UEG concede título de Doutora Honoris Causa à líder quilombola Procópia dos Santos Rosa
10 dezembro 2022 às 08h20
COMPARTILHAR
Aos 89 anos, Procópia dos Santos Rosa, líder Kalunga reconhecida por sua forte atuação em prol dos direitos de seu povo, recebeu homenagem do Governo de Goiás durante a semana. Em solenidade realizada na comunidade Kalunga Riachão, em Monte Alegre de Goiás, a matriarca foi agraciada com o título de Doutor Honoris Causa. Esta é a maior outorga concedida pela Universidade Estadual de Goiás (UEG) a personalidades que tenham se distinguido pelo saber em prol das artes, das ciências, da filosofia, das letras e para o melhor entendimento entre os povos.
A UEG já formou mais de 100 mil pessoas e este é apenas o 9º título de Honoris Causa entregue – o primeiro a uma mulher negra.
Mesmo sem ter tido acesso a estudo formal durante a vida, Dona Procópia rompeu paradigmas de um período em que mulheres não podiam sair da comunidade. A partir dos 50 anos, começou sua atuação em defesa do território Kalunga, envolvendo-se na luta contra o racismo e pelo empoderamento das mulheres. Graças aos esforços, o Conselho Superior Universitário aprovou a outorga do título por unanimidade. O processo de concessão tramitou por quase um ano, passando por todos os ritos formais.
Durante a solenidade de entrega da honraria, na última quarta-feira, 7, ela agradeceu o título e deixou uma mensagem que resume sua própria essência: “Se não fosse a união, aqui não tinha nada. Hoje todos estão se formando, e quem esperava por isso? Aconteceu porque a gente correu atrás, com união e paz”, destacou. “Se unam. Não deixem o Kalunga ir abaixo”, pediu a matriarca.
O reitor da UEG, Antonio Cruvinel, enalteceu a homenageada. “Alguém da comunidade me perguntou se eu tinha vindo formar Dona Procópia. Digo que nós é que somos formados por ela. A UEG se engrandece ao entregar esse título a quem formou centenas de pessoas com suas ações, que dedicou a vida ao que acredita. Se cada um fizesse o que ela fez em sua comunidade, o mundo seria melhor”, salientou.
Neta de dona Procópia, Lourdes Fernandes de Souza, que é diretora das escolas estaduais da comunidade Kalunga, destacou que o título é precedido de outros gestos de grande impacto ou simbolismo que a UEG dirige à comunidade negra. “A concretização desse momento é uma afirmação do marco histórico para o quilombo Kalunga e seu povo, bem como o reconhecimento dos valores humanos, em especial uma matriarca de 89 anos: mulher negra, quilombola, que não teve oportunidade de estudar e, mesmo assim, com coragem e fé, junto a outras lideranças, lutou fortemente contra a discriminação”, lembrou.
Vida
Nascida no dia 10 de fevereiro de 1933, a líder Procópia dos Santos Rosa vive na comunidade Kalunga, do lado direito do rio Paranã, no município de Monte Alegre de Goiás. Com 89 anos, a matriarca é mãe de dois filhos, 12 netos, 70 bisnetos e 15 tataranetos.
Aos 50 anos, rompeu um costume da comunidade de que somente os homens podiam ir à cidade e foi pela primeira vez a Monte Alegre. Aos 60, conheceu a capital do Estado. Sua força e determinação a tornou um nome conhecido por toda a comunidade. Lutou contra o racismo e conseguiu unir a comunidade para buscar benefícios como a titulação das terras, energia elétrica, escola e internet. A líder quilombola também se destaca na defesa do meio ambiente e na promoção da harmonia entre os povos.
A atuação da líder quilombola fez com que a Organização das Nações Unidas (ONU) a indicasse, em 2005, para concorrer ao Prêmio Nobel da Paz, entre mil mulheres do mundo, sendo apenas 52 brasileiras. Mesmo não tendo levado o prêmio, a líder ressaltou a importância da indicação. “Fiquei muito feliz por levar o nome do Kalunga para o mundo todo”, destacou.