Senador defende que seria melhor o ex-ministro da Saúde ter pedido para sair, já que não concordava com 100% do que o presidente diz

Senador Vanderlan Cardoso (PSD) em sessão plenária virtual
Senador Vanderlan Cardoso (PSD) em sessão plenária virtual | Foto: Leopoldo Silva/Agência Senado

Defensor da retomada com equilíbrio das atividades econômicas em municípios e Estados brasileiros, o senador Vanderlan Cardoso (PSD) tem acompanhado com cautela as discussões de projetos que tramitam no Congresso. O parlamentar diz que o governo tem demorado na tomada de decisão para socorrer empresários e trabalhadores. Mas que, dentro do possível, começou a agir. Como no caso do auxílio emergencial de R$ 600 aos informais.

Vanderlan critica a PEC 10/2020, Proposta de Emenda à Constituição apelidada de “orçamento de guerra”. Para o senador, muitas pautas encontraram na pandemia da Covid-19 cenário ideal para a aprovação sem análise. “Há situações em que a Covid-19 está sendo usada como desculpa para serem aprovadas. Tudo agora é a Covid-19.”

Sobre a demissão do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, o senador afirma que, conhecendo o perfil de atuação do presidente, não havia outro caminho a não ser a troca do titular da pasta. “Não tem condições de um ministro conduzir da forma que o Mandetta fez e ficar por isso mesmo”, pontua Vanderlan.

No final de março, o sr. fez um apelo ao presidente Jair Bolsonaro para que ele assuma o comando das ações de combate à pandemia da Covid-19. Qual foi a intenção ao gravar aquele vídeo?
Até então, o que víamos de medidas efetivas eram definições muito tímidas. A Medida Provisória que autorizava as empresas a mandar o funcionário para casa durante quatro meses sem receber fazendo cursos não é uma medida que se apresente. Como as empresas vão mandar o funcionário para casa? O funcionário vai viver de que? Vai receber o que?

Não tínhamos visto nenhum projeto para salvar as empresas, as pequenas, micros, médias e grandes, como vemos agora. Aquele vídeo era para que o presidente assumisse de fato o controle. Porque seus ministros, como o ex-ministro da Saúde [Luiz Henrique Mandetta], estavam voltando a atuação para aparecer muito mais do que o presidente.

Entendo de hierarquia. Tudo que o ministro tinha de fazer era de comum acordo com o presidente. Lógico que podendo colocar a sua opinião. Mas uma hora fala uma coisa e outra hora falava outra, a depender do Estado e o meio de comunicação no qual estava. O vídeo foi para que Bolsonaro assumisse tanto a questão da economia com projetos concretos. Apresentei algumas ações que precisavam ser feitas, como a ajuda às Santas Casas, repassar recurso para a população.

Logo em seguida tivemos o projeto dos informais, com os R$ 600 do coronavoucher. Apresentei uma emenda que incluiu os trabalhadores intermitentes. E falo com propriedade porque faço parte da base e tenho votado junto com o governo em cerca de 90% dos projetos para aprovar as matérias de interesse do nosso País. Era um vídeo com tom de alerta para dizer ao presidente que está no momento de Bolsonaro assumir o comando e não deixar que as coisas tomem outro rumo.

Publiquei o vídeo em uma terça-feira – 24 de março. No dia seguinte vimos que surgiram medidas concretas para o País no enfrentamento à Covid-19.

O sr. falou que entende bem de hierarquia e que entendeu que em alguns momentos o ex-ministro da Saúde e o presidente se colocaram em um confronto. Como o sr. vê a relação de Bolsonaro e Mandetta?
Desde que Mandetta assumiu o Ministério da Saúde, elogiei o ex-ministro algumas vezes. O programa Saúde da Família é um projeto muito bom. Só que passou o tempo e, quando veio a Covid-19, os holofotes acenderam no ministro, talvez por uma pretensão política. Por muitas vezes, Mandetta desfez o que o presidente falava. O ministro não tem de concordar com 100%, mas havia várias maneiras de dialogar com o presidente.

