Abilio Wolney Aires Neto é Juiz de Direito, professor, autor de 15 livros, mestre em Direito, graduando em história e filosofia e calouro de Jornalismo

Campo aberto de Palipalas, 1988,Acrilico sobre tela de Sanatan | Foto: Reprodução/Sanatan

Alto Jalapão

Assentado em vales severos e majestosos
Desdobra-se formoso e desmedido o Jalapão
Fracionado em horizontes de platôs flanqueados
Ergue-se em arenitos de blocos branqueados

Por ali a mão de Deus cinzela os montes
No mirante entardecer dos planaltos
Paredões verticalizam rochas basálticas
Em galerias de extensas alamedas
Como campos elísios em bulevares de veredas

Centro oeste das jalapas, que florescem nos despenhadeiros
Enfiando-se pelos prados nos pendões dos seus trigueiros
Oh, formoso Rio da Conceição, estuário do Manoel Alves,
Verte-lhe o céu azul de todas as pátrias
Como ‘azul é a parede da casa de Deus’
Num zênite opala em painéis aos deístas e ateus.

Ermas chapadas de capim dourado
Tremeluzindo flores em vassouras de meninos
À álea erguida dos buritizais encantados
Qual leque em estilhas de poentes centralinos

O disco do sol mergulha lentamente
Matizando o calvário nos bulcões do poente
Como hóstia mergulhada no cálice do sacrário
Esbatendo num crepúsculo de maciços calcários

Cai a tarde…

Arbustos graciosos dispõem agradavelmente a paisagem.
Longe, o sol incendeia o horizonte a prumo de aterrissagem
No seu fulcro cor-de-abóbora, levitando sobre a grei
Faz no céu um leque esplêndido, queima as nuvens, astro rei!
 
Fadado à glória, no seio da eternidade
Te depões ao firmamento, noite nova, amenidade
Desce o sudário da noite, acende a vésper diamantina
Cravejando o céu tão puro, brilha bela, feminina
 
É noite…
 
Apaga-se o dia e acende o firmamento…
Nas alturas, em silencio, viaja o pensamento
Painel de estrelas desafiando o tempo
Rastilho de mundos que cobrem o relento
 
Era junho, noite nova, chovem fogos, escumilha
São foguetes, artefatos, nas distâncias que se mira
Sobem rojões em centelhas, descem faíscas em véu
Em clareiras de artifício derramando-se do céu
 
 
Oh! Deus dos paraísos distantes, do firmamento sem fim
Mergulho no oceano cósmico à procura de mim
Estou só, contigo, pulverizado, sigo assim…
Assombra-me a imensidade onde moram os Serafins.
Em espaços estelíferos, onde vivem anjos alados
No etéreo infinito sigo na marcha dos astros
 
É um êxtase a miragem dessa contemplação
Da planície ao céu aberto a história da Criação
Ó mundos que rolam no azul do outro chão
Ninho de vidas, plêiades, galáxias em constelação
 
Umbela, fulgor, madrugada ridente
De saudade o céu chora dois meteoros candentes
Lume de luz fulgura nessa senda dos milênios
No escrínio do universo labaredam esses proscênios
 
Meu estro, sou destro, meu ser é fagulha
Crepita em fogueira no cunhal da rua
Explende o luar, em solidão imponente
Orquestra do Universo… Deus é o regente!

Cora Coralina

A primavera deu-lhe o cavalo selvagem da paixão
Apeada em seu corcel, noite alta, solidão
Trotando os 21 anos na quimera da ilusão

Amor de outras plagas, seu encanto, sua parelha
Proibido como o Éden em versos de torrentes vermelhas
Depois o adeus…
Depois o amar do mirante da ponte, varanda do mundo, sacada da fonte

E então a imperatriz de aspectos matronais
Brava dama quer viver no prazer de deixar ser
Linda vida, longos passos, um romance pra se ler
Atol de coral, ventania, longe a roda de menina
Água marinha do rio, em botânica, Coralina

Passos lépidos, silenciosos, qual gazela em pradaria
Desde os 15 nascitura em cordel sem livraria
Pós 70 em versos soltos, sua primeira edição
Na espádua cai-lhe a trança, foi-se o tempo, irrisão!

De coração fez-se Cora, Coralina de Vermelho
Fez o rio qual Narciso dar-lhe a face como espelho
Púrpuro rosto bordando nos lábios secretas verdades
Cinzéis triunfantes talhando palavras de liberdade

Vasquejando o firmamento na varanda de algum tempo
Deixando perder o vale sepulto do prazer quase ao relento
Lá na ponte o balaústre faz fronteira ao anoitecer
Doce amante, sem pecados, versos teus não vão morrer

Da sacada do sobrado nos fundos de quintal altivo
Desce o rego em cristal líquido como leve é o seu sorriso
Aragem de outono sopra a úmbria do seu horto
Manuscritos pejam cartas e poemas absortos

Fogão de lenha, bronze, tachos, limão e cinza
Dias lentos, casa da ponte, sua gamela é o horizonte
Tem um vaso na janela orvalhado de esplendor
Tulherias, flores brancas traz fragrâncias de olor