Mãe de assassino faz relato pungente e sem concessões sobre a tragédia de Columbine

02 julho 2016 às 10h33

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Relação de Dylan Klebold e Eric Harris, os adolescentes que mataram alunos de uma escola nos Estados Unidos, pode ser definida como uma “loucura a dois”, como sugeriu Jacques Lacan para o caso das irmãs Papin
Candice Marques de Lima
Especial para o Jornal Opção

A escola de ensino médio de Columbine situa-se no Estado do Colorado, EUA, na comunidade de Columbine, próxima do condado de Jefferson e da cidade de Littleton. É uma instituição pública com 43 anos de existência. Por lá, tudo parece ter sempre corrido bem, até a manhã do dia 20 de abril de 1999, quando dois estudantes, que estavam finalizando o ensino médio, entraram com armas de fogo e bombas caseiras, mataram 13 pessoas, feriram outras 24 e se suicidaram em seguida.
Esse não foi o primeiro tiroteio em escolas dos Estados Unidos. No ano letivo de 1997-98 houve 42 homicídios em escolas americanas e, após o massacre de Columbine, houve pelo menos dois outros tiroteios em escolas do país com mortes de vários estudantes e professores.
Não pretendo listar todos os massacres em escolas ou tentar compreender as causas desses massacres, os quais acredito que devem ter motivos diversos e até incompreensíveis para a maioria das pessoas. As explicações que se tenta encontrar para tais atos, como bullying, desavenças com professores, transtornos mentais, não justificam crimes como esses. Há outras maneiras de se lidar com essas questões, pois nós humanos podemos fazer uso da palavra para expressar nossos sentimentos e pensamentos.
Mas a tentativa de explicação permeia o imaginário cultural, pois, como seres racionais, acreditamos que deve haver alguma coisa que aponte para o que essas pessoas pensavam para cometer tais atrocidades. Isso é o que a mãe de um dos assassinos de Columbine, Sue Klebold, tenta entender e expressa no livro que escreveu sobre a tragédia, “O Acerto de Contas de uma Mãe — A Vida Após a Tragédia de Columbine” (Verus Editora, 299 páginas, tradução de Ana Paula Doherty).
“Recentemente eu tinha feito cinquenta anos. Tinha um marido carinhoso e um casamento que já durava vinte e oito anos de altos e baixos. (…) Minha única e maior preocupação na vida, eu dissera a minha amiga, era a saúde precária de nosso gato idoso, Rocky.”
Segundo os relatos, Sue, o marido e os dois filhos formavam uma família feliz. Sue era professora e defensora de pessoas com deficiência e Tom, geofísico por formação, trabalhava em casa, e por isso convivia mais com o filho caçula, Dylan Klebold. Eram pais participativos, que controlavam o tempo e os filmes que os filhos assistiam na televisão, e faziam programas juntos com frequência.
Para Sue, todas as situações eram motivo para ensinar algo aos filhos. Quando ia ao supermercado, aproveitava para ensinar-lhes como escolher frutas, sobre o trabalho dos fazendeiros no cultivo dos alimentos e para introduzir novas palavras em seu vocabulário. “Eu ensinava Dylan a ser gentil ao colocar a fruta dentro da cesta; nós deixávamos uma senhora de idade com um ou dois itens passar na nossa frente da fila; fazíamos contato visual e dizíamos um ‘obrigado’ educado ao atendente do caixa.”
O filho mais velho, Byron, na época do massacre, já havia saído de casa. Dividia apartamento com um amigo e trabalhava, pois não quisera cursar faculdade. Quando Byron expressou a vontade de morar fora da casa dos pais, estes procuraram seu terapeuta, que lhes sugeriu que
Byron poderia morar só. Segundo Sue, foi uma situação tranquila, pois viam o filho com frequência. Após a morte de Dylan, Byron voltou a morar com os pais, mas não foi uma convivência tão pacífica como antes. “Nosso relacionamento com Byron também ficou abalado. (…) Tom e eu não conseguíamos parar de fazer pressão e de nos meter na vida pessoal dele; achávamos que nossa falta de participação na vida de Dylan levara a Columbine. (…) Eu o fiz prometer nunca, de propósito, machucar a si mesmo ou a outra pessoa. (…) Estávamos começando a cair no padrão complicado que definiria nosso relacionamento nos anos seguintes ao tiroteio, mesmo tendo ficado mais próximos do que nunca.”
Uma vida pessoal e familiar que era aparentemente feliz, após o massacre tornou-se infeliz e torturante. Ao longo do livro, o relato de Sue mostra como a destruição que seu filho Dylan causou e se auto infligiu modificou sua vida e de sua família.