Mas se o ex-ministro não concorda com 100% do que presidente diz, mesmo que seja em parte ou discorde de tudo, seria melhor ter pedido para sair. Por outro lado, o presidente não teve pulso para demitir o Mandetta há cerca de 30 dias. Tínhamos a certeza de que esse conflito não duraria muito tempo. Não tem condições de um ministro conduzir da forma que o Mandetta fez e ficar por isso mesmo. Conhecendo o presidente e sua forma de agir, o ministro seria mesmo demitido.

Por outro lado, o presidente tem descumprido medidas restritivas e feito declarações que contrariam as orientações das autoridades de saúde. Como o sr. entende que população recebe essas informações? E como o sr. vê as ações do presidente quando Bolsonaro contraria todas as recomendações?
Temos de separar as questões. Uma coisa é o que governadores têm tomado de medidas. Outra é como o ex-ministro conduzia o combate à Covid-19. E há também o que o presidente tem feito, que não concordo em hipótese alguma. Você acha que eu concordo com a ida a Águas Lindas para vistoriar o início das obras de um hospital de campanha com o ministro da Saúde, o governador do Estado e o presidente da República? Quem é que não sabia que ali daria aquela quantidade de pessoas? Quem não conhece o modo como o presidente age quando vê a população? Bolsonaro vai cumprimentar. O que o ministro e o governador foram fazer lá?

Antes do álcool em gel na mão, tivemos cenas de o presidente chegar e abraçar. Os holofotes complicam muito as coisas. Quando se quer aparecer nacionalmente, a situação complica. O presidente tem mostrado, em várias ações, que tem descumprido e desrespeitado as recomendações da OMS [Organização Mundial da Saúde]. É a forma do Bolsonaro. O presidente não mudou o discurso desde o início da pandemia. O presidente sempre fala que temos de conciliar a orientação da OMS, embora Boslonaro descumpra, com a questão da economia.

Mandetta tem entrevista, com gravação do ex-ministros, dizendo “o presidente está corretíssimo” em querer conciliar economia com a prevenção à Covid-19. E não disse isso só uma vez. O ex-ministro ia para outro Estado e mudava o discurso. Isso é ruim. Em um ponto Mandetta está certo, a população está sem saber a quem deve atender.

Fui prefeito. Há pastas em um governo que não podem ser preenchidas por políticos. Pode ter uma indicação política. Mas, no caso da Saúde, tem de ser técnico. No caso de uma crise na saúde, com os holofotes em cima, se a pessoa não for muito equilibrada ou tiver a intenção de disputar o governo do Estado. No caso do ex-ministro Mandetta, já se fala hoje em ser candidato a presidente da República. Qual é o maior problema que está ocorrendo nesta pandemia? Briga política.

Vejo muitos que não estão preocupados em ver como está a situação do cidadão. Mas já se avalia quem está certo ou errado. Juntou-se um grupo de governadores que só atacam. Mas se trabalha, pelo projeto que foi aprovado na Câmara, com o socorro aos Estados e municípios sem contrapartida nenhuma.

O Projeto de Lei Complementar número 149/2020, que prevê a compensação da perda de ICMS e ISS?
Exatamente. Qual é a contrapartida? Qual é o plano de austeridade? Parece muito simples. Governadores proíbem tudo, a arrecadação vai diminuir, mas o governo federal colocará o recurso nos Estados e vai ficar por isso mesmo. De onde vão sair os recursos? Como vai ser?

Não é só este projeto. Muitos projetos no Congresso Nacional, como a PEC 10/2020, em que foram colocados muitos jabutis para atender os bancos. Há situações em que a Covid-19 está sendo usada como desculpa para serem aprovadas. Tudo agora é a Covid-19.

O que eu vejo de errado do governo eu critico. A Medida Provisória 930 dá isenção de tributos aos bancos retroagindo a janeiro de 2018. Em janeiro de 2018 ninguém nem sabia o que era o novo coronavírus! Fazem isso porque os bancos passaram a ter um lucro exorbitante com swap cambial. São R$ 42,5 bilhões só neste ano de lucro dos bancos com swap cambial. Tem muita coisa que a população precisa saber.

A população precisa saber como o País vai sair com tantos aproveitadores, com tantos projetos de lei sendo aprovados. Aprovar uma PEC no meio de uma pandemia? PEC tem de ser discutida. Não pode ser desse jeito. Temos de preservar os empregos de uma forma equilibrada.

