“Polícia Civil não vai tratar produtor como criminoso”: delegado do meio ambiente fala sobre proteção ao Cerrado

25 junho 2024 às 11h44

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Levantamento feito pela rede colaborativa MapBiomas mostra que, em 2023, o Cerrado se tornou o bioma nativo mais devastado em todo o país. Conhecido como ‘Berço das águas’, o Cerrado influencia nos cursos d’água de todo o país e sua preservação é essencial para manutenção dos reservatórios brasileiros. Diante desse cenário, os órgãos ligados à proteção ambiental começam a reagir a fim de inibir o desmatamento da vegetação nativa.
Em entrevista ao Jornal Opção, o titular da Delegacia de Combate à Ocupação Irregular do Solo e aos Crimes contra a Ordem Urbanística e o Meio Ambiente (Dema), Luziano de Carvalho, explica que, durante a época de seca, a incidência de queimadas criminosas aumenta, o que impacta na devastação do Cerrado. “Quase todo incêndio que está aí ou é criminoso na forma dolosa ou na modalidade culposa”, explicou o delegado.
A experiência de Luziano mostra que, muitas vezes, os incêndios de grande proporção surgem das queimadas feitas dentro do limite legal das propriedades rurais, mas que saiu do controle. “Tem que olhar o vento, o horário, os recursos para controle dessas chamas…”, explica alguns cuidados necessários ao produtor rural que faz uso das queimadas para abrir novas lavouras. Na época do inverno goiano, é preciso redobrar esses cuidados, já que a vegetação seca somada aos ventos mais intensos facilita a propagação do fogo.
A narrativa compartilhada pelo delegado corrobora com um dado do MapBiomas sobre queimada recorrente. Segundo o estudo, 65% da área afetada pelo fogo no Brasil nos últimos 39 anos foi queimada mais de uma vez, sendo o Cerrado o bioma com a maior quantidade de área queimada recorrente. A cultura das queimadas como ferramentas ligadas à sazonalidade das lavouras reforça a validade dos dados obtidos no levantamento.
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O delegado Luziano explica que, no intuito de coibir essa prática, existem medidas ligadas à educação da população e também métodos coercitivos. Pensando em punições, existe reclusão de três anos para o produtor que realizar desmatamento ilegal, multa de R$ 50 mil por hectare desmatado e, em casos de recorrência, a propriedade rural pode ser embargada. “Tem multa que passa da casa do R$ 1 milhão”, exemplificou.
Todavia, o titular da Dema aposta na educação da população como principal ferramenta para diminuir os números do desmatamento no bioma. “A Polícia Civil não vai tratar o produtor como criminoso e sim como ator capaz de mudar a consciência e nós melhorarmos o estado de Goiás”, afirmou.

Ministério do Meio Ambiente
Diante da crescente no desmatamento do Cerrado, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) deu início à iniciativas no intuito de frear essa devastação. Em março deste ano, o Ministério convocou governadores dos estados que abrigam o Cerrado para firmar pacto contra a devastação do ‘berço das águas’ brasileiro. Criação de força-tarefa para ação conjunta, compartilhamento de bancos de dados e definição de municípios para ação prioritária são algumas medidas acordadas entre os governos estaduais e o federal.
O MMA destaca um aumento de 3% no desmatamento no Cerrado (dados obtidos com o Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite, Prodes) de agosto de 2022 a julho de 2023, em relação ao período anterior.
Ao mesmo tempo, o Ministério ressalta a diferença legal para propriedades no Cerrado e na Amazônia. Neste bioma, as propriedades privadas possuem uma margem de 80% da área com cobertura vegetal nativa protegidas pelo Código Florestal, o que permite 20% de desmatamento legal. Já no Cerrado, o cenário se inverte, já que o Código Florestal determina proteção para 20% da vegetação nativa em propriedades privadas, permitindo a devastação de 80% dessa cobertura vegetal.
No dia 27 de março, os governadores de Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Tocantins, Maranhão, e a vice-governadora do Distrito Federal firmaram compromisso no pacto com o Governo Federal para o combate à devastação do Cerrado. Luziano conta que a integração da Polícia Civil, das entidades ambientais, da população, com os órgãos do governo, com o Ministério Público e com o Poder Judiciário é fundamental para garantir a preservação do Cerrado.