Gerente da Fieto afirma que o governo estadual precisará investir em um ambiente favorável à indústria, por exemplo, aliviando a carga tributária de alguns produtos

Gilson Cavalcante

José Roberto - Foto - Camylla CostaCom 1,4 milhão de habitantes, o que representa 0,7% da população brasileira, o Tocantins é o quarto Estado menos populoso do Brasil. A baixa representatividade também é refletida na participação do Estado no Produto Interno Bruto (PIB) nacional, segundo o Perfil Industrial divulgado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). O Tocantins representa 0,4% do PIB nacional, o que equivale a R$ 18 bilhões. De acordo com José Roberto Fernandes, gerente da Unidade de Defesa dos Interesses da Indústria da Federação das Indústrias do Estado do Tocantins (Fieto), o setor industrial no Tocantins tem 19,6% (R$ 3,5 bilhões) de participação no PIB do Estado e acumulou perda de 3,3 pontos porcentuais entre 2001 e 2011. O número aproxima-se à média nacional que foi de 3,5 pontos no mesmo período. Na entrevista exclusiva ao Jornal Opção, José Roberto destaca que a área de alimentos concentra a maior participação no PIB da indústria do Tocantins com 55,9%. Em seguida está o setor de fabricação de coques, derivados de petróleo e biocombustíveis, 11,4% e a fabricação de minerais e não metálicos 11,2%. Juntos representam 78,5%. Na sua análise, as informações publicadas no estudo que mostra a distribuição industrial no País, colocam o Tocantins em situação de alerta porque evidencia um cenário de desindustrialização.

Entra governo, sai governo, há muito vem se falando em industrialização do Tocantins. No entanto, o setor ainda carece de um planejamento ousado. Como o sr. avalia o desempenho desse segmento na economia tocantinense?
O setor industrial no Tocantins tem 19,6% (R$ 3,5 bilhões) de participação no PIB do Estado e acumulou perda de 3,3 pontos porcentuais entre 2001 e 2011. O número aproxima-se à média nacional que foi de 3,5 pontos no mesmo período. A área de alimentos concentra a maior participação no PIB da indústria do Tocantins com 55,9%. Em seguida está o setor de fabricação de coques, derivados de petróleo e biocombustíveis, 11,4% e a fabricação de minerais e não metálicos 11,2%. Juntos representam 78,5%. Os estudos que mostra a distribuição industrial no país, coloca o Tocantins em situação de alerta porque evidencia um cenário de desindustrialização. É fundamental que se reverta esse quadro. No mundo todo é a indústria que, tradicionalmente, aporta os empregos de qualidade à economia, traz divisas através do aumento na produção de manufaturados e suscita a aproximação entre empresas e universidades. Tudo isso concorre para o aumento do bem-estar e da qualidade de vida da sociedade. Em suma, se você olhar com lupa, a participação da indústria no PIB tocantinense, 16% na verdade são advindos das atividades dos serviços de utilidade pública, ou seja, geração e distribuição de energia elétrica, captação, tratamento e distribuição de água. São serviços públicos e concessão. Então, não é a indústria propriamente dita. Não é a indústria que interessa ao Estado. A indústria que interessa é a indústria de transformação, que pudesse transformar os insumos produzidos no ramo do agronegócio.

Em que pese o Tocantins ser um forte produtor.
Isso. Nós produzimos carne, grãos e começa a aparecer agora frutas tropicais. Todos esses produtos vão embora do Estado sem nenhuma verticalização, sem nenhuma agregação de valor. A indústria poderia fazer isso, mas somente 4% da indústria são de transformação. A indústria de transformação nos interessa porque agrega os empregos de qualidade, é ela que aproxima a universidade da indústria, porque precisa de tecnologia e a universidade dispõe dessa ferramenta. É ela que promove divisas ao Estado, através de bens manufaturados. É a indústria de transformação é que gera divisas, principalmente a agroindústria.

A Fieto defende um Plano de Desenvolvimento da Indústria. O que seria esse plano?
O que tem que ser feito é livrar a indústria dos principais óbices que ela apresenta. Ou seja, criar um ambiente favorável à indústria. A carga tributária é muito pesada. Por isso, é o governo aliviar onde for possível a carga tributária sobre alguns produtos que deveriam ser considerados prioritários. Isso é uma coisa que poderia ser feita. Elegem-se alguns produtos e alivia a carga tributária sobre eles. Tudo isso deveria estar dentro de um programa de desenvolvimento industrial.

