A corrupção e o fundo do poço

30 agosto 2022 às 18h17

COMPARTILHAR
No ano de 1988 foi promulgada a Constituição Federal, que ficou conhecida como Constituição cidadã, por implementar direitos fundamentais e garantias individuais e coletivas, que trouxeram avanços à cidadania. A nova ordem constitucional deu nova roupagem ao Ministério Público para a defesa da cidadania e, consequentemente, da improbidade administrativa. Nesse ideário foi promulgada a Lei nº 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa). Em 2021, a título de atualizar a LIA, editou-se nova LIA (nº 14.230/21).
Nos últimos anos, o desmantelamento do combate à corrupção operou-se sistematicamente, iniciou-se com a edição da Lei de abuso de autoridade e seguiu com a alteração da Lei da ficha limpa. Na sequência, a lei de improbidade administrativa foi alterada com a edição da Lei 14.230/21.
A polêmica Lei n°14.230/21, retirou a culpa do art. 11, que estatui sobre os princípios da administração pública, e passou a exigir somente a conduta dolosa. A culpa grave não foi excepcionada, e o rol do referido artigo passou a ser taxativo, e não mais exemplificativo. Além dessa alteração, extinguiram-se as condutas dos incisos I e II. No art. 23, alterou o prazo da prescrição e a forma como ele é contado; reduziu-se o prazo de prescrição para 8 anos, a contar da data do fato, e não mais da data que a autoridade responsável tomou conhecimento do fato.
O retrocesso no combate à corrupção no Brasil é notório. Recentemente a transparência internacional publicou um estudo no qual o Brasil caiu do 94º para o 96º lugar no ranking mundial do combate à corrupção.
A nova Lei está mais para o estatuto do improbo, do que para uma lei que se propõe a regulamentar os casos de improbidade. Analisando o cenário atual, o promotor Alexander de Souza declarou que “não somos apenas o país do patrimonialismo, da desigualdade e do jeitinho. Parece mesmo que adoramos cultuar a impunidade.”
Nesse cenário, no dia 18 de agosto do corrente ano, o STF decidiu no recurso extraordinário, repercussão geral, tema 1.199, que a Lei nº 14.230/21 é irretroativa no tocante aos casos transitados em julgado e que estão em fase de execução. Foi recebida como alento. Como disse Dom Quixote, é preciso “sonhar o sonho impossível e enfrentar o inimigo invencível”.
A situação é preocupante e muito grave, ao ponto, de não ser exagero dizer que o Brasil está no fundo do poço. É preciso conscientizar os cidadãos, as instituições e os políticos de que o combate à corrupção deve ser prioridade. E o povo deve fazer sua parte e participar mais, exigir de seus representantes que respeitem as conquistas da cidadania.