Mudança de embaixada dos EUA de Tel Aviv para Jerusalém pode ser explosiva

28 janeiro 2017 às 14h27

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Mudança de endereço é o reconhecimento do governo de Donald Trump de que Jerusalém é a capital de Israel. O assunto é crucial em qualquer discussão sobre a paz no Oriente Médio, pois palestinos querem Jerusalém como sua futura capital

Foram precisos apenas alguns dias na Casa Branca para Donald Trump diminuir as expectativas sobre a mudança da embaixada dos Estados Unidos de Tel Aviv para Jerusalém. Sean Spicer, o porta-voz da Casa Branca, declarou, na semana passada, que “não existe nenhuma definição imediata sobre o assunto, e que as discussões ainda estão em um estágio inicial”.
A mudança abrupta no tom resulta do encontro entre a “turma” de Trump e as realidades que deverão enfrentar num Oriente Médio desgovernado e caótico. A equipe do novo presidente dos Estados Unidos já sabe que, ao mudar o endereço da embaixada em Israel, as consequências serão potencialmente perigosas e explosivas, não só para o Estado judeu, mas também para os americanos. Mas, diferentemente de alguns de seus antecessores, que também prometeram a mudança da representação americana em Israel para Jerusalém, mas não cumpriram, Trump garantiu que vai honrar a promessa.
Polêmica antiga
A discussão pode parecer polêmica, mas não é nova. Desde a criação do Estado de Israel, há quase 70 anos, que os Estados Unidos se recusam a reconhecer Jerusalém como sua capital. Pelo plano da partilha de 1947, quando a Palestina foi dividida, Jerusalém foi classificada como uma cidade internacional. Com a vitória israelense na Guerra de Independência, que se iniciou no dia seguinte à criação do Estado, o premiê David Ben-Gurion levou as instituições para a parte ocidental de Jerusalém e mudou o status da cidade para capital de Israel. O mundo inteiro esperneou, mas depois se adaptou à nova realidade. Desde então, os líderes que visitam Israel, incluindo todos os presidentes americanos e representantes de países árabes, vão a Jerusalém para falar com o primeiro-ministro e integrantes do Parlamento, apesar de não reconhecerem a soberania de Israel sobre a cidade.
Para a direita israelense e o gabinete de Benyamin Netanyahu, as promessas de Donald Trump são motivo de satisfação, principalmente depois de oito anos de amargura com a política do ex-presidente Barack Obama para a região, especialmente para Israel. O prefeito de Jerusalém, Nir Barkat, chegou a lançar uma campanha com outdoors espalhados pela cidade, agradecendo ao presidente Donald Trump e o encorajando a cumprir o que foi prometido.
Por outro lado, nos bairros árabes de Jerusalém oriental, a população e os líderes locais alertam para as consequências, tidas como incontornáveis. Os palestinos e praticamente todos os países árabes já disseram que a mudança de endereço da embaixada americana vai levar a região ao caos.
A mudança de endereço é o reconhecimento dos Estados Unidos de que Jerusalém é, de fato, a capital de Israel. E é justamente o “status quo” da cidade um dos pontos discutidos em qualquer negociação de paz, já que os palestinos querem a parte oriental de Jerusalém como sua futura capital.
Nas últimas sete décadas os governos americanos se esquivaram dessa questão polêmica e a mantiveram distante do salão oval da Casa Branca. Não por acaso, até hoje as embaixadas de todos os países com representação em Israel estão em Tel Aviv.

A ideia da transferência da embaixada americana para Jerusalém surgiu em 1972, durante as eleições presidenciais, e desde então passou a fazer parte da promessa de campanha de todos os candidatos republicanos, mas logo depois voltava para a gaveta.
Em 1980, o Congresso passou a discutir a questão mas nunca formalizou uma decisão. No começo da década de 1990, as tentativas de legislar o assunto aumentaram, mas não avançaram, até que em 1995 o Congresso americano aprovou a matéria e, desde então, a cada seis meses, quando chega à mesa do presidente dos Estados Unidos, é postergada. O motivo é sempre o mesmo: a segurança nacional. O último a assinar esse termo foi o ex-presidente Barack Obama, em dezembro de 2016.
Uma das razões que levaram os presidentes americanos a não assinarem a decisão do Congresso é que uma mudança de tal proporção coloca em xeque a habilidade dos Estados Unidos em servirem como negociadores honestos entre Israel e o mundo árabe. Com a estagnação das conversas de paz, as consequências são imprevisíveis e perigosas, entre elas a escalada da violência na região — além do rompimento da frágil aliança que Israel tem com alguns países árabes, como a Jordânia e o Egito.
Se Donald Trump apoia Israel, como já disse diversas vezes, deveria focar sua energia na construção de um caminho para a paz. Mas, mesmo que atrase um pouco mais, a decisão já está acertada com o governo israelense. É apenas uma questão de tempo. O dia seguinte à mudança é que ainda é uma incógnita. A mudança será, se ocorrer, explosiva.