também está nos ensinando alguma coisa. Precisamos retomar a participação da sociedade não como um favor, não como uma ajuda, mas como um arranjo institucional para as políticas públicas. Vivemos num país em que 70% dos municípios têm menos de 20 mil habitantes; 51% dos municípios brasileiros têm menos de 10 mil habitantes. Aqui no Tocantins é mais ainda: 82% dos municípios têm menos de 10 mil e 54% tem menos de 5 mil habitantes. Não preciso pensar cada município desses com um grande centro revolucionário de alta complexidade em saúde, mas eu preciso organizar o sistema. A atenção básica e de média complexidade, uma cirurgia de urgência, um tratamento de alta complexidade, isso daí são 20% só das necessidades da saúde da população. O restante, 70%, 80% das necessidades, é atenção básica. Então, como eu arranjo isso numa parceria com o governo federal e o governo do Estado? Cada um tem uma competência, tem uma autonomia, mas as responsabilidades são solidárias. Não pode ser divergente, competidora, concorrente, tem de ser sinérgica. O Estado e o município não precisam disputar o mesmo espaço. Um vai apoiar o outro. Quanto mais funcionar bem na atenção básica, menos vai precisar da urgência e da emergência. Quanto mais o Estado apoiar os municípios, menos vai sobrecarregar a alta complexidade. Então, isso ainda estamos por construir. Muitos secretários municipais ou estaduais às vezes não fazem as coisas, não porque não queiram, mas porque não têm conhecimento disso. E a população também não, porque a população só olha o dedo machucado, o dente doendo, não vê o conjunto.

Nós vivemos, na pandemia, uma exacerbação do individualismo, do eu, do vale tudo, do ódio, no negacionismo da verdade, da ética, da ciência, tivemos graves problemas na vacinação. Então, nós temos não só de recompor os serviços organizacionais da saúde: temos de retomar todo um processo de comunicação, de educação, de mobilização, de acordo com as características de cada território. O nosso arranjo aqui no Tocantins vai ser diferente em relação ao de São Paulo, ao de Goiás, assim por diante. Os governos, tanto o federal quanto o estadual e os municipais, bem como os conselhos de saúde, precisam compreender melhor seu papel. Conselheiro não é só para cobrar coisas, não; é também para fazer o caminho de volta, a devolutiva. A conferência vai deliberar prioridades e desafios que vão ser encaminhados para o nível nacional, mas muitos são do âmbito estadual e municipal. Como é que eu devolvo isso para o território? Tenho de levar agora o resultado desse debate para o plano estadual de saúde, para o PPA [plano plurianual], tenho de discutir com a Assembleia Legislativa, tenho de discutir com as câmaras de vereadores, tenho de informar isso para a imprensa, tenho de debater isso nas universidades que estão formando profissionais de saúde, para eles entenderem. 

O Tocantins é o Estado que tem mais vaga de Medicina por habitante no Brasil

A propósito da formação do profissional de medicina, como o sr. avalia essa particularidade do Tocantins em relação à grande concentração de faculdades médicas?

O Tocantins é o Estado que tem mais vaga de Medicina por habitante no Brasil. Eu até não questiono muito essa questão de números. Questiono a formação que nós estamos fazendo para estes médicos. Para onde eles estão indo depois de formados? Porque, se eles ficam aqui, se vão para os municípios onde não têm profissionais, vão para o sertão, vão para os territórios indígenas, tudo bem. Mas, se eles saem daqui para voltar especialistas, engrossar a fileira dos especialistas que não têm alcance para a população e que não estão no serviço público, então não tem nenhuma política associada. É preciso fazer essa articulação e integração, ter coragem de definir prioridades, discutir isso francamente com a população, com a comunidade, com os profissionais de saúde. Essa é uma compreensão que os conselhos de saúde precisam ter, mas principalmente os gestores, porque eles têm mais poder de interlocução, mais poder de mobilização e precisam fazer essa discussão intersetorial, interinstitucionalmente, para a gente poder avançar.

Foto: Fred Borges

As campanhas de vacinação de massa eram um orgulho. O governo federal abdicou disso e alimentou o medo

A queda na cobertura vacinal do Brasil é o típico caso da necessidade de uma comunicação estratégica para devolver aos brasileiros a confiança na imunização?