No momento que soube que seu filho poderia ser um dos responsáveis pelo tiroteio na escola, as informações eram muito confusas no início, Sue desejou que Dylan morresse. Policiais invadiram sua casa e impediram que ela e o marido lá ficassem até que tivessem revistado tudo. Ficaram na garagem, esperando a polícia desocupar a casa até o final da tarde. Depois recolheram algumas roupas e os dois animais de estimação, um gato e um pássaro, e foram para a casa de um meio irmão de Tom. Seria muito perigoso ficarem em casa, pois a fúria das pessoas recairia sobre os pais dos assassinos, e, além disso, a imprensa ficou na porta de sua casa por vários dias, em busca de imagens e informações.
Sue não conseguia comer, sentia muito cansaço, não queria ver as notícias pela TV e diz que a metáfora “coração partido” para ela era real. Além de sofrer pelo luto da morte do filho amado, que era chamado por ela de “garoto ensolarado”, sofria pela tragédia que seu filho fora capaz de fazer e pelas vítimas da mesma.
Seu marido dizia que gostaria que o filho os tivesse matado também e que preferiria nunca ter nascido, tamanho era seu sofrimento. Sue conta que aceitaria ter sido morta no lugar das vítimas e em outros momentos desejava morrer durante o sono.
Nas primeiras semanas, Sue sentia um “pesar profundo — perda de memória, déficit de atenção, fragilidade emocional, fadiga incapacitante”. Conta que em certa manhã sentou-se na cama para se vestir e demorou quatro horas para terminar, pois a cada peça de roupa que vestia, parava e ficava olhando para o nada. Perguntou a uma amiga sobre o cansaço, pois não fazia nada e este era permanente, ao que essa lhe respondeu “você não está sem fazer nada; você está de luto. É um trabalho árduo”.
Sue conta que teve vontade de se matar algumas vezes após o massacre. Em 2001 escreveu em seu diário “Eu sinceramente não vejo razão para continuar vivendo. Tenho uma mamografia marcada para quarta-feira. Chego a fantasiar sobre ter uma doença fatal, assim poderia dizer: ‘Quanto tempo tenho que ficar antes de poder ir embora daqui?’ Eu não faço contribuições à vida e não tenho nenhum prazer com ela. Fantasio sobre salvar um filho de um desastre e morrer no processo, ou oferecer minha vida a terroristas para salvar um avião lotado de gente”. Ao fazer a mamografia, Sue foi diagnosticada com câncer de mama. Teve problemas gastrointestinais, qualquer coisa que comesse poderia fazer-lhe mal, e emagreceu quase 12 quilos. Também desenvolveu síndrome do pânico.
Tom, o pai de Dylan, tentou encontrar emprego depois do massacre, mas, quando sabiam quem era, as pessoas não o contratavam.
Durante todo esse percurso de sofrimento, Sue tinha vontade de participar de algum grupo de psicoterapia, mas o advogado a desaconselhou, pois o que dissesse poderia levar algum participante a ser convocado pela justiça para dar depoimento. Trinta e seis ações judiciais foram movidas contra Sue e Tom, mas ela não conta o desfecho delas e diz que o juiz determinou que os depoimentos não fossem publicados por 20 anos.
Ela e o marido procuraram um terapeuta que se disse incapaz de lidar com a situação deles, até que posteriormente encontrou uma psicóloga, que tinha perdido um filho, e com a qual se sentiu à vontade, e pôde finalmente fazer um trabalho terapêutico.
Todos esses relatos são escritos sem sentimentalismo, de maneira direta e aparentemente sincera. Ao longo do livro, Sue entremeia suas percepções e sentimentos sobre a situação, narra a culpa que a acompanha, se perguntando onde ela pode ter errado para que o filho cometesse tais atos, diz em vários trechos não saber de nada do que o filho estava tramando, pois todo o crime foi premeditado e tinha uma dimensão muito maior da que de fato ocorreu, e conta como era Dylan Klebold.
Loucura a dois

Quando nasceu, na manhã de 11 de setembro de 1981, Tom e Sue batizaram o filho como o nome do escritor galês Dylan Thomas. Sue conta que enquanto estava com o bebê em seus braços, beijando suas bochechas e observando seus dedos perfeitos, teve uma “sensação profunda e incômoda de mau presságio, forte o bastante para me fazer sentir arrepios. Foi como se uma ave de rapina tivesse sobrevoado o lugar, jogando-nos à sombra. Olhando para aquele pacotinho perfeito em meus braços, fui tomada por uma forte premonição: aquela criança me traria um sofrimento terrível”. Quando tinha duas semanas de vida, o bebê foi diagnosticado com estenose pilórica, um estreitamento na base do estômago, e teve de ser operado imediatamente. Então, Sue acreditou que a premonição que tivera havia sido realizada.
