João (nome fictício) foi preso durante uma ronda policial em maio de 2020 na periferia de Bauru (SP) e posteriormente condenado por tráfico de drogas a uma pena de sete anos, 11 meses e oito dias de prisão. Os depoimentos dos policiais que realizaram a prisão trazem apenas a descrição da cor de pele do rapaz: “indivíduo negro”. A quantidade de droga apreendida foi de apenas 1,53 grama.

Para o defensor público Pedro Henrique Pedretti Lima, que está solicitando um habeas corpus para João, a condenação é um exemplo de racismo, pois “a cor da pele foi o fator que chamou a atenção inicialmente do agente de segurança pública, o que não pode ser aceito”, escreveu na petição.

Esse caso agora está sendo discutido em um julgamento sobre perfilamento racial no Supremo Tribunal Federal (STF) e pode impactar a forma como as prisões em flagrante baseadas na cor da pele ocorrem no Brasil.

O caso de João ilustra o que pesquisadores têm tentado comprovar com dados. Jovens negros do sexo masculino são encarcerados por tráfico de drogas no Brasil com pouca quantidade de provas, após procedimentos criminais rápidos e prisões fundamentadas em “comportamentos suspeitos”.

Uma pesquisa inédita conduzida pelo pesquisador Alexandre dos Santos Cunha, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), analisou casos de 5,1 mil réus por tráfico de drogas nos tribunais de justiça estaduais no primeiro semestre de 2019.

Essa é considerada a pesquisa mais abrangente sobre o perfil dos réus nesse tipo de crime, e os dados preliminares mostram que a população negra, jovem e de baixa renda é particularmente afetada pelo sistema prisional. As informações foram apresentadas durante o 17º Encontro Anual do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, realizado em junho, em Belém (PA), e o relatório final está em processo de revisão.

A análise semântica dos documentos revelou que o comportamento dos detidos está longe de caracterizar tráfico. Apenas 4% dos processos criminais resultaram de investigações prévias, e “comportamento suspeito” foi a fundamentação para 33% das abordagens que levaram à prisão em flagrante.

Fonte: Jornal O Globo.

População carcerária no Brasil

A combinação de desemprego e fome, que se agravaram com a pandemia, pode ser um dos principais motivos de um crescimento expressivo da população carcerária brasileira. Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apontaram que, em junho de 2022, o total de presos no país havia aumentado o equivalente a um município de 61 mil habitantes: passou de 858.195 pessoas privadas de liberdade contra 919.651 em 13 de maio do ano passado, um salto de 7,6%.

O cenário nos presídios poderia ser ainda pior porque atualmente há 352 mil mandados de prisão em aberto, sendo 24 mil deles de foragidos. Com a marca de 919 mil presos, o Brasil se mantém no terceiro lugar no ranking dos países que mais prendem no mundo, atrás da China e dos Estados Unidos.

A comunidade negra está sobrerrepresentada nos presídios, em proporção muito superior à média populacional. Um relatório elaborado pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo revelou, em março deste ano, por exemplo, que negros são 61% dos presos no estado, apesar de serem 40% da população paulista.

*Com informações do jornal O Globo.