Quais produtos poderiam ser eleitos como prioritários no processo de industrialização?
Isso depende de um estudo aprofundado, mas aparentemente a piscicultura estaria entre os produtos a serem priorizados no processo de industrialização, a cadeia do leite, laticínios, a cadeira da carne e a cadeia de grãos. Então, temos quatro cadeias que me parecem tudo convergiria para elas. Na Federação das Indústrias tem sido constante o esforço no sentido de adivinhar os cenários da indústria. Duas atividades dominam, hoje, o universo industrial do Estado do Tocantins: a construção de edifícios, do segmento da construção civil, e a fabricação de produtos alimentícios, do segmento da indústria de transformação. Juntas, as duas atividades perfazem quase um quarto da massa salarial injetada na economia do Estado através dos salários formais pagos pela indústria. A prevalência da construção de edifícios resulta, pelo lado da demanda, do déficit habitacional gerado pelo afluxo migratório de que o Tocantins tem sido alvo desde sua criação e, pelo lado da oferta, da expansão do crédito imobiliário e dos programas de aceleração do crescimento do governo federal. A fabricação de produtos alimentícios responde pela verticalização do insumo agropecuário produzido no Estado. Comparando-se estas duas atividades, notam-se diferenças em suas respectivas naturezas que levam a efeitos dignos de nota. A atividade da construção civil tem conotação, predominantemente, conjuntural, pois é suscetível às políticas públicas externas dependentes da vontade dos gestores em nível federal que, uma vez alteradas, podem conduzir a efeitos deletérios sobre o segmento. Paralelamente, em médio e longo prazo, uma vez suavizados seus condicionantes estará estabelecida uma tendência de desaquecimento. O Produto Interno Bruto (PIB) da indústria da construção exibiu regressão em 2012, pelo segundo ano consecutivo.

E o comportamento do setor da produção de alimentos, como tem sido?
A atividade de produção de alimentos, ao contrário do setor da construção civil, tem conotação, predominantemente, estrutural, vez que resulta de uma tendência de mercado que se orienta pelos menores custos de produção (ou maior competitividade) que é encontrada no Tocantins e por uma demanda mundialmente crescente seja qual for a dimensão considerada. Devido a processar matéria-prima local tem, por um lado, reduzido grau de dependência de políticas externas e, por outro, estimulada sua produção. Em médio e longo prazo, impulsionada pela atual apreciação dos seus condicionantes, apresenta tendência de aquecimento. O PIB desta atividade, para comparação, exibiu crescimento no biênio 2011/12. Mantidos estes cenários desses dois segmentos, é possível se concluir que as atividades industriais associadas à produção de alimentos ou, em termos mais abrangentes, ao agronegócio, representam mais que uma tendência, senão uma vocação do Estado do Tocantins. Esta vocação tem sido identificada em vários estudos prospectivos levados a termo no âmbito da Fieto.

Esse processo seria uma parceria com o poder público?
Essa é uma luta antiga da Fieto, de fazer em programa de desenvolvimento da indústria. Infelizmente, nós não temos recursos e muito menos competência para fazer isso. É um programa que poderia ser feito em parceria com o governo do Estado. Cada um entrava com seus recursos e competências e, juntos, o programa seria tocado, porque esse programa trará benefícios para ambos os lados. Ou seja, promoverá uma reação da receita da indústria, mas geraria também divisas para o Estado. É uma balança que pesa para os dois lados.

O governador eleito Marcelo Miranda já manifestou interesse pelo Plano de Desenvolvimento  da Indústria”
O governador eleito Marcelo Miranda já manifestou interesse pelo Plano de Desenvolvimento da Indústria”

Nesse contexto, o governo deveria, no seu entender, definir uma política clara de incentivos fiscais?
Exatamente. Quem sabe a gente estabelecesse alguns produtos como prioritários e incidisse sobre eles uma alíquota tributária diferenciada, uma renúncia tributária? Um maior volume de investimentos sobre essas cadeias produtivas? Um conjunto de medidas a serem estudadas, evidentemente, mas que passam por renúncia fiscal, alívio tributário e investimentos. Acho também que nesse programa de desenvolvimento da indústria deveria contar também com a participação da universidade.

Quando o sr. fala em universidade, refere-se obviamente à Unitins (universidade estadual)?
A universidade estadual (Unitins) hoje praticamente não existe. Ela praticamente produz muito pouco e transfere para a indústria menos ainda. Isso não pode acontecer, a universidade estadual deveria ter como função gerar economia, passando parte de suas pesquisas e inovações para ser exercida no meio industrial. O logos de criação é evidentemente a universidade. A Unitins, hoje, é praticamente inoperante, a não ser o ensino à distância, o que para a indústria interessa muito pouco.

E como atrair investidores para o Estado, se não há definição clara de uma política nesse sentido?
O Estado não tem competência para investimento, porque não consegue gerar uma poupança interna. Isso porque a máquina pública é muito pesada. Cerca de 42% de todos os empregos do Estado estão alojados na administração pública. Isso gera, além de uma folha muito pesada e outras despesas com diárias, entre outras, um custo muito caro para a manutenção da máquina administrativa. Se se gasta uma boa parte dos recursos para manter essa máquina funcionando, não sobra dinheiro para investimentos. E a indústria precisa de investimentos. Se não se tem uma poupança interna, a saída é atrair capital externo. Existe um estudo da revista britânica “The Economist” que classifica o Tocantins em 24º lugar no ranking nacional e capacidade de atrair investimentos. Nós não temos atratividade. Temos uma ótima capacidade de investimentos, mas não temos cadastro no banco.