Dylan foi uma criança quieta, reflexiva, adorava brinquedos de montar, aprendeu a fazer origami, era chamado pelos pais de “nosso pequeno veterano”, pela habilidade que tinha de tolerar frustrações. Entrou na escola um ano antes do tempo, por ser alto e ter facilidade pelo aprendizado — quando morreu, aos 17 anos, media 1,93 de altura, e estudou da quarta à sexta séries em classes para crianças com altas habilidades.
Desde garoto tinha facilidade para fazer amizades, embora fosse tímido, e desde sua infância teve três amigos inseparáveis, sendo um deles Eric Harris, o outro assassino do massacre de Columbine. Ambos se conheceram nos últimos anos do ensino fundamental. O pai de Eric era militar e tinha se aposentado na região de Denver. No final do oitavo ano, foram premiados por terem boas notas em matemática. Segundo Sue, Eric sempre tinha sido um garoto educado e respeitoso com ela e seu marido.
Um ano antes do massacre na escola, Dylan e Eric foram presos por terem arrombado uma van e roubado seus equipamentos eletrônicos. Foram encaminhados para um programa que atende jovens infratores chamado Diversion. Lá, tiveram de participar de palestras, pagaram pelos danos ao dono da van, e foram orientados a procurar terapia, situação à qual Dylan recusou-se terminantemente. Prometeu à mãe que não faria mais aquilo e os dois amigos foram dispensados do programa antecipadamente pelo bom desempenho que apresentaram.
Diferentemente de Dylan, Eric apresentava um comportamento agressivo. Tinha um site no qual publicava ofensas e uma vez, num jogo de futebol, foi agressivo verbalmente com Dylan por este ter tido um mau desempenho. Por essa agressividade, os pais de Eric haviam-no levado a um médico. O jovem estava tomando antidepressivo na época do massacre.
Ao longo do livro, Sue traz poucas informações sobre Eric e sua família, porém, não explica o motivo para isso. Mas conta que os especialistas que analisaram os diários do adolescente afirmam que tinha características de um psicopata. Os investigadores do FBI descobriram que Eric tinha tentado convencer outros garotos a participar de um plano de destruição em massa, mas somente Dylan aceitou.
Antes do massacre, houve um mandado para vasculhar a casa de Eric quando a polícia recebeu reclamações de que ele estaria fabricando bombas caseiras, mas o mandado nunca foi apresentado a um juiz e a casa nunca foi vasculhada.
Em nenhum momento Sue afirma que o filho foi vítima de Eric, embora ela conta que acreditou por um tempo nessa possibilidade. Ela soube de boatos de que teriam sido encontrados livros na casa de Eric, que ensinavam como fazer lavagem cerebral, mas que não foram comprovados. Ela não justifica os assassinatos que o filho cometeu por meio de seu transtorno mental ou do bullying que sofreu na escola. Entende que o filho quis fazer o massacre. Ao longo do tempo foi construindo e descontruindo a imagem do filho a partir das informações que recebia e de seus sentimentos em relação a ele. Quase ao final do livro ela escreve “Eu ainda o amo. Eu odiei o que ele fez, mas ainda amo meu filho”.
Após o tiroteio, foram encontrados pela polícia vídeos feitos na casa de Eric e de Dylan, que foram chamados de “vídeos do porão”, pois o quarto de Eric ficava no porão. Esses vídeos e os diários de Eric e Dylan serviram de base para um possível diagnóstico dos dois, embora seja difícil fazer um diagnóstico póstumo. Neste, observou-se que “Eric contava com a raiva depressiva e reprimida de Dylan para alimentar e dar combustível a seu sadismo, enquanto Dylan usava os impulsos destrutivos de Eric para tirá-lo de sua passividade”. Apesar de o livro ser escrito numa perspectiva neurobiológica, eu interpretaria a relação de ambos como uma “folie à deux” (loucura a dois), termo utilizado pelo psicanalista francês Jacques Lacan ao analisar o caso das irmãs Papin. Duas irmãs que eram empregadas domésticas e mataram violentamente sua patroa e a filha e mostraram-se após o assassinato profundamente perturbadas.