Minhas empresas, do setor de alimentação, tanto no Centro-Oeste, em Senador Canedo, como do Norte e do Nordeste, estão abertas. Os postos estão funcionando, as farmácias estão funcionando. Tem muita coisa que está aberta. Em Goiás, até as feiras foram autorizadas a funcionar. Qual é a diferença do meu funcionário para o trabalhador de uma pequena indústria que está fechada e do cidadão que precisa sobreviver? Vamos escolher agora quem vai morrer? É isso?

É preciso fazer de uma forma equilibrada. Cito bastante o vídeo do ACM Neto (DEM), prefeito de Salvador (BA), que tem mostrado de uma forma tranquila como irá funcionar. Nos shoppings, as lojas até 200 metros quadrados com determinadas regras. Qual é a regra para o comércio nas avenidas, com muito rigor na higiene, álcool em gel, máscara para atender os clientes. É a economia junto com a prevenção durante a pandemia.

Não é dizer que o senador Vanderlan é favorável que abra tudo ou de comum acordo com tudo que o presidente fala. Não. De forma alguma. Se você viu o vídeo que gravei para o presidente e a equipe econômica, reparou que tem duração de dez minutos. Porque é a maneira que o presidente se comunica. Não é pelas redes? Vamos falar com o presidente pelas redes. Não programei nada, não fiz texto. Precisava alertar o presidente do que estava ocorrendo.

Além do alerta ao presidente, o sr. fez cobranças à equipe econômica de medidas para salvar empresários e trabalhadores. O sr. avalia que as medidas demoraram a ser adotadas?
Demoraram muito a perceber o ponto que chegou o País e que já deveriam ter sido tomadas medidas emergenciais para salvar os empregos e as empresas. Para atender o cidadão, pegou-se um projeto que já estava há algum tempo na Câmara dos Deputados. Começou com R$ 200. Passou para R$ 300. A Câmara discutiu e subiu para R$ 500. Devido à gravidade, o presidente reuniu a equipe econômica e definiu-se o valor em R$ 600.

São R$ 98 bilhões que serão distribuídos e que começaram a chegar aos brasileiros. Começamos com um estudo de 6 milhões de trabalhadores intermitentes, mas pode chegar a 20 milhões apenas de intermitentes. Até então, não tínhamos quase nada. Entre a votação do projeto, na qual o Congresso agiu rápido, até sancionar a lei e viabilizar a chegada dos recursos passaram apenas 15 dias. Nos Estados Unidos, os US$ 1,2 mil de ajuda têm previsão de começaram a ser repassados em 30 dias. Aqui foi em 15 dias.

Depois que o presidente chamou o ministro Paulo Guedes (Economia) e disse que era preciso resolver o problema. Não é mandar o trabalhador para casa por quatro meses que vai resolver. Autorizar as empresas a suspenderem o pagamento do Fundo de Garantia, um dinheiro do trabalhador, é algo que Paulo Guedes deveria apresentar? Por isso fiz as críticas à equipe econômica. Naquele vídeo eu falava das reservas internacionais que nós temos. São quase US$ 2 trilhões em reservas.

A equipe econômica começou a discutir o uso de parte das reservas.
Citei a questão das reservas como parâmetro, porque temos R$ 1,4 trilhão no caixa único do Tesouro que precisa ser usado neste momento. Os R$ 98 bilhões vão sair do caixa único. O pacote chega a quase R$ 800 bilhões de tudo que foi anunciado. Não precisa nem usar as reservas. O que eu disse é que reservas são para momentos ruins. E estamos vivendo um momento ruim. Se usarmos US$ 50 bilhões das nossas reservas, teremos R$ 260 bilhões.

Temos recursos. O País tem recurso. Mas tem de agir mais rápido. Só que a equipe econômica quis tirar 50% do Sistema S em um momento difícil. Vai causar desemprego no Sistema S. Estão jogando para a plateia a questão dos R$ 2 bilhões do fundo eleitoral. Alguns parlamentares questionam quem é contra ou a favor do uso no combate à Covid-19.

