Depois da Câmara dos Deputados aprovar a reforma tributária no início de julho, o texto da proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019 agora é analisado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. A expectativa é que a votação do parecer ocorra no dia 4 de outubro.  Só depois disso a matéria deve ser apreciada no plenário da Casa. A previsão é que até o fim de novembro os senadores votem – e aprovem – o texto final que vai mudar a forma de tributação no Brasil.

Há pouco mais de uma semana, o governador Ronaldo Caiado (UB) participou de audiência pública sobre a reforma tributária na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal, que é presidida pela senador Vanderlan Cardoso (PSD). Aos senadores, ele alertou que atual Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019 “gera enormes prejuízos para estados e municípios”.

No Senado, a convite do senador Jorge Kajuru (PSB), Caiado reforçou a importância dos fundos constitucionais e destacou líderes históricos que trabalharam para o desenvolvimento das regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste, como o ex-presidente Juscelino Kubitschek e do fundador do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) e ex-presidente da Câmara, Ulysses Guimarães. “Esqueceram a visão desses homens. Essa reforma revoga tudo que eles fizeram. Ela inverte o eixo de desenvolvimento e concentra-se sobre Sul e Sudeste e esquece o desenvolvimento regional”, pontuou.

De acordo com dados do Instituto Mauro Borges (IMB), apresentados por Caiado aos senadores, os setores que mais geram empregos no país (educação, serviços, comércio, transportes, entre outros) serão os que mais sofrerão com a nova carga tributária. “O reajustes de é de 90%, 84%, 75% e 69%, respectivamente. Isso não é achismo, é cálculo. É dado, com base no que foi aprovado na Câmara dos Deputados”, reclamou o governador.

Senadores de Goiás se posicionam sobre a reforma tributária

Na ocasião em que chefe do Executivo goiano esteve no Senado, o senador Wilder Morais (PL) se posicionou contra a reforma. “Não tenho dúvida em falar isso”, reforçou. A preocupação do presidente do PL em Goiás é que o texto, se aprovado do jeito que está, vai ter como consequência a desindustrialização do Centro-Oeste, Norte e Nordeste a partir de 2032, quando acabaria os incentivos fiscais.

O senador Vanderlan – que tem percorrido o interior discutindo o tema -, lembrou que a reforma é necessária. No entanto, ele reconheceu que precisa de mudança e reiterou a importância do debate sobre o assunto. “O intuito ao criar o grupo de trabalho não é afrontar ninguém. Confesso que a cada audiência que fazemos, ficamos mais preocupados. Precisamos procurar soluções”, frisou o parlamentar.

Para o senador Jorge Kajuru, líder do PSB e vice-líder do governo no Senado, a discussão sobre a reforma tributária na casa legislativa segue o ritmo adequado. Segundo ele, a previsão é que o texto final deva ser votado em novembro. Antes disso, ainda deve ser muito discutido. Inclusive, o parlamentar antecipou que nos próximos dias os prefeitos devem ser ouvidos pelos senadores em uma reunião sobre o tema.

Kajuru reforça que governo Lula está aberto ao diálogo e que texto deve ser “melhorado”

Senador Jorge Kajuru é a favor da reforma, mas reforça que tem pontos a melhorar | Foto: Geraldo Magela/Agência Senado

Apesar de elogiar a posição do governador Ronaldo Caiado sobre a reforma, Kajuru destaca que o governo federal está aberto a ouvir todos os setores da sociedade. “A reforma com certeza vai ajudar não só Goiás como o Brasil. Tem vários pontos positivos, mas também tem negativos e Ronaldo Caiado foi muito feliz em apresentar alguns deles.”, destacou.

No entanto, o líder do PSB do Senado disse ainda que nem tudo o que Caiado coloca, o governo Lula concorda. “O governo federal está aberto ao diálogo e reconhece que alguns pontos podem ser melhorados”, pontuou o senador. Para Kajuru, os pontos da reforma tributária que sevem ser aprimorados passam pela clareza dos percentuais que Estados e municípios vão receber dos tributos e também o detalhamento de como vai funcionar a tributação do setor de serviços.

“No Senado, vamos discutir a questão dos trabalhadores de ramos como a advocacia, o turismo, além de bares e restaurantes”, listou o parlamentar, que acredito esses aspectos da reforma tributária devem ser melhorados para que o setor de serviços não seja prejudicado e concorde com as mudanças que impactarão todo o país.