Com a leitura póstuma dos “diários” de Dylan — na verdade, eram folhas de cadernos soltas, folhetos de propaganda, nos quais o adolescente expressava seus pensamentos e ideações suicidas —, Sue pôde perceber o quanto seu filho sofria e queria morrer, fato que ele nunca compartilhou com a família e os amigos mais próximos.
Uma das coisas que chamou a atenção tanto do especialista que analisou os escritos quanto de sua mãe, é como a escrita de Dylan era diferente, utilizando neologismos como “depressionistas” e “perceptidão” e uma sintaxe diferente, o que Lacan chamava de “assinatura da psicose”. Num dos trechos Dylan escreveu “ahhh meu deus, quero tanto morrer, taaanto… tão triste, desolado, sozinho e sem salvação eu sinto que estou… não é justo, NÃO É JUSTO!!! Vamos resumir minha vida… a existência mais triste na história de todos os tempos”.
Dois anos antes da tragédia, Dylan começou a expressar tais sentimentos por escrito e se não indicou que faria o massacre nem deixou bilhete suicida — na maioria dos casos o suicida não deixa bilhete —, segundo informações da autora do livro, ele escreveu várias vezes sobre o que o atormentava. Sue diz que, por respeito à privacidade dos filhos, nunca revistou seus escritos, embora olhasse o quarto de ambos, mas afirma que se tivesse outra oportunidade faria diferente e revistaria suas coisas, fato que ela orienta os pais de crianças e adolescentes a fazerem com frequência.
Outros escritos de Dylan que chamam a atenção é “quando estou em minha forma humana, sabendo que vou morrer, tudo tem um toque de trivialidade” (…) “feito um humano, sem a possibilidade de SER humano”.
Ao ter acesso a esses diários, Peter Langman, psicólogo especialista em atiradores de escola, escreveu a Sue: “1. Nada que você fez ou deixou de fazer levou Dylan a agir como agiu. 2. Você não “falhou em ver” o que Dylan estava passando — ele era profundamente fechado e escondeu deliberadamente o próprio mundo interior não só de você, mas de todas as pessoas na vida dele. 3. No fim da vida dele, o funcionamento psicológico de Dylan tinha se deteriorado a tal ponto que ele não estava mais pensando com clareza. 4. Apesar dessa deterioração, seu antigo eu sobreviveu o suficiente para poupar quatro pessoas durante o ataque”.
A partir disso, Peter Langman diagnosticou Dylan como uma criança com um possível transtorno de personalidade esquiva, especialmente por ser tímido, extremamente envergonhado e autocrítico; que teria progredido na adolescência para um transtorno de personalidade esquizotípica. Dylan apresentava pensamentos delirantes, nos quais era um ser divino, e paranoicos, como quando seus pais o levaram para conhecer uma universidade no Arizona a qual tinha sido aprovado e ele não quis ficar no McDonald’s onde tomavam um lanche por achar que uns adolescentes estavam rindo dele. Sue conta que os adolescentes nem olharam para o garoto, mas que foi embora dali, pois ele se mostrou muito incomodado com a situação.
Uma das maneiras que Sue encontrou para compreender as ações de Dylan foi perceber que o desejo de morrer do filho o levou a participar do massacre. Um especialista em justiça criminal, Adam Lankford, escreveu que “os atiradores, assim como os homens-bomba, compartilham três características principais: problemas de doença mental que geraram o desejo de morrer, um profundo senso de vitimização e o desejo de ganhar fama e glória por meio do assassinato”.
Entender o desejo suicida de Dylan foi a forma que Sue encontrou para se reconciliar com sua memória e de sobreviver à tragédia. Após o tratamento do câncer de mama, envolveu-se como ativista na prevenção de suicídio.
Ela relata que os números de suicídio nos EUA são alarmantes: 40 mil por ano, sendo que uma pessoa se suicida a cada treze minutos. É a terceira maior causa de morte entre pessoas de 10 a 14 anos e a segunda maior na faixa etária de 15 a 34 anos. Em um estudo com seis mil e quinhentos adolescentes em 2013, “um em cada oito já havia considerado o suicídio, e um em cada vinte e cinco tinha tentado se matar, embora apenas a metade estivesse em tratamento”.
“O pensamento suicida é um sintoma de doença, de algo a mais que deu errado. A maioria dos suicídios não é impulsiva, decisões tomadas de última hora. (…) Um suicida é alguém que não é mais capaz de tolerar o próprio sofrimento. Mesmo que não queira realmente morrer, ele sabe que a morte acabará com aquele sofrimento de uma vez por todas.”
