Por que o mercado volta sua atenção à chamada geração Z

29 dezembro 2017 às 23h14

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Pessoas que nasceram entre 1995 e 2010 começam a chegar à vida adulta e podem causar uma reviravolta no mundo do trabalho e no mercado consumidor
Até o dia 31 de dezembro de 2017, toda a população nascida em 2010 terá 7 anos de idade. Os mais velhos da geração Z, que também é conhecida como pós-millennials, centennials, plurais, iGeneration e Gen Z, que iniciaram suas vidas em 1995, chegaram neste ano aos 22. Considerados os nativos digitais, que se desenvolveram com smartphones, internet mais acessível e em um período no qual o mundo se digitalizou mais, 96% dessa nova juventude tem seu próprio celular, de acordo com a Econsultancy.
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Mas por que devemos nos preocupar tanto com a geração Z a partir de agora? A revista Fast Company afirma que em 2020, daqui pouco mais de dois anos, a Gen Z representará 40% de todo o mercado consumidor mundial. Enquanto os pesquisadores passaram anos tentando compreender as características gerais de comportamentos da geração Y, também chamados de millennials, que na maioria das definições são aqueles que nasceram entre 1980 e 1994, a primeira leva de adultos dessa faixa-etária já chegou à casa dos 30 e tende a ficar cada vez mais distante das estratégias de mercado, sempre pensadas para atrair os mais jovens.
Para esta matéria, vamos adotar como válida a definição utilizada pelas consultorias Box1824 e McKinsey no levantamento “Gen Z e a transformação do consumo”. Nesse estudo, a geração Z é descrita pelos nascidos entre 1995 e 2010, antecedidos pelos Y ou millennials, de 1980 a 1994, os X, entre 1960 e 1979, e os baby boomers, de 1940 a 1959. O interessante é notar como as gerações anteriores às mais novas tendem a olhar de forma pejorativa para os mais novos enquanto os traços comportamentais mudam como uma antítese aos mais velhos.
O primeiro traço que diferencia bastante os baby boomers e X dos Y e Z é que as duas primeiras gerações são as consideradas conservadoras digitais por terem se desenvolvido longe do contexto do acesso constante à internet em que cresceram millennials e Gen Z. Os baby boomers são filhos da Segunda Guerra Mundial, marcados pelos anos da cultura hippie, sendo mais idealistas, coletivos e revolucionários do que os X. Os nascidos entre 1960 e 1979 viveram a hegemonia do capitalismo no mundo e se voltaram para ideias mais materialistas, como a competitividade e a estabilidade em uma única empresa ao longo da vida.
Como os X negaram toda a liberdade pregada pelos baby boomers ao se voltarem ao trabalho como forma de melhorarem suas vidas, os Y, considerados por muitos como a geração mimada e superprotegida, acabaram se voltando a questões mais globais, como o aquecimento da Terra e o meio ambiente. Os também chamados de millennials são a primeira leva de filhos que cresceram enquanto o mundo se digitalizava aos poucos. Do vinil, VHS e da fita k7 aos CDs e DVDs até chegar ao mp3 e a música gratuita na internet. Da máquina datilográfica ao computador, do rádio e da televisão ao computador em casa e ao laptop. Dos orelhões e telefones fixos aos celulares, que viraram smartphones, e depois os tablets.
Os Y, classificados como migrantes digitais, apesar de estarem altamente ligados ao mundo virtual e aos serviços oferecidos via internet, se diferem dos Z por manterem uma vida online separada do cotidiano real. Já os nativos da era digital, a Gen Z, não diferencia o que é físico do que é o universo dos dados. Esses novos jovens tratam as duas realidades como parte de um todo comum, como se elas estivessem interligadas. Também por isso estão muito mais aptos a encontrarem soluções rápidas e adaptáveis às necessidades pelo seu contato desde o berço com a tecnologia. Aliás, tecnologia é uma palavra que não faz muito sentido para os Z, que já nasceram com ela inserida em sua realidade como é habitual para qualquer pessoa acordar, tomar banho e vestir uma calça, colocar uma camiseta, meias e um calçado.
Enquanto os Y, que viram a tecnologia se desenvolver enquanto sua vida mudava junto com as novas relações virtuais fazendo cada vez mais parte do mundo a partir da adolescência, se prenderam na exposição de uma expectativa de vida nas redes sociais muitas vezes distante daquele sonho de alcançar o sucesso profissional em pouco tempo, os Z têm se mostrado bem mais pés no chão. Apesar da tendência a se irritarem mais rapidamente no mundo real por terem de forma ágil grande parte das respostas e soluções oferecidas na vida virtual, a nova juventude é mais realista do que os millennials, que sonham com o emprego perfeito e as experiências a serem desfrutadas.
A geração Z, que tem se livrado aos poucos da tentativa dos Y de vender uma imagem traduzida em likes, compartilhamentos e comentários, tende a ser formada por ativistas muito mais ativos do que os millennials. Os Gen Z carregam muitos traços dos Y, como o tempo excessivo que gastam na internet, principalmente por meio do smartphone, que pode ser facilmente verificado por ser um aparelho pequeno e fácil de carregar para qualquer lugar. E que tem feito os baby boomers e X tentarem acompanhar essa nova realidade de conexão 24 horas por dia.
