Considerada uma das principais bandeiras da direita, a segurança pública também foi alvo de investimentos por parte do governo Lula (de esquerda). Enquanto ainda estava à frente do Ministério da Justiça e Segurança Pública, o agora ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Flávio Dino, destinou R$ 900 milhões ao Programa Nacional de Enfrentamento às Organizações Criminosas, além de criar novos métodos de combate como a Força Integrada de Combate ao Crime Organizado (Ficco).

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A Ficco, que é a junção das forças de segurança pública como Polícia Federal (PF), Polícia Civil (PC), Polícia Militar (PM), Polícia Rodoviária Federal (PRF) e Polícia Penal, tem surtido efeito em todo país, inclusive em Goiás, segundo a superintendente da PF em Goiás, delegada Marcela Rodrigues Vieira. 

Apenas entre 2023 e 2024, por exemplo, cerca de seis veículos aéreos (helicópteros e aviões) foram apreendidos pela polícia estadual e federal, em Goiás, por serem usados no transporte interestadual e internacional de drogas e agrotóxicos. Houve ainda o bloqueio judicial de pelo menos R$ 40 milhões de contas de investigados. Para a delegada, o sucesso das operações são um reflexo da vitalidade dos órgãos de segurança e do investimento do governo federal. 

“Cinco estados foram selecionados, dentre eles Goiás, para o combate intensifico a crimes violentos. Tivemos uma operação marcante contra as facções criminosas no final do ano passado. Foram os projetos institucionais enquanto o Flávio Dino estava como ministro. Apenas no ano passado tivemos quase 500 mandados de prisão cumpridos em Goiás a partir da Ficco”, explicou.

Marcela Rodrigues Vieira em entrevista ao Jornal Opção | Foto: Leoiran / Jornal Opção

Marcela Rodrigues Vieira afirmou que a atuação integrada não ocorre apenas em crimes federais, mas também estaduais. Ela cita exemplos como os casos recentes de furtos de joalherias em shoppings da capital goiana, assim como o envenenamento da idosa Luzia Tereza Alves, e do filho dela Leonardo Pereira Alves, que morreram após consumirem alimentos com substâncias nocivas à saúde, manipulados pela advogada Amanda Partata, em Goiânia.

“O celular [da Amanda] foi apreendido e o acesso aos dados foi feito pela Polícia Federal. Existe uma cooperação permanente para os crimes violentos e para os crimes de facções e organizações criminosas. [Temos] os melhores computadores, a verba vem direto do governo federal para essa força integrada. Pretendemos alugar um ambiente externo para que as forças tenham mais liberdade”, contou. 

Combate precisa ser fortalecido

Especialistas veem a integração ostensiva e de inteligência entre as polícias estaduais e federais como ponto positivo no combate à criminalidade. Porém, acreditam que ainda há falta de investimento na eficiência dos sistemas vinculados à justiça criminal, fato que traria ganho em escala e rapidez na condução dos processos, conforme Jean Charles.

O especialista em segurança pública diz que o aprimoramento em nível internacional poderia dar mais êxito ao enfrentamento do crime. As operações e a troca de informações com órgãos internacionais já ocorre, a exemplo da Organização Internacional de Polícia Criminal (Interpol). 

Neste ano, uma rede de tráfico de munições e armas internacional coordenada por Colecionadores, Atiradores Desportivos e Caçadores (CAC’s) goianos foi retirada de circulação pela PF durante ação conjunta com a polícia americana. Um dos investigados, que mora nos Estados Unidos, mandava o armamento para Goiás por meio de containers. O esquema foi descoberto por meio de troca de informações entre as corporações.

“As medidas adotadas são importantes para combater o crime organizado, mas não resolvem cem por cento o problema. A padronização institucional e informacional traz mais rapidez nas ações e tomadas de decisões dos órgãos competentes. Porém, até sua completa implantação, acaba sendo um processo muito demorado e, quando implantado, já pode ser obsoleto”, diz.