Esquecem que está na PEC 10/2020, no artigo 115, parágrafos 9º e 10º, a autorização para o Banco Central comprar no mercado secundário, ou seja, ir aos bancos e comprar as dívidas de crédito, os chamados créditos podres. Uma brincadeira que custará R$ 1 trilhão. Vamos usar o caixa único para salvar banco? Precisamos do sistema bancário, mas não da forma como será feito, ao dizer que salvarão as empresas. Não vão salvar as empresas. Vão salvar os bancos.

“Estão jogando para a plateia a questão dos R$ 2 bilhões do fundo eleitoral. Alguns parlamentares questionam quem é contra ou a favor do uso no combate à Covid-19”

“Só que a equipe econômica quis tirar 50% do Sistema S em um momento difícil. Vai causar desemprego no Sistema S” | Foto: Jane de Araújo/Agência Senado

Quando o sr. fez aquele apelo ao presidente e à equipe econômica no vídeo, o Supremo Tribunal Federal já tinha concedido uma liminar que autorizava o aumento da dívida pública da União e Congresso aprovado o decreto de calamidade pública. Mesmo que o sr. diga que 15 dias é um prazo pequeno, o governo não tinha condição de começar a pagar o auxílio emergencial antes?
O projeto original tratava apenas dos informais, que foram os primeiros que começaram a receber. Bolsa Família, quem já estava no Cadastro Único, que entraram primeiro na lista do benefício. Os intermitentes, que entraram com a emenda de minha autoria, o governo não tinha dados concretos. Os dados que temos dão conta de que mais 20 milhões de pessoas terão direito aos R$ 600.

Entre informais e intermitentes, a previsão inicial era chegar de 30 milhões a 32 milhões de pessoas. Já estamos chegando a 50 milhões. Como será feito um controle rígido para que não haja fraude? Isso tem um tempo para ser feito. Demorou a agir logo no início. Se tivesse sido feito no começo, já estaria resolvido. O dinheiro já estaria na economia. O pessoal vai ficar em casa, mas ao menos o dinheiro para comprar o arroz, o feijão e o remédio a pessoa teria. Os que mais precisam.

O governo demorou a agir. As primeiras medidas que vieram foram pífias. Fora dois projetos para salvar as empresas, o que foi proposto: Fundo de Garantia? Depois que foi aprovada a suspensão de pagamento de Pis/Cofins, INSS. Não é o perdão. As empresas terão de pagar parcelado. Se sobreviverem. Precisamos de ver o recurso chegar. Foram anunciados R$ 40 bilhões para as micro e pequenas empresas. É um dinheiro que precisa ser desburocratizado para chegar às empresas.

O Banco Central anunciou em março as linhas de crédito a juros de 3,75%. Como o sr. avalia a forma em que os empréstimos serão concedidos?
É uma medida que está demorando muito. Tem de ser simplificada cada vez mais. Ao colocar muita burocracia, as empresas vão buscar os recursos porque estão passando por dificuldade, senão não iriam. Se coloca tanto detalhe para ter acesso aos empréstimos que as empresas não vão conseguir o dinheiro. Gerente de banco está perdido, escondendo dos empresários as linhas de crédito.

Um amigo que tem duas lojas em Goiânia disse que foi ao banco mas não conseguiu informação, ninguém sabe falar nada. Os bancos estão dificultando, não querem emprestar para não correr risco. Anunciaram que o governo liberou quase R$ 300 bilhões de compulsório para os bancos emprestarem. O banco vai emprestar sem garantia? Subiram os juros para ninguém pegar empréstimo.

A taxa de 3,75% de juros na verdade será maior na hora de pegar o empréstimo com o banco?
Foram lançadas várias frentes. Primeiro veio a liberação do compulsório. Não é um recurso do governo federal, não é de banco federal nem do caixa do Tesouro. É o dinheiro que estava retido dos compulsórios, que o nosso dinheiro depositado em conta. Parte do recurso é retido pelos bancos. Chegou a ser de 40%, hoje está em 16%.

O governo liberou esse recurso para os bancos emprestarem. Nas contas do governo, os bancos estão com o dinheiro em caixa e têm de emprestar. Se há muito recurso, os juros abaixam. Mas isso em tempos normais. Não em meio à Covid-19, quando a empresas passam dificuldade. E ninguém teve acesso ao dinheiro. Colocou-se muita dificuldade para as empresas terem acesso ao recurso.