Celebridades? Não. Obrigado
Assim como os jovens ligam pouco para a TV por assinatura e gastam mais tempo de lazer com vídeos no youtube ou em serviços de streaming, as pessoas famosas que têm poder de influência sobre seus hábitos de consumo se parecem mais com gente comum. Não adianta tentar convencer um jovem de 15 anos por meio, por exemplo, da atriz Juliana Paes em uma propaganda de cosméticos. A youtuber Mari Maria, com 2,9 milhões de inscritos em seu canal, que dá dicas de beleza e maquiagem, talvez consiga dialogar de forma mais rápida e prática com a geração Z do que o maior sucesso da última novela das 9 da Rede Globo.
A equidade de gênero é uma pauta constante nos vídeos e postagens da geração Z, que não se coloca apenas como consumidora, mas também como influenciadora das mudanças desse mercado que tenta abocanhar essa fatia que só aumenta. E não é só nas compras que eles geraram uma reviravolta nas marcas, que precisam mostrar além de um discurso para convencer esse público-alvo mais consciente e cada vez mais em busca de marcas que trabalham com a verdade de sua produção e engajamento. As relações de trabalho podem ser totalmente modificadas com a chegada dos Gen Z às empresas, um novo empregado cada vez menos fiel a uma ou outra corporação, mas que é capaz de entender a necessidade de se garantir financeiramente. Eles cresceram bem no meio da grande crise econômica mundial iniciada com o estouro da bolha imobiliária dos Estados Unidos em 2008.
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Nada afeitos a hierarquias, acostumados a tratar a todos de igual para igual, há quem aposte que em pouco tempo os Z serão os chefes das gerações anteriores nas empresas. Já há quem acredite que a hiperconectividade e a hiperinformação transformaram a nova juventude em extremamente difusa e com dificuldades de se dedicar a qualquer aprendizado ou conhecimento mais aprofundado. Tudo isso pelo seu caráter mais demorado, bem diferente da realidade rápida do mundo virtual e da divisão de atenção entre a tela do smartphone, a TV ligada, a música ou o som do vídeo no Youtube nos fones de ouvido e o computador, tudo ao mesmo tempo.
É a geração considerada de identidade fluída, que aceita melhor a sexualidade e as opiniões alheias e tem um comportamento mais conciliador. Longe da hiperexposição nas redes sociais adotada pelos Y, os Z preferem postagens aleatórias no Snapchat ou mensagens privadas no Instagram ou WhatsApp. Esses jovens entre 7 e 22 anos têm abandonado cada vez mais o Facebook, descrito como a rede social dos pais e avós. No levantamento “GenExist – I want to leave (GenSaída – Eu quero ir embora)”, feito por Sean Monahan e Sophie Secaf (Box1824), as características de abandono da tentativa de criar uma imagem nas redes sociais é cada vez mais abandonada pelos Z.
Seria como se o novo jovem buscasse uma alternativa para a ansiedade criada pela vida do sucesso vendido nas redes sociais. Os Z querem fugir dessa exposição das postagens dos Y que deixam as expectativas virtuais pautarem suas fotos e textões. Os millennials geralmente tratam as fotos de comida no Instagram como uma relação de identidade e não de saúde, de acordo com o levantamento. O bem estar apresentado nos posts, que deveria ser uma demonstração de cuidado, se torna uma busca por controle. Viagens, vistas por seguidores, deixam de ser uma oportunidade de descanso e criar novas perspectivas para se transformar em uma moeda de troca por poder sobre as frustrações alheias ao ver um sucesso que não foi alcançado por ele na postagem do outro. E os Z estão cada vez mais longe dessa falsa realidade criada pelos Y nas redes sociais.
https://www.instagram.com/p/Bct8FeTDrW7/?hl=pt-br&taken-by=gabrielapugliesi
Assim como amigos no Facebook e Instagram para os millennials nem sempre se tratam de demonstrações de carinho e amor, mas uma plataforma de conquistas sociais, os Z preferem saber se seus dados serão preservados. Eles querem a privacidade que os Y esqueceram de resguardar. Um dia os millennials foram apontados como a geração que mudaria o mundo. Hoje já se discute como estará a insatisfeita e frustrada a mesma geração Y quando chegar à meia-idade.
Os pós-millennials, ou geração depois da marca pessoal (personal brand), tão desejada na imagem virtual dos Y, também é analisada como a mais propensa a abandonar a faculdade, não se adaptar aos empregos convencionais e distante da consciência política. Mesmo com todo o ceticismo que a crise econômica trouxe aos Z, eles tendem a ser mais pragmáticos do que os Y. O que pode ser uma vantagem. Ao trocar a busca por uma identidade e se direcionar na construção de uma geração de ideias, a Gen Z tem ignorado a perseguição ao poder dos Y e caminhado no anonimato, mudando o controle pela fluidez e a conquista pelo senso de comunidade.
A análise de Sean Monahan e Sophie Secaf chega à seguinte conclusão: “O problema real nunca foi a exposição. Sempre foi nossa capacidade de conexão. Há uma enxurrada de comentários sobre o nosso recém-descoberto desejo de sermos uma comunidade. Algumas pessoas veem isso como uma coisa boa. Mas precisa ser dito: se queremos algo, significa que não temos isso.” E é justamente esse o grande desafio da geração Z. Transformar a habilidade virtual em criadora de laços no mundo real. Se, ao contrário dos millennials, eles vão salvar o mundo, ninguém tem como saber.