Novas suspeitas em prédio na Praça do Sol
15 abril 2018 às 00h00
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Construtora City Soluções Urbanas pode não ter obedecido a regras que dificultam propagação de fogo
Com entusiasmo, o corretor de imóveis descreve a única unidade disponível no City Vogue Praça do Sol, erguido na Rua 13 no Setor Oeste, em Goiânia, pela construtora City Soluções Inteligentes. O apartamento fica no 13° andar, tem cinco vagas de garagem, sendo três individuais, duas gavetas e um escaninho. Depois de parcelamento dos valores, já com chave em mãos, o proprietário terá desembolsado mais de R$ 1,6 milhão pelo imóvel, protagonista de um enredo emblemático.
“Com os bombeiros está tudo certo e a Prefeitura de Goiânia deve dar o Habite-se em breve”, diz ao repórter o corretor depois de conversas e trocas de e-mails, sem mencionar, contudo, nada a respeito da narrativa em torno do empreendimento com embargos e disputas judiciais devido a irregularidades. O caso se tornou público após série de reportagens do Jornal Opção publicadas desde dezembro do ano passado, que apontaram problemas normativos que colocam em xeque a segurança dos futuros condôminos.
Desta vez, o Jornal Opção traz a público uma denúncia engavetada pelo Ministério Público do Estado, com apontamentos de supostas irregularidades no prédio da Praça do Sol. O problema seria com a compartimentação horizontal e vertical aprovada pelo Corpo de Bombeiros Militar do Estado de Goiás (CBMGO), mesmo em desacordo com as normas técnicas da própria corporação. A possível inobservância pode, em caso de incêndio, aumentar o dano aos moradores do arranha-céus, como esclarece a mesma norma.
Conforme a denúncia, a fachada lateral esquerda indica aberturas com alumínio e vidro incolor com distâncias inferiores a 1 metro, quando a Norma Técnica 09/2017 do CBMGO estabelece no item 6.2 que a distância mínima seja de 1,20 metro.
Segundo a norma, se a distância não for respeitada, um provável incêndio pode dar mais trabalho para o controle, já que “o fogo que esteja no andar de baixo, passa para o andar superior devido às chamas”. No item 6.2.1, fica claro a importância de se obedecer as normas: “as seguintes condições devem ser atendidas pelas fachadas, com intuito de dificultar a propagação vertical do incêndio pelo exterior dos edifícios”.
A denúncia chegou à 7ª Promotoria de Justiça de Goiânia do Meio Ambiente, Patrimônio Cultural e Urbanismo, mas o promotor Juliano de Barros Araújo indeferiu a representação sob a justificativa de que a denúncia, enviada anonimamente, “traz apenas suposições”. A mesma denúncia foi enviada ao comandante-geral do CBMGO e ao Departamento de Denúncias e Irregularidades em Aprovação de Projetos junto ao CBMGO.
Procurados, no setor de análise e aprovação de documentos no CBMGO, os responsáveis se reuniram em um sala e voltaram informando que só iriam se pronunciar diante do “projeto original, com todas as pranchas”. Um dos bombeiros ainda explicou que a inspeção é feita apenas depois de a obra ser concluída. “Mas, nesses casos [de inconformidade com a norma], depende do empreendimento. Cada caso é um caso, mas é possível que seja embargado”, reconhece, sem mais explicações.
Perigoso
Especialista em Direito Imobiliário, o advogado Thales Meneses explica que não preencher os requisitos exigidos por órgãos públicos e a desobediência de normas técnicas geram consequências a todas as partes envolvidas no empreendimento. “Um imóvel construído em desconformidade às exigências do Corpo de Bombeiros, além de ser bem perigoso, jamais terá seu Habite-se expedido”, esclarece.
Meneses ressalta que o problema maior é com os compradores, impossibilitados de financiamento do bem, resultando em desvalorização do preço de mercado do imóvel. “Além de exigir cautelas especiais ao vender o bem a terceiro, pois se os defeitos não forem informados ao novo comprador no ato, o antigo comprador se responsabilizará pelos danos que aquele vier a sofrer, assim como os corretores de imóveis que intermediarem estas vendas”, avisa.
Para o advogado, um apartamento vendido sem observar normas técnicas é um imóvel com defeito. Constatada a irregularidade, a construtora terá a obrigação de corrigir o problema em um prazo predeterminado ou, caso isto não seja possível, rescindir os contratos de compromisso de compra e venda com os compradores. “E tendo de devolver a eles o valor total pago, corrigido monetariamente, sem prejuízo de indenização por perdas e danos que vieram a sofrer pela não entrega do imóvel na data e forma prevista em contrato e lei”, diz Meneses.
No início de abril, a construtora convidou o Jornal Opção para ter acesso aos documentos que comprovam a regularidade do empreendimento. “Quanto ao acesso ao projeto aprovado, a City Incorporadora está de portas abertas para que representantes do Jornal compareçam na sede para esclarecimentos técnicos e demonstração dos mesmos”, escreveu em nota.
Durante a semana passada ficou acertado que o repórter teria acesso ao projeto e documentos, mas no final da tarde de sexta-feira, 13, a City Soluções recuou e não permitiu a visita. Em nota, a construtora explicou que “a obra foi executada conforme aprovação no corpo de bombeiros, cumprindo exatamente todas as exigências solicitadas, resultando no certificado de conformidade que atesta legalmente que o empreendimento cumpriu tudo que lhe foi exigido pelo órgão competente”.
Ainda conforme a construtora: “Se houvesse qualquer tipo de irregularidade no empreendimento seria apontado, pela análise de projeto e/ou pela vistoria de inspeção”. A nota explica ainda que o empreendimento tem o Certificado de Conformidade (Cercon), em que os Bombeiros comprovam que o prédio possui as condições de segurança contra incêndio previstas na lei.
“O documento legal comprova que foram atendidos todos os critérios de composição de processos de segurança de incêndio e pânico validando que o empreendimento possuiu condições de segurança contra incêndio previsto pela legislação e constantes no processo”, diz a nota.
Nenhuma menção, no entanto, à observância da Norma Técnica 09/2017 de que, caso a somatória das dimensões — 1,2m entre verga até o piso da laje — seja inferior, poderá ser utilizado fechamento com vidros de segurança para a complementação.
NOTA OFICIAL – CITY SOLUÇÕES URBANAS
Prezados,
A obra foi executada conforme aprovação no Corpo de Bombeiros, cumprindo exatamente todas as exigências solicitadas, resultando no certificado de conformidade que atesta legalmente que o empreendimento cumpriu tudo que lhe foi exigido pelo órgão competente.Se houvesse qualquer tipo de irregularidade no empreendimento seria apontado, pela análise de projeto e/ou pela vistoria de inspeção. Tendo em vista CERCON é o documento legal que comprova que foram atendidos todos os critérios de composição de processos de segurança de incêndio e pânico validando que o empreendimento possui condições de segurança contra incêndio previstas pela legislação e constantes no processo.
Cumpre salientar, de qualquer publicação de matéria inverídica, sem comprovação dos fatos configura crime de calúnia e difamação, previstos no Código Penal Brasileiro, nos artigos 138 e 139 direcionado a pessoas físicas e jurídicas envolvidas. Caso isso ocorra, todas medidas legais cabíveis serão tomadas.