Goiânia tem estrutura e recursos para reaproveitar mais do que atualmente se rejeita. Agentes envolvidos na reciclagem concordam que o empecilho é o desinteresse popular

Coleta seletiva aproveita 1.600 toneladas de resíduos por mês, quando a meta é de 4.800 toneladas / Fernando Leite/Jornal Opção

Neste ano, a coleta seletiva porta a porta completa dez anos, fazendo de Goiânia uma das 1227 cidades brasileiras com um programa municipal de reciclagem. A cidade é ainda uma das poucas que tem todos seus bairros visitados por caminhões semanalmente. Segundo o Cempre Review 2019, estudo realizado pela associação Compromisso Empresarial para Reciclagem, somente 35 milhões de brasileiros (17% do total) têm acesso a programas municipais de coleta seletiva.

De acordo com o estudo, três quartos do lixo urbano é composto por material reciclável e o Plano Nacional de Resíduos Sólidos traça como meta para cidades do Centro-Oeste em 2019 a reutilização de 15% de seus rejeitos, o que corresponde a 4800 toneladas em Goiânia. Entretanto, a cidade aproveita apenas 5% do total, ou 1600 toneladas por mês. O restante do material útil é enviado ao Aterro Sanitário de Goiânia, junto com rejeitos orgânicos no lixo comum.

A reciclagem poderia evitar o lançamento de 7,02 milhões de toneladas de gases de efeito estufa na atmosfera e gerar uma economia R$ 1,1 milhão por dia em nível nacional. Se os benefícios dessa atividade são tão aparentes, por que em uma década o reaproveitamento não se tornou uma cultura?

A Política Nacional de Resíduos Sólidos estabelece que a responsabilidade pelo ciclo de vida dos produtos deve ser compartilhada por fabricantes, distribuidores, consumidores e pelo serviço público. Ou seja, a gestão dos resíduos não é incumbência somente do Estado, mas de todos envolvidos na produção, logística e consumo dos bens. Na prática, os agentes que realizam o reaproveitamento são a prefeitura, empresas particulares e cooperativas de catadores.

Metade de toda coleta é feita por cooperativas de catadores

Foto- Divulgação

Metade de toda coleta seletiva no Brasil é feita por cooperativas de catadores e essa proporção vem crescido nos últimos anos. Em Goiânia, quinze cooperativas conveniadas ao programa municipal são apoiadas com espaços, materiais e recursos. Todo o lixo recolhido pelos caminhões da prefeitura é doado a esses grupos, que negociam os materiais com fábricas de embalagem, aparatistas e indústrias.

Segundo a presidente da Cooperativa de Material Reciclável Reciclamos e Amamos o Meio Ambiente (Cooperama), Dulce Helena do Vale, o que limita o desempenho das cooperativas é a conscientização e o engajamento popular. “Se reciclarmos todo nosso lixo, quem ganha é o município, que diminui gastos com a limpeza. Mas isso só vai acontecer quando a sociedade se engajar na coleta seletiva; a população parece não ver as consequências da reciclagem”, afirma ela.

Dulce Helena do Vale lembra ainda a importância social das cooperativas: “muita gente depende desses materiais; é uma atividade que tira pessoas da rua.” A Cooperama recicla mensalmente 70 toneladas de lixo e conta com 42 integrantes. O produto reciclável é negociado e a renda dividida entre os cooperados. As cooperativas de catadores desenvolvem projetos educativos, acordos com condomínios e empresas, e têm de se conformar com condições de segurança e integração social para fazerem parte do convênio municipal.

Empresa extingue uso de caçamba no canteiro de obras

A preocupação com o ecossistema tem atingido também o setor privado, que crescentemente busca certificações sociais e ambientais. Um exemplo criativo de modelo de negócio sustentável é o da NewInc, uma construtora sediada em Goiânia que tem a redução do impacto ambiental como valor, desde a escolha da área, concepção do projeto e execução até a entrega dos imóveis.

Camila Abigail Storti, consultora associada a NewInc, explica que não se utilizam caçambas no canteiro de obras: o entulho é reciclado, vendido ou doado, e o rejeito excedente, transformado em materiais para a própria construção. Outras condutas para gestão de água, energia resíduos e para relacionamento com comunidade do entorno, funcionários e fornecedores geram economia que recompensa os funcionários. Ao se economizar R$ 30 mil, a empresa investe outros R$ 30 mil para a construção de uma casa que é doada a um funcionário.

Segundo ela, apesar de a gestão de resíduos ser financeiramente compensadora, o exemplo da NewInc ainda não se espalhou pela construção civil por uma questão cultural. “A maior dificuldade é convencer o empresário de que gastar mais não é o mais fácil a ser feito. Ele tem a alternativa de se responsabilizar, até porque isso é lei. Apesar de a gestão de resíduos compensar seu investimento, o empresário tem de ter controle, mão de obra, boas práticas administrativas e incentivos para obtê-la”.

Agência do Meio Ambiente acredita ser possível ampliar a coleta de recicláveis

Segundo a Agência Municipal do Meio Ambiente (Amma), Goiânia tem potencial para alcançar as metas estipuladas pelo Plano Nacional de Resíduos Sólidos, desviando para cooperativas 15% dos recicláveis que iriam para o aterro neste ano e 25% em 2031. Três novos galpões de triagem de materiais recicláveis próximos ao aterro sanitário foram inaugurados recentemente para atender 240 catadores de três cooperativas, frutos da parceria entre Prefeitura, Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), Central de Trabalhadores dos Catadores de Materiais Recicláveis (Uniforte), e Universidade Federal de Goiás (UFG).

O desafio para se atingir a meta, de acordo com a Agência, é a participação popular e o destino correto dos recicláveis de forma correta. Por meio da Assessoria de Imprensa, a Amma afirmou que o resíduo é de responsabilidade do gerador e ele tem a obrigação de destinar de forma correta, assim como a Prefeitura é responsável pela limpeza pública e tratamento final do resíduo sólido final. Os cidadãos podem se informar acerca do dia e horário em que o caminhão da coleta seletiva passa em sua porta pelo telefone 3524-8500 ou pelo site da Comurg,