Wilder critica texto da reforma tributária aprovada na Câmara

Senador Wilder Morais é contra a reforma tributária | Foto: Marcos Oliveira/ Agência Senado

Ao Jornal Opção, o senador Wilder Morais, que faz oposição ao governo Lula no Senado, já criticou o texto em discussão. Segundo ele, é necessário “mudar o texto todo” para que ela tenha efeito positivo. O parlamentar acredita que a matéria precisa de uma revisão significativa na casa legislativa. “A reforma tributária que chegou não serve para nós goianos e nem para o Brasil. Vamos fazer uma oportunidade de mudar o texto todo”, argumentou.

Há um ano, quando ainda era candidato a senador pelo partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, o PL, Wilder já reforçava que o chamado “custo Brasil” é um dos maiores do mundo e condena a complexidade e disfuncionalidade do sistema tributário brasileiro. Na ocasião, ele dizia ser impossível gerar impactos positivos na produtividade e no crescimento do país sem uma ampla reforma.

Durante as eleições de 2022, o parlamentar que é presidente do PL em Goiás chegou a falar que Bolsonaro também seria a favor da reforma tributária e que só não a fez durante seu governo por não ter todo apoio nem da Câmara nem do Senado. E no último mês de julho, ao visitar Goiânia e almoçar com o governador Ronaldo Caiado, o ex-presidente confirmou que estava “99% alinhado com Caiado no tocante à reforma tributária”.

Na ocasião, Bolsonaro reafirmou à imprensa seu descontentamento com o texto da reforma tributária aprovado pela Câmara dos Deputados. “Conversei pouca coisa com o Wilder e tenho conversado com a nossa bancada”, revelou na época, quando a expectativa já era de que o Senado revisasse alguns pontos que têm sido criticados por diversos governadores e prefeitos, como é o caso de Caiado.

Vanderlan antecipa que questão os incentivos fiscais “já tem solução”

Senador Vanderlan Cardoso em reunião da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado | Foto: Pedro França/ Agência Senado

O senador Vanderlan Cardoso, que é do mesmo partido do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já declarou ao Jornal Opção que alguns pontos do texto da reforma tributária em discussão precisa de mais clareza. Esse ponto, para ele, explica a preocupação de diversos segmentos da sociedade sobre a questão. “Ainda não está muito claro o que os setores vão perder, ou se vão ganhar, qual alíquota vai ser a real”, afirmou.

Vanderlan reforçou que a dúvida paira principalmente sobre o setor de Serviços. Mas além disso, há outros pontos nebulosos, como o Conselho Federativo. “Vamos trabalhar no Senado Federal para um aperfeiçoamento com relação ao Conselho, que seja mais claro”, prometeu o parlamentar.

Com relação aos incentivos fiscais, o senador do PSD já avisou que a situação “praticamente já tem uma solução” sobre isso. “Foi dada por alguns técnicos, equipe do governo, em especial o secretário da reforma tributária, Bernardo Appy. A gente tem reunido com ele e sua equipe, buscando solução para aqueles pontos que são mais polêmicos”, destacou.

Segundo o senador, os governadores de Goiás, Pará, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, que são estados pioneiros na criação de fundos de desenvolvimento, já foram recebidos em reuniões para tratar do tema. “Estamos buscando, junto com a equipe econômica, uma solução para que esses estados, que precisam desses fundos, não sejam prejudicados na reforma tributária”, destacou.

Apesar do tom conciliador de agora, Vanderlan chegou a criticar publicamente Caiado depois da votação da proposta na Câmara, quando o governador cobrou dos senadores uma postura mais crítica sobre a questão. Na época o parlamentar chegou a criticar chefe do Executivo goiano pelo que chamou de uso de frases de efeito na tentativa de direcionar a culpa para o Senado pela reforma tributária que deve ser aprovada no Congresso até novembro.

Reforma tributária segue em discussão no Senado

Audiência pública debate impactos da reforma tributária no agronegócio | Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado

Na última semana, uma audiência pública realizada na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado discutiu os impactos da reforma tributária no agronegócio. Na ocasião, a manutenção dos incentivos fiscais foram defendidas por especialistas e representantes dos setores, inclusive o ex-ministro da Fazenda, Mailson da Nóbrega (ele atuou no governo de José Sarney no período de hiperinflação do fim dos anos 80).

Para o ex-ministro, hoje o Brasil possui “o pior sistema de tributação de consumo do mundo”. “Não tem nada parecido de bagunça em canto nenhum do mundo, e esse sistema responde em grande parte pela armadilha do baixo crescimento em que se meteu o Brasil”, declarou durante a audiência pública no Senado.

Segundo Mailson, estamos diante de uma “revolução” tributária e ele é otimista ao dizer que é possível que o Brasil tenha o melhor sistema de tributação do mundo, tecnologicamente falando. “É uma oportunidade ímpar que vai aumentar, se aprovada a reforma, o potencial de crescimento da economia brasileira”, pontuou.

