Paz? Com o Hamas?

22 agosto 2015 às 12h33
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Em meio a rumores de negociações secretas, o inimigo pode se tornar um parceiro para a paz. Mesmo que ela tenha prazo de validade
Afinal, Israel e o Hamas estão ou não negociando um acordo de “paz” duradoura? Essa é a pergunta, que desde a semana passada, permeia desde o gabinete do primeiro-ministro israelense aos vilarejos e cidades que ficam bem perto da fronteira com a Faixa de Gaza.
O governo turco e o Hamas afirmaram que há diálogos intensos entre autoridades israelenses e líderes do grupo islâmico. Ao saber das conversas “secretas”, a Autoridade Palestina, que governa a Cisjordânia, passou a acusar o Hamas de tentar implantar um novo Estado em Gaza com o apoio de Israel. O gabinete israelense negou imediatamente a acusação, mas sem mais delongas.
“Não há contato direto ou indireto com o Hamas”, disse o premiê de Israel, que negou qualquer tipo de conversa com os inimigos. Mas, como no Oriente Médio tudo é possível, não deu pra ficar impressionado com a “firmeza” de Benyamin Netanyahu ao afirmar que com o Hamas não há diálogo. Porque mesmo que nesse momento não haja nenhum contato, isso não significa que não tenha havido alguma aproximação, ou que não possa haver, em um futuro bem próximo.
Quando Israel negociou a libertação do soldado Gilad Shalit, que ficou cinco anos nas mãos do Hamas em Gaza, e ,depois foi trocado por mil prisioneiros palestinos ou até mesmo todos os acordos de cessar-fogo, inclusive o atual, não surgiram do nada. Quando rumores, como o dessa semana se tornam fortes, nem mesmo o primeiro-ministro consegue disfarçar.
Negociações que podem levar a um longo cessar-fogo interessam à política implantada pelo governo israelense. Afinal, construir um novo porto marítimo na Faixa de Gaza não requer retirar os colonos dos territórios ocupados, o reconhecimento do Estado Palestino ou a garantia dos direitos civis dos quase 2 milhões de residentes de Gaza. A reabilitação econômica do território palestino controlado pelo Hamas, a ideia de troca da paz pelo crescimento e desenvolvimento econômico, interessam ao gabinete israelense. E o motivo não é ideológico, pelo contrário, o que estimula Netanyahu é a possibilidade de conseguir trazer tranquilidade para os moradores do sul de Israel. É mesmo inconcebível que verão sim, verão não, uma guerra se inicie em Gaza. Alcançar um acordo não é somente interessante para Israel, mas também para o Hamas, seus líderes e toda a população da Faixa de Gaza que sofre pela falta de moradias (destruídas na guerra do ano passado) e desemprego.
As forças de Defesa de Israel, mesmo antes do último conflito em 2014, já vinha pedindo ao governo que facilitasse a entrada e saída de comida, remédios e materiais de construção através da fronteira, o que vem sendo implementado diariamente há algumas semanas, sem interrupções. Recentemente, o Hamas passou pelo teste de interromper o terrorismo dentro de seu próprio território. E sucedeu de forma exemplar. Provou que tem habilidade para interromper grupos radicais que atuam na Faixa de Gaza lançando foguetes contra o sul de Israel. Ideologicamente o grupo está agindo contra a própria natureza, e intermamente está dividido, porque enquanto mantém a calma na fronteira israelense, agora teme o vizinho Egito, que luta contra o “pai” do Hamas, a Irmandade Muçulmana, e por isso que volta e meia fecha a única passagem que ainda resta aos palestinos de Gaza. Uma janela de oportunidade se abre diante dos olhos de Israel.E para o Hamas também. A máquina militar do grupo já pode estar até reabiliitada, mas não há nenhuma movimentação da comunidade internacional de reconstruir o enclave que ficou devastado na última guerra. Apenas promessas não cumpridas. Entre a população de Gaza há tanto ressentimento contra o Hamas, que uma rebelião contra o governo pode começar a qualquer momento. Um acordo com Israel parece ser a melhor proposta. talvez a única.
E como não há limites para a ironia, vejam só: o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, chegou à conclusão e declarou recentemente que não há mais chances de conduzir um processo de paz diplomático com o governo de Benyamin Netanyahu. O Hamas, surpreendentemente, surge como um sério parceiro. Se a notícia de que Abbas pretende visitar o Irã em outubro se confirmar, então Israel poderá acusar o líder palestino do que vem fazendo há anos, e dizer que Mahmoud Abbas não é um parceiro para negociar a paz com os palestinos. Será o enterro diplomático de Abbas, e então eis que surge o Hamas, de inimigo mortal a parceiro para a paz… sem escalas.