Sue orienta que os veículos de comunicação não divulguem histórias de suicídio, pois essas informações podem gerar outras mortes. “Mais de cinquenta estudos pelo mundo conectaram fortemente a cobertura de suicídios pela mídia com o aumento da incidência de suicídios similares ou imitados.” Seria o chamado “contágio suicida” ou efeito Werther, em referência ao personagem do escritor alemão Goethe, pois, quando o livro foi publicado, muitos jovens se suicidaram usando a mesma roupa do personagem. Ela também orienta que nos casos de assassinatos em massa, que não se divulgue imagens dos assassinos vestidos com as roupas do crime, porque pode incentivar outras pessoas. “Não faça dos assassinos heróis, sem querer. Parece óbvio, no entanto, quando um evento desse tipo acontece, o que se vê são descrições detalhadas (e, eu diria, fetichistas) das armas usadas, de como os assassinos as esconderam.” Para corroborar essas informações, a autora informa que foram encontrados materiais referentes a Columbine entre as posses dos atiradores da universidade Virginia Tech e da Escola de Ensino Fundamental Sandy Hook.
Ela e o marido lutaram na justiça para que a divulgação dos vídeos do porão fosse proibida. Vi algumas imagens que penso serem desses vídeos, mas de fato não encontrei muita coisa. As imagens são chocantes, Dylan e Eric aparecem com expressões faciais muito agressivas.
Em 2014, após 43 anos de casamento, Sue Klebold e o marido resolveram se separar. No livro ela conta como eles se distanciaram gradativamente após a tragédia de Columbine.
Necessidade de escuta
Eu já havia lido um livro literário que tratava de massacre em escola, “Precisamos Falar Sobre o Kevin”, e assistido ao filme homônimo. Nesse livro, embora a história seja muito triste, achei mais fácil e até prazerosa sua leitura. A narrativa é feita em formato de cartas da mãe de Kevin, Eva, a seu pai, Franklin, contando como ela percebia esse filho que foi incômodo desde o nascimento.
O acerto de contas de uma mãe é um livro bem escrito, mas bastante repetitivo. A autora parece escrever em círculos, sempre dizendo o quanto sente-se culpada pelas ações do filho e afirmando que não sabia de nada. Ao mesmo tempo, ela traz informações além de sua família e de Dylan, sobre suicídio, transtornos mentais e a necessidade de tratamento e escuta dessas pessoas.
O importante é que os leitores do livro não fiquem preocupados em demasia se seus filhos, alunos ou outros adolescentes que conhecem possam cometer uma tragédia dessa magnitude, mas que a leitura sirva para perceberem que as pessoas precisam de uma escuta que possa ajudá-las e até salvá-las do sofrimento.
Candice Marques de Lima, psicanalista, é mestre em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás e professora da Universidade Federal de Goiás (UFG).
Sue Klebold sugere mais conversa e menos sermão no relacionamento com filhos

A partir de pesquisas que fez, Sue Klebold, autora de “O Acerto de Contas de uma Mãe — A Vida Após a Tragédia de Columbine”, escreve: “Eu gostaria de ter escutado mais em vez de dar sermões; gostaria de ter me sentado em silêncio com ele em vez de preencher o vazio com minhas próprias palavras e pensamentos. Gostaria de ter reconhecido os sentimentos dele em vez de tentar tirá-los de sua cabeça, e de nunca ter aceitado as desculpas dele para evitar uma conversa (…) quando algo parecia estranho. (…) Gostaria de ter deixado tudo de lado para focar nele, ter investigado e fuçado mais, e de ter estado presente o suficiente para ver o que não vi.”
Essas orientações podem ajudar pais, educadores e profissionais da área da saúde a ter uma escuta mais afinada para os pedidos de socorro, que às vezes podem estar inaudíveis. Um dos psicólogos entrevistados por Sue Klebold diz que, quando o adolescente se recusa a fazer tratamento psicológico, ele chama os pais ao consultório. Isso pode ser uma forma importante de procedimento ao escutar os pais e poder orientá-los na melhor forma de lidar com seus filhos.
Outra informação importante é que o comportamento de adolescentes com depressão é diferente do comportamento de adultos na mesma situação. Enquanto estes ficam tristes e apáticos, os adolescentes “tendem a se isolar e a mostrar um aumento da irritabilidade, autocrítica, frustração e raiva. Dores inexplicáveis, reclamações, distúrbios do sono e teimosia/implicância” são sintomas mais comuns inclusive em crianças mais novas. (Candice Marques de Lima)