O ex-ministro afirmou ainda que alguns pontos da reforma são “desprezados” ou “pouco entendidos”, como é o caso da criação do Conselho Federativo. “É, na minha opinião, a maior inovação dessa reforma. Sem ele a reforma não existe”, disse ao explicar que o Conselho é a garantia que nenhum ente perderá receita com as mudanças.

No entanto, o ponto elogiado por Mailson é alvo de críticas duras de Caiado. “É loucura achar que um conselho federativo com 54 membros seria capaz de substituir os 27 governadores e 5.568 mil prefeitos”, disse o governador em um debate promovido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) sobre a Reforma Tributária no mês de agosto.  “Os conselheiros jamais conseguirão saber as necessidades de todos municípios”, completou o governador, que lembrou ainda que o Senado só existe porque representa os entes federados e que perderia sua finalidade se o conselho federativo passar a decidir o orçamento.

O ex-ministro lembrou que já participa do debate sobre a reforma tributária há 40 anos. Ele integrou a primeira comissão sobre o tema em 1983. “Os estados perdedores de uma reforma que mude da origem para o destino vão se opor e se opuseram sempre. A coalizão de veto contra a reforma acontecia exatamente por isso: a falta de um mecanismo que permita obviar o problema das perdas e ganhos da reforma durante um certo período”, explicou.

Agronegócio cobra tratamento diferenciado

A representante da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Maria Angélica Echer Ferreira Feijó, na mesma audiência pública, defendeu o que chamou de avanços conquistados no Senado até o momento no texto da reforma tributária aprovado na Câmara. Para ela, é preciso garantir o que está previsto no artigo 187 da Constituição Federal, que prevê tratamento diferenciado à agricultura e pecuária por meio de crédito e incentivo fiscais. “O tanto que pagamos de tributo é o tanto que o agro contribui para a manutenção do nosso PIB”, argumentou.

No Senado, Maria Angélica trouxe à tona dados atualizados da Receita Federal e revelou que o setor da economia que mais recebe benefícios fiscais é a indústria – e não o agro. “Se analisarmos as 100 maiores empresas industriais que recebem os maiores benefícios fiscais do governo federal, 78% delas são indústrias de mineração, energia e siderurgia”, disse.

Para a assessora técnica da CNA, entre os pontos a serem aperfeiçoados no texto da reforma tributária estão a redução da alíquota para os produtos de gênero alimentício do agronegócio em 80% (e não nos atuais 60%); o endereçamento dos fundos estaduais; e a imunidade do imposto de transmissão causa mortis e doação (ITCMD) para o pequeno e médio produtor rural, como um incentivo para mantê-los no campo.

Empresários e políticos defendem incentivos ficais em evento do PAC em Goiás

Lançamento do PAC em Goiás reúne lideranças políticas e empesariais | Foto: Iron Braz/ Agência Cora

Apesar de já ser pública e notória a opinião do governador à respeito da reforma tributária, no evento que detalhou como serão os investimentos do novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em Goiás, Caiado preferiu não tocar no assunto. Na ocasião, estavam presentes dois ministros do governo Lula: o da Casa Civil, Rui Costa (PT-BA), e o do Empreendedorismo, Márcio França (PSB).

Ao discursar, o governador preferiu reforçar a parceria com o governo federal para garantir melhorias para o povo goiano para além das diferenças político-partidárias. Apesar disso, Caiado defendeu a importância dos incentivos fiscais para o setor produtivo, mesmo sem citar a reforma. Apesar do tom leve de Caiado, o assunto veio à tona com mais força nos discursos do senador Vanderlan Cardoso e do presidente da Associação Pró-Industrial de Goiás (Adial), José Garrote.

Garrote não se intimidou e aproveitou o momento para cobrar, tanto dos ministros quanto dos parlamentares goianos a preservação dos incentivos fiscais e a garantia de permanência dos fundos constitucionais de incentivo à produção, como um gesto de parceria entre os setores públicos e privados. “Goiás cresceu com leis públicas que fizeram com que nós pudéssemos chegar onde chegamos”, lembrou o representante do setor produtivo.

De acordo com o empresário, que é dono da São Salvador Alimentos – empresa goiana que figura na lista dos 100 maiores do agro brasileiro, ocupando a 55ª posição -, tantos os incentivos fiscais quanto o Fundo Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste (FCO) contribuíram – e muito – com o crescimento de sua empresa. “Eu sou um produto das boas políticas públicas que Goiás fez”, destacou José Garrote.

Ao entrar do debate, o ministro petista preferiu sair pela tangente e disse que “o problema é cada um tem a sua própria reforma tributária”. “É igual escalação da seleção”, comparou Rui ao usar uma analogia bem popular.