A capacidade de endividamento do Estado é grande, mas não tem liquidez?
Isso. A capacidade de investimento é muito grande. Isso é um assunto que temos que trazer para a mesa de discussões e detectar quais as alternativas para melhorar esse cenário.

Logística para desenvolver a indústria o Tocantins tem.
Você tocou num assunto muito importante. Dispomos de muitos insumos agrícolas. Temos um sistema logístico moderno e eficaz. E transformar esse macrocanal viário em um eixo de desenvolvimento. Detectar os locais para os empreendimentos industriais e quais serão eles, ao longo desse eixo, elencar as cadeias produtivas ao longo desse eixo, e definir políticas fiscais para esses grandes empreendimentos e também a política de gestão para as famosas PPPs (parcerias público-privadas), que nunca saíram do papel. O eixo está aí e em junho do próximo ano ele estará concluído, que ligará Açailândia (MA) até Anápolis (GO).

Existe alguma conversa entabulada, nesse sentido, com o governador eleito Marcelo Miranda?
Tivemos várias conversas, inclusive, no mês de setembro deste ano, a Fieto manteve diálogo com os seis candidatos a governador e, recentemente, após as eleições, o governador eleito Marcelo Miranda concedeu uma entrevista à nossa revista e ele manifestou interesse pelo Plano de Desenvolvimento da Indústria. A recessão do segmento industrial vem sendo amplamente discutida pela Fieto nos últimos anos. A “Carta da Indústria”, documento elaborado pela Federação e entregue aos governadoráveis na véspera da eleição, reúne alternativas para fortalecer e viabilizar a competitividade. A indústria definiu eixos com ações estratégicas para que o Tocantins se desenvolva. O fortalecimento da indústria depende de uma adequação das ações do Estado com mais investimentos em educação, inovação, tecnologia e principalmente infraestrutura. Para que o Tocantins tenha mais representatividade no segmento industrial, proporcionando mais empregos na iniciativa privada, alguns fatores-chaves devem ser colocados em prática pela gestão pública: melhorias nos indicativos sociais, o Estado deve se tornar mais eficiente e os mercados desenvolvidos. Incluem-se também o aperfeiçoamento do marco regulatório para as pequenas indústrias, desenvolvimento territorial com foco nas vocações regionais, financiamento como possibilidade de estímulo ao microcrédito produtivo, reforma tributária e fiscal , estabelecendo a simplificação da arrecadação, qualidade na educação básica, profissional, superior e tecnológica. E ainda, incentivo à educação empreendedora, pesquisa e mais interação Universidade/Empresa e Gestão Empresarial. Nesse processo, consideramos importantes dois alvos estratégicos: de um lado, a busca pela competitividade dos seus produtos e serviços nos mercados mundiais e, de outro, uma firme governança formada pelo poder público e a iniciativa privada para conduzi-la. Ambos orientados por um projeto de estado pré-concebido.

Como fica a questão ambiental dentro do PDI?
A água está relacionada a todos os setores. A indústria tem a visão de sustentabilidade dos recursos naturais, mas tem a clara percepção também, de que o aspecto ambiental sem a visão econômica dificilmente se sustenta. Todo processo exige a criação de programas oficiais de aproveitamento sustentável de seus recursos naturais e biodiversidade e aliar o macro sistema viário de alcance transnacional, em fase final de implantação em seu território, com a verticalização das commodities agrícolas e minerais através da agroindústria e da indústria minerária, são os insumos para esta transformação. A verdade é que uma indústria forte é fundamental para a agenda de crescimento do Estado. É ela que aportará mais empregos de qualidade, ampliará a geração de divisas através da maior participação do Tocantins no mercado de manufaturados e contribuirá para o aumento da produtividade e da inovação. Em todo mundo está em curso uma revalorização do papel da indústria na economia e o reconhecimento de sua influência benéfica sobre a rede de atividades produtivas e sobre a dinâmica da agropecuária e do setor de serviços. Mas uma indústria maior e melhor supõe a redução dos obstáculos que, desde sempre, dificultaram seu desenvolvimento, no Estado e País. Além do aperfeiçoamento da organização estatal em todos os níveis, o Tocantins necessita de arranjos institucionais que assumam a responsabilidade de conceber e implantar estratégias de curto, médio e longo prazo, que ampliem a capacidade de ganhar espaço nos mercados pela indústria local, ou, em outras palavras, uma governança em favor do aumento da sua competitividade. Estado e iniciativa privada têm missões definidas neste arranjo. O segundo aumentando a produtividade e a qualidade de seus produtos e o primeiro aportando políticas públicas que habilitem a isso.