É um exemplo estratégico. O PNI [Plano Nacional de Imunizações] está fazendo 50 anos. Em 1973, nós criamos o PNI. Até 2020 eu dizia que no PNI ninguém tinha a coragem de mexer, por ser uma política de Estado e não de governo. Partido nenhum, governo nenhum, tinha coragem de mexer. Pois mexeram. E mexeram por meio da negação da ciência, das fake news, ou seja, comunicação sendo usada como não deveria. A comunicação por meio das redes sociais, com as fake news, foi usada para botar medo nas pessoas usando a vacinação, que é um patrimônio da ciência brasileira. Nós temos o maior programa de vacinação do mundo. Estamos agora reconstruindo esse patrimônio. No governo passado, perdemos mais de R$ 2 bilhões em vacinas, que eles demoraram a comprar e, depois de comprar, não fizeram o trabalho de mobilização que sempre fazíamos. As campanhas de vacinação de massa eram um orgulho, uma propriedade do SUS brasileiro. O governo federal abdicou disso e, pior, colocou receio, alimentou o medo que as pessoas já têm. Estamos recuperando e tendo de recompor as altas coberturas de vacinação, porque têm muitas doenças que nós só conseguimos erradicar no Brasil com vacinação. O sarampo já voltou. O vírus da paralisia infantil [poliomielite] está reaparecendo em vários países novamente. Então nós temos de rapidamente elevar as taxas de coberturas. É possível fazer isso só com o governo? Só com o Ministério da Saúde, só com as secretarias de Saúde? Não. A gente faz isso com todo mundo, principalmente com a comunicação correta. Uma comunicação bem focada, estrategicamente colocada. Então, temos de fazer esse trabalho de novo, intersetorial. Esse trabalho de mobilização local, regional e federal. Tudo junto num processo de propriedade coletiva. Não podemos dar essa autoria dessas conquistas para governo A, B ou C. Isso é propriedade coletiva. Propriedade dos governos, propriedades dos trabalhadores da saúde, é propriedade da comunidade. Nós temos de construir essa identidade. Mais uma vez eu considero que a comunicação é um instrumento poderoso e principalmente estratégico e prioritário para a gente utilizar neste momento agora.

Foram cem dias do novo governo recompondo programas que já eram consolidados e que foram destroçados. Mas agora está na hora de fazer coisas novas. O Mais Médicos voltou, o Zé Gotinha voltou, vamos fazer o lançamento da nova Farmácia Popular com maior abrangência. Recuperamos o vínculo com a saúde indígena. O Brasil apresentou agora, na Assembleia Mundial da Saúde, semana passada, uma proposta. A Organização Mundial de Saúde (OMS) [organismo das Nações Unidas] aprovou uma política de saúde indígena mundial. Então, temos muitas novidades para fazer, neste momento de efervescência das conferências. É preciso também que cada pessoa que está na conferência, numa etapa dessas, leve de volta essas informações para sua comunidade.

Não posso discutir hospital de urgência se não discutir o programa todo

Como o sr. avalia a crise na saúde de Palmas, que o sr. conhece bem, com o anúncio da construção do Hospital de Urgência e Emergência, aliás, uma promessa antiga?

O SUS tem seus princípios fundamentais da integralidade, da universalidade, da equidade e do controle social. E tem as diretrizes organizacionais – regionalização, municipalização e hierarquização de funções – num processo crescente. Isso tudo está nas leis, precisamos alterar isso na prática. A gente avançou muito na municipalização, mas a gente avançou pouco na regionalização. E num País tão diverso, tão grande como o nosso, descentralizar não pode ser A ou B, tem de ser A e B. Eu tenho de fazer o acesso ao menor município ocorrer, mas eu tenho de fazer também a oferta de serviço em termos de escala. Eu não posso colocar um hospital de alta complexidade em município de 2 mil, 3 mil habitantes. Mas eu preciso pactuar isso com os gestores estaduais, municipais e governo federal. Preciso negociar isso com a sociedade como um todo e informar isso corretamente. O que eu vejo é que nós ainda estamos vendo predominar uma concorrência entre Estado e município. Tem de haver uma sinergia. O Ministério da Saúde também fez e ainda faz, em alguns momentos, concorrência. Até porque às vezes o governo estadual é de um partido, o federal é de outro, o município de outro. Nós temos de ir por cima dessas questões. O trabalho é sinérgico. Definir o que é competência de cada esfera. O Ministério da Saúde não tem de fazer ação local. O governo estadual, quanto mais apoiar a atenção básica, menor fica a carga dele na assistência de maior complexidade. Agora, serviços de saúde, representam somente 10,8% dos fatores que impactam a saúde de uma comunidade; 19% são fatores ambientais, 20% é a genética da pessoa e 51% é estilo de vida. Eu tenho de discutir com a comunidade, de novo, estilo de vida, relacionamento fraterno, exercícios físicos, redução de sal e açúcar. Isso se faz no dia a dia, na atenção básica, na universidade, nas escolas. É preciso ter uma articulação forte entre saúde e educação porque a gente vai informar as crianças, os jovens, as famílias. Então eu não posso discutir hospital de urgência em qualquer lugar do mundo, muito menos no Brasil, se não discutir o programa todo, o arranjo todo, o desenho todo. Eu tenho de discutir quem vai cuidar disso e daquilo e entendendo que, mesmo eu cuidando de um pedaço, aquele outro pedaço é tão importante quanto, que somos parceiros nessa construção. Isso eu acho que está faltando entre os diferentes gestores. Falta entre os políticos, falta entre os governantes, seja o prefeito, seja o governador, seja o governo federal. O Tocantins, comparado a outros Estados, é ainda pequeno. Temos um território grande, com potencialidade na agricultura, uma pecuária muito forte, mas somos uma população de 1,5 milhão de habitantes, não estamos nos últimos lugares de pobreza, temos uma economia, temos uma rede de estradas muito boa, temos duas bacias hidrográficas poderosas, o Araguaia e o Tocantins, temos sol, temos um monte de coisas que poderiam nos deixar mais bem colocados. E a saúde é um campo de maior articulação, de maior integração. É preciso integrar políticas com assistência, com desenvolvimento e com comunicação constante para todo mundo.