Para o também especialista em segurança pública, Ivan Hermano Filho, outro fator que pesa é a legislação brasileira e a separação das policiais. Cada corporação tem a própria área de atuação. A PM, por exemplo, realiza o policiamento ostensivo, a PC investigativo, a PF federal e a PRF rodoviário.

Ivan diz ainda que as instituições perdem muito tempo com as atividades burocráticas, com pessoas que não vão ficar presas, visto que a legislação é “frouxa”. Segundo ele, o “ciclo único policial” ou “ciclo completo”, adotado em alguns condados dos Estados Unidos, seria uma opção, visto que a própria PM teria autoridade para realizar os trâmites burocráticos da prisão, deixando de sobrecarregar a PC que, por sua vez, ficaria apenas na investigação.

“Os órgãos policiais são eficientes, mas a separação institucional que existe entre eles os tornam cativos e problemáticos. Quando um policial militar prende alguém, ele precisa encaminhá-lo à delegacia. A burocracia faz com que o policial militar fique horas e horas cumprindo as medidas. Muitas vezes acontece do policial ficar mais tempo dentro da delegacia do que a pessoa que foi presa em flagrante”.

O especialista conta que o governo federal também tem pecado na segurança do sistema financeiro. Ivan diz que o crime organizado, responsável por movimentar bilhões anualmente, assim como as grandes empresas, se financiam por meio de bancos. No entanto, ao invés de empréstimos, eles cometem mega assaltos a agências, transportadoras e carros fortes, na modalidade chamada “novo cangaço” e “domínio de cidade”.

“Não temos muitos criminosos, mas muitos crimes praticados por estas mesmas pessoas. O sistema legislativo é benéfico ao bandido, permitindo diversas possibilidades possibilidades de uma pessoa não ser condenada ou se for, ficar pouco tempo presa. É preciso mudar a legislação, assim como fortalecer a segurança financeira de modo que o crime organizado seja asfixiado. Como uma empresa, se há uma apreensão de drogas grande, isso gera prejuízo aos criminosos, mas esse lapso é muito curto porque eles se refinanciam rápido”, disse. 

Segurança e as eleições 

A criminalidade e a forte atuação das facções em todo país fez com que a segurança pública fosse uma das principais preocupações do eleitor, conforme pesquisas. O cientista político, Marcos Marino, explica que a área será um dos principais pontos de exploração e promessas por parte dos candidatos nas eleições municipais, estaduais e nacionais. 

A esquerda, conhecida por declarar investimentos na educação e saúde, inclusive, também deve reforçar as promessas de melhorias na segurança, a fim de rivalizar com a direita, que tem como principal bandeira o policiamento e o combate à criminalidade. 

“A segurança não deve dar o tom do discurso nas eleições municipais, que tem outros assuntos mais relevantes como infraestrutura. A nível estadual, a segurança pública não é crítica. Um dos responsáveis pela alta aceitação do Caiado em todos os municípios é a segurança pública, mas a nível nacional é diferente porque é um problema crônico”, afirmou.

Cogitado como candidato à presidência em 2026, o governador Ronaldo Caiado pode enfrentar dificuldades, mesmo tendo a segurança pública como principal destaque. Marcos afirma que outros estados governados pela mesma ideologia política carecem neste aspecto, como São Paulo e Rio de Janeiro. 

Por outro lado, enquanto grandes estados sofrem com a criminalidade, o governo Lula tem aprofundado esforços e investimentos na segurança. O cenário, conforme o cientista político, pode influenciar as eleições e impactar a direita, que não irá mais dominar o assunto.

“É normal ter uma cooptação da pauta pela direita, mas é facilmente atacável, visto que a direita não está entregando. Mesmo com o Bolsonaro na presidência não entregou. O Lula, a maneira como age e opera, entendo que vai ser minorada a distância entre a esquerda e à direita em relação a segurança pública”, concluiu.