A outra tentativa é fazer chegar recursos do Tesouro e do Banco Central avalizados pelo governo. A forma que encontraram de fazer foi com a autorização para o Banco Centra comprar títulos no mercado secundário. Isso vai resolver a situação dos bancos, que vão pegar todos os créditos duvidosos, chamados de tóxicos ou podres. Há anos os bancos tentam passar esse problema para a União.

Defendo que os recursos sejam disponibilizados via aplicação direta do caixa do governo pelos bancos regionais e dos bancos oficiais para as empresas. Gostei muito do modelo francês para salvar as empresas. Limitou-se um valor de faturamento da empresa do ano anterior a € 300 bilhões. A empresa que fatura de € 1 mil até € 300 bilhões por ano terá direito a financiamento do governo, direto com a empresa, de três meses durante o ano. Se uma empresa fatura € 100 milhões, terá direito a € 25 milhões. É um modelo que vejo como interessante para o Brasil fazer o dinheiro chegar às empresas que estão passando dificuldade.

No modelo que fizeram, com autorização ao Banco Central para ir ao mercado secundário negociar direito com os bancos, um operador do BC vai decidir qual empresa tem de ser salva em negociação direito com o banco. Não vai salvar as empresas. Só os bancos. Por isso a PEC não foi aprovada. Estava pronta para ser votada na terça-feira da semana retrasada – 7 de abril. O Senado é uma casa revisora. Não podemos deixar isso passar. A Câmara votou em dois dias uma PEC desse tamanho. Você acha que teve discussão? Zero de discussão. Não cabe PEC.

Se o STF já reconheceu e foi aprovado na Câmara e no Senado a calamidade pública, o presidente já está autorizado a tomar as medidas necessárias, até com relação aos investimentos que têm de ser feitos, com a possibilidade de quebrar a regra de ouro.

Que avaliação o sr. faz da atuação do ministro da Economia, Paulo Guedes, e do secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida?
Vejo o Mansueto jogando muito para a plateia, querendo fazer graça com o chapéu alheio. Desde o início, tenho cobrado do ministro Paulo Guedes transparência em relação ao que o Banco Central e a equipe econômica têm feito. Nos pronunciamentos no Senado, tenho cobrado a questão da dívida pública. Por que 80% das nossas reservas estão em titulos do Tesouro americano e parte em bancos europeus? Por que recebemos a juro zero e pagamos um juro bem maior? Por que ainda somos o único país do mundo que remunera sobre de caixa dos bancos?

São questionamentos que fiz ao ministro. Pedi uma reunião para discutir a PEC 10/2020 e a MP 930 com o presidente do Banco Central [Roberto Campos Neto]. A sobra de caixa que o Brasil remunera aos bancos é o nosso dinheiro dorme na conta. Quando isso gerou aos bancos nos últimos dez anos? Quase R$ 1 trilhão. Mais do que a reforma da Previdência. Fico em dúvida com relação à condução do ministro da Economia e do presidente do Banco Central.

Da mesma forma como defendo que o ministro da Saúde tem de ser um cargo técnico – pode até ser uma indicação política, mas vamos buscar um técnico –, defendo que ministro da Economia, presidente do Banco Central, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal sejam técnicos dos quadros. Quando pegamos banqueiro e colocamos nesses postos, eles vão defender quem: o povo? Não vão. Defender Estado e município? Vão defender os bancos.

Mandetta estava indo muito bem, mas é um político. Ministro da Saúde tem de ser cargo técnico. Quantos técnicos bons temos país afora, até mesmo nos quadros do Ministério da Saúde. São vários. Paulo Guedes está comprometido até o pescoço com os bancos.

O sr. diz que é um momento difícil para se discutir uma PEC, até porque estamos em um momento atípico, que tem sido chamado de situação de guerra, mas temos visto o Congresso aprovar projetos com muita rapidez. Parece consolidada a proposta de criar um orçamento paralelo, o chamado “orçamento de guerra” [PEC 10/2020]. O certo é que os gastos com a pandemia sejam separados do orçamento de 2020?
Estão colocando nomes que só fazem mais confusão na cabeça do povo brasileiro. Por falta de informação, vimos a loucura que ficaram muitos Estados e cidades. Na segunda-feira, 13, tínhamos 14 pessoas internadas com Covid-19. E 74 suspeitas. Quando se fala em guerra, guerra é tomar medidas irresponsáveis, como foi a de proibir cirurgias eletivas no nosso País? A maioria dos hospitais particulares sobrevivem com cirurgias eletivas. Tenho conversado com proprietários de hospitais particulares no Estado e em São Paulo que não têm paciente. O atendimento na rede particular praticamente zerou.

