Em uma entrevista recente ao jornal norte-americano The New York Times, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, abordou questões sobre o papel da Suprema Corte na defesa da democracia brasileira. Durante a conversa com Jack Nicas, chefe da sucursal do jornal no Brasil, Barroso destacou os desafios enfrentados pelo Judiciário diante de ataques e defendeu as ações do STF contra acusações de autoritarismo, que surgiram nos últimos tempos.

Barroso sublinhou que o STF tem agido de forma mais ativa em razão das ameaças à democracia que se intensificaram tanto no Brasil quanto no cenário global. “Estamos fazendo uma defesa vigorosa da democracia”, declarou o ministro. 

Questionado se essa defesa mais enérgica poderia estar prejudicando a própria democracia, ele argumentou que o contexto de ameaças justifica as medidas adotadas pela Corte. Para Barroso, o STF agiu para evitar o colapso do Estado democrático de direito, cenário observado em outros países.

Ataques e tensões políticas

O ministro relembrou momentos de grande tensão política no Brasil, quando o Judiciário foi alvo de ataques diretos. Ele mencionou eventos como o desfile de tanques militares em frente ao STF, uma tentativa de intimidação por parte de setores das Forças Armadas, e também os discursos agressivos do ex-presidente Jair Bolsonaro. “Tivemos um pedido do ex-presidente da República para que caças fizessem voos rasantes sobre o Supremo Tribunal para quebrar as janelas”, destacou Barroso, ao falar das tentativas de pressionar a Corte.

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Além disso, Barroso explicou que Bolsonaro apontou o STF como seu principal inimigo, o que gerou ressentimento em parte de seus eleitores, que lhe deram 49% dos votos no segundo turno das eleições presidenciais de 2022. “É surpreendente que não haja ressentimento contra o tribunal?”, perguntou Barroso de forma retórica. Ele argumenta que, diante da polarização política no Brasil, era esperado que o STF se tornasse alvo de críticas vindas dos apoiadores do ex-presidente.

Investigações sobre atos golpistas e redes sociais

Outro ponto abordado na entrevista foram as investigações conduzidas pelo STF em relação aos atos golpistas ocorridos após as eleições de 2022 e à suposta tentativa de golpe de Estado. Segundo Barroso, essas investigações estão próximas de serem concluídas. “Quase tudo o que precisava ser apurado já foi. Cabe ao procurador-geral [Paulo Gonet] apresentar a denúncia”, afirmou o ministro, sinalizando que os processos devem avançar em breve.

A discussão também incluiu a polêmica em torno da derrubada de conteúdos e perfis em redes sociais. Barroso esclareceu que a legislação brasileira é diferente da norte-americana no que diz respeito à liberdade de expressão. Ele argumentou que o Brasil não tolera discursos que incitam a violência, e que o STF tem atuado para garantir que conteúdos nocivos sejam removidos das plataformas. “A Constituição brasileira é muito diferente da americana, especialmente em relação à primeira emenda. Nós não aceitamos discursos de ódio ou que incitem violência”, pontuou.

Sobre o caso do bloqueio do X (antigo Twitter) no Brasil, Barroso foi enfático ao dizer que a decisão não teve motivação ideológica, mas sim legal. “A história do X é muito simples e não tem nada a ver com liberdade de expressão. Tem a ver com o Estado de Direito”, explicou.

Ele detalhou que a empresa cometeu um ato ilícito ao retirar seus representantes do Brasil, descumprindo a lei nacional que exige que empresas estrangeiras tenham uma representação oficial no país. “Portanto, o X não pôde atuar no Brasil até que regularizasse sua situação”, concluiu o ministro.

Defesa da democracia e do pluralismo político

Barroso também aproveitou a oportunidade para ressaltar a importância do pluralismo político e a legitimidade de diferentes perspectivas dentro de uma democracia saudável. “O conservadorismo é uma opção política legítima”, afirmou o presidente do STF, destacando que é essencial que existam pontos de vista variados no debate político.

No entanto, ele foi categórico ao afirmar que o extremismo e a intolerância não devem ter espaço. “Intolerância, agressão verbal, discurso de ódio e violência física. Isso é o que considero inaceitável”, destacou.

Nesse sentido, o ministro reforçou que o papel do STF é garantir que a democracia proteja não apenas os direitos de quem pensa diferente, mas também os limites do que é considerado aceitável em uma sociedade democrática. A Suprema Corte, segundo Barroso, está empenhada em garantir a paz social e a coexistência de diferentes correntes ideológicas, desde que estas não incitem a violência ou ataquem as instituições democráticas.