O Hospital de Urgência é necessário? É. Mas para fazer o quê? Junto com esse hospital, com quem vou organizar para não ter lá uma unha encravada que posso resolver na atenção básica? Uma diarreia que eu possa resolver sem remédio nenhum, só com orientação? Muitas vezes as pessoas fazem uma inversão de valores: 80% dos problemas de saúde de uma comunidade se resolvem no âmbito da atenção primária de saúde, com uma educação em saúde, com informações, com orientação, com limpeza de terrenos, com saneamento básico, com orientação alimentar, com escolas. Então, está faltando esse tipo de exercício em muitos dirigentes – e até não é por má vontade, é porque eles desconhecem isso. Então nós também estamos aproveitando as conferências para abrir este debate.

Estamos propondo aqui para o Tocantins, depois da etapa nacional, termos um grande seminário, promovido pelos governos, pelas universidades, principalmente as públicas, pela Superintendência do Ministério da Saúde, pelo Judiciário, pelo Ministério Público, pelos meios de comunicação. O tema: a saúde indígena no Tocantins. Vamos chamar todo mundo. Vamos chamar os distritos sanitários indígenas, os representantes das comunidades indígenas, não vamos fazer as coisas que achamos a partir de nossa cabeça. Vamos perguntar a eles o que estão sentindo. Vamos ver se o que está de acordo com nossa prioridade e trabalhar com eles as necessidades que às vezes têm, mas não estão sentindo ainda e que são tão importantes quanto as que eles estão manifestando. Então, essa discussão precisa ter boa vontade. Precisa haver abertura. Precisa eu falar, juntar todo mundo, e aí o papel das universidades é muito importante porque são instituições plurais. O Conselho Estadual de Saúde tem um papel importantíssimo, porque agrega usuários, trabalhadores, prestadores de serviços e gestores de saúde. A gente tem de fazer isso nos próximos meses.

Foto: Luciana Pires

A luta da democracia, contra a desigualdade social é de todos e tem que ser permanente

O sr. é um militante ideológico histórico, um quadro respeitadíssimo no meio progressista. O que o fez desistir da militância partidária?

Eu fui, entre outros companheiros, um dos principais articuladores e construtores do PT no Tocantins. Eu era da direção nacional e saí do PT no auge do partido. Lula estava reeleito para o segundo mandato e eu saí porque a luta da saúde era muito mais ampla, e a luta partidária estava me tolhendo. Fiquei fora. A questão partidária é um instrumento, mas você tem outros instrumentos. Depois, achei que era uma boa oportunidade reconstruir o PSB aqui no Estado. E fizemos isso. O PSB tinha três prefeituras, na próxima eleição fomos para 16 prefeituras, 4 das maiores cidades. Com o quê? Com a visão da participação, principalmente da juventude. Agora, têm três anos que eu de novo vi que a atuação partidária limitava minha atuação sanitária plural. Então, priorizei minha estrada de sempre, a militância da saúde púbica, a saúde como espaço de debate, como espaço de articulação, de mobilização e de revolução. A saúde é a área mais plural, mais multideterminada, mais difícil de trabalhar, mas não tem nenhuma que produza tanto resultado do ponto de vista da cidadania, do ponto de vista da organização da comunidade, como a saúde. Eu acho que nós estamos precisando de mais e mais, principalmente de jovens. Quando eu comecei nesta luta, há 48 anos, ela já estava na estrada, muitos companheiros a iniciaram. Hoje, nós estamos precisando atrair mais jovens para continuar essa luta, que é permanente. A luta da democracia, a luta contra a desigualdade social e pela inclusão social. Isso é uma luta de todos e tem de ser permanente. A área da saúde está num momento extremamente visível, mas precisa se fortalecer mais, com melhor assistência, com melhor organização, com mais prevenção, com mais e melhor comunicação com a sociedade.