Por que proibir as cirurgias eletivas? Estava previsto para durar até o final de março, passou para a primeira quinzena de abril e já prorrogou para depois do dia 15. Mas que se aguarde o momento em que será preciso usar toda a estrutura hospitalar, quanto podem parar as cirurgias eletivas. Pelo menos é preciso dar uma sobrevida para quem tem que pagar funcionários. Funcionários que estão desesperados porque a maioria já começou a ser dispensada. Faltou equilíbrio. É uma decisão irresponsável que veio do Ministério da Saúde.

Com o sufoco que os hospitais particulares estão passando, não tem como não demitir. Estão sem receber, sem prestar serviço. Como vão manter quase 400 funcionários? Isso em um único hospital.

Algumas medidas, no meio dessa história de guerra, como mandar bilhões para Estados e municípios sem qualquer contrapartida, incentivam que a farra continue como era antes, com gastos sem controle. Qual é a contrapartida prevista no projeto que substituiu o Plano Mansueto, que é o que foi aprovado na Câmara? Nem uma austeridade fiscal maior? Nada. Fica muito simples. Essa conta vai estourar. O projeto que estava em discussão antes chegava R$ 222 bilhões. Agora tudo é a Covid-19.

As autoridades médicas recomendam como medida necessária para reduzir o contágio e impedir um colapso do Sistema Único de Saúde o isolamento social. Ao mesmo tempo, Estados e municípios começam a ceder à flexibilização das atividades econômicas. Como o sr., como empresário, vê a discussão? O que seria o ideal?
Estamos com 53 dias do novo coronavírus no Brasil. Não vi ninguém dizer que não deveríamos fazer o carnaval porque viria muita gente da Europa, da China e de outros países. O equilíbrio é a base de tudo. Aglomerações em hipótese alguma. Como fazer um culto em uma igreja com 5 mil pessoas? Não tem jeito. Temos feiras enormes com muita gente que também não podem ocorrer.

Por onde andamos hoje vemos pessoas que já estão com o hábito de sair de casa de máscara e com o álcool em gel. Podemos abrir outras atividades. A indústria de alimentação ficou aberta desde o começo, as farmácias, posto de combustível, a área de saúde. Com muitas pessoas esclarecidas, que sejam liberadas as pequenas indústrias com cinco a dez funcionários, com as devidas recomendações.

Hoje está todo mundo apavorado. Quando faltar comida para os filhos, a pessoa vai sair de casa para fazer o que der, com o seu Covid-19. É preciso fazer tudo de uma forma equilibrada. Vejo como dois exemplos de equilíbrio o prefeito de Salvador e o governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), que conciliaram as recomendações da OMS com a economia.

Só quem passou ou passa por dificuldade que se coloca no lugar dos trabalhadores, que serão os mais prejudicados. O dono de empresa vai perder a sua empresa. Muitos já perderam, não têm mais como recuperar. Os empresários se viram, sempre terá algo. Mas o trabalhador, aquele que o dinheiro é praticamente só para comer, viverá uma onda como na época do [Fernando] Collor, quando os recursos foram confiscados, tínhamos notícias de pessoas que tiraram a própria vida. E isso infelizmente voltou a ocorrer. Bate o desespero no pai de família quando não tem o que levar para os seus filhos.

