Revista “Veja” finalmente “concede” uma capa ao senador tucano Aécio Neves. Odebrecht teria depositado dinheiro na conta de sua irmã, Andrea Neves, em Nova York

Andrea Neves e Aécio Neves: a jornalista age como porta-voz do irmão

“Veja” é vista, por vezes, como uma revista pró-tucanos. Não é bem assim. A publicação é mais liberal do que porta-voz do tucanato, que é socialdemocrata, como o PT. Como não há um partido liberal forte no Brasil — o DEM não chega a ser liberal; na prática é um partido controlado por caciques regionais —, há quem, na imprensa, dê algum crédito ao PSDB. Dizia-se, nas redes sociais sobretudo, que a “Veja” não daria uma capa ao senador Aécio Neves, do PSDB de Minas Gerais, quando fossem divulgadas suas supostas ligações com as principais empreiteiras do país — como Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e Odebrecht. Enganaram-se os críticos da publicação da Editora Abril: Aécio Neves está na capa da revista desta semana. Para piorar, sua imagem sai profunda e duramente arranhada.

A capa da Veja diz: “A vez de Aécio — Ex-executivo da Odebrecht afirma que a empresa depositou propina para Aécio Neves numa conta em Nova York operada por sua irmã. Ele nega”. Com o título de “Chegou nele”, a reportagem ocupa pouco mais de cinco páginas. O texto é de Renato Onofre.

Ressalve-se que a reportagem da “Veja” sobre Aécio Neves não tem o tom tão enfático das reportagens sobre Lula e o PT. O que não sugere que não é tão rigorosa quanto.

A base da reportagem é a delação premiada de Benedicto Junior, o BJ, um dos principais executivos da Odebrecht. “Em seu depoimento, BJ afirmou que a construtora baiana fez depósitos para Aécio em conta sediada em Nova York operada por sua irmã e braço-direito, a jornalista Andrea Neves. De acordo com BJ, os valores foram pagos como ‘contrapartida’ ao atendimento de interesses da construtora em empreendimentos como a obra da Cidade Administrativa do governo mineiro, realizada entre 2007 e 2010, e a construção da usina hidrelétrica de Santo Antônio no Estado de Rondônia, de cujo consórcio participa a Cemig, a estatal mineira de energia elétrica”.

A informação de Benedicto Junior foi confirmada por “Veja” com mais três fontes — que optaram pelo anonimato por receio de retaliações. Todas ratificam o depoimento do executivo da Odebrecht. Elas indicam que os depósitos foram mesmo feitos numa conta bancária em Nova York que era operada por Andrea Neves.

Aécio Neves disse a “Veja” que a denúncia é “falsa e absurda”. “Se confirmadas tais declarações — vazadas ilegalmente —, elas precisam necessariamente de comprovação, dada a gravidade de seu conteúdo”. Andrea Neves frisa que a declaração do executivo da Odebrecht “é falsa e covarde”. Ela afirma que se sente “impotente nesse momento, refém de uma afirmação mentirosa”. E acrescenta: “É lamentável que afirmações dessa gravidade sejam divulgadas sem que seja checada antes a sua veracidade. Assim que forem apresentados os dados que permitem identificar o banco e a conta, vou cuidar pessoalmente de provar a falsidade da acusação”.

Benedicto Junior precisa comprovar a denúncia, não basta ter apresentado a denúncia. Mas teria apresentado uma denúncia tão grave se não tivesse provas? A Procuradoria-Geral da República dificilmente a aceitaria se não estivesse acompanhada de documentação.

O senador mineiro, neto de Tancredo Neves, é um dos políticos mais citados na Operação Lava Jato. “Dos 83 inquéritos que a Procuradoria-Geral da República pediu para abrir com base nas delações da empreiteira, seis se referem a Aécio. De acordo com o conteúdo das delações da empreiteira, ele é também o político que recebeu uma das mais altas somas da construtora, 70 milhões de reais”, revela a “Veja”. Aécio Neves não declarou tal volume de dinheiro nas suas contas de campanha. Oficialmente, a Odebrecht doou 15,9 milhões de reais à campanha presidencial do político em 2014. “Do total de 70 milhões, 50 milhões foram repassados ao senador depois que a Odebrecht venceu o leilão para a construção da hidrelétrica de Santo Antônio, em dezembro de 2007.”

Na sua delação premiada, Marcelo Odebrecht “declarou que decidiu repassar os 50 milhões ao tucano porque queria ter uma boa relação com as duas sócias da usina sobre as quais Aécio tinha influência — a Cemig, estatal mineira que na época era controlada pelo tucano, e Furnas”, anota a “Veja”.

A “Folha de S. Paulo” publicou, em fevereiro deste ano, que Benedicto Junior disse, em delação, que se reuniu com Aécio Neves, “ao menos uma vez, para” discutir “um esquema de fraude em licitação na obra da Cidade Administrativa”. Oswaldo Borges da Costa Filho, o Oswaldinho, tesoureiro informal de Aécio Neves, teria combinado os detalhes da propina com as construtoras Andrade Gutierrez, OAS e Queiroz Galvão. “Ficou acertada uma propina de 2,5% a 3% do valor da obra. Segundo o executivo, o próprio Aécio decidiu quais empresas participariam da empreitada, liderada pela Odebrecht”, conta “Veja”.