“Só quem passou ou passa por dificuldade que se coloca no lugar dos trabalhadores, que serão os mais prejudicados”

“O trabalhador, aquele que o dinheiro é praticamente só para comer, viverá uma onda como na época do [Fernando] Collor, quando os recursos foram confiscados, tínhamos notícias de pessoas que tiraram a própria vida” | Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
A suspensão do contrato do trabalhador por quatro meses foi reduzida para até dois meses, houve a criação da possibilidade de redução do salário com compensação do governo federal e discute-se o congelamento dos vencimentos dos servidores públicos por dois anos. Como o sr. avalia essas medidas?
É uma medida muito boa a possibilidade de o governo compensar o valor do salário reduzido. A suspensão do contrato do trabalhador por dois meses ou a renegociação depende muito da faixa salarial. Se um funcionário ganha mais de dez salários mínimos, talvez seja possível negociar a redução do salário. Mas como negociar com um funcionário que ganha R$ 2 mil por mês? Vai propor uma redução de 5%? É onde o governo tem de agir. E tem agido. Mas precisa ser um pouco mais rápido.

Com relação aos servidores públicos, o congelamento por dois anos tem de ser estudado para os altos salários. A partir de determinado valor se congela. Temos categorias que não recebem aumento há anos. E o cidadão recebe uma mixaria. É preciso haver, de forma equilibrada, um estudo para que isso possa ser feito por faixa salarial. Há casos, principalmente no Poder Judiciário, em que a pessoa já ganha bem. Não é que não mereça. Estudaram muito para ocupar os cargos. Mas podem contribuir mais.

Cada caso é um caso. Vejo na Assembleia Legislativa se discutir uma proposta de redução de 50% nas despesas. No Congresso, é preciso discutir a redução de custos.

Sabemos que o momento para qualquer outra discussão fica impossível, mas há cenário para uma possível privatização dos Correios no Congresso?
O momento não é para discutir privatização nenhuma. Tudo que for vendido agora é a preço de banana. Inclusive os chineses estão comprando meio mundo. A economia da China não foi afetada. Países como a França já trabalham com PIB em 2020 de 8% negativo. Brasil fala em queda de 5%. A China terá crescimento. Estão com muito dinheiro e comprarão a preço de banana no mundo inteiro.

A China é um grande parceiro comercial do Brasil. Mas como reverter a dependência de insumos chineses para fabricação de tudo?
A China é realmente um grande parceiro comercial do Brasil. Mas em que: commodities, soja, alimento? Ouvi em uma entrevista recente um alerta feito sobre a venda intensa de soja para a China. Chegaremos a agosto e setembro sem soja para esmagar. Há três anos tivemos o problema do preço do milho, quando faltou nas granjas para criar frango, fazer os embutidos, ração do porco, do boi. Com a falta da soja, falta o óleo, a margarina.

Se exportar a soja com o dólar alto, falta o produto no Brasil e dispara o óleo de palma, de algodão. Na base da alimentação do brasileiro, tudo tem óleo, trigo, que já está lá nas alturas porque produzimos 15% a 20% do trigo que consumimos. Já viu a China comprar do Brasil farelo de soja, óleo de soja, soja transformada, minério transformado em barra? Só commodities. Navios e navios encostam e levam. E precisamos vender.

Alertei a ministra Tereza Cristina (Agricultura) que precisamos organizar o estoque de alimentos para atender a demanda do nosso País. Senão vamos ficar com a conta do coronavírus e o Brasil de barriga vazia. Ou tendo que exportar milho como importamos há três anos. Brasil, um dos maiores produtores de milho, teve que buscar milho de fora porque vendeu tudo. É um controle que não está sendo feito.

O ministro Luís Roberto Barroso assume a presidência do Tribunal Superior Eleitoral em maio. Barroso é contra a prorrogação das eleições municipais para 2021. O ministro defende a realização do pleito no final deste ano. Qual é a dificuldade neste momento de fazer trabalho partidário? Como o PSD tem enfrentado o momento de impossibilidade de realização de reuniões presenciais?
Temos feito muitas reuniões da forma como estamos conversando aqui, por meio virtual. Um dos momentos mais corridos que há para uma eleição é o momento das filiações. E ocorreu sem trauma. Fiz inúmeras reuniões com pré-candidatos e pessoas que se filiaram no partido do Estado inteiro. O PSD se fortaleceu muito em número de pré-candidatos. Ministro Barroso é um legalista, sabe que se houver mudança para unificar as eleições em 2022 é preciso ser através de uma PEC. Não há clima para discutir isso. Ficou acertado no Congresso Nacional que a única PEC que seria discutida é a PEC 10, a PEC do “orçamento de guerra”.

Talvez as eleições sejam adiadas em um ou dois meses. Mas as eleições serão realizadas neste ano. Não ficarão para 2021 ou 2022. Não tem clima para discutir isso agora. Temos de centrar nossas discussões na Covid-19, no emprego, em salvar as empresas. Precisamos unir nossas forças para resolver esse problema.

“Se não tivesse ocorrido a pandemia, a discussão pré-eleitoral estaria mais intensa”

“O que a população menos quer é discutir eleição agora. Todos, inclusive a classe política, não querem discutir eleição” | Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado

Informações de bastidores dão conta de que o sr. será candidato a governador em 2022, e não colocará seu nome na disputa para prefeito de Goiânia. O sr. apoiará a pré-candidatura do deputado federal Francisco Júnior (PSD)? Ou há uma disputa aberta para consolidar o nome do PSD nas eleições da capital?
Dentro do PSD não há disputa entre mim e o deputado Francisco Júnior. Temos sim um diálogo de dois amigos. O que temos conversado e acertado as filiações, formação de chapas, na busca de pré-candidatos a vereadores, vice-prefeitos, prefeitos, como é o caso de alguns municípios.

O segundo passo que virá é a discussão em Goiânia. E por último quem será o candidato. Se for o Francisco, vou apoiá-lo 100%. E tenho certeza que se eu for o candidato, o deputado Francisco me apoiará 100%. Não há problema nenhum dentro do PSD como essa questão.

Francisco Júnior tem todo o meu respeito, me ajudou e me apoiou no segundo turno em 2016. É um cidadão honrado. Nossas ações são feitas em conjunto. Dos quase R$ 22 milhões de emendas de bancada, 100% foram destinados para a saúde. Foi um entendimento nosso. Não tiramos R$ 1 para outra área. Só para o combate ao coronavírus nos municípios. Não há essa disputa dentro do partido entre mim e Francisco Júnior.

O PSD entende que há um momento certo para se definir quem será o candidato a prefeito? Seria melhor fazer logo a decisão ou isso pode ser deixado para depois?
Pode ser deixado para depois. Se não tivesse ocorrido a pandemia, a discussão pré-eleitoral estaria mais intensa. O que a população menos quer é discutir eleição agora. Todos, inclusive a classe política, não querem discutir eleição. Precisamos esperar a pandemia para fazer um balanço. Depois de tudo, teremos pesquisa, levantamento de dados e outras ações. Agora não dá nem para fazer uma pesquisa.

O eleitor que votou em mim para o Senado vai compreender uma candidatura à Prefeitura de Goiânia. Nós temos de saber disso. É algo que se faz com pesquisa. Se um entrevistador chegar hoje em uma casa, o pessoal coloca ele para correr. Ainda mais com pergunta eleitoral.

Quem seria o candidato mais competitivo no MDB: o prefeito Iris Rezende ou o ex-prefeito de Aparecida de Goiânia, Maguito Vilela? Como está a relação com o presidente estadual do MDB, o ex-deputado federal Daniel Vilela, com quem o sr. construiu uma boa relação nas eleições de 2018?
Excelente. Daniel é um amigo, um companheiro. Me ajudou muito na campanha ao Senado. Daniel, Maguito. Grande parte dos emedebistas. Só deixei amigos no MDB quando passei pelo partido durante um ano.

Se for Iris Rezende, que é o candidato natural por estar no cargo, é um bom candidato. Se for o Maguito também é um candidato forte do MDB. Teremos um ou o outro. MDB não vai ficar sem candidato em Goiânia.

PSD tem dois pré-candidatos, eu ou Francisco Júnior. Do bom entrosamento que tivemos, não só na última eleição, temos uma boa relação, se tivermos como continuar em Goiânia, como estamos fazendo em alguns municípios, a decisão não é só minha. A decisão é do partido. Temos o presidente Vilmar Rocha, o próprio Francisco Júnior, vereadores, deputados e uma série de pessoas que com certeza vão decidir. Não é só minha a decisão.

Se você observar os outros pré-candidatos, são todos nossos amigos e companheiros. Deputado federal Elias Vaz (PSB), vereadora Dra. Cristina (PL). São inúmeros os pré-candidatos. Temos muita afinidade com todos.